Paizão Adolescente

Aquele que ficou ambicioso... Mike Torrance


ESCOLA SAINT MARKO, ANO DE 1992

Quando a vejo, minhas mãos suam, minhas pernas bambeiam, meus lábios tremem e minha boca fica seca. Ela é a garota mais linda do colegial... Estudamos desde o ensino básico, lá pelo segundo ano. Ainda me lembro de ter nos beijado no rosto numa peça teatral de Robin Hood. Porém, a garotinha inocente virou uma garota linda, que arrasa um quarteirão se puder. Annelise Roosevelt é a típica garota comum do colegial: bonita, popular, estudiosa e que namora um cara também bonito, estudioso e popular... Bem, esse cara sou eu!

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— O que você está pensando? — eu estava sentado na arquibancada do campo de beisebol observando o treino e ela estava sentada entre as minhas pernas.

Annelise Roosevelt é loira, tem um corpo escultural, é delicada até demais. Seu rosto perfeito combina com seus olhos castanhos claros. Puxa vida... Ela é minha namorada! Eu sou um cara sortudo, diga-se de passagem, pretendo assim quando me tornar adulto, pedir sua mão em casamento. O mais fofo de tudo é que eu a namoro há 1 ano, mas ela quem tomou a iniciativa hehehe... Sim, fui meio covarde de a pedir em namoro, mas já éramos bons amigos.

— Só estou tendo um devaneio. Quer ir embora ou vai esperar o seu irmão?

— Vou esperá-lo. Pode ter mais paciência, Mike?

— Claro.

Sou Michael Torrance... sim, eu sei. O mesmo sobrenome do psicopata vivido por Jack Nicholson em O Iluminado. Mas fazer o quê? Tenho uma altura mediana, cerca de 1,78, sou caucasiano, cabelo loiro e liso, olhos... Tchan tchan tchan tchan! AZUIS! Não gosto de me gabar de muitas coisas, porém, meus olhos são a parte do meu corpo que eu acho mais bonito. Obviamente eu já namorei várias vezes até achar minha garota perfeita. Sou bom nos estudos, bom es basquete, bom em dança e até em defesa pessoal. Sou o que podemos dizer de "o filho perfeito". Sou filho de pai jornalista com mãe microempresária.

— Ele está vindo, já acabou — disse Ann quando viu seu irmão, Simon, sair do campo.

— Até que enfim, Simon.

— Pô gente, desculpa a demora. Não sei se perceberam, mas os treinos estão mais intensos por causa das preliminares da semana que vem.

— Sei. Quando vocês forem enfrentar os representantes da escola Shawn, tenho certeza que vão ganhar — disse na tentativa de animá-lo.

Simon era mais baixo do que eu e irmão caçula da Ann. Ele era bom no beisebol, mas nem chega perto do que eu sou no basquete. Ele é pelo menos um ano mais novo que Ann, ela tem 16 anos.

Fomos para a saída da escola e o pai deles estavam nos esperando. Fomos os três com o meu sogro até a minha casa.

— Até logo, Mike.

— Tchau, senhor Roosevelt — Ann fez sinal com a mão atrás do vidro. Estava dando tchauzinho para mim.

Cheguei na minha casa. Era uma casa de classe média, com sótão e porão. Havia uma garagem para dois carros e não necessitava de muro. Minha rua era bastante arborizada e meus vizinhos amigáveis. Eu moro em Los Angeles, mas longe do Downtown.

— Cheguei!

— Oh, querido. Estou tão feliz sobre o seu jogo de amanhã — Lisa Torrence, minha mãe meio louquinha. — Seu pai e eu vamos acompanhar, não se preocupe.

— Chegou cedo hoje, mãe?

— Sou dona da loja. Tenho que tirar pelo menos a tarde de folga, não é? Ou você acha que isso só ocorreria no Dia de Ação de Graças? Mas enfim... Soube que está namorando com a Annelise. O pai dela já sabe?

— Quê?

— Bom, não quero que o meu filhinho vire eunuco. Você só tem 17 anos e está à flor da pele. Provavelmente já fez aquilo com a garota, garanhão!

— Mãe! Vou subir e terminar meus deveres de casa. Preciso ficar concentrado para a partida de amanhã.

