A touch of fire

Ele tem que estar sempre sem a maldita camisa?


Quantos meses ainda faltavam? Eu até perdi a conta. Eu tinha medo que quando eu me fosse o inferno me seguisse. Que algo acabasse por me alcançar.

Volto para o quarto. Não tenho fome mais e estou muito desperta apesar de ter dormido por duas horas apenas. Limpo o machucado e começo a adiantar as lições de casa. Isso me ajuda muito. É perto da hora do almoço quando termino tudo. Eu não desço. Não tenho fome. Acho um filme qualquer e mal presto atenção. Eu perdi minha moto. A única coisa que me dava à sensação de liberdade. Com ela eu podia ir para qualquer lugar. Eu podia fugir e agora... Eu não tinha nada. Minha casa foi vendida, minha moto foi vendida. Tudo isso por meros caprichos.

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E Lia espera que eu vá a uma maldita festa beneficente? Não. Vai. Acontecer. Passei o dia todo no quarto. E quando tenho certeza que ela já não está mais em casa eu me visto para ir ao mercado. Meu estoque de doces está baixo e eu preciso de algo realmente bom. O mercado mais próximo fica há quinze minutos, ou seria se eu tivesse de moto, como não estou vai levar pelo menos meia hora, mas isso é bom. Eu por acaso comentei que eu sou uma pessoa de planos? Quando você passa por tantos baixos na vida e não tem tempo de ficar deprimida, você começa a olhar além, é isso que eu faço. Eu espero as coisas ruins. E quando elas acontecem. Por que sempre acontecem. Eu me permito um dia de sentimentalismo e então eu olho para frente. Eu formo um plano e tento segui-lo. Mas quando eu fizer dezoito anos, daqui a alguns meses eu vou embora, e esse é o meu plano máster. O carro chefe de todos os planos.

Respiro fundo e desço. Estou vestindo uma calça de moletom preto e tênis cano alto. E uma camisa cropped que é a cara de um panda. Uma pequena faixa da minha barriga está amostra. Essa blusa me faz sorrir.

Saio disparada pela escada para encontrar um Aléxis sem camisa ali na sala vendo TV. Meu Deus! Ele tem que estar sempre sem a maldita camisa? Eu coro! Meu Deus! Eu ainda não tinha pensado em me desculpar por ontem e a julgar por sua expressão não vai nada fácil. Limpo a garganta.

— Hey. – eu digo. Ele me olha e apenas mexi a cabeça. Deus! Ontem eu o estava agarrando e hoje eu não posso nem olhar pra ele. Engulo seco. – Sobre ontem... Eu...

— Você deixou claro o que pensava ontem. – Ele diz. Ele não me olha. Sinto meu estômago revirar. Eu nem comi nada o dia todo! Por que diabos meu estômago está como se eu tivesse me alimentado para hibernar?

— Eu queria me desculpar. – Isso chama a atenção dele.

— Por quê? – ele pergunta confuso.

— Eu fui lá e ti... Você sabe. – Eu digo. Ele está me olhando fixo demais e eu quero que o chão se abra e me engula.

— Não sei.

— Eu ti... – eu nem consigo falar! Que merda! – Beijei. – agora ele está lutando contra o riso.

— E?

— Eu não devia ter feito isso.

— Você não gostou? – ele pergunta ainda segurando a risada. Ele sabe que eu gostei. Merda! Eu não parei! Eu continuei e queria ter continuado!

— Eu não devia ter agido como se você fosse o culpado e eu sinto muito. - Eu propositalmente não respondo sua pergunta. Ele ri.

— Uh, ok, desculpada. Sabe que eu me senti meio violado mesmo. – Ele ri outra vez.

— Idiota! Você disse que queria mais. – eu digo antes de poder pensar. Olhamos um para o outro por um minuto e então caímos na risada até que lágrimas enchem meus olhos.

— Onde você está indo?

— Ao mercado.

— Essas horas?

— Eu preciso de algo doce. Tipo chocolate com caramelo. Isso! Chocolate com caramelo soa bem, talvez um pouco de creme de avelã, e alguns cookies, ai eu posso fazer um sanduíche de cookies com creme de avelã. – Creme de avelã é a famosa nutela. Que é basicamente um pedaço de céu em forma de creme, mas quem sou eu para fazer propagandas? Escuto outra vez a risada de Aléxis. Tenho que admitir eu gosto do som disso.

— Vejo que você se perdeu. Eu vou junto! Ai você pode me dar uma carona naquela sua moto. – ele diz sorridente. E eu quase sorrio de volta.

— Oh, não eu estou indo a pé.

— A pé? Tá doida? O mercado é há meia hora daqui e você ainda estava pensando em sozinha?

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— Bem, eu achei que todo mundo ia estar na festa.

— Eu não curto essa merda e meu pai não me obriga a ir. E você?

— Não quis ir.

— Bem, vou colocar uma camisa. Vai pegando a moto...

— Aléxis, eu não vou de moto.

— Por que diabos não?

— Lia vendeu a moto. – eu digo baixo.

— Ela o que?

— Ela vendeu. – toda minha frustração está jogada nessas palavras.

— Como assim?

— Ela vendeu Aléxis, simples assim.

— Eu achei que a moto era sua.

— Ela era. Eu economizei dois anos para comprar. Um inferno, eu trabalhei horas extras e feriados e dois natais! – Uh, eu falei de mais! Ele aproximou de mim.

— Por que diabos você a deixou vender?

— Eu não deixei! Ela pegou os documentos! E quando acordei essa manhã tinha dois homens levando embora e eu não pude fazer nada!

— Pegue o dinheiro e compre outra.

— Ela ficou com o dinheiro. – eu sussurro. Seu rosto é pura indignação.

— Com quem meu pai se casou? – Com a bruxa má! Porra!

— Com Lia? – eu digo.

— Que diabos é isso no seu rosto? Está preto! Eu achei que estava vendo mal de longe!

— Eu bati o local machucado outra vez, e o corte abriu.

— Bateu? – Ele não acreditava. – Baixinha...

— Aléxis deixa isso pra lá.

— Deixar pra lá?

— É! Foi só uma batida sem querer! Argh! Eu estou indo.

— Porra! Eu vou te levar no meu carro.

— Não é necessário.

— Não me diga porra, que não é necessário. Você quer chocolate, vamos conseguir seu chocolate. – ele coloca uma camisa para o meu alivio. Aléxis deve malhar horas para acabar com aquele corpo é... Merda, já estou pensando besteira! Meu coração se acalma um pouco quando entro no carro dele. Uma grande SUV! Nossa esse carro e o meu sonho de consumo que eu nem ouso sequer sonhar! Ele está sério. Mas eu não vou derramar ainda mais o verbo para ele. Não mesmo. Quem sabe o que mais vem por ai? Afinal até eu fazer dezoito tem um tempo.