I Can't Love You

Capítulo 96 — Angústia.


CASTLE.

Às vezes a vida é tão corrida que a gente não nota o tempo passar. Às vezes estamos tão felizes que os momentos bons correm, e depois nós sentimos falta. Mas as vezes as coisas estão bem complicadas e nós rezamos para que tudo passe o mais rápido possível. Era exatamente assim que eu estava. Torcendo para que esse tempo de angustia passasse logo.

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Angustia. Palavra forte, mas que descreve exatamente o que eu estou sentindo agora. Nesse momento minha mulher está dando entrada na emergência do hospital e tudo o que eu sou capaz de fazer é rezar para ela fique bem.

Não queria soltar sua mão. Prometi que não faria isso, mas era preciso. Trancaram ela numa sala privada na emergência rodeada de médicos e me mantiveram longe dali.

Estamos tentando salvar a vida da sua mulher e de seus filhos, você precisa sair daqui”.

Esse foi o único argumento usado pelos médicos, e tudo o que eu consegui dizer foi: “Salva ela. Se for possível, salva ela”.

Não consigo descrever o quanto estou sendo egoísta agora. Eu tenho três vidas preciosas naquela maca de hospital e todas eram extremamente importantes para mim. Mas eu não queria e não suportaria viver sem Kate, então eu pedi por ela.

Os dois últimos meses foram bem complicados. O cansaço de Kate aumentou, suas cólicas e sangramentos também apareciam de vez enquanto. Érica lhe deu alguns medicamentos, mas disse que não poderia dar mais para não comprometer a gestação. Kate estava visivelmente fraca, mas ao mesmo tempo se mantinha forte e não se deixava fraquejar nem quando estávamos sozinhos no quarto.

Ela podia negar, mas eu conheço a mulher com quem eu me casei e vi apenas olhando em seus olhos que sim, ela estava no seu limite, e sabia mais quanto tempo aguentaria aquilo. Carregar uma criança no ventre requer muito esforço e cuidado. Duas requer tudo duplicado. No caso de Kate era pior. Ela tinha tudo não levar a gravidez até o fim e ao que parece, ela não vai.

Sentei na sala de espera do hospital e escondi meu rosto entre as mãos. Meus braços apoiados em minhas pernas. Ali eu deixava claro toda a minha fraqueza. Kate era meu ponto fraco. Tudo o que ela sentia, eu sentia o mesmo só que três vezes mais. Quando ela sentia dor, eu também sentia. Quando ela estava cansada demais até para conversar, eu também me sentia assim.

Tudo o que eu queria era que isso passasse logo.

Que tudo voasse como os primeiros meses que ela estava bem voaram.

Mas por ironia do destino, cada segundo parecia uma eternidade.

SEMANAS ATRÁS.

— Como você está? – coloco a última caixa no chão e me aproximo dela.

Finalmente nós estávamos voltando para nossa casa. Toda mudança é cansativa, então tomei cuidado para que Kate não sentisse esse impacto quando voltássemos. Fiz questão de pagar uma equipe para arrumar toda a casa, desde a limpeza geral até o último porta-retratos colocado na sala. Tudo o que nós tínhamos que fazer era guardar nossas roupas nas malas e levar nossos pertences mais pessoais nas caixas.

E assim eu fiz. Guardei tudo no carro trouxe para o rancho, depois voltei e peguei as três belas mulheres que me aguardavam no apartamento de Kate. Quando chegamos ao rancho tive que convencer Kate a deixar o tour pela casa nova para depois, ela não precisava se cansar mais do que já estava, então a levei para o andar de cima.

Eu podia convencê-la a tudo, menos a não ir olhar o quarto dos meninos, que estava pronto e decorado exatamente do jeito que ela pediu. Vi seus olhos encherem de lágrimas. Ela observou cada lugar, cada cantinho, e depois abriu as gavetas onde estavam algumas roupas. O cheiro de bebês invadiu o lugar e foi impossível não se sentir bem com aquilo.

Estava cada vez mais perto.

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Se tornava cada vez mais real.

— Eu só preciso descansar. – ela ajeitou os travesseiros em suas costas e me entregou outro. Coloquei embaixo de suas pernas e a vi fechar os olhos.

— Daqui a pouco é a hora dos seus remédios, até lá você pode descansar à vontade. – beijei sua testa e ela sorriu fraco. Há muito tempo não vejo o sorriso brilhando que Kate tinha. Não consigo imaginar o quão complicado deve estar sendo para ela esses dias.

