Cinzas

Medidas Desesperadas


Final de Maio – 1998

A antiga Torre de Astronomia fora o ponto de encontro escolhido. Era simbólico e ideal: Depois da morte de Dumbledore o lugar não fora mais frequentado, nem sequer reconstruído; as paredes e a estrutura ainda guardavam as marcas da batalha que causou uma reviravolta no mundo bruxo. Marcas de morte e destruição.

Todos do pequeno grupo estavam encapuzados, como se o simples ato de esconder o rosto fosse suficiente para fazer com que as emoções internas fossem mais facilmente controladas. Quando Gina subiu o pequeno e último lance de escadas que dava acesso à Torre, seguindo os passos de Harry, todos os voluntários já estavam lá. Enquanto Harry se dispersava cumprimentando com murmúrios um e outro, Gina viu a figura mais alta se aproximar dela e cochichar.

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"Onde você passou a noite? Fui te procurar com Percy no meio da noite e sua cama estava vazia. Se não tivéssemos que salvar o mundo no dia seguinte, teria procurado a mamãe para que ela te achasse." Rony disse, com um jeito carrancudo.

"E aposto que essa simples visita de madrugada não significou nada." Ela completou, com um tom sarcástico, tão baixinho quanto podia. "Ah sim, isso se não considerarmos que vocês tinham em mente usar qualquer artifício para que eu ficasse no castelo." Ela frisou explicitamente a palavra. Já tinha passado pela sua cabeça mais de uma vez que algum dos irmãos (ou todos eles juntos) tentaria fazer alguma coisa para impedi-la de ir.

"Er, bem…" Ele falou e Gina tinha certeza que seu irmão tinha ficado com as orelhas vermelhas. "Agora não importa mais. De qualquer forma, vamos ter uma conversa séria quando chegarmos."

Ela já estava com a resposta mal-criada na ponta da língua quando se deu conta de que Rony tinha uma fé tão cega na vitória - e em Harry - a ponto de usar o mesmo tom que ele usaria ao dizer 'vamos conversar depois que chegarmos das compras no Beco Diagonal'. Ela inevitavelmente sentiu uma onda de otimismo e ternura pelo irmão. Sem resistir ao impulso, fez algo que desarmou totalmente o ciúme de Rony: se levantou bem na ponta dos pés, envolveu o pescoço dele com os braços, deu um beijo leve no seu rosto e disse ao seu ouvido.

"Eu te amo, Rony. Nunca se esqueça disso." Ela o soltou depois de alguns segundos. Rony ficou ali parado, como se Voldemort tivesse aparecido em pessoa para dizer que o amava, ao invés da sua irmã caçula.

Gina não conseguiu observar por mais tempo a reação de Rony porque no instante seguinte Harry elevou a voz para que todos o ouvissem. Ele repassou em voz alta o plano que já tinha virado mais ou menos um mantra na cabeça dela: "Voldemort estará sendo guardado por quatro comensais essa noite: Mulciber, Rowle, Rockwood e Selwyn, com mais seis deles fazendo a ronda para garantir que nós não consigamos evacuar Hogwarts com os feridos," Ele fez uma pausa e Gina mais uma vez se sentiu inquieta com a confiabilidade dessas informações, que ninguém, com exceção de Harry, sabia de onde vinham. Ele continuou "Quando tiver se passado quarenta minutos da nossa partida, Carlinhos começará a evacuação dos feridos e daqueles que querem abandonar o castelo. Caberá a ele contar para a Ordem e os outros sobre o que vamos fazer e sobre o que eu, Rony e Hermione estivemos fazendo nesse último ano" Ela viu seu irmão mais velho assentir silenciosamente, sob seu capuz. "Quanto a nós, o mais importante é que nossa ação seja feita de surpresa, a ponto de evitar que os que estão de guarda não consigam chamar os outros comensais. Qualquer tentativa nesse sentido deve ser absolutamente impedida. Estou bem certo de que, se chegarmos até Voldemort, ele não se rebaixará a chamar ajuda, mesmo estando fraco. Por isso nos dividiremos em grupos, de forma a lidar com os comensais separadamente; eu, Rony, Hermione e Neville tentaremos chegar até Voldemort, sem nos determos muito nos outros comensais. Essa será tarefa de vocês." Ele disse, apontando para o resto do grupo. "Jorge e Angelina, Dean e Lino, Percy e Gina." Aos ouvidos dela, pareceu que ele tinha dito seu nome contra a vontade, mas ela não se importou. "Lembrem-se, temos uma lista com os nomes dos comensais, só terminaremos quando tivermos lidado com todos eles."

Depois que ele terminou, o silêncio tomou conta de todos; não se ouvia nada a não ser o som do vento batendo contra os escombros da Torre de Astronomia. Gina já começava a se sentir sufocada pelo silêncio quando Hermione falou, num tom meigo que Gina quase não via a amiga utilizar.

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"Harry, você sabe que somente um feitiço para desarmar não vai funcionar mais, não é?"

"Eu sei." Harry disse, com os dentes cerrados. "Eu sei." Ele repetiu mais baixo, mais para si mesmo do que para os outros.

"Então, todos estão prontos?" Carlinhos tomou as rédeas da situação. Quando todos assentiram, ele conjurou cinco vassouras, que apareceram em linha na frente dele. "Creio que seja melhor que vocês também viajem em duplas, chamará menos atenção. Contarei o tempo a partir do momento em que vocês levantarem voo." Ele se virou para os quatro irmãos, reunidos num canto da sala. "Se alguma coisa acontecer com qualquer um de vocês, eu juro que faço lanche de dragão com o responsável. Então tomem cuidado. Eu odiaria que meus dragões tivessem indigestão." Dizendo isso, ele abraçou cada um deles, se demorando um pouco mais com Jorge. "Espero vocês dentro de algumas horas."

Sem mais palavras, cada par subiu na sua vassoura. Num ato de rara admissão de incapacidade para alguma tarefa, Percy ofereceu a Gina o papel de condutora da vassoura. Quando ela lançou a ele um olhar interrogativo, seu irmão falou.