Ser filho da minha mãe não é fácil. Ela é meio desbocada, apesar de ser uma mulher de negócios. Não tem papas na língua quando o assunto é sexualidade.

Subi até o andar de cima onde estava o meu quarto pronto para me receber de braços abertos, se tivesse braços. Mas antes de passar pela porta do meu quarto, minha irmã mais nova apareceu por trás e me deu um abraço. Ela é muito carinhosa e apegada a mim, mesmo com apenas oito anos.

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— Sara, que foi?

— Pode me ensinar uma tarefa de casa, por favor, maninho?

Respirei fundo e assenti. Ela abusava de mim, mas eu adorava essa pequenina. Antes eu tive que entrar, tomar um banho, preparar meu uniforme do time e depois pegar minha mochila. Fui para o quarto de Sara.

Passaram-se algumas horas, estava anoitecendo. Fiquei jogando de basquete em frente de casa, porque havia uma cesta bem na frente da garagem. Sou o melhor cestinha do time e pra mim cesta de 3 pontos é algo muito fácil. Por isso fui escolhido como capitão do time.

O carro do meu pai chegou finalmente. Era um chevrolet 1990, preto. Observei ele saindo com sua pasta.

— Papai...

— Mike, como vão os preparativos para o jogo de amanhã?

Meu pai é jornalista, ou melhor, editor de um jornal. Foi ele quem me ensinou a gostar de basquete. Weevil Torrance além de pai é o meu herói.

— Já estou preparado para amanhã.

— Ótimo. Isso vai garantir uma bolsa de estudo importantíssima.

Suei frio. Ele quer que eu me mude para Nova Iorque numa universidade importante de lá... Eu tenho tal condição, minhas notas são altas e quase nunca falto. No entanto, meu verdadeiro sonho é fazer uma família aqui mesmo na minha cidade. Ir para o Leste é, para mim, muito extremo. Como desistir de uma bolsa de estudos sem deixar o meu pai triste? Impossível.

DIA SEGUINTE...

Ouço a multidão no ginásio berrando, assobiando, falando alto demais. A torcida era grande, a partida final será no ginásio da minha escola. Estou tão nervoso que comecei a suar frio. Fiquei por alguns minutos descansando a mente e o corpo no vestuário. Meu treinador me chamou pois já estava na hora.

A torcida era intensa. Meus pais estavam na arquibancada assistindo, Ann tava de líder de torcida e linda como sempre, os Shawn estavam esperando a surra tão desejada. O treinador nos chamou para dar os últimos conselhos e táticas. A partida começou. A disputa foi intensa, foi difícil, eles eram bem treinados, porém nunca haviam enfrentado um Mike Torrence na vida.

— Vamos lá, meu filho! — ouvi o grito do meu pai.

O placar era de 67 para os Shawn e 63 para Saint Marko. Faltava um minuto apenas. Deu tempo de fazer uma cesta de dois pontos e subirmos no placar. A tensão era grande. Fiquei com a bola de ouro na mão faltando menos de dez segundos. Silêncio... apenas joguei e seja o que Deus quiser. A bola passou e acabamos sendo vitoriosos. Foi uma festa. Fui o herói do jogo. Olhei para Ann, coloquei a mão no peito simulando arrancar meu coração e dando a ela, depois dei um beijo e imitei fazer uma cesta.

— Cara, você foi demais — disse meu amigo CDF, Jack. Ele era um pouco desajustado, usava óculos e gostava de cultura japonesa.

— Valeu.

— Mike — me virei e fui beijado pela Ann de surpresa, corei na hora e rezei para o pai dela não ter visto. Porém, seu olhar não estava nada contente.

— Que foi? Por que está triste?

— Eu não. Impressão sua.

— Não, não... Você está triste sim, apesar da nossa vitória. Pode me dizer.

Fomos a um corredor da escola onde haviam algumas salas de aula. Ela ficou encostada na parede enquanto eu a observava.

— Agora me diz, Ann.

— Meu pai sabe do nosso relacionamento. Ele não se opôs, mas...

— Mas?

— Ele ligou para o seu pai e desmentiu dizendo que você não ficará na cidade. Você vai viajar para ganhar uma bolsa de estudos caso ganhasse a partida... Parece que o que eu mais temo está prestes a acontecer.

— Escuta, Ann. Não me importo mais nessa bolsa. O que mais quero é ter uma vida contigo, entendeu?