— Você pode ajudar Alexis a arrumar as coisas dela? Ela ainda precisa estudar porque amanhã ela tem prova e se deixarmos ela passa o dia arrumando o quarto e nem lembra de pegar os livros.

— Pode deixar. – sorrio. Mesmo extremamente cansada Kate não para de se preocupar com a gente.

Saio do quarto e apago a luz. O lugar fica parcialmente escuro, apenas uma pequena claridade vinha da janela da nossa varanda. Vejo Kate acariciar a barriga enquanto solta um longo suspiro.

Há dois dias ela teve um sangramento. Eu a levei para o hospital e entraram com medicação, mas logo ela recebeu alta. A recomendação era a mesma: repouso e sem nenhum esforço. Mas aquilo não parecia aliviar em nada o que Kate sentia.

Eu não sabia mais o que fazer para ajudá-la.

Alguns dias depois.

A maioria das noites eu passava em claro. Antes Kate não dormia porque os gêmeos mexiam muito, agora eu não durmo com medo que ela acorde sentindo alguma dor, como fez ontem. Seu grito me despertou e eu não pedi tempo ao leva-la para o hospital. Mais uma vez os lençóis estavam sujos de sangue, mas numa quantidade bem maior que as últimas vezes.

Quando chegamos na emergência ela foi levada para fazer exames e logo controlaram a hemorragia. Os bebês estavam bem, mas tudo indicava que Kate teria um aborto e tivemos que ficar no hospital.

Passamos uma semana inteira naquele lugar. Fiquei ao seu lado quase o tempo todo. Ia para casa apenas para ver Alexis e coloca-la para dormir, mas Tereza sempre ficava no meu lugar. Minha mãe voltou para o rancho nesse meio tempo, disse que cuidaria da Alexis enquanto estivéssemos no hospital.

— Rick... – ouço sua voz rouca e me levanto rapidamente.

— Oi amor... você está bem? Está sentindo alguma coisa? – olho por toda a extensão do seu corpo procurando algo, mesmo ela estando coberta.

— Não, só estou sem sono. – Kate suspirou e segurou minha mão. – queria te pedir uma coisa.

— Claro. O que você quiser. – me sentei na ponta da cama e seus olhos encheram de lágrimas.

Eu conseguia ver o medo ali. Medo de perder os filhos. Medo que algo lhe acontecesse.

— Quero que você me prometa que... – sua voz falhou e as lagrimas começaram a rolar. – que se tiver que escolher...

— Shiii... para Kate. Por favor, não fala isso. – limpei suas lágrimas ao mesmo tempo que fechava os olhos. Não queria que ela pensasse nisso. Nunca.

— Mas eu preciso. – ela limpa a garganta e sua voz sai mais firme. – você precisa me prometer que se tiver que escolher, vai escolher eles.

Abri meus olhos e encontrei a escuridão em seu olhar. Foi o único momento de fraqueza ela teve. Sua voz firme me mostrou o quão decidida estava, e isso não era coisa de uma noite sem sono. Ela pensou nisso bem antes disso tudo acontecer.

— Você precisa me prometer. – ela insiste.

— Não precisa se preocupar com isso, ok? – falei balançando a cabeça. – por favor, tente dormir.

Me encaixei ao seu lado na cama e a puxei para meus braços.

Eu simplesmente não podia prometer aquilo, eu não conseguia. Não podia escolher a quem salva. Se eu pudesse, escolheria todos, mas eu não queria ter essa decisão. Permanecemos em silencio o restante da noite até que senti sua respiração ficando mais leve e souber que ela estava no mundo dos sonhos.

Uma semana depois.

A gente sempre acha que está vivendo o momento mais feliz de nossas vidas. Não imaginamos que num futuro próximo o nosso momento mais feliz ainda vai chegar. E então o ciclo continua. A gente continua achando que estamos no ponto mais alto de nossas vidas, mas na verdade não estamos nem na metade.

Era assim que Alexis se sentia nesse momento. Sua fez de aniversário estava saindo exatamente como ela queria. Cheio de brinquedos no jardim, máquina de sorvetes, algodão doce, crepe e uma doceria ambulante. Tudo o que as crianças, e eu, mais gostam. Tudo foi aprovado por ela, que fez questão de saber cada detalhe que eu e Kate organizávamos.

