A árvore de memórias

10. A Árvore e a passagem.


Mais um dia havia começado. Diante do calor, Natsume não pode acordar muito tarde. Levantou-se ensopado de suor, para então checar como Itsuki estava indo - abriu a porta de seu armário vagarosamente, que é onde a menina dormia.

O espaço era, de fato, pequeno e improvisado, mas Itsuki parecia gostar. Quando as noites estavam demasiadamente frias ou quentes, Itsuki dormia ao lado dele e de Madara. Obviamente, transformava-se numa forma mais simples, que não precisasse gastar energia, para que coubesse na cama - uma pequena gata estranha e laranja, ensinamentos, é claro, de Nyanko-sensei. Natsume tinha certa dificuldade para dormir quando ela estava ao seu lado. Ficava pensando que, apesar de não parecer naquele momento, Itsuki é uma menina. Mas preferia que ela ficasse confortável. Já a yokai não se importava muito. Gostava do armário porque o rapaz colocava algumas fotos em seu rodapé, e ela se sentia confortável ao olhá-las até dormir. Como também não sabia quando poderia se tornar humana novamente, o local mais seguro era alí.
De qualquer forma, lá Itsuki não estava, havia sumido sem deixar rastros. O rapaz olhou pela janela, procurou pela casa e não achou. Não viu outra alternativa a não ser acordar seu gato, que rabugento, concordou em ajudar a procurará-la pelo cheiro. Não tardou muito para descobrir que a menina estava na casa que haviam visitado ontem - e pensando bem, não havia mistério algum nisso. Natsume e Nyanko se sentiram meio bobos.

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— Desculpe, Natsume-san. Eu pretendia voltar antes de você acordar, mas...

Natsume recolheu a mão direita da menina e, com ambas as suas, apertou-a pela palma - mais ou menos como uma cartomante faria para prever o futuro de alguém. Itsuki olhou para seu rosto, procurando entender a situação, e o rapaz parecia chateado. Sua cara estava fechada e, continuamente, apertava a mão da menina. Em certo momento, ainda em silêncio, percebeu que estava fazendo isso há muito tempo e então a soltou

— Só não faça isso de novo...

O rapaz, por si mesmo, não sabia exatamente o porquê de ter agido daquela maneira, ou de ainda estar ressentido, apesar de ouvir as desculpas da yokai. Ela acenou desanimada para o irmão com aparência de avô, mas que guardava também a expressão de criança que havia perdido o colega de brincadeiras. Por alguns segundos o rapaz se sentiu mal e egoísta por tirá-la dalí mal-humorado, mas lembrando da conversa que tiveram antes, concordou em se dar ao luxo de ser assim uma vez.

O tempo ia passando vagarosamente, e como rotina, todas as manhãs Itsuki ia até o irmão para ouvir suas histórias. A temperatura continuava quente e as pessoas iam reclamando, enquanto Ryotaro, senhor de sua família, preparava o local para a tempestade.

Ele ordenava ao filho e neto que preparassem selos e outros tipos de amuletos que protegessem a grande casa contra a tempestade. Como eles não conseguiam ver yokais, Ryotaro não sabia ao certo se seriam tão efetivos, já que isso era sinal da falta de poder espiritual de seus parentes. Porém, ele mesmo já não tinha forças para fazer os procedimentos, então não restava muita escolha.
Na verdade, O senhor Endo piorava a cada dia. Agora já não podia ficar olhando as flores no jardim, muito menos brincando com os yokais na floresta. Seu dia se resumia a ficar deitado, relendo seus velhos livros e admirando a paisagem por sua janela. Suas fortes tosses iam aos poucos o consumindo, fazendo com que seu filho Daichi ficasse cada vez mais rigoroso com sua saúde. Seu único momento de diversão era quando Itsuki aparecia, e ambos ficavam olhando velhas fotos da família.

A yokai percebia o quão mal ele estava, apesar de todo esforço do irmão para esconder a condição de doença. Por isso, aumentava o tempo ao lado dele: Lia livros para ele, trazia flores e sementes das quais plantava em pequenos vasos e espalhava pelo quarto. Porém, ao mesmo tempo, se sentia mal por passar pouco tempo ao lado de Natsume e Nyanko, que afinal, foram os responsáveis pelo encontro com sua família - mesmo que até então, ela se resumisse ao seu irmão, visto que não tinha contato com os outros dois membros da casa.