"O propósito do plano é, ao menos, chegarmos vivos na Floresta Proibida. Isso provavelmente não vai acontecer se eu guiar a vassoura." Ele disse, arrumando os óculos que insistiam em escorregar pelo seu nariz comprido.

Ela sorriu e subiu na vassoura. Percy foi logo atrás, segurando firmemente na sua cintura. Com um sinal silencioso de Harry, todos levantaram voo em direção a parte leste dos terrenos de Hogwarts.

E foi maravilhoso sentir o vento batendo contra o rosto; foi invadida por uma vontade louca de dar piruetas e segurou um princípio de sorriso quando imaginou a cara que Percy faria se ela fizesse isso. Balançou a cabeça, resolvendo que era mais prudente se concentrar na missão. Usando sua visão periférica, percebeu que as vassouras tinham tomado distância umas das outras, como haviam combinado previamente. Depois de poucos minutos de voo, já adentravam nas proximidades da Floresta; Lino e Dean desceram primeiro, rapidamente perdendo altitude e desviando de galhos. Gina desejou silenciosamente boa sorte ao ex-namorado e ao amigo. Na seqüência, Jorge e Angelina desceram; ela estava com a cabeça e os braços bem junto do corpo de Jorge, com os olhos fechados como se estivesse fazendo uma prece.

Agora ela sabia que era sua vez, mas não resistiu ao impulso de chegar mais perto da vassoura de Harry, posicionando sua vassoura de forma a ficar lado a lado dele e de Neville. Ela simplesmente olhou dentro daqueles olhos verdes numa forma íntima de despedida, que guardava um mundo de promessas, que sempre começavam com a frase "Quando nós voltarmos…".

Ela sorriu para Harry e acenou para Neville. Sentiu Percy pressionar sua cintura como se dissesse 'o que diabos você está fazendo?' e então mergulhou para a escuridão na Floresta Proibida.

Eles pousaram o mais silenciosamente possível; com um toque da sua varinha, Percy fez a vassoura desaparecer. Eles andaram por alguns metros, com Percy tomando a frente da busca de forma protetora. Sabiam que, assim como eles, comensais patrulhavam em pares, ora o perímetro do castelo para se certificar de que os gigantes continuavam bloqueando a saída para Hogsmead, ora os arredores da Floresta Proibida, para garantir a segurança do seu mestre.

Gina podia sentir sua capa se arrastando sobre a grama molhada da floresta, num ruído abafado. Estava tensa da cabeça aos pés, se virando rapidamente ao som de qualquer coisa, desde o vento que batia nas árvores até as pequenas corujas que piavam inesperadamente. Ela seguia os passos de Percy, como se pisar nas pegadas deixadas por ele na relva fofa pudesse diminuir a já pequena perturbação que geravam na floresta.

Era difícil caminhar longe das trilhas, mas se fosse diferente, acabariam se tornando alvos fáceis. Gina desejou que os Centauros estivessem ali, entretanto, segundo as misteriosas informações de Harry, depois da decisão deles de se juntarem ao lado de Harry na Batalha de Hogwarts, Voldemort não tivera piedade e eles também não puderam voltar para a Floresta, sob pena de morrerem de forma terrível.

Ela foi interrompida dos seus devaneios quando Percy parou bruscamente na sua frente, fazendo com que ela esbarrasse nas costas dele. Ele se virou e fez um sinal de silêncio, colocando o dedo indicador sobre os lábios. Havia duas pessoas, perto da trilha, se aproximando deles pela direita.

"Eu te disse, Nott. Deveríamos entrar no castelo e acabar logo com isso." Disse uma voz se tornando cada vez mais nítida, para o desconforto de Gina. Pela tonalidade da voz, ela calculou que eles estariam muito perto agora.

"Não é como se estivéssemos transbordando força, Crabbe. E todo mundo sabe que você só quer entrar para se vingar pelo seu filho." Gina sentiu um incrível tom de malícia se sobrepor na voz naquele que deveria ser o Nott. "Além do mais, pelo que o filho do Goyle nos contou, foi algo que ele mesmo causou. Não era digno de ser um comensal, falhando em controlar feitiços assim."

Gina nunca soube se a reação do irmão se deu pela superestimação das habilidades dos comensais ou pela profunda falta de respeito com a morte do filho de alguém, sendo a morte de Fred tão recente. A questão é que o pai de Crabbe nem pôde responder, porque Percy pulou mais rápido do que Gina supôs que ele poderia e num sacudir de varinha, tinha estuporado um comensal.

Ela correu na direção do irmão, tentando esconder sua imagem atrás das árvores, que eram numerosas e se posicionou perto da onde o irmão estava. Percy já começava a duelar com um grande comensal, com braços desproporcionais em relação ao corpo. O comensal atacava com uma voracidade surpreendente para o seu tamanho e Percy tinha alguma dificuldade em rebater os feitiços. Gina estava com a varinha erguida, tentando mirar no comensal, mas tanto ele quanto seu irmão se moviam muito rápido para que ela tivesse segurança para lançar qualquer azaração. Um feitiço passou muito perto dela e Percy gritou, depois de se proteger atrás de uma árvore.

"GINA, VAI!" Ele lançou um feitiço e voltou a usar a árvore como um escudo. "Temos que inutilizar a maior quantidade de comensais possível! Eu te encontro assim que terminar com esse aqui." Ela hesitou mais um pouco, apontou a varinha mais uma vez, quando seu irmão gritou de novo. "VAI!"

Então ela correu em busca de novos alvos. Percy tinha razão, deveriam tentar abater o maior número de comensais antes que o ataque fosse alardeado. Diminuiu os passos assim que a adrenalina permitiu que ela raciocinasse propriamente; seria um alvo mais fácil se continuasse fazendo mais barulho do que um berrador. Andou por mais alguns minutos, torcendo para que Percy pudesse seguir seu rastro. A Floresta Proibida era extremamente densa; os galhos batiam no seu rosto e Gina teve a certeza de que suas bochechas ficariam muito cortadas no dia seguinte. Se houvesse dia seguinte, ela pensou.