Meredith finalmente chegou na cidade. Agradeci mentalmente por isso, porque apesar de não vir passar um mês inteiro, ela pelo menos veio passar o fim de semana com a filha. Justamente o fim de semana de aniversário dela. Alexis estava completando nove anos.

E justo hoje fazia um ano que eu a tinha em minha vida. Então isso era um duplo motivo para comemorar. Não quis deixar que a gravidez difícil de Kate atrapalhasse todos os seus pequenos sonhos de uma festa de aniversário grande. No meu tempo livro resolvi tudo por telefone. Discuti algumas opções com Kate e programei toda a festa. Kate ficaria todo o tempo sentada numa poltrona confortável. Ela não queria deixar de participar da festa, então entramos em um acordo.

Crianças correndo, gritando, chorando, sorrindo. A festa estava realmente agitada. O mágico fazia seu show para algumas crianças enquanto outras preferiam o pula-pula. Alexis se dividia entre dar atenção aos seus amigos e a Meredith. Pedir, quase ordenei, que Alexis esquecesse de tudo e apenas aproveitasse. Ela nunca teve uma festa assim, e tinha que aproveitar enquanto ainda era criança e a adolescência não chegava. E junto com ela as rebeldias que eu tinha certeza que viriam.

— Como você está? – pergunto pela décima vez a Kate.

— Amor, eu estou bem. Estou exatamente como estaria na nossa cama, sentada. A única diferença é que eu estou numa poltrona no meio da festa da minha filha.

Sorrio e me abaixo selando nossos lábios rapidamente.

Kate estava feliz. Diferente dos outros dias ela estava mais sorridente. Não era o mesmo sorriso pelo qual me apaixonei, mas mesmo assim era um sorriso. Ver a filha feliz a deixava feliz. Então mesmo que seja errado, deixa-la participar da festa foi a decisão mais certa que já tomei.

Assim que Lanie chegou e começou a contar como estava sua gravidez, Kate pareceu se animar mais. Ao contrário do que eu pensei. Esposito pegou uma cerveja para a gente e ali, ao lado de Kate, ficamos conversando ao mesmo tempo que meus olhos buscavam saber se estava tudo bem na festa e se Kate também estava bem.

Quando os últimos convidados saíram já era noite. Eu já tinha convencido Kate a voltar para o quarto e Alexis já estava jogada no sofá.

— E então pestinha, gostou da sua festa?

— Amei. – ela abre um sorriso enorme. – posso abrir os presentes?

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— Depois. Sua mãe está indo para o hotel, quer saber se você vai querer dormir com ela.

— Vou. – ela prontamente se levanta. – onde ela está?

— Está conversando com um amigo. – aponto para o jardim.

Meredith tinha passado a festa inteira conversando com Will Soreson. Não sei como esse cara ficou sabendo da festa, mas não falei nada para não estragar a comemoração da minha filha. E só quando eu saí para avisar a Meredith que Alexis iria com ela, eu entendi tudo. A ruiva estava beijando Will com todo o seu fervor.

O namorado da Meredith era Will.

Por isso ele veio a festa

Por isso eles ficaram o tempo inteiro juntos.

Minha ficha caiu em segundos. Limpei a garganta deixando claro que tinha mais alguém ali e rapidamente eles se separaram, mas a mão dele continuou em sua cintura.

— Alexis foi arrumar as coisas dela. – avisei.

— Ótimo. – a ruiva sorriu e se aproximou. – vou embora daqui a dois dias, creio que ela possa ficar comigo, certo?

— Claro. Desde que você cuide bem dela.

— Rick, eu cuidei dela sozinha por oito anos...

— Errado. – eu a corto. – seu pai cuidou dela por oito anos. Você fazia exatamente o que está fazendo, aparecia de vez enquanto e passava um tempo com ela.

— Que seja. – ela joga os ombros. – oi, meu amor. Pronta para ficar o resto do fim de semana comigo?

Olho por cima do meu ombro e vejo Alexis com sua mochila.

— Sim. – minha ruivinha sorrir e me olha. – a mamãe já está dormindo, mas deixei um beijo nela e outro em meus irmãos.

Acaricio seus cabelos e sorrio.

— Pode deixar que quando ela acordar eu digo que você se despediu dela. Agora em dá um beijo.

Me abaixo e abraço forte. Alexis vai até a mãe, que segura sua mão e arruma seus cabelos.

