O ladrão de sonhos

Conhecendo o passado - o dia em que tudo mudou


Quando acordei, estava jogado em um beco escuro. Não havia sinal dos capachos do senhor Willers e nem do próprio. Eu estava com raiva e assim que me levantei, chutei alguns barris velhos. Andei pela cidade olhando para meus pés. Meus pés estavam pulando as divisões das calçadas. Dois pés sozinhos e uma estrada, dois pés chutando pedras. Então o vento fez um jornal vir até mim:

A Srta. Willers está aberto para dotes de casamento.

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O mais alto dote leva a mão da dama mais cobiçada da vila.

Interessados tratar na residência dos Willers.

Quando li aquilo surtei. Como assim ele venderia a própria filha? Eu sabia que Kira nunca permitiria aquilo, mas sabia também que aquela era a minha chance de tê-la. Conseguiria dinheiro nem que fosse a ultima coisa que fizesse em vida.

Com esse pensamento, fui até uma loja e gastei quase tudo o que tinha em baralhos. Minha próxima parada foi o bar, onde assim que cheguei comecei a apostar todo o pouco que tinha. Em pouco tempo, consegui ganhar de muita gente e multipliquei minhas economias por muito. Eu era bom. E então, quando o bar fechou e eu tive que sair, andei até a janela de Kira e joguei uma pedra.

_Kira, abre! – gritei e um sorriso se fez quando vi uma vela ser acesa e a janela se abrir devagar

_Nicholas? É vossa mercê? – ela perguntou feliz, mas desacreditada.

_Claro que sou eu! Achou que eu não viria hoje por quê? – perguntei estranhando esse fato.

_Vossa mercê não veio ontem, e papai disse que vossa mercê tinha desistido de mim. – ela parecia realmente feliz em me ver – o que houve?

_Seu pai não quer que fiquemos juntos K, mas o que ele não sabe é que nos deu essa chance. Estou ganhando dinheiro e logo terei mais que o suficiente para ter a sua mão. E juntos fugiremos daqui e poderemos ser felizes.

_Nicholas, é perigoso. Como esta ganhando dinheiro?

_Não importa. Vossa mercê fugiria comigo? – perguntei a olhando com expectativa

_Sem hesitar. – ela sorri terna e então olha para trás e apaga a vela rapidamente – tem alguém vindo, vossa mercê precisa ir meu bom salvador.

_Te verei amanhã? – perguntei tirando o gorro e sorrindo para ela

_Bem, vossa mercê sabe onde fica a minha janela. – com isso e um sorriso sapeca, ela fecha a janela bem a tempo de eu ver o contorno de seu pai entrando com uma lamparina.

Sorri e pus-me de volta a minha humilde cabana, mas no caminho vi um galo grande e forte com aparência rude. Pensei nas varias brigas de galo organizadas que havia na vila e sem mais nem menos, peguei o galo e fui embora.

No dia seguinte, logo que o bar abriu eu estava lá para impulsionar as brigas de galo. Filas se formaram no bar e um espaço foi criado apenas para isso. Com meu forte galo, vencia todas as brigas e minha fortuna foi crescendo. Em uma semana, já tinha mais do que o necessário para me casar com Kira. Mas eu queria mais, é claro que eu queria.

Na noite seguinte fui até a janela de Kira e joguei sete pedras. Ela abriu e desceu sorrindo.

_Vossa mercê demorou. – ela falou me abraçando

_Desculpe. Tive uns problemas, mas tenho uma boa noticia. – falei empolgado

_O que? O que foi?

_Tenho o dinheiro para nos casarmos! – falei e ela se jogou sobre mim me beijando

Não resisti. Beijei aqueles lábios salgados e firmes que já conhecia. Ela s afastou quase chorando de emoção.

_Então vossa mercê vem pedir minha mão amanhã? – ela pergunta sorrindo

_Er... na verdade não. – falei jogando a mão na nuca

_Por que não? – ela perguntou ainda sorrindo, mas confusa – pensei que tudo estava pronto.

_E está... mas não tenho dinheiro suficiente para manter nossas vidas.

_Do que está falando? Iriamos fugir sem nenhuma moeda.

_Eu sei, mas... bulhufas, eu só queria dar o melhor para vossa mercê.

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_Vossa mercê é o melhor para mim... – Kira disse com dor na voz

_Dê-me apenas tempo. Uma semana. E então pedirei sua mão e partiremos.

_Promete? – ela perguntou segurando minhas mãos com medo

_Eu prometo. E vossa mercê será a dama mais feliz desse mundo.

Nossos lábios roçaram. Ela então abaixou a cabeça e olhou para a própria janela.

_Preciso ir. Vejo vossa mercê amanhã? – ela perguntou já subindo as escadas que colocara ali de manhã

_Eu sei onde fica sua janela. – sorri tirando o chapéu e vendo-a entrar na janela com precisão. Dei um assobio.

_Shiiiii. Vai acordar meu pai. – ela disse meio rindo e meio brava

_Vossa mercê vale o risco. Até amanhã...

E com isso eu fui para casa.

