Kitty's Pride

Um chá de pensamentos


— A Srta. Audrey Höwedes lhe espera hoje à tarde. – Informou Jane, calmamente. Kitty quase se esquecera do compromisso que havia assumido com a nada sã Srta. Audrey. – Isso é uma manobra típica de alguém interessado em uma dama. Pedir a prima que a convide para um chá. – Concluiu ela, fitando Bingley com um olhar amoroso e muito significativo.

— Se engana, minha irmã. – Começou Kitty. – A Srta. Audrey me convidou antes mesmo que eu tivesse conhecido seu primo. Esperem ai! Vocês leram minha correspondência?! Que absurdo!

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—– Não conseguimos resistir. Aliás, em nossa defesa, o envelope não veio selado. - Garantiu Lizzie, tomando um longo gole de sua xícara. - As Bolton vão enlouquecer quando souberem.

— Quem contaria a elas? – Quis saber Kitty, tentando se concentrar em seu café, mas sem deixar seu descontentamento de lado. Como as irmãs poderiam ser tão curiosas?

— Eu mesma, ora. Na primeira oportunidade. Kitty! Até parece que não cresceu comigo. Meu passa tempo predileto é contrariar. – Garantiu Lizzie, entre um de seus sorrisos característicos. Kitty quis subitamente acertar a irmã mais velha com a louça da mesa.

— Não me importo. Fim. – Assumiu Kitty, balançando os ombros levemente. – Podemos mudar de assunto? – Pediu ela, cortando um generoso pedaço de queijo e o levando a boca. A conversa entre Bingley e Darcy parou inesperadamente e os dois se levantaram. Darcy tinha um semblante pensativo, mas parecia cansado demais para dar explicações, então Charles se encarregou de justificar a partida deles.

— Senhoras, temos alguns assuntos para resolver no meu gabinete. Se não se importam. – Disse ele. Todas as damas presentes assentiram e os dois desapareceram por uma das portas laterais.

— O que está acontecendo? Darcy parece preocupado. – Questionou Kitty, olhando impaciente para Lizzie, que se servia de alguns biscoitos de nata.

— Ele voltou hoje cedo muito incomodado com as notícias de Londres. – Começou a explicar a irmã. – Parece que houve uma desestabilização do comércio e isso afetou algumas empresas.

— O que quer dizer com isso, Lizzie? – Interrompeu Jane.

— Darcy me pediu sigilo, pois queria tratar disso apenas com Bingley, mas acho justo que saibam. Ele quis vir aqui para ter a aprovação de Charles... – Continuou ela.

— Aprovação? Pelos céus! Desde quando seu marido pede a aprovação de Charles para alguma coisa? Sem ofensas. – Tornou a interromper Jane, quase se debruçando sobre a mesa para poder ouvir melhor.

— Jane, deixe-me terminar! – A repreendeu Lizzie, atenta para que nenhum dos criados entrasse e ouvisse algo da conversa.

— Alguma das empresas de Bingley está envolvida, não é? - Interveio Kitty, não demorando a ligar os pontos.

— Não exatamente. Mas ele será afetado. – Informou Lizzie, fazendo Jane lamentar em voz alta e cobrir a boca com a mão. – Darcy me disse que não devemos ficar alarmados, pois já encontrou uma solução.

— Charles não me disse nada! Como pôde esconder isso de mim. – Choramingou Jane, tomando cuidado para que o marido não a ouvisse. Kitty acariciou o ombro da irmã e lhe sorriu com doçura.

— Acho que já até imagino qual a natureza dessas complicações. – Começou Kitty. – Se posso opinar, foi um erro dar a Charlotte Bingley e ao marido o controle de um empreendimento. – Criticou Kitty, três anos antes, em virtude do casamento de Charlotte, a parte da irmã na herança foi entregue a ela e o marido, Victor Grant. Mas o vício do homem pelo jogo e pela vida luxuosa em poucos meses os deixaram em situação crítica, e Bingley, como um bom irmão, havia doado a eles uma de suas muitas empresas para que pudesse se reerguer. Kitty não precisava da confirmação da irmã, mas ela veio com um breve aceno de cabeça.

— Darcy acha que não é tarde para salvá-los da miséria. Além do mais, ele já encontrou um investidor. – Anunciou Lizzie, enquanto Jane se recompunha e ouvia com atenção. Kitty havia esquecido de todos os bailes, danças e chás.

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— Quem seria? – Questionou Jane.

— O Visconde Bridgerton. – Respondeu Lizzie. – Ele é um bom amigo de Darcy e aceitou fortalecer o negócio em troca de uma porcentagem da propriedade.

— Porque Bingley não pôde ajudar a irmã? – Quis saber Jane. Uma das empregadas entrou na sala e as três irmãs pararam de falar. Quando a mulher se retirou, Lizzie prosseguiu.

— O marido, nosso querido Sr. Grant, declarou que não aceitaria. – Disse ela. – Como podem ver, o homem continua tão soberbo e orgulhoso como sempre foi. Fico triste ao imaginar que Bingley perderá o sono por conta disso.

— Pobre Charles. Tem o coração tão bom! Mal consigo imaginar vê-lo passar por esse martírio de novo! Ele ficou muito mal com a primeira falência de Charlotte, não imaginávamos que aconteceria de novo. – Lamentou Jane, à beira das lágrimas. Kitty suspirou ao seu lado.

