Livro 1 - Alvorecer de uma nova era

Capítulo 8 - Uma história


Raava nada disse. Era como se também estivesse esperando pra sentir o tão mencionado direcionamento do destino.

O silêncio que se estendeu não era estranho. Afinal, os anfitriões ainda estavam saboreando o jantar. Porém, Asami percebeu que Korra já havia acabado e ainda assim não dizia nada enquanto encarava seu prato.

A engenheira franziu as sobrancelhas.

Isso é exatamente igual aos momentos em que ela fica perdida em pensamentos durante nossos almoços no Narook’s.

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“Korra?” Chamou sua amiga. Quando os olhos da Avatar encontraram os seus, ela perguntou: “Você está bem?”

Ao ter que levantar a cabeça para procurar o olhar da Sato, Korra percebeu que esteve encarando o prato vazio em sua frente já fazia um tempo. A ideia de que estava viajando na frente deles a fez corar um pouco. “É... Sim! Eu... me distraí aqui. Desculpa.”

Mais uma vez, Asami percebeu, será que um dia ela vai confiar em mim pra contar esses pensamentos que tanto a afastam do que acontece ao redor? Pensar que a avatar não confiava nela a deixava triste. Seus lábios formaram um biquinho, que combinava com a leve linha que apareceu entre suas sobrancelhas ao contraí-las. “Tem certeza?”

Korra sorriu. Ela é muito fofa... “Não se preocupe, ‘Sami. Eu prometo que estou bem.” Limpou a garganta, insegura de como prosseguir. “Eu estava falando com Raava, tentando checar uns fatos.”

Asami arregalou os olhos em surpresa “Raava? É com ela que você fala quando se distrai assim?”

Korra riu divertidamente com o fascínio no rosto da Asami. “Sim. Não é fácil conversar com duas pessoas diferentes, sobre assuntos diferentes.” Isso fez Asami rir, imaginando o quão estranho deveria ser: ouvir uma coisa das pessoas ao seu redor, e outra completamente diferente de um espírito em sua mente.

“E o que ela disse?”

Korra deu de ombros.

“Pra ser sincera eu estava esperando uma resposta, mas ela não disse nada. Parece que ela mesma está perdida em pensamentos.”

Riram em conjunto, sem notar que Hiroshi tinha uma expressão de descontentamento que não conseguiu esconder, pois imaginava que Korra estava inventando ladainhas para convencer sua filha de que sabia verdades acessíveis apenas a ela. Como se fosse realmente um ser supremo só por ter esta 'conexão' com o mundo espiritual.

“E qual é a história por trás desse espírito de luz, Avatar?” Perguntou, esperando que ela inventasse alguma desculpa para evitar falar sobre, ou ao menos que ela gaguejasse ao inventar algo. “Estou curioso.” Sorriu amigavelmente, esperando disfarçar a frustração que sentia ao ver sua filha sendo enganada por aquele charlatanismo barato.

“Bom... É uma longa, longa história. Tem certeza de que quer ouvir agora? Já está ficando tarde, e eu já tomei tempo demais...”

“Não tem problema nenhum, conte-nos. Eu realmente não tenho mais nada pra fazer agora, acredite.” Disse humoradamente. Estava se divertindo com a ideia de vê-la nervosa, tentando inventar mais desculpas.

Para surpresa dele, Korra não apenas sorriu de volta, como também afirmou “Bom, eu avisei que é uma história longa, não se impressionem se eu sair daqui apenas lá para as onze da noite.”

Asami sorriu animadamente “Eu até te dou uma carona se precisar! Vai, conta! Eu também estou morrendo de curiosidade desde que você mencionou que tinha uma história por trás do nome Raava.”

Korra riu “Ok, ok... Por onde começar...” Perguntou-se em voz alta, lembrando algumas partes de sua visão como Wan foi apresentado a ela. “Ok.” Ela disse, de maneira final, decidindo como narraria os fatos. “O primeiro Avatar da história, como todos na época em que vivia, era um não dominador.”

O som de surpresa feito por Asami e Hiroshi trouxe um sorriso pro rosto da Avatar. Amava a história do Wan, esperava poder fazer jus a ela enquanto contava. Esperava poder passar pra eles todos os detalhes que sua visão a mostrou. Queria poder fazer com que eles sentissem o mesmo senso de maravilhamento que sentiu ao conhecer Raava e Wan.