— Filha, eu já te falei... Kate é sua madrasta, não sua mãe.

Meredith pisca e sai de mãos dadas com Alexis e o namorado.

Até pensei em revidar, mas o dia foi cansativo o bastante para fazer com que eu dê meia volta e suba até o quarto para ficar com minha mulher.

DIAS DEPOIS...

Parecia um dia tranquilo como outro qualquer. Alexis tinha terminado o dever de casa e estávamos nos preparando para jantar. Tereza estava no quarto fazendo companhia a Kate enquanto o jantar seria por nossa conta. Alexis terminada de colocar a mesa enquanto treinava seu espanhol comigo.

Mas aquele maldito celular tocou.

Aquela maldita ligação.

Senti o celular vibrar e atendi sem ao menos me afastar do fogo. Qualquer descuido e meu frango queimava. A voz não era conhecida e seu tom era sério. Começou perguntando se eu era Richard Castle, e eu prontamente respondi. Mesmo sem saber do que se tratava olhei para Alexis, que tinha parado de falar quando viu que eu estava no telefone, mas continuou fazendo seu trabalho.

Nós estamos ligando para falar de Meredith, esse foi o último número discado em seu celular. – a voz do homem me assusta.

— O que houve? – tento parecer normal.

— Ela estava abordo de um jatinho particular que iria de Nova Iorque para Los Angeles. – o homem para, como se eu precisasse absorver aquele informação primeiro antes de contar o que de fato aconteceu. – houve um acidente...

— Ela está bem? – eu o interrompo.

— Não. – a voz fria fez meu corpo inteiro se arrepiar.

Apago o fogo e me afasto o máximo que posso de Alexis tentando me manter normal.

— Ela morreu? – pergunto baixo.

— Não. – ouvir aquilo fez um peso sair de minhas costas. Solto a respiração que nem eu sabia que estava prendendo e me viro para a ruiva. – mas ela está gravemente ferida. Seu estado é crítico.

— Pode me passar as informações?

O homem concordou e eu andei rapidamente até o escritório e anotei tudo o que ele me disse. Seu nome, a cidade e o hospital que estavam. Assim que desliguei o telefone vi Alexis atrás de mim dizendo que já tinha acabado e estava com fome. Por sorte ela não desconfiou que nada estava errado. Sorri e disse que iria subir para avisar a Thereza e Kate.

Entrei no quarto e as duas riam de algo. Raramente via Kate sorrindo ultimamente, mas sei que quando estava com sua tia e sorria assim, era porque elas lembravam de algo sobre seus pais.

— O que houve? – ela pergunta assim que me nota e seu sorriso morre. Ela sabia que tinha algo errado.

— Um acidente com a Meredith. – me limito a dizer. – Thereza você pode ficar com Alexis um segundo, eu não sei de muita coisa, preciso conversar com a Kate.

— Claro. O tempo que precisar. – ela sai do quarto e encosta a porta.

Sinto o peso do olhar de Kate sobre mim. Podia notar por sua respiração acelerada que ela estava ficando nervosa. Me aproximei e sentei ao seu lado. Olhando para baixo tentando entender o que tinha acontecido.

— Como você soube? – ela quebra o silencio

— Os médicos dela me ligaram. O meu número era o último discado. – eu finalmente a olho. – ela está mal, Kate. E eu não sei como contar isso para Alexis.

— Castle ela precisa saber.

— Eu sei. – me levanto. – mas o que eu vou contar? Que a mãe dela sofreu um acidente e que está entre a vida e a morte num hospital? Não, ela é uma criança!

— Tudo bem, então você precisa saber o que está acontecendo.

— Já sei que fazer.

Pego meu celular disco o número tão conhecido por mim. Assim que Mark, meu advogado, atende eu peço que ele verifique tudo para mim. Meredith estava em um hospital em Nova Iorque, assim que ele soubesse exatamente o que estava acontecendo ele me retornaria.

— Castle você precisa ir até lá. – Kate chama a minha atenção. – Alexis vai querer vê-la.

— Não vou sair e deixar você aqui. – digo firme e ela suspira. – sem chance, Kate.

— E como você vai fazer?

— EU NÃO SEI! – falo alto demais e respiro fundo. – desculpa, não quis falar assim. É só que..

— Você está assustado, eu sei. Vem cá. – ela estica o braço e eu me aproximo. – amor, querendo ou não Alexis e você são a família dela.

— O Will também. – lembro.

