14 de Julho de 1949 – Finchley, Inglaterra.

Passaram-se alguns longos e monótonos dias desde o casamento. Caspian ficava boa parte dos dias úteis sozinho já que eu precisava trabalhar na boutique e mamãe e papai passavam seu tempo na Inglaterra visitando parentes e velhos amigos, então restava-lhe conversar com Prunaprismia algumas vezes.

Três dias após a partida dos noivos, recebemos cartões -postais com notícias. Pedro disse que Julia estava encantada com tudo em Paris, Lúcia contou o infortúnio de perder acidentalmente a mala que estava com o dinheiro, em Belfast. Ela e Nícolas ficaram sem ter como pagar o hotel, mas foram gentilmente abrigados por um adorável senhor chamado Clive, que tomou conhecimento de sua situação; logo receberiam as economias de Nícolas que seriam enviadas pelos pais dele. Já Natália, nos mandou da Escócia uma fotografia de Edmundo usando kilt, enfatizando o quanto ele ficava cômico com a peça e que ele fazia questão de usá-lo para ir a todo canto.

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–Por Aslam, Edmundo, não me envergonhe mostrando as pernas! Nem Lúcia usa uma saia tão curta! - foi o que Caspian disse. Eu comecei a rir com ele antes de conseguir explicar-lhe que não era uma saia.

Passaram-se mais alguns dias e encontrei uma carta vinda de Cambridge em meu correio quando voltei do trabalho. Entrei no apartamento e encontrei Caspian terminando de pôr a mesa. Ele sorriu para mim como se eu o tivesse pego no flagra.

–Temos data especial hoje? - brinquei, me aproximando dele.

–E precisamos ter apenas uma? - replicou ele antes de envolver-me com seus braços e beijar-me brevemente. - É apenas uma singela forma de me redimir por permiti-la sair para trabalhar todo dia enquanto eu fico aqui, sem fazer nada.

–É por pouco tempo, lembra? Quando meus irmãos e Nícolas voltarem vocês terão muito trabalho pela frente.

Caspian pareceu conformado por um tempo. Fui lavar as mãos e logo me reuni a ele no jantar. Estava maravilhoso, bem melhor do que os primeiros que ele fez. Parece que esse tempo sozinho lhe permitiu aprimorar suas técnicas junto às aulas particulares com Prunaprismia.

Depois do jantar ouvimos as notícias no rádio enquanto lavávamos e secávamos a louça. Após esse ato, ingressei em um banho relaxante usando e abusando dos óleos e loções que mamãe me recomendou (ou melhor, me presenteou), ela disse que ajudaria a manter minha pele firme e macia. Arrastei-me para a cama, já vestida com as roupas de dormir doida para descansar, estava cada vez mais difícil carregar aquela barriga que parecia não parar de crescer nunca, deixando-me ainda mais ansiosa.

Ainda de olhos fechados, senti quando Caspian veio para a cama também, permanecendo perto dos meus pés inchados, começando a massageá-los.

–Você não terminou de me contar sobre a conversa com sua mãe ontem. - lembrou ele.

–Tem certeza? - permaneci de olhos fechados.

–Tenho. Você dormiu antes de terminar. - riu.

–Ah – lembrei. - E em que parte eu parei?

–No início.

–Ah... - pensei um pouco, esforçando-me para não me distrair com a massagem. - Bem, eu estava conversando com mamãe, Prunaprismia e Sra. Wonderwood no casamento e elas quiseram saber como estava indo a gravidez. Eu disse que estava tudo bem e que, pelas contas, deveria estar entrando no sexto mês. E elas não acreditaram.

–Não? Por que? - estranhou ele.

–Não sei ao certo, mas Prunaprismia disse que eu parecia estar com mais de seis meses. Então mamãe descontraiu e mudou de assunto, mas voltou a ele na primeira oportunidade que teve, quando estávamos a sós.

–E então?

–Ela disse que sabia que nosso bebê foi concebido antes do casamento então eu não precisava mentir o tempo da gestação para ela. Eu garanti que não estava mentindo e que não estava entendendo o que acontecia. Mamãe disse que minha barriga parece estar do tamanho de mais meses, uns sete, sete meses e meio. Mas estou certa de que são seis meses e não mais. Os exames também confirmam o mesmo. Não entendi o porque de elas terem estranhado.

–Talvez seja apenas impressão da parte delas. - concluiu Caspian. - O que importa é que o bebê esteja bem.

–É, você tem razão. - confirmei. A massagem terminou e eu estava prestes a protestar quando senti Caspian deitar ao meu lado envolvendo-me com seus braços. Ao abrir os olhos notei que Caspian apagara as luzes antes de começar minha massagem. Abracei-o de volta deitando a cabeça contra seu peito. Caspian beijou-me no alto da cabeça antes de sussurrar o quanto me ama e desejar boa noite. E ele falou na hora certa, pois logo em seguida peguei no sono.

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Na manhã seguinte, um sábado, acordei com o delicioso aroma de café. Eu estava sozinha na cama banhada pelo sol da manhã que entrava pela janela. Olhei para o outro lado e encontrei Caspian de volta à cozinha distraído cantarolando uma canção narniana enquanto preparava nosso café da manhã. Observei-o embalado pela canção sentindo certa nostalgia no ar. Caspian nem percebeu que eu despertara, nem mesmo quando comecei a sentar na cama, ou caminhei até o banheiro para a rotina de todas as manhãs.