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“Naquela época, as cidades habitadas por humanos se localizavam em cima das tartarugas leão. Esses espíritos os protegiam, e concediam aos humanos a dominação quando precisavam sair da cidade para ir caçar na floresta. Wan era apenas um garoto pobre e, na cidade onde ele morava, a maioria desfavorecida vivia com fome, pois os ricos governantes que dominavam os armamentos e o estoque de comida não dividiam o que tinham de maneira justa. Então um dia, após ter decidido que já estava cansado daquela vida, ele se juntou aos caçadores que exploravam a floresta dominada por espíritos, apenas para adquirir a dominação de fogo.”

Vendo que até então os seus ouvintes estavam cativos, Korra se permitiu mergulhar em suas lembranças para tirar o máximo de detalhes possível.

Lembrou-se de como ele fingiu estar com medo da floresta, e como ele manteve a dominação para entrar na cidade e utilizá-la para roubar a família rica que mantinha a comida longe dos habitantes.

Relembrou a maneira como ele foi expulso e passou a viver entre os espíritos por dois anos. Como ele conheceu Raava e Vaatu. Como ele separou os dois mundos tentando trazer a paz, mas ainda assim morreu sem ver o equilíbrio perfeito no mundo. Sem entender que a perfeita paz é impossível de ser alcançada. Sem entender a inevitabilidade do Caos.

Mas sendo o criador do ciclo que mudaria o mundo para sempre.

“A dominação deveria ser devolvida ao retornar para sua cidade, mas ele não tinha intenção nenhuma de fazê-lo. O que ele queria era usar o fogo como uma arma contra os soldados bem protegidos e armados que guardavam a comida a sete chaves.” Continuou a história, notando que Hiroshi percebeu a ironia dos tempos atuais.

No passado, Wan foi atrás da dominação por se sentir desprotegido contra pessoas que dominavam todo o estoque de armas e comida. Hoje em dia, a dominação é a tal vantagem que faz a massa desfavorecida viver à sombra dos dominadores em Cidade República.

“Ele voltou para casa, convocou seus amigos e cidadãos descontentes com a situação que viviam, colocaram máscaras para esconder suas identidades, e então invadiram o castelo que escondia o depósito de comida. Um igualitário, eu diria.” Brincou, arrancando risadas da Asami.

Hiroshi estava ficando irritado com a forma que Korra tentava de todas as formas fazer parecer que Dominadores e Não dominadores eram iguais. Como se dominação fosse algo comum. Uma arma como qualquer outra. Será que ela não percebe que a dominação é que não deveria existir entre os humanos? Ela mesma falou que o fogo deveria ser devolvido, e esse imbecil do Wan a roubou.

“Infelizmente, apesar de ter a vantagem, Wan não conseguiu matar os responsáveis pelo seu sofrimento: os governantes da cidade.”

Se tem algo que Korra faria sem pensar duas vezes é acabar com aqueles tiranos. Não por se sentir superior ou por se considerar no direito de julgar. Mas por conhecer a dor da perda causada por seres egoístas como eles, que não se importam com a quantidade de pessoas que matam com sua ganância.

“Sua consciência condenava a atitude de tirar aquelas vidas, por mais egoístas que fossem. Então ele acabou exilado da cidade, pois além de roubar, se recusava a dizer quem eram os outros mascarados que o ajudara.”

Korra esperava que Hiroshi entendesse o ponto daquela história. Gostaria que ele percebesse o ciclo se repetindo e, principalmente, que ele reconhecesse a falha no raciocínio anti-dominação do Amon. Pois mesmo que ele consiga tirar a dominação das pessoas, as armas utilizadas pelos igualitários serão instrumento de coerção para forçar outros a se juntar a ele. Queria mostrar que, no cenário planejado por Amon, ele seria o rico, enquanto os que discordam dele seriam os pobres desarmados.