— Então você precisa contar para ele também.

Balanço a cabeça concordando. Mas eu esperaria até ter mais notícias.

***

Demorei para dormir. Toda vez que conseguia fechar os olhos, as lembranças do telefonema me assombravam. Verifiquei a hora mais uma vez. Duas horas da manhã. A última mensagem de Mark tinha sido a três horas, dizendo que se tivesse notícias me contaria.

Quando meu celular finalmente tocou eu pulei da cama. Alexis dormia entre Kate e eu. Nenhum de nós quis que ela dormisse sozinha hoje. Kate acordou junto comigo, posso apostar que ela não estava dormindo realmente. Atendi a ligação com cuida para não acordar Alexis. Kate me olhava atentamente, mas depois do meu “Oi, Mark” não disse mais nada.

Como sempre Mark tinha sido direto. Apenas um “Sinto muito, ela não resistiu”. Mas aquilo foi suficiente para eu saber que os dias de tormento na minha família não estavam nem perto de acabar.

— Cuide de tudo, ok? – Mark concordou e eu desliguei a ligação. Não precisava de mais nada, ele sabia exatamente o que fazer.

Kate ainda me olhava atentamente esperando uma resposta, eu apenas balancei a cabeça negativamente e ela sussurrou algo enquanto fechava os olhos. Suas mãos acariciaram o rosto de nossa filha e eu senti um aperto no coração. Como Alexis reagiria a isso?

***

— Bom dia, amor. – ouço a voz carinhosa de Kate e quando me viro, vejo que ela está cumprimentando Alexis.

Já tinha passado da hora normal que ela acorda durante a semana, mas nós decidimos deixar ela acordar sozinha para então contar a notícia que mudaria sua vida. Vejo a ruiva sorrir e abraçar Kate.

— Eu não vou para escola hoje? – ela pergunta coçando os olhos e olhando as horas.

— Não filha, nós precisamos conversar. – me aproximo. Eu já estava arrumado, apenas esperando a nossa hora de ir.

Alexis senta na cama e nos encara.

Dar aquela noticia a minha filha foi a pior coisa da minha vida. Ver seus olhos mágicos se enchendo de lágrimas e perguntando repetida vezes se aquilo era verdade partiu meu coração. Senti vontade de chorar com ela, mas me mantive forte. Kate a acolheu em seus braços e falou coisas que só ela podia ouvir, mas vi ela assentir com a cabeça e logo depois de levantar e seguir para seu quarto.

Kate estava quieta, não queria falar muito. Sei que toda essa situação lembrou a morte de seus pais, mas conversaria com ela melhor quando chegasse. Thereza estava ajudando Alexis a se arrumar, nós pegaríamos um voo particular até Nova Iorque, ficaríamos no funeral até fim da tarde e depois voltaríamos para tarde.

— Kate, são só algumas horas, ok?

— Eu não estou preocupada comigo, Castle. Estou preocupada com minha filha! Eu queria ir com você.

— Não. – balanço a cabeça. – já não me sinto bem indo e te deixando aqui, se você fosse eu ficaria pior. – suspiro. – minha mãe e Jackson vão chegar daqui a pouco, então se alguma coisa acontecer peça ajuda, por favor. – peço cansado. – a noite eu volto.

Me abaixo e beijo sua testa. Mesmo contrariada Kate aceita minhas condições e eu vou até o quarto de Alexis, partiríamos em uma hora e ela tinha que está pronta rápido. Assim que vejo a menina em seu vestido preto decidi que daqui em diante ela não usaria mais aquela cor. Seu rosto sem alegria era de partir o coração. Os olhos estavam vermelhos e os cabelos longos soltos.

Ela foi o voo inteiro em silencio. Podia imaginar as milhões de coisas que estavam se passando por sua cabecinha. Queria distrai-la, mas ao mesmo tempo queria dar um tempo a ela. Há um ano atrás ela perdeu o avô, agora perdeu a mãe. Sinceramente não sei se posso dizer algo que a faça se sentir melhor.

Assim que chegamos no local do velório vi alguns repórteres, Meredith estava no auge da carreira, estava bem conhecida, sua morte foi notícia no mundo inteiro. Pedi para Mark que desse a volta, nós entraríamos por trás. Assim que estacionou o carro me virei para Alexis.

— Você quer mesmo ir? Você não precisa, ok?

— Eu quero. – ela me olhou e eu pude ver seus olhos marejarem novamente.