Por mais que soubesse que a condição do irmão era ruim, Itsuki não sabia exatamente como funcionava a morte humana, muito menos como a medida de tempo funcionava para eles. Por isso, não acreditava que a condição do irmão seria mortal - ela sequer entendia a mortalidade. Por isso, procurava dividir o tempo entre ele e o jovem que a resgatara. Porém, por algum motivo, Natsume não lhe parecia muito feliz. A frequência de seus sorrisos havia diminuído, bem como aumentado a de olhares estranhos e solitários que iam para sua direção. Não sabia para quem dar mais atenção, e isso a deixava desorientada e isso foi a deixando cada dia mais fraca.
O tempo começava a ficar ameno, mas Itsuki ardia em febre. Com muito esforço, transformou-se no gato que havia aprendido com Madara, e deitou ao lado dos companheiros como de costume. Natsume fez o que pôde para tratá-la, e logo que sua febre abaixou, acabou adormecendo ao lado dela.

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No dia seguinte, o rapaz despertou vagarosamente ainda com preguiça, olhando para os lados, ainda pouco atento, levou susto: itsuki estava deitada ao seu lado, dormindo. Porém em sua forma humana.

Natsume deu um abafado grito, e com o rosto rosa de uma mistura de susto e vergonha, colocou as mãos na boca, evitando fazer mais barulhos - não que adiantasse muito, visto que foi o suficiente para acordar seu gato, que apesar de raro, tinha o sono extremamente leve naquele momento. Talvez por estar em estado de vigília?

Os dois se olharam por alguns segundos, sem saber o que fazer. Enquanto isso, ouviram barulho de passos vindo pelo corredor, que logo acompanharam uma voz familiar.

— Takashi-kun, é hora do café! Preciso pegar sua roupa de cama, na verdade.... você já está acordado? - Touko, a guardiã de Natsume falou, enquanto vagarosamente posicionava uma das mãos na porta, afim de abri-la. Fazia isso com cautela, para que houvesse tempo para o rapaz responder, se necessário.

Natsume esbugalhou os olhos. Precisava pensar rápido, ou sua guardiã veria uma cena bastante desagradável e difícil de explicar.

— Er... Ahn.... Na verdade! - Disse ele, em um tom exaltado - Eu... estou me trocando agora, desculpe... - E começou a ajustar o tom da voz, enquanto fazia um sinal para que Madara se transformasse e levasse a menina para fora. - ...O telhado! - sussurrou o menino. - mas fique com a cabeça para fora, assim você me vê pela janela.

— Oh! tudo bem, Takashi-kun. Hoje você acordou especialmente tarde, tentei chamá-lo para o café mais cedo, como você não ouviu, como costuma fazer, fiquei com pena de insistir... Achei que estava cansado! - Touko fez uma breve pausa e continuou após um suspiro que parecia ser de alívio - Eu preciso ir comprar algumas frutas agora, guardei uma parte da comida para você, mas Shigeru já foi trabalhar.

— Ah... S-sinto muito, não acontecerá de nov...! - respondeu o rapaz, bastante envergonhado com a situação. Nunca havia se atrasado para o café da manhã, e mesmo que não houvesse nada a ser feito hoje, sentia um certo medo de ter causado uma má impressão.

— Na verdade! - interrompeu a guardiã - Ficamos felizes que você se sinta a vontade aqui, Takashi-kun. Por favor, tente não se esforçar demais.

Dizendo isso, a sombra da mulher, que podia ser vista pela porta do quarto de Natsume, rapidamente desapareceu. Ela havia falado aquilo quase como um desabafo, e ido embora correndo como quando colegiais se declaram. Natsume ficou alguns segundos parado, enquanto um turbilhão de memórias passava por sua cabeça - talvez Itsuki tivesse razão, afinal...

Rapidamente o rapaz se lembrou da situação em que se encontrava. Colocou a cabeça na janela, despedindo-se de sua guardiã, e também fazendo sinal para que Madara descesse para pegá-lo. Quando já se encontrava sobre o yokai, pediu para que ele o levasse para o único lugar que podiam ir: A Cada dos Endo.