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Ela avistou uma pequena clareira que poderia servir como ponto de encontro com Percy e possivelmente um bom lugar para se criar armadilhas para os comensais. Ela decidiu que poderia se aproximar, se fosse bastante cautelosa. Ainda estava protegida pelas sombras das árvores quando deu uma espiada para o pequeno lugar onde a luz da Lua incidia com mais força. Parecia deserta. Ela respirou fundo, se preparando para expor sua posição quando sentiu a ponta de uma varinha contra sua nuca.

"Abaixe e coloque sua varinha no chão, onde eu possa vê-la." A familiaridade da voz registrada pelo seu subconsciente foi abafada pelo medo crescente. Ela fez o que lhe foi ordenado; qualquer reação diferente disso significaria sua sentença de morte. "Ande." Ela seguiu em direção ao lugar descoberto na floresta, sentindo com alívio que a varinha tinha descolado do seu pescoço. Imaginou que isso se devia ao fato de que o comensal havia se abaixado para pegar a varinha que ela havia deixado no chão.

Ela entrou na pequena clareira, especulando se ali seria o lugar da sua morte. Decidiu que encararia o que quer que fosse de frente, se virando altiva, com a convicção de que não iriam vê-la fraquejar antes de sucumbir. Quando os seus olhos se encontraram com o da figura vestida de negro a sua frente, seu estômago se contraiu instantaneamente.

Draco Malfoy estava parado uns poucos metros à sua frente, apontando a própria varinha para a cabeça de Gina com uma mão e segurando a varinha dela com a outra, ostentando um sorriso zombeteiro no rosto. Inconscientemente, ela abaixou o capuz que cobria sua cabeça; com o movimento, os longos cabelos ruivos caíram como uma cascata pelas suas costas.

"Você…" Ele balbuciou no mesmo instante em que o sorrisinho desaparecia da sua boca. Gina estava impassível, sem saber ao certo como reagir. Ele tinha, de certa forma, protegido-a na Batalha de Hogwarts e agora estavam ali, claramente em lados opostos. Ela notou que ele tinha abaixado a varinha levemente e todas os sentimentos contraditórios que ela sentira em Hogwarts com relação a ele atingiram-na como um raio.

"Malfoy, escute…" Ela começou torcendo as mãos, toda a confiança de minutos antes se esvaindo do seu corpo. Como dizer coerentemente que eles precisavam neutralizar todos os comensais dali, matar Voldemort e destruir o lado dele da guerra, mas que ele podia vir com ela, se ele quisesse? Ah, isso tudo sem soar uma completa lunática.

Se alguém perguntasse a razão desse comportamento, Gina teria mil explicações ensaiadas, como 'ele poderia ter matado Dumbledore, mas não o fez', 'ele podia ter me ajudado desacordada e exposta em Hogwarts, mas não o fez' e 'todo mundo merece uma segunda chance'. Mas todas elas não representavam totalmente a verdade; ela simplesmente queria ajudá-lo, tirar aquela perturbação enlouquecedora dos olhos dele... Ninguém merecia passar por aquilo e ele também não. Era só um adolescente jogado no meio daquilo tudo, como ela, Rony e Harry.

Ela tomou coragem para falar. "Isso vai chegar ao um fim hoje, independente do que fizermos agora. Voldemort está fraco e debilitado… Você pode simplesmente virar as costas e procurar ajuda a ajuda da Ordem, procurar se proteger." Foi tudo que ela conseguiu dizer.

Ele permaneceu um instante em silêncio, antes de responder, frio. "E você acha que eles me aceitariam?" A pergunta foi mascarada com um tom de deboche, mas Gina sabia que por trás das palavras havia brilhado uma centelha de esperança.

"Eu aceitaria…"

Ela não conseguiu organizar os pensamentos para terminar a frase. Malfoy tinha ficado tenso novamente. Ele estava prestando atenção em algum ponto acima do ombro dela e quando ela virou o pescoço para ver, notou seu irmão se aproximando. Gina imaginou que Draco estava fora do campo de visão de Percy, uma vez que, quando ficou a poucos metros de Gina, ele começou a falar naturalmente, ainda ofegante e ajeitando os óculos.

"Por Merlin! Aquele troglodita me deu mais trabalho do que eu imaginava! Mas agora os dois estão amarrados e incomunicáveis." Ele disse com um sorriso. Quando percebeu que a irmã não tinha retribuído seu gesto e ainda estava parada tensa, ele congelou. Foi a única coisa que ele teve tempo de fazer: com o canto do olho, ela viu Draco Malfoy erguendo a varinha em direção a Percy e tudo aconteceu ao mesmo tempo.

Gina gritou um sonoro "NÃÃO!" diante da possibilidade de perder outro irmão; Draco Malfoy lançou um feitiço não-verbal e Percy caiu inerte no chão.

Passou um segundo até que ela tivesse coragem de ter qualquer reação. A mente dela registrava informações freneticamente.

Luz vermelha, não verde. Luz vermelha, não verde.

Malfoy tinha escolhido estuporar seu irmão, não matá-lo.

Gina sentiu seus olhos marejarem repentinamente; queria correr até Percy e verificar se estava tudo bem mas seus pés estavam fincados no chão. Por um momento, Malfoy pareceu hesitar e então voltou a colocar no rosto a máscara de indiferença que Gina, com estranhamento diante da ideia, estava se acostumando a prestar atenção. Ela estava tão absorta naquela figura enigmática que não notou a aproximação de outra, um pouco mais alta e sinistra, se aproximando dos dois num andar resoluto.

Lúcio Malfoy havia encontrado o filho.