Descemos e vamos direto a sala onde Meredith estava sendo velada. Alguns amigos dela, mas nenhum que eu conhecesse pessoalmente. Vi dois ou três amigos da faculdade, mas os cumprimentei de longe e segurei a mão da minha filha.

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Alexis andou quase no automático até o caixão. Sua decisão de vê-la foi uma surpresa para mim, mas ela queria se despedir. Nós nos aproximamos e ela parou em frente. Delicadamente tocou o rosto da mãe que parecia tão bonito quanto antes. As lágrimas caíram e eu segurei o choro mais uma vez. Tinha que ser forte por minha filha.

As horas seguintes passaram se arrastando. Nos sentamos nas primeiras cadeiras e escutamos o padre dar seu sermão. Escutava vagamente suas palavras já que minha atenção estava inteiramente voltada para a minha filha. Quando então chegou a hora do caixão descer, Alexis me pediu para ir embora, e assim eu fiz. Estava ali para garantir que ela se sentisse o mais confortável possível e não obriga-la a ver tudo o que vinha a seguir. Eu nunca tinha passado por isso, mas sei que doía. Doía muito.

Fomos para um hotel até chegar a hora do nosso voo. Ao contrário de quando viemos, não vamos voltar em um jatinho particular. Fiz Alexis tomar um banho e quando terminou, me pediu para ver TV. Concordei e fiquei olhando-a de longe. Seu semblante era sempre triste. Respondi algumas mensagens de Kate e me sentei ao lado da ruiva. Queria que ela soubesse que eu estava ali com ela, por ela. Sempre.

***

Chegamos a noite em casa. Alexis dormiu o voo inteiro, e voltou a dormir quando entramos no táxi. Ela estava cansada, foi um dia puxado. A segurei no colo e entrei em casa. Minha mãe e Tereza logo vieram em minha direção. Avisei que a colocaria na cama e logo descia para falar com elas.

Subi e fui direto para meu quarto. Não queria que Alexis dormisse sozinha hoje. Assim que abri a porta Kate largou o celular e se sentou direito na cama. Coloquei Alexis em seu lado e dei a volta, selando nossos lábios demoradamente. Foram apenas algumas horas, mas depois de tudo, eu precisava vê-la.

— Como foi?

— Horrível. – suspiro. – eu não sei o que conversar com Alexis, nunca passei por isso e ela parece mal. Mas não quer falar comigo.

Kate acariciou o cabelo da filha que logo se aconchegou nela.

— Ela vai se abrir com a gente quando estiver pronta, ok? – concordo balançando a cabeça. – está com fome? Sua mãe deixou janta para vocês...

— Sim, eu vou descer e conversar com ela um pouco. esta tudo bem?

— Vou ficar bem com ela. – Kate pisca e se deita na cama puxando o corpo pequeno de Alexis para seu lado.

***

Mais uma vez passei a noite acordado velando o sono das duas mulheres ao meu lado. Kate dormia tranquila, mas toda vez Alexis tinha pesadelo ela acordava e sussurra algo para ela. Mesmo estando tão perto, eu não conseguia ouvir.

Quando enfim amanheceu, troquei de roupa rápido e fui correr. Precisava extravasar toda a energia que tinha dentro de mim. Precisava colocar para fora o quão sufocante estava sendo todo aquele tempo de agonia e angustia. Quando isso vai acabar?

Corri sentindo o vento gelado da manhã bater contra o meu rosto.

Essa era a melhor coisa que já senti nas últimas semanas.

Me senti livre e feliz.

Me senti eu novamente.

KATE.

Acordei enquanto Castle ainda se vestia para correr. Estranhei aquilo tudo, mas entendi que ele precisava sair e espairecer um pouco. Têm sido difícil para todos nós, mas agora eu não estava preocupada comigo ou qualquer outra pessoa, estava preocupada com minha filha. Minha doce e pequena Alexis.

Não estar com ela em um momento difícil com esse realmente me quebrou por dentro, mas Castle estava certo quando disse que eu poderia cuidar dela o quanto quisesse assim que chegarem. Mas eu tinha que pensar nos meus meninos também. O dia de ontem foi angustiante, desde quando contamos a notícia para Alexis até o momento em que eles voltaram de nova Iorque.