— Não, Mike. Por favor, não largue seu sonho para viver comigo. Não sou nada em comparação com a sua chance de vida.

— Você é tudo comparada a essa bolsa. Não vou desistir de você nunca, Anne-Anne.

Ela ficou preocupada, abracei forte e tomei coragem para falar com o meu pai. O sorrisão do coroa durou exatamente cinco minutos até eu falar sobre o meu relacionamento com a Ann.

— Você só pode estar louco. Trocar uma oportunidade de ouro dessa por um rabo de saia — me deu sermão já em casa.

— Rabo de saia não. Anne é a garota que eu amo e nem você nem ninguém pode mudar isso.

A minha vida mudou a partir daí.

...

LOS ANGELES, 2017

Foi só um sonho? Sim, mas sonhei de novo no dia em que desafiei o meu pai e decidi namorar mais sério com Ann. Continuamos a namorar até entrarmos numa faculdade pública da cidade. Eu me formei em jornalismo e fui trabalhar numa revista renomada onde sou o chefe dos editores. Annelise virou veterinária. Casamo-nos, nossa primeira filha, Jessica, veio quando eu tinha 25 anos; o caçula, Mike Junior, nasceu dois anos depois. Hoje estão com 17 e 15 anos, respectivamente. Vivemos uma maravilha, casamento estável... por vinte anos fomos felizes. No entanto algo deu errado.

— Acorda, Bela Adormecida.

Ainda estava meio tonto. Na noite anterior, minha esposa quis o divórcio, assim na cara mesmo. Mostrou que não estava para brincadeira. Acusou-me de ser o culpado daquilo e agendou até mesmo a audiência. Oi? Como assim? O que eu fiz para merecer isso? Abri os olhos e vi o meu melhor amigo com a cara bem perto e quase me beijando. Sim, hoje dormi na casa de um amigo, e não sei onde continuarei a dormir já que decidi sair de casa mesmo.

— Vai ficar sonhando acordado? Da próxima vez eu te jogo um balde d'água — disse meio aborrecido.

— Dá um crédito, Jack. Não precisa me tratar assim, cara. Minha esposa não quer mais saber de mim.

— Você é burro ou se finge. Passa a maior parte do tempo trabalhando naquela empresa e esquece que tem família. E não me venha falar que só porque eu sou rico que não preciso trabalhar etc... Qualquer um vê que você está equivocado.

— Vou tomar um banho.

No espelho apareceu o reflexo de alguém bem diferente do garoto de 17 anos, apesar de minha fisionomia continuar. Ganhei um pouco de rugas, cabelos grisalhos, barba por fazer, ou seja, ganhei a velhice. Bom, não sou tão velho assim, ainda tenho 42 e ainda mulheres se interessam por mim, apesar de eu apenas me interessar pela minha esposa. Só estou um pouco abatido porque o divórcio me pegou de surpresa.

— Você deveria rever seus conceitos, sabia?

— Por que, Jack? Eu não fiz nada.

— Dá vontade de atirar em você com raios gama. Ou te cortar no meio com a espada do Star Wars. Desde que você foi promovido naquela empresa, nunca mais deu a mesma atenção à família. O que aconteceu?

— Nada disso que você está falando é verdade. Bom, eu já vou indo. Trabalho não pode esperar. Até logo, Jack.

— Espera, vai morar aqui?

— Claro. Você não se importa, não é?

Vi Jack engolir em seco e assentiu a contra gosto. Saí da casa dele, peguei meu carro e fui para a revista que ficava em Downtown. O prédio tinha uns 10 andares e havia um outdoor sobre ele. Entrei e fui logo para o último andar. O local era cheio de gente trabalhando... Fui para a minha sala.

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— Nada melhor do que trabalhar para esquecer os problemas pessoais.

Sentei-me na sala, encostei a cabeça na mesa, mas antes de descansar fui surpreendido pela minha secretária. A reunião editorial foi agendada hoje de manhã e terei que aprovar pelo menos um projeto e promover o dono desse projeto. Saco disso!

Já na reunião, os candidatos à vaga para vice-editor chefe começaram a apresentar seus projetos em slides. A última foi uma moça que eu mal conhecia chamada Desirée... diga-se de passagem, oh mulher cafona. Só para ter uma ideia ela era loira, mas prendia o cabelo, usava óculos de grau e roupas igual daquela personagem da Feia.