Passou-se cinco dias desde o incidente na janela. Eu havia visitado Kira em todos os cinco e nossa promessa se avivava. Eu ia todo dia ao bar e logo fiz uma boa fortuna. Fui elevado a nobre e poderia arrumar qualquer emprego de boa fama. Mas as rinhas de galo me clamavam. Então continuei ali, ganhando de todos os que ousavam me desafiar.

Até que então, chega um velho de aparecia imunda e podre que se senta a minha frente.

_Meu jovem... É vossa mercê que anda apostando com galos? – ele pergunta com uma voz arrastada e irritante

_Bem, uma granja isso aqui não é. – digo e meus, abre aspas, amigos, fecha aspas, riem.

_Poderia duelar comigo e meu pobre galo? – ele pergunta outra vez mostrando uma gaiola coberta, onde só se vê uma pata murcha.

_Aqui só apostamos dinheiro, e não jogamos com esmolas. – digo novamente. Céus, como eu era arrogante.

_Eu não tenho dinheiro, mas peço que olhe para dentro de si mesmo e ache um meio de, por favor, dar a esse velho galo uma morte honrada.

_Está bem, mas porque hoje estou bonzinho. – me levanto e sorrio ao apago o toco de charuto, acendendo um novo.

_Coloque seu... frango... no ringue. Que entre o campeão.

_Espere, o que vamos apostar? – o velho pergunta

_Se eu ganhar quero a cabeça do seu galo.

_E se eu ganhar? – o velho pergunta novamente

_Vamos falar de causas possíveis...

_E se eu ganhar!? – o velho diz quase exaltado

_Eu te dou qual-quer coisa. – respondo calmo

_Qualquer mesmo? – o velho pergunta com um sorriso sádico no rosto

_Não se preocupe com isso. Vossa mercê não ganhará. – eu disse indo até meu galo e o pegando no colo acariciando sua crista e por fim o colocando na arena.

_Eu tenho serias duvidas se essa afirmação é verdade. – o velho disse e tirou da mesma gaiola que segurava um galo maior do que o meu e mais forte provavelmente. Vi os caras do bar ficarem espantados e se afastarem do velho. Ele colocou o galo dele na arena e então o juiz tocou o sino.

O velho, que não parecia mais tão velho assim, vibrou ao ver meu galo em alguns minutos morto. Ele me olhou e meu charuto havia caído da boca. Até uma hora atrás isso era impossível. Eu me levantei e respirei fundo. Todos do bar me encaravam pensando no que eu iria fazer. Mas eu quis ser astuto e fingi cumprimentar o senhor.

_Parabéns, seu galo venceu. O que quer em troca? Ouro? Terras? Meu galo? – pergunto olhando em volta tentando demonstrar que não tinha medo.

Então o velho bateu o pé no chão e o tempo parou. Tudo ficou imóvel, inclusive a agua que caia de um copo qualquer. Olhei para o velho assustado.

_Não, não senhor Blenks. Vossa mercê é presunçoso e arrogante. Esse tipo de coisa me enoja. Vossa mercê trata mal as pessoas que te servem e isso a que? Uma semana? Poupe-me, já lidei com piores. – ele fala com um verdadeiro nojo na voz

_O-o que vossa mercê quer de mim? – perguntei hesitante – vossa mercê é um bruxo.

_O que eu quero? Eu quero sua alma, sua mortalidade, sua vida... – ele da um sorriso sádico – seus sonhos.

_Vai me matar? – pergunto rapidamente

_Matar? Nãão. Não sou um assassino. Mas sei exatamente o que fazer com vossa mercê...

_Seu bruxo imundo, eu deveria manda-lo a fogueira por ameaçar um nobre como eu e... – ando ate ele com raiva e ele me pega pelo pescoço com rapidez me erguendo do chão.

_Nanão, atacar o adversário pelas costas é muito feio. Você deveria se envergonhar!

_Voce? Isso é uma ofensa? – pergunto confuso

_Ah, o século XV... – ele diz sonhador e me deixa mais confuso

_O que vossa mercê fará comigo? – pergunto irritado

_Você, ou vossa mercê, tanto faz. Você irá vagar eternamente em busca de uma libertação. Eu, o grande feiticeiro, te amaldiçoo com a pior das maldições. Irá se alimentar de sonhos roubados no meio da noite. Será invisível a todos e não terá comunicação com nenhum ser humano. Exceto... como hoje estou bonzinho, alguns seres humanos através do tempo irão aparecer e poderão vê-lo. Se não os afastar, terá algum contato de tempos em tempos. Os pesadelos dos outros, serão os seus. Os sonhos dos outros serão a sua força. Nenhum alimento mortal te saciará além de sonhos e apenas disso viverá. Veremos quantas décadas durará esse seu egocentrismo. De adeus a sua família, amigos e amores. Será apenas você por muito tempo. Nicholas Blenks, você se torna hoje um monstro. Lendas sobre seu nome existirão e seus pais assustarão os filhos com sua existência.

Ele fala de uma vez só e sinto tudo ao meu redor ficando escuro. Ele então me joga no chão com força e limpa as mãos dando uma risada maligna.

_Te vejo em alguns séculos.

As sombras me invadem novamente. Apenas uma coisa me passa pela cabeça.

_Kira...