"Ora, ora, Draco! Deixo você sozinho por um minuto e veja o que encontra. Não é a coelhinha Weasley que me causou alguns pequenos problemas no Ministério?" Ele se aproximava dela vagarosamente e o primeiro impulso de Gina foi correr, mas se lembrou de Percy, estendido no chão próximo a ela; não poderia deixá-lo. Viu Lúcio se postar ao seu lado e levantar uma rebelde mecha de cabelo ruivo, que tinha caído sobre o testa dela. Ele não carregava uma varinha, mas ainda assim era uma figura imponente, bem mais alta do que ela. "Sabe o que a sua aventura e dos seus amiguinhos significaram para mim e para minha família?" Gina olhou para Draco, mas o garoto se mantinha impassível, parado no mesmo lugar, como se fosse uma estátua. Quando ele notou o olhar de Gina sobre si, demonstrou um vislumbre do que poderia ser dúvida. Mas foi breve: logo a expressão gélida voltara ao rosto do adolescente. Gina virou os olhos para Lúcio Malfoy; não demonstraria o medo que sentia, por nada nesse mundo. "Mas talvez nós pudéssemos começar uma pequena revanche. Eu proponho um embate justo, coelhinha: ambos sem varinha, apenas com os instintos mais primitivos. Penso que você, como uma suja amantezinha de trouxas, apreciará minha oferta." O sorriso cínico dele chegava a ser aterrorizante.

Gina sentiu os braços serem apertados terrivelmente por mãos implacáveis. Ele estava sacudindo-a como uma boneca. Ela tentou chutar, mas ele se esquivava com relativa destreza. Gina cerrou os dentes quando ele libertou uma mão, sabendo que isso não significaria um alívio de qualquer forma. Seu palpite se provou verdadeiro quando ela sentiu uma forte bofetada no lado direito do rosto. O movimento a fez cair no chão bruscamente, sentindo um gosto metálico de sangue na boca. Ela ergueu os olhos, tentando colocar neles alguma ponta de desafio, mesmo que isso não fosse significar nada para Lúcio Malfoy.

Ele pareceu achar graça da situação, deu uma risada altiva e a ergueu do chão, puxando-a pelo braço como se ela não pesasse quase nada. Segurou-a pela garganta, postando os dois polegares na altura das suas amígdalas e fazendo uma pressão quase insuportável. Ela começou a perder o fôlego e o seu mundo estava escurecendo aos poucos; via o vento balançando as folhas das árvores, a lua grande no céu e o rosto em frente a ela, tão pálido, tão distorcido pela raiva, tão mau. Já no limiar entre a consciência e a inconsciência, Gina decidiu que não queria que aquela fosse a última imagem que ela veria. Ela então mirou o Malfoy mais novo, que olhava a cena com uma apreensão visível. No estado daqueles que tem suas ações permeadas pela falta de raciocínio lógico, ela quase ficou mais tranqüila ao ver que ele hesitava diante da cena. Será que ele interromperia? Foi seu último pensamento com um mínimo de coerência, até que o mundo começasse a mergulhar numa neblina densa e…

"Avada Kedavra!"

Como um buraco negro que suga tudo a sua volta, o pulmão de Gina voltou a absorver todo o ar que podia, causando uma dor terrível. Ela se viu de joelhos no chão e seus olhos não tardaram a registrar a cena. Neville Longbottom estava com a varinha apontada para o ponto onde Lúcio Malfoy estivera, carregando no rosto uma expressão que misturava espanto, determinação e medo. Draco, em choque, corria os olhos do grifinório até o corpo do pai, estendido inerte no chão, e então até Neville novamente. Quando ele abriu a boca, não havia mais sinais do adolescente esnobe e indiferente; só havia ódio.

"Seu grande bastardo imbecil! O que você fez?!" Ele falou, já levantando a varinha em direção a Neville. Gina tentou gritar, mas a dor extrema na garganta a impediu de emitir sons mais fortes do que leves murmúrios roucos. Os dois haviam começado a duelar e Gina sabia que Neville não aguentaria muito tempo contra um Malfoy com suas habilidades potencializadas pelo ódio. Ele se esquivava dos feitiços com certa dificuldade e Draco avançava, como se quisesse lançar a azaração final com a varinha colada na garganta de Neville. "Seu maldito filho da puta!" Cada feitiço era permeado com uma ofensa diferente, nunca gritada. E essa fúria gelada era assustadora.

Gina se levantou, com a intenção de interferir de qualquer forma, mas estacou quando reparou que ele tinha lágrimas nos olhos. Nesse momento ela percebeu que Draco Malfoy estava condenado, perdido para a Ordem, para o seu lado. E essa foi uma realização inexplicavelmente dolorosa e amarga.

Não posso ficar parada aqui pensando no que já foi, feito uma estátua! Neville não vai resistir por mais muito tempo – Ela pensava com o desespero que já tomava conta dela.

Como um bálsamo para sua falta de ação, Harry tinha surgindo ofegante, às costas de Draco Malfoy. Ele ergueu a varinha e muito baixinho, como se sentisse um pesar absurdo, disse o feitiço que estuporou o jovem loiro. Neville, ao ver seu oponente tombar desacordado fortemente contra o chão, parou, largando sua varinha como se segurá-la fosse algo impróprio e indigno dele.

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"Eu… Eu… Ele ia matar a Gina." Ele disse para ninguém em particular, olhando para as suas mãos abertas. Quando falou novamente, ele se dirigiu à garota. "Ouvimos um grito seu e disparei na frente de Harry, sem pensar muito bem. Acabamos nos perdemos e quando cheguei aqui… Eu nunca deveria ter feito isso." Ele concluiu, balançando tristemente a cabeça.

Gina caminhou até ele, com as pernas ainda bambas. Ela abraçou o amigo, sentindo que ele tremia. "Obrigada, Nev. Você foi muito corajoso e eu sempre vou me lembrar disso." Sua voz era fraca e dolorosa.

"Nós não fazemos isso, Gi. Não matamos. É errado." Ele disse olhando fixamente para o chão.

Ela procurou Harry com os olhos em busca de apoio, mas encontrou o adolescente perplexo olhando para o corpo de Lúcio Malfoy, como se não acreditasse no que os olhos estavam vendo.

"Não era para eles estarem aqui. Eles não estavam na lista. Merda! Não era para os Malfoy estarem aqui!" Gina sentiu vontade de ir até ele para esbofeteá-lo. O que menos importava agora era a porcaria da lista de comensais que estariam na Floresta Proibida naquela noite.

"Harry, eu desconfio que temos coisas mais importantes para resolver agora do que um problema de comparecimento de comensais." Ela disse com os dentes cerrados diante da dor que era falar.

"Você não entende. Não era mesmo para eles estarem aqui!" Ele disse, um pouco triste.