Já disse isso uma vez antes, mas até que Hiroshi despertasse, repetiria de maneiras diferentes, com imagens diferentes, exemplos diferentes, metáforas diferentes, até que ele entendesse o significado da revolução Igualitária de Amon. Que o problema não era a dominação, e sim quem a usava. Que o problema não eram os igualitários, mas sim, quem os usava. Precisava que Hiroshi reconhecesse o mascarado pelo mentiroso que era.

“E esse foi o início da jornada do Wan. Ele tinha muito o que aprender sobre o mundo, sobre os espíritos, sobre a verdade das tartarugas leão.” Essa era sua parte favorita, como Wan cresceu espiritualmente. Como ele e Raava se conheceram, se ajudaram, e se conectaram. Como ele decidiu lutar para consertar seus erros em vez de fugir e se esconder, da maneira que ela mesmo fez, todas as vezes que não conseguia lidar com suas falhas.

Admirava a coragem de Wan, e fez questão de demonstrar enquanto contava a história do primeiro avatar.

—//—//—//—

Enquanto isso, em sua sala, Tarlok lia alguns relatórios que o detetive contratado entregou em suas mãos. Infelizmente, até onde havia lido, não havia nenhuma novidade. Nenhuma informação que o próprio Saikan não havia lhe fornecido antes.

Só o que me faltava era gastar dinheiro à toa, pagando detetive por informação conhecida. Pensou, passando o olho no histórico familiar da Jornalista que tanto lhe aporrinhava.

Pai: Felipe Nihan.

Mãe: Amelia Gan-Lan.

Felipe Nihan, sendo um tanto machista e teimoso, fez com que a paixão avassaladora que o levara ao altar com sua esposa morresse aos poucos. Ele não gostava da ideia de que depois do casamento, mesmo com uma filha, Amelia não abria mão do emprego. Porém, ele mesmo não estava disposto a fazê-lo. Ficaram em um empasse onde a rotina deles os afastava cada vez mais.

Nos piores meses de crise entre seus pais, Maia viveu na casa de seu avô materno Lau Gan-Lan (dono de toda a Corporação Repolho), enquanto esperava que eles se resolvessem. No fim das contas, seus pais decidiram se divorciar. Por alguns anos a pequena viveu com sua mãe e seus avós, sendo bem cuidada e tendo acesso a tudo o que o dinheiro pôde comprar. Bons estudos, bom tratamento, bom tudo. Lá, Maia teve maior contato com a vida luxuosa dos Gan-Lan, e teve mais convivência com seu único primo: Héctor Gan-Lan (atualmente engenheiro mecânico das fábricas de produção de carros da corporação repolho). Eles se tornaram bons amigos, e mantém esta amizade até hoje.

Porém, conforme crescia, ter que ouvir todas as coisas ruins que falavam sobre seu pai tornava a convivência cada vez mais difícil, pois ela sabia que seu pai não era o mau homem que seu avô e tios tentavam enfiar na sua cabeça. Maia sabia por experiencia própria o quão doce ele era. Até sua mãe o defendia, pois apesar de machista em seus ideais, nunca as tratara com menos do que amor. Havia sido um ótimo pai, e um bom marido.

Então, desde os 16 anos - quando ingressou em uma faculdade de jornalismo - tem sido apenas Maia e o Sr. Felipe, em um apartamento muito espaçoso para apenas duas pessoas. Agora formada e trabalhando, o apartamento fica mais vazio ainda.

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Ao menos, é isso que consta na ficha levantada pelo detetive contratado por Tarlok. “E isso é tudo o que descobriu sobre ela?”

O homem calmamente pegou a xícara sobre a mesa e bebeu do chá sem estresse. Não se intimidava com aquele chefe de estado, pois sabia que logo logo a revolução do Amon derrubaria esse soberbo conselheiro do pedestal que o fazia sentir superior a todos ao seu redor. “Em suas mãos está a vida toda dessa garota.“

“Mas nada disso me ajuda!” Tarlok Jogou a ficha em cima de sua mesa com certa agressividade, mas o homem em sua frente nem piscou com tal ato. Será que ele sabe que posso acabar com a carreira dele com apenas uma palavra para as pessoas certas? Irritou-se com a calma do detetive “Eu só quero uma prova de que ela está envolvida ou é apoiadora da causa do Amon. Como ela consegue esconder seus podres tão bem?! Você não descobriu nada disso?!”