Na TV passavam notícias a todo momento e imagem do funeral. Senti meu peito doer quando, sem querer, vi a cena de Alexis praticamente fugindo do enterro com o pai. Ela não queria ver o caixão descer, e eu entendia isso. Eu também não quis quando meus pais morreram.

Mas agora ela estava ali, ao meu lado, dormindo como um anjo que ela é.

Fico apenas observando-a enquanto dorme até ver a porta do quarto abrir novamente e Castle entrar. Não sei quanto tempo se passou desde que ele saiu, mas acredito que muito, porque ele está suado e visivelmente ofegante.

— Já acordada? – ele fala baixo se aproximando.

Olho para o relógio e vejo que são seis e vinte da manhã.

— Sim. Não consegui dormir direito.

— Vou tomar um banho e já volto para ficar com vocês.

Sorrio concordando e volto a minha atenção para Alexis. Não demora muito para que ela comece a se mexer na cama e finalmente abrir os olhos. O mar azul cristalino está ali, como eu gosto, mesmo que pequeno ainda com sono.

— Oi, amor. – cumprimento e ela boceja.

— Oi.

— Como está?

— Eu não vou a escola hoje de novo? – ela desconversa.

— Só se você quiser. Você quer?

— Não. – ela puxa a coberta até o pescoço e fecha os olhos.

— Está com fome? – ela balança a cabeça concordando e fico aliviada, pelo menos ela quer comer já que ontem não quis comer nada o dia inteiro. – posso pedir para o seu pai fazer seu prato favorito? Ovo mexidos com torrada e geleia?

— Só os ovos, Kate. – sua voz sai abafada.

Kate... a quanto tempo ela não me chama assim?

Não falo nada, apenas concordo. Quando Castle sai do quarto peço que ele faça o nosso café da manhã e leve para a cama. Alexis continuou na mesma posição, deitada de lado com o corpo quase inteiro coberto, apenas com a cabeça de fora. Sabia que ela não estava dormindo porque seus dedos brincavam discretamente com a ponta do lençol.

Assim que Castle chegou nós nos sentamos e começamos a comer a enorme bandeja que ele trouxe cheia de comida. Alexis comeu um pouco dos ovos e bebeu seu suco. Todas as nossas tentativas de puxar assunto com ela falharam, ela apenas respondia “sim” ou “não”, e as vezes jogava os ombros.

— O que você quer fazer hoje? – Castle pergunta.

— Só quero assistir desenho.

— Ah, então a gente pode passar a amanhã inteira assistindo seus filmes. Nós três, aqui no quarto. O que acha?

Tento parecer animada.

— Pode ser. – Alexis joga os ombros sem nenhuma animação. – mas eu só queria ficar no meu quarto. Eu posso, Kate?

Cada vez que ela me chamava assim eu sentia um frio na barriga. Alexis estava distante, mas eu posso entender isso. Castle me olha confuso pela forma como ela me chamou, mas eu ignoro.

— Pode... só escove seus dentes antes de se deitar novamente, ok?

Ela concorda e sai do quarto.

— Kate? – Castle me encara. – como assim Kate? O que houve com mãe?

— Ela está confusa, acabou de perder a mãe. Precisa de um tempo.

— E você está bem com isso? – o encaro por um tempo.

— Não, mas posso aguentar. – sorrio.

***

Os dias se passaram e Alexis continuou a mesma coisa. Meias palavras, preferia ficar trancada no quarto do que conversar, vinha ao meu quarto duas vezes no dia e se deitava ao meu lado. Sempre conversávamos um pouco e então ela voltava para o quarto. Aquilo era quase como uma obrigação para ela. Desde que voltou do velório da Meredith ela não me chamou mais de mãe. Deve algum tipo de reação, já que ela acaba de perder a mãe e não quer substitui-la, mas eu sinto falta.

As reclamações dos professores se tornaram frequentes. Todos os dias vinha algum bilhete dizendo que ela respondeu um professor, ou esqueceu o dever casa, ou simplesmente não quis participar da aula de educação física. Em casa todos os dias eu escutava Castle brigando com ela, mesmo que eu digo mil vezes que ele não precisar gritar e sim conversar, mas ele já está ficando sem paciência. Quando eu toco no assunto com a ruiva ela desconversa, o que me fez ter a ideia de leva-la a um psicólogo.

Hoje seria sua segunda sessão. Depois da escola Castle buscaria Alexis e iria com ela até o consultório da psicóloga. Sei que eles chegaram porque a porta do quarto da menina bateu forte, ela está furiosa. Logo depois Castle entra, seu semblante sério e cansado.