"ISSO NÃO INTERESSA MAIS!" Ela perdeu o controle que vinha segurando desde então e podia jurar que sentiu sua garganta rasgar diante do esforço. "Lamentar não vai nos ajudar! Merlin, ele já está morto!" Ela cambaleou e colocou a mão na garganta, como se o gesto pudesse fazê-la parar de doer.

Harry pareceu recuperar o bom-senso diante da explosão de Gina e retomou um pouco do controle da situação. Ele olhou para Percy, caído no chão.

"Ele está...?"

"Não. Draco apenas o estuporou." Ela não pôde reprimir um sentimento de gratidão avassaladora que a invadiu novamente. Harry apenas a olhou, com um jeito um tanto confuso. "Onde estão Rony e Hermione? Eles não deviam estar com vocês?" Ela perguntou, antes de Harry conseguir fazer qualquer pergunta a respeito do acontecimento ou da inesperada intimidade com Malfoy.

"Vamos encontrá-los logo. Tínhamos programado pousar em áreas diferentes para não chamar atenção e nos encontrar usando os galeões encantados da Hermione." Ele então se dirigiu a Neville. "Você está pronto para ir? Se quiser pode voltar e…"

"Não, Harry." Neville parecia ter recuperado sua cor e já estava muito mais controlado, ainda que tremesse levemente. Deu uma última olhada no corpo de Lúcio Malfoy antes de completar. "Nós sabíamos que isso poderia acontecer."

Harry assentiu compreensivamente e então foi até Gina. Ele retirou a mão dela que estava pousada no pescoço e examinou as duas manchas roxas deixadas por Lúcio. Um brilho de raiva passou pelos olhos verdes. "Você vai ficar bem?"

"Sim." Ela disse com firmeza, com os lábios unidos numa expressão determinada. Ele deu um beijo casto na sua testa e não precisaram trocar mais palavras depois disso.

Foi só quando eles saíram da clareira que Gina sussurrou um 'Boa sorte'.

Na sequência, ela foi até onde Draco Malfoy estava estendido, recuperou sua varinha, conjurou cordas e o amarrou com certo peso no coração. Dando as costas ao corpo desacordado do filho, ela se virou em direção ao corpo sem vida do pai. Retirou a longa capa que vestia para cobrir o que restava de Lúcio Malfoy. Ela não entendeu de fato a razão de ter feito isso, mas no fim das contas, acabou fazendo. Deu de ombros pensando que não queria que Draco acordasse e desse de cara com o corpo do pai exposto cruelmente. Ainda que ele fosse uma pessoa cruel, ela pensou, cheia de rancor.

Foi até Percy e com um feitiço acordou seu irmão mais velho. Assim que ele abriu os olhos, confuso, ela estendeu a mão para ele.

"Vamos Percy, temos trabalho a fazer."

Segundo as projeções de Harry, havia mais dois comensais cobrindo o perímetro da Floresta. Os Malfoy deviam ter sido designados para a função de última hora, mas Gina não achava que eles tivessem aumentado o número de comensais patrulhando, a presença deles fora um golpe de azar.

Tentando desviar os pensamentos, ela desejou profundamente saber como os outros estavam indo.

Andava com os passos firmes pela floresta, dessa vez tomando a frente de Percy, que tinha se tornado muito mais alerta depois de ter sido estuporado por Draco Malfoy. Eles não ousavam trocar uma palavra, com receio de que isso atraísse atenções indesejadas.

Eles pararam subitamente quando ouviram passos se aproximando, com a varinha em riste, pularam os arbustos que os escondiam, prontos para atacar. Eles deram de cara com Jorge e Angelina, numa posição muito parecida com a deles. Gina não pôde deixar de notar a estranheza de apontar a varinha agressivamente para Jorge e ele para ela.

Ele parecia transtornado. "Por Merlin, são vocês!" Ele disse abaixando a varinha e ficando menos tenso. "Precisamos achar os outros." Ele foi diretamente ao ponto e sua face estava lívida. "Um comensal fugiu. A essa altura, nossa operação seria mais secreta se mandássemos um berrador para Voldemort."

"Primeiro precisamos nos organizar, achar Dean e Lino e depois…"

Gina viu Jorge empalidecer ainda mais. Percy provavelmente observou o mesmo porque sequer terminou sua palestra de 'como devemos nos organizar em situações críticas'.

"Lino está morto. O comensal que fugiu foi o responsável." Foi Angelina que tomou a palavra, dando um leve aperto na mão de Jorge, que parecia em outro lugar. Gina sabia o quanto essa perda significava para o irmão, ainda mais depois de Fred. "Dean retornou ao castelo com o corpo dele. Nesse momento, Carlinhos e a Ordem já devem estar evacuando o castelo. Achamos que isso era o melhor a ser feito." Ela disse, como se estivesse pedindo desculpas.

"Eu sinto muito, Jorge. Eu sei que ele era um bom amigo." Gina foi até o irmão e encostou a cabeça no ombro dele.

Jorge se desvencilhou gentilmente das duas garotas que o cercavam.

"O melhor que eu posso fazer por eles é continuar lutando." Ele disse tentando um sorriso e olhando para o céu ainda escuro. "É uma ofensa para a memória deles se o mundo de continuar tão tristemente sem graça."

Eles se olharam por um momento, como se o silêncio pudesse consolá-los de alguma forma.

"Agora que um comensal fugiu e que nossa ofensiva já não é mais tão secreta, temos que decidir se voltamos ao castelo ou procuramos Harry e os outros." Percy falou.

Gina olhou para os outros três e a expressão deles já revelava toda resposta que a pergunta de Percy demandava.

Eles ficariam.

Gina estava ofegante quando chegou às proximidades da clareira de Aragogue. Lembrou-se involuntariamente de quando Rony e Harry haviam chegado em Hogwarts com o velho Ford Anglia do seu pai; o carro agora vivia em algum lugar por ali, na Floresta Proibida e ela se perguntou onde exatamente um velho carro enfeitiçado escolheria ficar.

Foi tirada por seus devaneios por Angelina, que fez um gesto levando o dedo indicador aos lábios, para que o grupo parasse, em silêncio. Havia barulhos crescentes vindos da clareira; certamente Harry e os outros já estavam lá, lutando. O estômago de Gina deu um nó.