“Não. E você nunca vai encontrar tais provas porque ela não é uma igualitária.” Disse o detetive, que bebeu novamente do chá com um leve sorriso. Eu a teria visto nas reuniões se fosse o caso. Ao ver a expressão irritadiça no rosto do Tarlok, decidiu acabar de uma vez por todas com aquelas buscas. “Uma pessoa com o perfil dela não se envolveria com um movimento anti-dominação. Vejamos… Pai dominador, chefe das forças de treinamento da cidade república, com quem tem relacionamento próximo. Amigos dominadores, que percebi por análise que são realmente amigos, não apenas colegas ou pessoas de convivência obrigatória. Ela não tem nenhum tipo de preconceito em relação a Dominação e tem pessoas com quem se importa sendo alvos desse movimento. Ela não tem motivos pra se envolver nessa guerra.”

Ainda. Sentia o que estava por vir e, se aquela garota realmente fosse alguém de senso crítico, reconheceria a necessidade de livrar tanto seu pai quanto a sociedade da doença que alimenta a soberba em seus corações.

“Isso só dá forças ao argumento da Avatar!” Exclamou Tarlok. “Não. Ela tem que ter algum passado igualitário. Talvez durante aquela época rebelde em que você mencionou? Quem foi aquela garota que o pai não queria que ela namorasse? Era igualitária?”

“Suas especulações não vão alterar a verdade, Tarlok.” Pela reação do conselheiro, o detetive sentiu que não veria a cor do dinheiro que ele trabalhou tão duro para conseguir. A ironia o fazia sentir mais animado do que o dinheiro em si. Usar do dinheiro do chefe da força tarefa para financiar um novo grupo de igualitários que treinava em chi-bloqueamento era como justiça poética. “Mas...” Deixou no ar, sabendo que a curiosidade dele o faria escutar.

“Mas o que?”

“Se tudo o que você quer é fazer parecer que ela tem uma conexão igualitária, então você não precisa que ela seja uma, só provar que ela é.”

“Mas é ISSO QUE EU ESTOU TENTANDO FAZER!” exclamou, pegando as fichas e jogando-as na mesa novamente como se fosse dar ênfase a sua exaltação.

Se toda a população pudesse ver este lado infantil e birrento do Tarlok, talvez pensassem duas vezes antes de defender um conselho que entregava todo o poder nas mãos desse canalha.

“Não, você está tentando achar evidências inexistentes.” Continuou calmamente o detetive. “O que você precisa é PLANTAR essas evidências. Se o que você quer é provar o envolvimento dela com os igualitários...”

Ai sim, sinos tocaram na cabeça do Tarlok e ele pegou a ficha novamente pra ler um fator interessante que ele havia deixado passar “O apartamento...”

Vazio das 7:00 às 16:00. Horário que Maia volta do trabalho. O pai dela chega ainda mais tarde, mas isso não te interessa.

Achei que você pensaria nisso por conta própria. Pensou o detetive, já conhecendo a maneira de operar daquele homem. Muitos de seus colegas, apesar de apoiar o movimento, nunca saíram nas ruas nem se envolveram nos treinos de chi-bloqueamento. Ainda assim, misteriosamente apareceu em suas casas bastões e luvas de choque, para reforçar uma culpa inexistente. Apenas por estas pessoas sentirem a necessidade de se libertar das amarras opressoras da dominação. Apenas por frequentarem reuniões para discutir seus medos e suas insatisfações.

Fausten fez muito esforço para esconder o desdém com seu sorriso.

“É durante esse horário que certos equipamentos igualitários aparecerão na casa da suspeita.” Tarlok sorriu “Até que você não é tão inútil assim, Festin”

“É Fausten. E eu agradeceria se você fizesse o resto do pagamento agora.” Finalmente terminou o delicioso chá, e descansou a xícara na mesa.

“Claro, claro. Foi um prazer fazer negócios com você” Disse Tarlok com um sorriso animado. Finalmente seus planos poderiam ser colocados em ação, ele só precisava tirar uma peça do jogo.

A avatar estava cavando seu próprio buraco ao se aproximar cada vez mais dos ideais igualitários. Ao livrar-se de seus apoiadores públicos, ele teria menos dor de cabeça para controlar o descontentamento da população com suas decisões.