— O que aconteceu? Ela não gostou da consulta?

— Não, até que gostou, mas... – ele para e suspira pesado. – a diretora falou comigo hoje, as notas da Alexis caíram e ela está preocupada.

— Como assim caíram?

— Caíram! E não porque ela não sabe, e sim porque ela faz questão de responder errado ou não responder as questões. Alexis é ótima em matemática mas deixou toda em branco.

— Ok, nós combinamos que eu iria dar espaço a ela porque ela está se sentindo confusa, mas esse tempo acabou. Eu vou conversar com ela. – ameaço levantar da cama e Castle se apressa.

— Kate você não pode se alterar. – ele me faz sentar novamente na cama. – se acalma e quando ela vier aqui mais tarde vocês conversam, com calma.

— Castle...

— Por favor... – fecho os olhos e respiro fundo.

— OK. – o encaro. – eu vou esperar um pouco, mas se ela não vier até o fim do dia, eu vou até lá e nós vamos conversar seriamente.

— Tudo bem.

O dia passou quase se arrastando. Alexis não saiu do quarto e nem quis jantar. Ela não estava com raiva de mim ou do pai, e sim da mistura de sentimos que tinha dentro de si e ela não sabia lidar. Eu sinto falta da minha ruivinha meiga e que me contava sobre tudo.

Sem mais me aguentar, levantei e caminhei devagar até seu quarto. Se Castle em visse agora me impediria de continuar, então tento ter todo o cuidado possível para que não leve uma bronca dele depois. Normalmente caminhar até o banheiro é o bastante para me cansar, e mesmo que a distância do quarto de Alexis seja maior, eu precisava fazer isso.

Bate na porta e abri devagar. Alexis estava sentada na sua mesa de estudos ao lado da cama. Ela em encara por alguns segundos e depois volta sua atenção para seus livros. Caminho até sua cama e me sento, olhando atentamente para ela.

— Passou o dia estudando, porque não para um pouco? – falo calma.

— Vou precisar refazer meu teste de matemática amanhã, eu preciso estudar.

— Eu posso te ajudar?

— Não precisa.

— Alexis... – ela finalmente me olha. – eu sei que você está confusa, sei exatamente pelo o que está passando, mas...

— Kate, eu preciso estudar. – mais uma vez eu sinto como se uma faca acabasse de entrar em meu coração. Ouvi-la me chamar assim era a pior coisa do mundo, eu nunca me acostumaria com isso.

— O que aconteceu o mãe?

— A minha mãe morreu... – ela volta sua atenção para o livro.

— Alexis a gente já conversou um milhão de vezes sobre isso, eu nunca vou subs...

— Eu preciso estudar ou o papai vai brigar de novo comigo se eu zerar a prova. – ela me interrompe e me olha rapidamente. – pode me deixar sozinha? Por favor, Kate.

Balanço minha cabeça lentamente e me levanto.

— Tudo bem... mas eu também sou sua mãe. – digo quando passo por ela, me abaixo e beijo seus cabelos.

Abro a porta do quarto para sair e sou surpreendida por um furacão de pelos dourados. Cosmo passa correndo por mim e tudo o que acontece a seguir é feito em segundos. Sinto apenas seu corpo esbarrando em minhas pernas e eu tentando me segurar nas paredes, mas eu perco o equilíbrio e acabo caindo e batendo forte a minha barriga no chão.

Meu grito assusta Alexis que em menos de um segundo está ao meu lado e perguntando se eu estava bem, mas tudo o que eu consigo fazer é gemer de dor. Era como se eu fosse ser dividida no meio sem nenhuma anestesia. Doía mais do que as outras vezes.

Ouço Alexis gritar pelo pai. Minhas lagrimas já lavavam meu rosto. Não sei se era de dor ou desespero, mas eu gemia e chorava incontrolavelmente. Minhas mãos estavam segurando minha barriga de forma protetora, eu tinha que proteger meus filhos. Castle aparece do meu lado e se abaixa na minha frente perguntando infinitas vezes se eu estou bem ou como é a dor que eu estou sentindo, mas não sou capaz de falar. Logo depois ouço a voz da minha tia e os braços fortes de Castle ao redor do meu corpo e me carregando em seus braços.

Essa é a última coisa que lembro antes de perder a consciência e acordar na sala de emergência do hospital rodeada de médicos.