Pelo cheiro que inundara o apartamento, teríamos panquecas, torradas, bolo e café para a refeição. Eu sabia que Caspian descobrira em si certo gosto pela culinária desde que teve que ficar o dia todo só e se empenhou em melhorar desde então. Só que, gostando ou não da cozinhar, ele também se sentia culpado por eu ter que sair para trabalhar, ainda mais na condição em que me encontro. Eu disse que não me importava, mas toda vez que eu dizia isso, ele começava seu discurso de que odiava me ver ficar cansada depois de um longo dia de trabalho quando eu não devia fazer tanto esforço, e tudo isso porque ele não sabia fazer nada além de usar a espada, montar estratégias de guerra e governar.

Nunca levávamos esse debate até o fim. Eu entendia o lado dele e apreciava de coração todas as refeições que ele preparava com tanto carinho. E admito, Caspian leva jeito para a coisa. Quando deixei o banheiro e encaminhei-me em seu rumo, Caspian dirigiu-me um lindo sorriso apesar de meu cabelo bagunçado. Ele inclinou-se para me dar um rápido beijo sem parar de mexer a massa das panquecas.

–Bom dia, meu amor.

–Bom dia. - respondi. - O que temos para hoje?

–Café, que eu sei que você gosta. - começou. - Panquecas, bolo e torradas. - finalizou. Sorri.

–Hmm. Acertei. - disse. Caspian riu.

–Fica pronto rapidinho.

Deixei-o terminar seu serviço e caminhei até a mesa, no caminho vi as cartas que chegaram ontem sobre o balcão, apanhei-as e tomei acento. As primeiras eram a conta de luz e gás. A terceira era a carta de Cambridge. Deixei as outras de lado e abri esta.

–Carta de Eustáquio. - falei à Caspian enquanto abria.

–É mesmo? Fazia tempo que ele não escrevia. - comentou, virando uma panqueca na frigideira. - O que diz?

–“Queridos Susana, Caspian e bebê” - comecei. Caspian riu levemente. - “Sei que estou escrevendo pouco, mas prometo conversar melhor em breve. Esta carta tem motivo especial e não posso fugir dele, até porque minha ansiedade não deixa. Serei direto: recordam-se de Jill? Claro que sim. Então, semana passada fomos a um baile em nossa antiga escola e lá, eu a pedi em casamento! E ela, como morre de amores pela minha pessoa, é claro, aceitou! Noivamos, e infelizmente não tivemos uma festa nem nada. Mamãe diz que quer poupar gastos, vai entender. Enfim, queria que todos estivessem aqui. Espero vê-los logo. Atenciosamente, Eustáquio”

Puxa. - Caspian ergueu as sobrancelhas depois de algum tempo, parado em minha frente a mim usando avental e segurando a frigideira com uma das mãos metida na luva térmica.

–“Puxa” mesmo. - concordei. Caspian serviu-me enquanto eu esticava o braço devolvendo as cartas ao balcão.

Caspian separou-se da luva e do avental e sentou-se à mesa para logo levantar e correr para pôr a mão sobre minha barriga quando o avisei que o bebê chutara de novo. Era um sábado comum. No domingo, como previsto, os recém-casados retornaram da lua de mel com mil e uma histórias para contar. O dia terminou com um agradável jantar em família no qual Edmundo fizera questão de usar o kilt, fazendo papai querer se enterrar de vergonha, e a notícia do noivado de Eustáquio foi repassada a todos.

Meus pais lamentaram, pois nos informara que não estariam presentes para o casamento já que precisavam voltar para a América e estavam apenas esperando meus irmãos retornarem para que o fizessem.

–Mas já? - Lúcia lamentou. - Estão aqui há tão pouco tempo.

–Sim. - concordei. - Queria que estivessem aqui quando o bebê chegasse.

–Oh, querida, também queríamos. - mamãe segurou minha mão. - Mas seu pai tem trabalho a cumprir lá.

E, apesar dos lamentos e dos argumentos de Lúcia, eles realmente foram por volta do dia 19 daquele mesmo mês. Depois de abraços e despedidas, mamãe e papai embarcaram para a América, mas não sem antes deixar um presente para Caspian e eu. Papai entregou a escritura da casa para nós deixando bem claro que fazia aquilo pelo neto e por mim, não por Caspian, mas mamãe lhe interrompeu dizendo que, agora com todos os seus filhos casados, nós precisaríamos mais da casa do que eles.

Ficamos imensamente agradecidos e passamos a semana seguinte inteira fazendo as mudanças. Caspian e eu nos instalamos em casa e colocamos o apartamento para alugar, já que precisaríamos da renda. Pedro e Julia morariam conosco, Nícolas e Natália mudaram-se com seus respectivos cônjuges para as casas que foram presente de seu pai. Para nossa completa alegria, ficavam na mesma rua que a casa Pevensie sendo a de Edmundo e Natália uma casa depois da nossa e a de Nícolas e Lúcia, do outro lado da rua, ficava em frente à casa que separava a minha da de Edmundo.

Na quinta, quando finalmente terminamos a mudança, ficamos um tempo parados na calçada, em silêncio, todos de braços dados, absorvendo o momento em que uma nova etapa de nossas vidas começava.