Ele colocaria um fim naquele jornalzinho subversivo, a começar pela jornalista mais mentirosa que ele já encontrou na vida. Falariam sobre a avatar apenas os que estavam alinhados com seus planos.

“Precisando de mim para descobrir mais coisas, sabe como me encontrar.”

“Só mais uma coisa...” Tarlok disse, assim que o detetive abriu a porta.

Fausten olhou por cima do ombro com uma sobrancelha levantada “O que seria?”

“Investigue a família Sato.”

Fausten abriu um grande sorriso. Ai, Tarlok... Você não perde por esperar. “Com prazer.”


—//—//—//—

“Uau...” Asami disse, assim que Korra terminou de contar a história “Isso... Isso é incrível! Quer dizer que Raava está em você? Dentro de você? Nesse exato momento? Não no mundo espiritual?”

“Sim. O domínio dos quatro elementos vem de Raava. O ciclo Avatar existe justamente por este espírito de luz fazer parte de mim. Eu, Korra, tenho meu próprio espírito, assim como você tem o seu, e Hiroshi também, todos nós enquanto vivemos temos espíritos, que é nossa essência. Mas é por estar conectada com o espírito de Raava que o ciclo avatar vai continuar existindo. É ela quem carrega todas as experiências dos espíritos que se uniram a ela antes de mim. Ela carregará meu espírito até minha próxima vida, quem quer que seja. O Avatar não sou eu. O Avatar somos nós. Raava, Wan, Kuruk, Kiyoshi, Roku, Aang..."

Lágrimas umedeceram os olhos de Korra. Um dos motivos pelos quais ela ainda não tentou entrar em contato com suas vidas passadas era o medo de, na verdade, Raava não ter sido restaurada ao seu estado anterior à destruição.

Tinha medo de que carregavam não apenas a lembrança, como também a consequência daquele dia.

Mas eu consigo senti-los, Korra. Você não consegue?

Eu nunca fui capaz de me conectar com nenhum deles conscientemente, como faço contigo agora. Eles vinham até mim. Você os trazia até mim.

Korra olhou pra cima para evitar que o brilho das lágrimas em seus olhos fossem notados pelos demais. Piscou para secá-las e então voltou a prestar atenção na pessoa que ela mais precisava convencer da verdade.

"Eu sou um portador temporário do espírito da luz."

Hiroshi franziu o cenho em pensamento. Ela realmente parece estar falando a verdade. Tudo o que Korra contou fazia sentido, as pausas que ela fizera não pareciam as pausas de uma pessoa que estava inventando mentiras, mas sim de alguém que tentava lembrar pedaços de uma lembrança antiga.

De repente, algo veio à mente do Industrialista, e essa ideia o fez sorrir. “Espera, você disse que as tartarugas leão deram a dominação a um não dominador...”

“Sim...” Korra disse, receosa com as conclusões que Hiroshi tinha tirado da história. Pois, ao invés de parecer com remorso ou dúvidas, ele parecia estar mais que animado com algo.

“E que elas ensinaram Aang a TIRAR a dominação...”

“Sim, eu disse isso, mas...”

“Então isso quer dizer que elas estão no mundo físico, não é? Depois que Wan fechou os portões espirituais, elas não entraram no mundo espiritual. Elas ficaram no plano físico, e então sumiram.”

“Sim. Isso é, mas o que tem?”

Hiroshi percebeu que estava muito animado para a pergunta que faria a seguir. Ele controlou suas emoções e então, na melhor atuação que podia fazer, fingiu estar preocupado.

Nem Korra nem Asami perceberam que a mudança repentina de humor era uma atuação, e que ele ainda estava muito feliz com a conclusão que chegara.

Enquanto Asami tentava entender o motivo do pai estar tão preocupado, Korra pensou que ele havia finalmente percebido a farsa de Amon.

“Isso significa que as tartarugas leão podem mesmo ter ensinado Amon a tirar dominação, não é? Afinal, Wan não deveria ter roubado a dominação, e os amigos dele que causaram toda aquela destruição às florestas também não. E se Amon tenha sido realmente favorecido com o conhecimento da dobra de energia?”