Eles tinham o elemento surpresa ao seu favor e agora só precisavam saber aproveitá-lo. E, obviamente, isso era o que eles não fariam.

Não sem amargura, Gina se lembraria sempre desse dia como um exemplo claro de uma ação que não se deve tomar por impulso. Ela nunca soube quem tomara a iniciativa, somente que, no momento seguinte, eles estavam correndo loucamente em direção ao lugar de onde vinham os barulhos de feitiços sendo lançados, coisas se quebrando e gritos ocasionais. Ela sentia seu pé se enroscando esporadicamente em algumas raízes, mas continuava correndo como se sua vida dependesse disso. E dependia.

Jorge, que estava na frente dela, se jogou no chão, rolando na grama rasteira para se desviar de um feitiço perdido que estava endereçado à sua cabeça.

"Merda!" Foi tudo que Gina ouviu do irmão, antes de dar um salto por cima da figura caída que praguejava. Não precisou parar para socorrê-lo: viu com o canto do olho que Angelina já tinha dado cobertura a ele. Tomou a dianteira com Percy ao seu lado, a varinha em punho e o coração na boca.

Eles chegaram até o núcleo da clareira onde a batalha estava se desenrolando e ela prendeu a respiração.

O cenário era caótico: havia feitiços cruzando o ar; pares, trios, duelando desesperadamente. Ela registrou que Voldemort estava parado no fundo da clareira, com seus olhos ofídicos fixos em nada mais do que Harry e sentiu mais uma pontada na barriga, que ela sabia ser de medo. Viu que o rapaz, em contrapartida, tentava chegar até o bruxo das trevas, mas seus esforços eram sempre impedidos por algum comensal. Rony seguia com ele, suas costas contra as de Harry, formando uma posição que garantia uma razoável proteção aos dois. Dois comensais mascarados duelavam com eles, procurando insistentemente uma brecha que pusesse fim no avanço dos rapazes. Hermione estava numa situação parecida, com sua expressão pensativa típica; Gina sabia que aquele comensal estaria em apuros em breve. Neville tinha a situação mais complicada, tinha dois comensais junto de si e parecia prestes a sucumbir. Com a atual disposição da batalha, sem sequer Voldemort ter se dignado a levantar a varinha, eles não tinham a menor chance se permanecessem apenas os quatro. Ela se sentiu feliz por ter decidido ficar e lutar.

Viu Jorge ficar lado a lado com ela e Percy, seu rosto se contorcendo numa máscara de raiva que não combinaria jamais com seu rosto.

"Rockwood! Olhe aqui, seu bastardo de merda!" Ele gritou e se direcionou para um dos comensais de cabelo oleoso que atacava Neville. Gina sentiu uma pontada de alívio quando percebeu que a raiva de Jorge significava que aquele era o Comensal que havia matado Lino e que ele havia preferido lutar em vez de chamar reforços.

Pelo menos os comensais pareciam terem sido pegos de surpresa; as coisas do acampamento improvisado estavam espalhadas pelo chão, servindo ora de proteção para os duelistas, ora de obstáculos à movimentação intensa. Percy e Angelina dispararam na mesma direção, em busca de alvos inimigos. Gina respirou fundo e seguiu em frente, deixando a adrenalina guiar seus movimentos.

Estava tão absorta no desenvolvimento da batalha que só percebeu que seria atacada quando um corpo muito gordo se chocou contra ela, derrubando-a no chão e ficando por cima dela. Ela perdeu o fôlego e seus olhos se encheram de água quando suas costas bateram no chão. Com esforço, reconheceu Goyle, que tentava imobilizá-la com os braços gordos. Quando conseguiu, ele aspirou fortemente o perfume dela fungando no seu pescoço e falou ao seu ouvido, com voz rouca.

"Eu sempre quis saber como era seu cheiro." Ela aproveitou a distração para se debater com mais força e cravou as unhas no rosto dele, que se contorceu de dor e recuou, muito pelo susto com a reação dela; Gina rolou para sair debaixo dele.

"Eu nunca quis sequer chegar perto de você, seu capacho sujo." Ela se levantou, mas tropeçou quando ele puxou seu tornozelo, acometido pela raiva de ter sido arranhado.

"Sua puta!" Foi tudo que ele falou quando começou a puxá-la para baixo. Ela caiu de novo com as costas no chão e quando Goyle se preparou para se projetar por cima dela, foi atingido em cheio por um feitiço e caiu para trás, desacordado. Gina se apoiou nos cotovelos para ver da onde o feitiço viera e viu Harry, tentando enxergar se ela estava bem. Ela assentiu levemente e ele virou as costas, para voltar a seu objetivo principal – mirando Voldemort.

Ela percorreu a clareira tentando se aproximar de Rony e Harry e quando deu por si, estava ao lado de Hermione, duelando com um comensal sem máscara que ela sabia ser Mulciber - ele fora um daqueles que tinham perseguido Gina e os outros no Ministério da Magia, dois anos antes.

Ela atacava com ferocidade, como se estivesse descontando todas as frustrações do último ano, como se Mulciber personificasse todas as coisas erradas da vida dela. Hermione seguia acompanhando o ritmo da amiga, mas nunca com a mesma violência nos feitiços. Gina quase gritou com ela quando a bruxa mais velha lançou uma azaração Immobulus.

"Hermione, precisa ser mais objetiva!" Ela disse exasperada, enquanto elas se escondiam atrás de uma barraca semidestruída.

"Estou tentando!" Hermione respondeu, quase no mesmo tom. "Só não consigo me concentrar direito, com o Harry e Rony ali, precisando de ajuda." Elas se abaixaram para se desviar de um feitiço que tinha endereço certo.

"Harry tem que fazer isso sozinho, você sabe. A profecia…" Ela disse escondendo a insegurança. Não completou a frase - já era de conhecimento de todos ali sobre a profecia que envolvia Harry e Voldemort. "Vamos!" ela gritou puxando Hermione pela mão, quando o pequeno esconderijo improvisado seria alvejado.

