Dark Cigarette

Prólogo


Na última noite, eles dormiram na mesma cama, como costumavam fazer quando eram crianças. Em algum momento entre os treze e os quatorze anos, os pais dos dois haviam decidido que eles estavam velhos demais para fazer isso sem soar suspeito, mas, como aquela era uma ocasião especial, eles haviam concordado em abrir uma exceção.

Sendo assim, Emma Carstairs ficou para jantar na casa dos Blackthorn naquela noite, e, quando o Sr. Blackthorn ordenou que todos fossem dormir, seguiu Julian, o terceiro mais velho das crianças, até seu quarto. Até ali, eles estavam conversando normalmente, trocando provocações e piadas como se fosse um dia qualquer, mas as risadas despareceram lentamente conforme eles se aproximavam do cômodo.

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Eles trocaram de roupa - Emma no banheiro, com a porta entreaberta, e Julian no quarto, tentando não espiar - e se deitaram lada a lado, sem dizer nada. O coração de Emma pesava como uma bola de boliche; hesitante, ela esticou a mão, invadindo o espaço de Julian, o que, em circunstâncias comuns, o faria empurrá-la para longe. Ele apenas a segurou.

— Vou sentir sua falta, Jules – sussurrou Emma.

Ela recebera a notícia da mudança meses atrás, em uma conversa cheia de protestos e lágrimas de fúria com os pais. Não que ela fosse completamente contra a ideia de morar em Nova York; ela só não queria morar em Nova York sem Julian.

— Eu vou te visitar – prometeu Julian. Ele não parecia se importar com o fato de Los Angeles, Califórnia, ficar praticamente do outro lado do país em relação a Nova York. – E vou telefonar. Mandar cartas, se for preciso.

Emma riu, baixinho.

— Ou sinais de fumaça.

Eles ficaram em silêncio, e, após alguns minutos, Julian se aproximou, puxando Emma para que ela ficasse junto a ele, espremida contra seu corpo, perto o suficiente para ouvir seu coração. A batida era familiar. Ela conhecia Jules desde o nascimento; não havia uma de suas memórias importantes que não o envolvesse, mesmo que indiretamente. O pensamento de não criar mais memórias com ele – ou pior, de esquecer as memórias que tinha delea entristecia. Mais que isso, fazia com que ficasse difícil respirar.

— Eu vou voltar – disse Emma, alto demais, rompendo o silêncio. – Assim que eu tiver uma oportunidade, vou voltar para Los Angeles, e aí as coisas podem voltar ao normal.

Ela sabia que soava esperançosa e ingênua demais para seus catorze anos, mas não achava que Jules fosse se importar. Ele acariciou o cabelo dela, suavemente, como fazia com seus irmãos mais novos quando precisava acalmá-los.

— Eu sei.

Mesmo no escuro, Emma sabia que ele estava sorrindo, e, portanto, ela sorriu de volta. Estava começando a ficar sonolenta.

— Boa noite, Jules.

— Boa noite, Em.

Emma adormeceu nos braços de seu amigo de infância, o que já era, por si só, um indício de que as coisas estavam mudando. Ela não soube se estava sonhando ou não ao ouvir Julian murmurar:

— Espero que não nos tornemos pessoas diferentes até lá.

Que bobagem, pensou Emma, no sonho. Jules e eu, nós somos para sempre.

Ela já havia partido quando Julian acordou na manhã seguinte. Não queria que ele a visse chorar.