“Isso não é possivel. Apenas eu, como Avatar, sou capaz.”

“Como tem certeza disso? Você viu Amon tirando a dominação dos outros, você sabe que não há outra forma, e sabe também que as tartarugas leão ainda estão no mundo físico... E se Amon as encontrou?”

Korra suspirou, finalmente percebendo o porquê de o Hiroshi ter ficado tão animado antes. Ele encontrou na história de Wan argumentos que explicam a história de Amon. Não algo que tire o crédito dos argumentos daquele mentiroso.

Hiroshi estava apenas fingindo estar preocupado, e isso fazia Korra se sentir apreensiva.

Eu não deveria ter contado.

Você fez o certo, Korra.

Ele vai usar o que eu acabei de contar contra mim. Vai dar ao Amon o que faltava para cobrir os buracos em sua história furada.

Dê um tempo. Ele há de perceber que Amon está enganando a todos.

Mas ele agora parece tão certo de que Amon foi abençoado pelas tartarugas leão. Raava, tudo bem que foi através de você que Wan dominou os quatro elementos, mas dobra de energia é uma técnica espiritual... Mesmo que eu tenha dito que Amon não consegue dominar essa técnica sem você, eu não posso confirmar! Agora é minha palavra contra a de Amon. A história de Wan só confirma que quem dá, tira, e domina energia espiritual são as tartarugas leão. E como Aang conseguiu a habilidade de tirar dominações através delas... Amon pode usar esse conhecimento contra mim. Lá se vai meu plano de confrontá-lo com isso no ginásio!

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Hiroshi pode não contar, justamente por pensar que Amon já sabe disso.

Mas se ele contar...

Você ainda vai sair vitoriosa daquele ginásio. Lembre-se que ele carrega uma falsa cicatriz. Lembre-se de que a mentira nunca sustenta a luz da verdade.

“Eu sei que Amon está mentindo. Nunca houve na história alguém além do Avatar com a habilidade de dominar energia espiritual.”

“Entendo.” Disse Hiroshi com uma falsa expressão Solene. Wan pode ter sido o primeiro avatar da história, Aang pode ter sido o primeiro Avatar capaz de tirar dominação das pessoas, mas Amon... Amon foi o primeiro não dominador abençoado por tartarugas leão com o poder de limpar os humanos da impura dominação. A dominação foi um erro trazido pelo idiota do Wan. Amon irá corrigir, e trazer o mundo para uma nova era! Pensou, tentando controlar o sorriso que queria se formar no seu rosto.

“Independentemente... Korra! Isso é incrível! Você é incrível! Você é o Avatar!”

Korra riu, era como se apenas agora Asami entendesse o que significava. “Eu sei!”

“O avatar!” ela repetiu, dando risada “Você é o ser mais poderoso do mundo!”

Korra sorriu apaixonadamente em direção à Asami.

Não sem você. “Sozinha eu não faço nada. A mudança deve ser coletiva, e são pessoas como você que fazem isso acontecer. Asami, com seus sonhos e projetos, você vai me ajudar a mudar o mundo.”

Asami sorriu de volta, envergonhadamente colocou uma mexa de cabelo atrás da orelha. “Você me honra com essa confiança. Vou dar o meu máximo para não decepcionar.”

“Você? Decepcionar? Impossível! Asami e falha não existem na mesma frase. Seus erros são acertos futuros, boto fé.” Brincou Korra fazendo a engenheira rir, e Hiroshi sorrir apesar do seu desconforto. Korra mais uma vez provava que não era tão mal assim. Para alguém que tinha todos os motivos pra se sentir a pessoa mais especial do mundo reconhecer o talento de sua herdeira…

Podia ser a paixão daquela jovem falando, de qualquer maneira Hiroshi apreciava.

Ele sabia que sua filha era mais capaz que todos os dominadores que ela insiste em se envolver. Odiava a forma como Asami admirava tanto esses imundos, a ponto de se sentir inferior. A única coisa que tornava Korra poderosa era sua dominação. Amon vai dar um jeito nisso, e logo, Asami não precisará se sentir inferior de maneira nenhuma. E Korra… bom, talvez ela realmente se torne uma pessoa digna de estar com Asami. “Realmente foi uma ótima história, mas você não mentiu sobre ela ser longa, Avatar. Estou exausto!” Riu se levantando da cadeira “Se não se importa, vou me retirar para meus aposentos. Pode ficar pra conversar mais um pouco com Asami, se desejar. Comportem-se!” Piscou na direção da Korra, fazendo-a se engasgar na própria saliva.

