Depois que você partiu

Quedas marcam recomeços


POV VAMPIRA

Me levantei de novo da cama, já havia perdido as contas de quantas vezes havia feito isso. A raiva voltava em mim depois de já ter ido embora um pouco antes, me incomodando, depois ia embora de novo, deixando apenas o medo.

Olhei pela janela de vidro: alguns alunos passeavam pela grama, entre eles estavam Kitty e Bobby, andando de mãos dadas e parando eventualmente para se agarrarem e darem risadinhas, felizes, até demais. Percebi que eles ainda me incomodavam, a alegria deles me incomodava, mesmo que tenha sido eu a colocar um ponto final, mesmo que eu não sentisse mais o mesmo por ele, mesmo que eu soubesse que estávamos fadados ao fim. Tudo que eu conseguia pensar era que eles estavam se reconstruindo – por cima dos meus pedaços, por sinal – tinham um ao outro, enquanto eu continuava no chão, sem ele, sem quase todo mundo que eu queria perto de mim.

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A raiva indo e voltando não facilitava em nada a situação, minha pele formigava e eu tinha certeza que se eu estivesse perto deles os sugaria e provavelmente gostaria disso, faria um estrago pior do que fiz em Gustavo e então eles saberiam como é sentir suas forças sendo sugadas de você sem que você saiba como segurá-las ou tenha onde se apoiar. Balancei a cabeça tentando afastar o pensamento e decidi me afastar da janela. É como se toda a calma e felicidade ao meu redor fosse uma afronta.

Ele saberia o que fazer.

Mas não sabe mais, porque ele se foi. Ela o levou. Levou tudo, na verdade: O professor, Scott, a paz e alegria de Ororo, Logan... E eles não faziam a menor ideia disso, todos esses pirralhos que perderam apenas sua inspiração ou mestres, eles ainda têm algo além disso aqui. Não sabem o que é ter só isso.

— Você não sabe o que é ter medo dos seus poderes. Ter medo de se aproximar das pessoas.

— Sei. Sei, sim.

Droga.

Soquei a parede, sem medir a força. As costas da minha mão ficaram vermelhas.

— Não quero que você vá.

Ele retira a tag’s do pescoço e coloca em minhas mãos.

— Voltarei atrás disso.

As garras saíam da minha mão, vagarosas, doendo.

— Dói quando elas saem?

— Toda vez

Fechei os olhos. Que droga. O que estava acontecendo comigo? O que era aquilo que eu via se levantar de dentro de mim?

— Por que te chamam de Vampira?

— Eu não sei. Por que te chamam de Wolverine?

— Meu nome é Logan!

— Marie.

Comecei a socar o travesseiro, sem recolher as garras, tentando canalizar todas as minhas forças, medos e dores, até soar. Olhei para os quadros me provocando na escrivaninha. Peguei o que tinha a foto de toda a equipe reunida, olhei o rosto dele na foto: a sobrancelha levemente arqueada, o rosto sério como sempre. Levei meu dedo indicador até sua imagem e deslizei-o por ela. Apertei o porta-retratos de vidro até a palma da minha mão ficar vermelha e doer bastante, olhei pra cima, deixando a primeira de muitas lágrimas daquele dia cair. Joguei com força cada um dos porta-retratos no chão, deixando apenas o da equipe. Peguei meu celular e apaguei algumas fotos minhas com Bobby que ainda não tinha tido coragem para me desfazer.

Não sei quanto tempo ainda fiquei batendo e quebrando as coisas e lembrando de cada droga de momento que tivera com Logan e com os outros. Agora eu estava sentada no chão, encostada na minha cama, na posição fetal com a foto da equipe, que eu havia tirado do porta-retratos, na mão, olhando pra ele, com as lágrimas agora secas em meu rosto.

— Por que você não some daqui? – sussurrei pra um Wolverine que não iria me ouvir – Por que não vai embora também da minha mente e me deixa de vez? – Deixei uma lágrima solitária molhar de novo meu rosto – Por que diabos você ainda está impregnado na minha vida?

Quando alguém vai embora é comum tentarmos arrancá-lo de uma vez de dentro de nós. Sabemos que as coisas não funcionam assim, mas insistimos. Temos o processo, a droga do processo que leva tempo demais e a pior parte dele: as recaídas. Eu já havia aprendido a controlar, ou pelo menos ignorar, mais ou menos, as vozes dentro de mim, eu já havia caminhado um pouco para longe da confusão mental em que me encontrava. Mas a verdade é que as outras mentes faziam-me distrair da minha própria, de Logan vivendo ali e me fazendo falta. Eu apenas estava trocando um monstro pelo outro.

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Então, todo o meu progresso parecia ter retornado ao zero. Era um retrocesso, mas eu também tinha uma nova chance. Talvez tentar combater as dores, as vozes, as saudades, os medos não fosse o melhor caminho. Das mentes eu não entendia muito, mas sabia que o resto precisava de tempo. Eu não podia fazer aquilo passar, o máximo que estava ao meu alcance era diminuir a quantidade de pessoas feridas com minhas recaídas até que o tempo resolvesse aquilo. Qual a melhor maneira de evitar machucar pessoas? Bom, não existe, mas, como diz o ditado: o que os olhos não veem, o coração não sente. Pelo menos, o nosso coração, não.

***

Já eram 22:47, o toque de recolher para os alunos era às 22:00. A essa hora já deviam estar todos nos quartos, mas eu definitivamente não podia confiar nisso, já havia sido aluna do Instituto e estava ciente do quanto era comum burlar as regras.

Respirei fundo mais uma vez, para não deixar a coragem se esvair. Mas ela se foi, junto com o calor do meu corpo quando vi a porta se abrir e Nathaly entrar no meu quarto. Ela verificou o corredor antes de fechar a porta e eu a vi, quase em câmera lenta, se virar.

— Desculpe não vir antes. Eu resolvi te dar um tempo e tamb... – ela se calou por uns dez segundos assim que terminou de se virar e viu a bagunça que estava no meu quarto. Seus olhos passearam por tudo, até pousar na mochila cheia, pronta pra uma viagem, que estava ao lado dos meus pés – O que... O que é isso? O que está acontecendo?

Olhei-a uns dois segundos, sem conseguir falar nada.

— Nathy, eu... – joguei minha mecha para trás, com a mão – Eu preciso ir.