Depois disse subi e arrumei o antigo quarto de Bryan para ficar com uma cara de mais moderno para um garoto de 19 anos. Bryan dormia pesado, quando os lobos de Ártemis apareceram. Mamãe pediu o numero de Jessye caso não me encontrasse, antes de sairmos. Seguíamos noite adentro, com a luz pálida da lua brilhando sobre nós enquanto os lobos nos seguiam com facilidade. Logo retornamos ao acampamento. Naquela mesma noite, após caçarmos todos os monstros presentes na região, Jessye me puxou de lado e disse que eu precisava de um treinamento especial e que tínhamos que começar naquela hora. Na hora estranhei, não sabia que não estava tão boa como minhas outras irmãs. Não recusei o treinamento. Se estava ruim, tinha que melhorar. Quando acabamos, me senti bem cansada.

Os meses passaram, e com eles meu treinamento passou a ficar mais forçado, mais exigia de mim. Exercícios de concentração, equilíbrio, pontaria e muitos outros. Por mais puxados que fosse eu os concluía com perfeição e satisfação. Jessye havia mudado em alguns aspectos. Tornou-se mais distante e fazia ligações ao amanhecer, durante todas as noites. No começo a questionei para quem ligava e ela me respondia com “ninguém importante” ou apenas olhava para o horizonte. Algo a havia mudado. Havia ficado mais distraída, mais distante mentalmente, mas não me dava folga com os exercícios. Ela me incentivava fazendo elogios e dando dicas. Esse era o único momento que ela parecia estar realmente ali.

Estávamos numa floresta no Oregon, de frente ao oceano pacifico. Ártemis pediu para nós armássemos o acampamento ali. Ela olhou para Jessye com um olhar frio, e pela primeira vez percebe como a deusa podia ser perigosa. As duas seguirão para floresta adentro, o que me preocupou. Ajudei Beatrice que estava com dificuldade com sua barraca. Depois de ajudá-la, sentamos em um tronco de arvore.

– Então, Ty, eu queria falar contigo – começou ela.

–O que houve?- perguntei.

– A Jessye esta estranha. Acho que você já percebeu?

– Sim.

– Então em umas das vezes que estava ao telefone, acabei sem querer escutando sua conversa.

–E ai?

– Ela...

Beatrice não terminou de falar. Segui seu olhar espantado e vi Jessye na margem da floresta.

– Ty, você pode vim comigo? – perguntou Jessye, cabisbaixa.

– Claro – falei levantado. Olhei para Beatrice com aquele olhar de “Terminaremos essa conversa mais tarde”. Beatrice assentiu com a cabeça.

Caminhei ate Jessye com passos pesados. Tinha impressão de que algo ruim ia acontecer.

–Venha! Precisamos conversar. – disse Jessye. Quando ela disse isso, vi tudo o que havia feito de errado passar como um filme diante dos meus olhos.

Andamos em silencio até encontrar Ártemis em um lado distante. A deusa estava com uma expressão triste e sombria. Seus olhos amarelados possuíam agora um tom mais escuro. Ela me olhou e seu olhar se suavizou, mas ainda permanecia letal.

– O que está acontecendo?- perguntei por impulso. Na verdade, era para essa pergunta ficar somente na minha cabeça.

– Ty, olha vai ser tão difícil para eu dizer como para você escutar – começou Jessye.

– Do que você ta falando? – perguntei. Olhei para Ártemis em busca de resposta e a deusa apenas abaixou a cabeça.

– Ty, acontece com todo mundo. É a vida, e não da para mudá-la. Infelizmente, chegou minha vez. – disse ela.

– O que você quer dizer com tudo isso? – continuei.

– Olha, sua amizade foi uma das coisas mais lindas que já aconteceu comigo – disse Jessye se virando para Ártemis – outra foi ter sido acolhida por você, Ártemis. Muito obrigada por tudo que você fez por mim.

A deusa apenas acenou com a cabeça, ainda séria. Jessye se virou para mim e continuo:

– Espero que não fique brava comigo por muito tempo, pois não terei tanto tempo como você. Sempre te considerarei como uma irmã. Lembre-se disso. –disse ela

Sabe quando você esta quase dormindo e alguém te joga um balde d’água na cabeça? Então senti essa sensação.

– Isso tudo é uma despedida, não é? – perguntei, deixando o desespero transparecer na minha voz.

– É. Eu... Eu estou saindo da caçada!- disse por fim.

Na hora senti como um bando de minotauros tivesse me acertado.

– Mas por quê?- perguntei, segurando o choro. Jessye foi a primeira pessoa que conheci das Caçadoras e ali estava ela dizendo que ia sair.

– Por que eu me apaixonei. Quebrei meu voto e meu juramento. Eu sinto muito, muito mesmo. Aconteceu há pouco tempo. E você conhece a pessoa.

– E quem é?

– Seu irmão, Ty. Todas as manhãs ligam para ele, como você percebeu. Estávamos planejando contar para você da melhor maneira possível...

– Não há melhor maneira para contar isso!

–Eu sei disso. Seu irmão te ama muito, e até me pediu para não sair da caçada, que isso te magoaria muito. Ty, você é muito imprevisível e temos medo por você.

– Esta dizendo que todo esse teatro é por minha culpa? Poupe-me disso.

– Não é um teatro, Ty, é a realidade. Entenda!

– Não entendo. Não entendo mesmo.

Jessye foi protestar, mas My Lady tocou-a e disse:

–Ela tem todo direito de estar brava. – exclamou a deusa.

Jessye lhe lançou um olhar que parecia dizer “Então me ajuda!”

–Mas é claro que tenho. – retruquei de volta.

Jessye se virou para Ártemis e disse:

– Como eu disse, logo estarei de partida. Mas depois de tudo que fez para mim, não irei te deixar na mão. Foi por isso que treinei Ty durante esses meses para ser sua nova tenente. – exclamou Jessye.

– O que? Como assim? Você... Você disse que eu tinha que melhorar na caçada; que era um treinamento. - afirmei.

– Não deixou de ser um treinamento, só que num nível mais alto. Treinamos vigorosamente e agora você esta a par para exercer qualquer atividade de tenente. Como estou de saída, você esta habilitada para assumir tal tarefa. – explicou ela.

Sacudi a cabeça, bufando.

–Como você pode fazer isso comigo? Você nem perguntou o que eu achasse ou se era isso o que eu queria? Você não se importou comigo, só com você mesma. – resmunguei, segurando o choro.

– Não. Eu pensei sim, fiz tudo isso...