Gina se afastou para lançar um feitiço em direção ao um comensal que duelava com Angelina e depois desviou sua atenção para Harry e Ron, que tinham derrubado um comensal. Agora seu irmão estava duelando com aquele que restava e Harry se encaminhava resoluto em direção a Voldemort. Ela voltou realidade da área onde estava quando um feitiço pegou Hermione de raspão, fazendo um corte profundo no braço esquerdo da amiga. Hermione olhava inerte para o braço que sangrava abundantemente.

"É magia negra…" ela balbuciou, erguendo sua varinha debilmente e indecisa sobre o que fazer. Ela mordeu o lábio inferior e se tornou mais introvertida, numa expressão que Gina sabia que significava que ela estava pensando freneticamente sobre como consertar aquilo.

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Em três passos, Mulciber estava praticamente em cima de Hermione e encostou a varinha sadicamente para o peito da amiga, se precavendo contra qualquer movimento de Hermione. Gina não estava perto o suficiente para ouvir o que ele disse quase ao ouvido da amiga, mas pôde ver quando Hermione soltou sua varinha num sinal de rendição e o objeto pareceu cair em câmera lenta na visão de Gina.

Mulciber posicionou melhor a varinha, Gina viu seus lábios começaram a se mover e o mundo parou. Ela sabia o que viria a seguir e também sabia que não poderia lidar com mais isso. Não com Hermione, não com Hermione. Ela verbalizou seus pensamentos.

"Hermione, não!" Ela gritou e correu em direção a Mulciber. Atirou seu corpo contra o corpo dele tal violência que conseguiu derrubá-lo e a varinha dele caiu distante alguns centímetros dos dois. No instante seguinte, depois de rolar no chão com o homem, conseguiu se colocar sobre ele, com uma perna de cada lado do corpo do comensal. Apontou a varinha diretamente para o rosto dele. Ela estava com o olhar fixo no rosto odioso do homem, que agora estava tenso devido ao medo.

Medo?

Gina achou estranho estar do outro lado da situação. Mesmo que não quisesse ou não pudesse demonstrar, sempre ela e seus amigos eram aqueles que estavam com medo. Mas ela não queria sentir mais medo; queria que aquele comensal sumisse junto com os outros. Uma gota de suor frio escorreu do seu rosto no instante em que ela percebeu que queria que Mulciber sumisse, desaparecesse.

Seus devaneios a impediram de ver a mão do Comensal que procurava sua varinha. Ela não teve tempo para pensar quando observou com sua visão periférica que a mão dele se fechou em torno da varinha e se preparava para levantá-la. Tinha a consciência de que se ele pegasse a varinha, seria o fim dela.

Gina se inclinou para frente e quase sussurrou, com os longos cabelos ruivos caindo ao lado do rosto, criando uma cortina que encerravam o rosto dela e de Mulciber num mesmo lugar.

"Avada Kedavra." E olhos dela e de Mulciber se fecharam ao mesmo tempo.

Ela permaneceu assim, com os olhos fechados sobre o corpo inerte durante o que pareceram milênios, tempo suficiente para que ela entendesse a nova dimensão da sua vida: ela agira como aqueles que odiava, como aqueles que ela dedicava toda sua força para combater. Onde estava a racionalidade disso? Onde estava o certo e o errado? A imagem de Neville dizendo 'nós não matamos', surgiu na sua mente e o estômago dela afundou.

Sim, eles matavam.

"Gina, vamos!" Hermione a levantou dali, como se a imagem por si só fosse agressiva, como se ela não quisesse enxergar sua amiga ali por mais um minuto, sobre o corpo do comensal. E então Hermione completou baixinho, meio envergonhada. "Obrigada."

Gina assentiu triste. Sabia que ela tinha feito o que Hermione não podia. Tinha se corrompido num ponto que poderia levá-la a se questionar sobre vários aspectos dos seus próprios ideais. E poderia, de certa forma, afastá-la de Harry… Ela tocou a bolsinha com os pertences dele que levava no pescoço e olhou para o rapaz, apenas para encontrá-lo duelando com Voldemort. O bruxo das trevas parecia inusitadamente mais restrito em seus movimentos, como se a confiança, antes inabalável, não estivesse mais totalmente com ele.

Havia chegado mais comensais na clareira. Algum dos malditos chamara reforço.

"Merda" Gina gemeu, sabendo que a situação pioraria potencialmente agora. Ela se deixou levar por Hermione, que parecia mais pálida a cada minuto que passava. Foram barradas por um comensal de cabelos negros e cara de rato que foi prontamente estuporado pela amiga.

"Gina, preciso para em algum lugar seguro para fechar isso." Ela mostrou o corte que ainda sangrava no braço esquerdo. Elas correram, se desviando de feitiços ocasionais, para trás de uma grande pedra na extremidade da clareira, de onde Gina lançava feitiços enquanto Hermione murmurava os encantamentos para a cicatrização do braço. De onde estava, Gina podia ver Voldemort e Harry ainda duelando ferozmente enquanto seus irmãos e amigos tinham dificuldade de lidar com o número crescente de comensais. Estranhamente, nenhum dos lados ousava interferir na batalha entre os dois bruxos mais poderosos, como se aquilo fosse uma coisa que somente os dois pudessem fazer. E algumas daquelas pessoas realmente sabiam a verdade desse pensamento.

"Hermione, precisamos voltar." Ela falou antes de desarmar de longe um dos comensais que se aproximava de Jorge pelas costas. "Não sei quanto tempo vamos aguentar..."

Levou um minuto até que Hermione respondesse, parecendo sair de um transe e olhando para o braço com uma expressão resignada. "Já acabei. É o máximo que deu para fazer, nessas condições. Vou ajudar Rony a dar cobertura a Harry, você ajuda os outros." Ela disse se levantando e Gina assentiu com alívio, vendo que ela tinha voltado a ser a Hermione de sempre.

A amiga correu em direção ao lugar Harry e Rony estavam e Gina se manteve próxima a extremidade da clareira, duelando com tantos comensais quanto podia; depois de uns instantes Percy se juntou a ela, tentando falar enquanto se desviava e lançava feitiços ao lado de Gina.