— O vencedor é John Cruz — é um funcionário novo, mas promissor.

Depois da reunião, Desirée veio falar comigo na minha sala. A primeira vez que eu vejo esse estrupício na minha frente. Ela começou a falar de uma maneira bem desrespeitosa, alegando que trabalhava lá a mais tempo e que a chance deveria ser dela.

— Não. A chance é de quem apresenta o melhor projeto para a Social Vip. O senhor Cruz apresentou e você não. Não me interessa se está aqui há anos, se não fizer um bom trabalho, não ganha promoção. Agora me dá licença que tenho mais o que fazer.

Fui atender um telefonema, a garota pegou o telefone da minha mão e jogou contra a parede. A garota era louca. Obviamente que eu a demiti imediatamente por justa causa. Quanto desrespeito!

Saí mais cedo do trabalho. Fui chamado para comparecer na escola Saint Marko a fim de verificar algum problema com meu filho caçula. Para mim ele estava muito bem. Junior é um excelente aluno, é impossível ele me dá trabalho.

Cheguei à escola. A verdade que Anne estava ocupada e pediu a mim. Há anos não ia naquele lugar, bateu-me uma nostalgia dos tempos em que eu era um fenômeno no basquete. O que aconteceria se eu tivesse aceitado a bolsa?

Entrei na diretoria e vi uma bela mulher ruiva com quase a idade da Anne. Vi Junior na sala, acanhado. Ele tinha cabelo castanho claro, olhos azuis iguais aos meus, mas não era tão popular como eu era na época escolar.

— Junior, o que houve?

— Senhor Torrence, o Junior foi alvo de bullying mais uma vez. Dessa vez trancaram ele no banheiro. Ficou por lá quase uma hora.

— Bullying? Como assim? Junior, nunca contou que sofre chacota dos colegas para mim. Explique-se!

— O senhor é ausente o tempo todo. Pensa apenas no trabalho. Quando foi chamado sempre deu uma desculpa de faltar as reuniões, por isso sempre a mamãe vinha.

— Escuta aqui, filho, eu preciso trabalhar para sustentar a minha família. Dinheiro não cai do céu ou nasce em árvore. O conforto da minha família sempre dependeu do dinheiro.

— Isso que me dá raiva no senhor, pai. O senhor sempre arranja uma desculpa para colocar o dinheiro em primeiro lugar na sua vida. Nem parece aquele cara que desafiou o próprio pai no passado — ele saiu repentinamente.

— Junior volte aqui! — a diretora ficou me olhando com desprezo. Essa é outra que não me entende.

Ficar na escola me trouxe dor de cabeça. Tirar a tarde de folga, de fato, foi um erro grave. Enfim, antes de sair, eu fui até o ginásio de basquete. Quanta nostalgia! Observei a arquibancada, as cestas, cada canto daquele lugar. Vi uma bola largada, peguei e automaticamente o meu corpo reagiu para que eu jogasse um pouco. Retirei meu paletó, arregacei as mangas e comecei a jogar com a bola, fazer alguns passos e enterrar a bola numa cesta de 3 pontos. Eu não estou nem um pouco enferrujado.

— Para um cara de quarenta e poucos anos, até que se comportou como um adolescente. Você é excelente como sempre.

— Treinador Rogers? — era meu ex-treinador. O velho mudou muito nesses anos. Estava um ancião.

— E aí, Mike. Relembrando o passado?

— Só vim à escola por causa do meu filho. Aproveitei para ver como estava o lugar onde eu já fui o melhor. E sobre o Junior, ele tá no time?

— Olha Mike... infelizmente ele não se interessou em entrar. Talvez você converse com ele mais um pouco.

— Com licença — uma moça da faxina passou entre a gente.

A moça inconveniente parou perto de mim e falou com o professor que iria varrer a quadra. Ela olhou para mim e nem pude acreditar no que eu vi. Desirée de faxineira, como assim? Não faz nem duas horas que eu havia demitido a mesma. Ela sorriu para mim... o mesmo estrupício usando óculos de sempre. Ela sorriu olhando nos meus olhos. Arrepiei até a espinha... Essa mulher é alguma bruxa?

CONTINUA...