Ele sabe? Ponderou, entre um engasgo e outro, concordando com a cabeça vigorosamente enquanto não conseguia falar. Não... ele não deve saber... Eu não disse nada demais, disse? Ai Raava...

Se ele sabe, eu não sei. Mas que você é muito obvia, isso você é. Daqui a pouco Asami descobre por conta própria como você se sente.

Nãaaao! Eu não queria dar tanto na cara!

Não é como se você pudesse controlar seus sentimentos.

“Eu... Eu acho melhor ir embora também... Sabe como é o Tenzin.” Respondeu sem graça, e se levantou da cadeira, evitando olhar ao redor.

“Ah, deixa eu te dar uma carona então. É o mínimo que posso fazer depois de você passar sua noite de folga nos entretendo com a história do avatar Wan” Asami se levantou junto, caminhando em direção à Avatar com passos largos. “Minha motocicleta já está estacionada na frente da mansão...”

Korra corou, pois Hiroshi parecia ter descoberto todos os pensamentos menos que próprios passando em sua cabeça: Asami pilotando sua moto e ela abraçando a cintura de sua amada, aproximando seus corpos o máximo que lhe fosse permitido. Apoiando seu queixo naquele ombro...

“Não!” Korra recusou rapidamente, seu nervosismo era tão grande que a fez falar mais alto do que pretendia. Asami se surpreendeu com a recusa repentina, encarando a avatar com uma expressão meio confusa, e meio magoada. Ao ver o quanto sua recusa afetou Asami, Korra desviou o olhar e tentou se corrigir. “Digo... Não precisa, ‘Sami. Eu vim com a Naga, ela deve estar se sentindo bem sozinha depois de ter ficado esse tempo todo lá fora me esperando. Eu acho melhor ir com ela mesmo.”

Asami tentou parecer que não se importava com a recusa. Sorriu levemente, mas a sensação que tinha era a de que Korra estava evitando passar mais tempo com ela. Essa ideia a incomodava. “Ah, tudo bem então. Um outro dia eu te levo pra uma volta de motocicleta.” Ela deu uma piscadela divertida para disfarçar o seu desapontamento.

Korra sentiu sua face esquentar ainda mais com o tom sugestivo não intencional de sua amiga. “Soa incrível.” Ela disse, ainda evitando olhar nos olhos das pessoas presentes. Não queria entregar seus sentimentos daquela forma, e por isso acabou não notando a tristeza na expressão de sua amiga.

“Bom” Hiroshi disse, chamando a atenção das duas, dispersando aquele clima desconfortável. “Foi realmente uma honra te receber aqui em casa, Avatar. Volte mais vezes, certo?” O sorriso brilhante que recebeu da Korra deixava claro que a animação daquela garota tinha a ver com o tempo que passaria com Asami. Se a Asami manter a Avatar na palma de sua mão, mesmo que ela não saiba, me dá toda a vantagem de que preciso. Hiroshi sorriu de volta.

“Eu quem devo agradecer a hospitalidade” Korra respondeu “Te vejo amanhã antes da partida?” Perguntou à Asami, que finalmente deixou pra lá a tristeza de antes, pois o sorriso que Korra direcionou em sua direção ainda tinha o poder de fazê-la sentir especial.

“Sim. Não perderia por nada a estreia de vocês.”

“Então até amanhã.” Korra disse, hesitando por um momento antes de abraçar Asami, que mais uma vez se surpreendeu mas não demorou para retribuir. Apoiou o queixo no topo da cabeça da Korra, se permitindo apreciar como a Avatar encaixava perfeitamente em seus braços. Suspirou brevemente quando a mais baixa apertou sua cintura de leve antes de se afastar. Naquele momento, Asami percebeu que não se importaria em ser abraçada mais vezes daquela forma.

“Tchau…” Disse Korra ao se afastar.

“Tchau, Korra. Até amanhã.”

“Até amanhã.”