"Gina, precisamos recuar!"

"Não!" Ela gritou "Não podemos desistir agora! Estamos perto demais!"

"Estamos perto demais de morrer! Não sabemos quantos comensais ainda podem chegar!" Ele puxou a irmã para que ela saísse do caminho de um feitiço e lançou uma azaração por cima do ombro dela. "Isso era para ser um ataque surpresa! Agora estamos perdendo em número e em coragem para fazer o que deve ser feito."

Gina se soltou bruscamente dos braços do irmão. Sentiu vontade de gritar que ela tivera coragem de tomar uma atitude drástica, mas a voz ficou presa na garganta. O que todo mundo acharia?Ela percebeu que não tinha vontade de saber. Entretanto, ela sabia que Percy estava certo: se usar uma maldição de morte era o preço para o fim daquelas atrocidades, Gina estava disposta a pagar, mas os outros estariam? Ela correu os olhos pelos amigos em busca da resposta; alguns deles pareciam entender aquilo: havia mais corpos sem vida de comensais espalhados pela clareira.

De repente a imagem de Blaise Zabini apareceu na sua mente dizendo que o mundo não se dividia exatamente entre preto e branco como ela achava. Ela vivia mesmo num conto de fadas?

Sentiu um silêncio e falta de movimentação súbitos na clareira e instintivamente seus olhos caíram sobre Harry. Ele estava de pé, visivelmente cansado. Seu rosto estava sujo, as roupas rasgadas em algumas partes e sua expressão não revelava a turbilhão de emoções que ele devia estar sentido. Sua varinha estava em riste, apontando para um alvo, caído no chão.

O coração de Gina falhou uma batida quando ela percebeu que era realmente Voldemort que estava no chão, debilitado, esperando pela sentença que poria fim a todo o sofrimento.

Esperando por uma sentença que demorava a vir.

A tensão era tão latente, que Gina teve que se lembrar que precisava respirar. Todos estavam parados, numa situação semelhante, esperando o desfecho do confronto. Amigos e inimigos lado a lado, formando uma plateia cheia de medo e expectativa. Pela segunda vez naquela batalha, Gina não pôde distinguir os adversários, classificar condutas. Todos tinham seu destino igualmente em jogo naquele momento e esse pensamento enviou um calafrio pela sua espinha.

Harry permanecia ali, parado como uma estátua. E então, como se já se considerasse um vencedor moral, ele hesitou.

"Essa hesitação em fazer o que a situação pede é o que nos separa, Harry." A voz de Voldemort ecoou. Ainda que debilitado, Gina tremeu ao ouvi-la. Instintivamente soube que isso tinha ocorrido também com todos os outros presentes. "E ao mesmo tempo, é o que nos une. Você demonstra seu egoísmo ao se negar a me matar e isso te coloca mais próximo de mim do que você ousa imaginar"

"Fique quieto!" Harry falou entredentes, com a mão pressionando a varinha tão fortemente que os nós dos seus dedos estavam brancos.

Os olhos vermelhos brilharam com uma intensidade assustadora. "Veja, você arrastou os seus amigos aqui, sabendo o que eles encontrariam. Quantos deles já morreram, Harry? Pela sua expressão eu diria que não muitos. Mas não tema: todos eles cairão inevitavelmente, graças a você. Porque o que você faz para retribuir o sacrifício deles é justamente isso: hesitar diante de mim, quando tem a chance de pôr um fim nisso."

"FIQUE QUIETO!" Harry gritou numa explosão que só refletia dor.

Se o mundo continuava a rodar, não importava mais porque naquele momento Gina tinha certeza que o tempo tinha parado.

No instante em que Harry fechou os olhos para conter a frustração e gritou, Voldemort se levantou com uma agilidade surpreendente e todos que estavam a sua volta pareceram sair de um encantamento voluntário. A varinha do bruxo das trevas tinha endereço certo e o feitiço que sairia dela dentro de segundos também atingiria Harry em cheio.

Gina não soube como, mas registrou a cena toda como num filme trouxa, que atormentaria seus sonhos nos próximos anos.

Rony deu um soco num comensal que se aproximava dele e derrubou outro com ânsia de impedir Voldemort.

Hermione gritou e tentou um feitiço protego que não teria a menor chance contra uma maldição da morte.

Jorge não estava perto o suficiente para impedir qualquer coisa, mas, mesmo assim, correu para tentar. E com ele foi o coração de Gina, que batia com toda a força.

Mas Neville estava perto. Perto o suficiente para perceber as intenções de Voldemort antes que qualquer um, antes mesmo que Harry. Então, sem mesmo hesitar, ele se atirou na frente de Harry no exato momento em que o jato de luz verde saía da varinha de Voldemort.

E os dois caíram inertes, sem vida. O corpo de Neville sobre o de Harry, num amontoado estranho que revirou o estômago de Gina. O sacrifício de Neville fora em vão, a maldição de alguma forma acertara os dois e Gina não podia sequer se mexer, para ir chorar ao lado da pessoa que ela amava e de um amigo tão querido.

Voldemort olhou desinteressado para a ponta da sua varinha e disse distraidamente "Dois hipogrifos com um só golpe. Melhor do que eu esperava."

E na sequência tudo se passou como num sonho. Ela ouviu um som que parecia uma buzina. Sentiu o braço de Percy na sua cintura e então carregando-a como se ela não pesasse nada. Ela só pôde contemplar de longe Hermione ajoelhada ao lado do corpo de Harry e Neville, enquanto Rony afastava com feitiços letais qualquer Comensal que se atrevesse a chegar perto demais.

"É um pesadelo." Ela balbuciava para si mesma, enquanto Percy a jogava dentro do Ford Anglia que fora do seu pai.

Ela sequer viu o que aconteceu depois. Não viu Jorge protegendo Angelina e se encaminhando para o Ford enquanto Percy lançava feitiços do banco do motorista. Não viu quando o carro entrou em movimento, certamente se movendo para fora da Floresta Proibida. Não viu quando a Ordem da Fênix chegou em auxílio, tarde demais. Não viu mais nada.

Harry Potter havia morrido. E junto com ele, a melhor parte de Gina Weasley.