— Me preocupo com ele mas me reservo o direito de não me importar além disso. – Disse a Srta. Bennet, com sinceridade. Jane lhe lançou um olhar severo. – O que foi? Quer que eu minta e chore por Charlotte e suas dívidas. Não consigo ser tão fingida.

— Mostre compaixão. – Pediu Lizzie.

— Tudo bem. Ela tem minha compaixão. – Disse Kitty, sarcástica. A tragédia financeira de Charlotte era uma história anunciada para ela, cuja a única preocupação era não ver a irmã de Bingley sob o mesmo teto que ela, para infernizar sua vida com seu ar superior. Com amargura, Kitty percebeu que ela também estava ali na condição de agregada, e engolindo suas ideias sobre Charlotte, afastou o assunto de sua mente. Lizzie e Jane continuaram no tema por mais alguns instantes, e nesse tempo, Kitty percebeu o elegante envelope preso debaixo da xícara de Jane. Com um gesto curto, que as irmãs ignoraram, ela o retirou dali e o abriu com os dedos trêmulos. Não haveria nada demais escrito ali, se houvesse, Jane e Lizzie a teriam aborrecido e rido dela com toda a certeza. Em uma letra caprichada se lia:

“Cara Srta. Kitty Bennet.

Espero poder ter a honra de sua presença hoje, para o chá. Mal posso descrever nossa satisfação.

Atenciosamente, Audrey Höwedes.

Ottercrow.”

As palavras eram simples mas fizeram a mente de Kitty flutuar. ‘‘Nossa satisfação”? Quem mais estaria lá? A Srta. Bennet pedia em uma prece silenciosa que o plural não se referisse a Sebastian. Respirou fundo e repetiu em voz baixa “Não. Não será.’’

— Disse alguma coisa, Kitty? – Quis saber Lizzie, atenta ao murmúrio da irmã. Kitty as olhou assustada e balançou a cabeça duas vezes, abrindo a boca por curtos instantes antes que pudesse de fato produzir som.

— Er...não. Estava pensando alto. Por favor, continuem sem mim. Tenho que me aprontar para... – Ela começou, olhando nervosa para o papel que segurava. – Isso.

— Coloque um vestido bonito. – Pediu Jane, enquanto Kitty se levantava e deixava as duas sozinhas sem muita formalidade. A jovem apertou o envelope contra o peito ao subir as escada, e no seu quarto, vasculhou entre as centenas de vestido que as irmãs e os cunhados haviam lhe dado só naquele ano. Encontrou por fim uma peça discreta e muito elegante. Era o que a ocasião pedia, e ela ficou muito satisfeita por não ter enlouquecido na procura.

Mais tarde naquele dia, Lizzie e Darcy retornaram a Pemberley. Ficou acertado que o Visconde poderia conceder o empréstimo à irmã de Bingley, e que Darcy deveria transmitir os mais sinceros votos de gratidão a família Bridgerton. Infelizmente o marido de Jane não soube pensar em nada além disso durante todo o dia. A mulher andava de um lado pro outro tentando fazê-lo se ocupar com outras coisas, mas sem sucesso. Kitty, graças ao grande respeito que sempre nutrira por Charles, não fez nenhum comentário sobre a má sorte de Charlotte e o orgulho do marido. Ao invés disso, ficou reclusa no quarto reunindo coragem para a tarde que tinha pela frente.

Jane acabou mandando duas criadas para ajudarem Kitty a se aprontar. Quando a jovem já estava devidamente vestida e penteada, a carruagem foi chamada e a irmã mais velha fez questão de acompanha-la até ela.

— Não esqueça de ser simpática e amável. – Pediu Jane, com um sorrisinho nervoso. Kitty soube que por mais ansiosa e curiosa que estivesse sobre o chá com os Höwedes, Jane estava triste por Charles.

— Eu sempre sou simpática e amável. – Retrucou Kitty, fingindo olhar a irmã de forma indignada e ofendida.

— Nós duas sabemos que não, Kitty Bennet! Agora entre logo. – Pediu a irmã. Kitty deu a mão a um dos criados e se acomodou na luxuosa carruagem da irmã, a tempo para ouvir as últimas instruções da mesma. – Ele é um rapaz muito bonito, Kitty. Pense na possibilidade.

— Não há nenhuma possibilidade. – Disse Kitty, quando a carruagem começou a andar. Ela repetiu aquela frase durante todo o trajeto até Ottercrow. Que destino caprichoso seria o seu? Se Jane soubesse o quão leviano era o homem que ela acreditava ser ideal para Kitty, ela teria uma síncope. Sentada ali no balanço insistente da estrada irregular, a jovem se perguntou se todos os homens seriam assim na intimidade. Afastou o pensamento. Albert Walters certamente não seria. O futuro Lord era tão polido que era difícil imaginá-lo fazendo comentários com duplo sentido e observações afiadas à uma dama. Mesmo que fosse sua esposa. Kitty se perguntou então se esses pequenos detalhes não eram o que faziam homem e mulher cúmplices, e não apenas um casal. Mas no que ela estava pensando? Não queria ser cúmplice de Sebastian, não queria pensar em nada que envolvesse casamento e ele e queria parar de usar seu primeiro nome como se fosse muito próximos. O homem certamente cairia em gargalhadas ao saber de tais ideias. Afinal, mal se conheciam. Quão estúpido era aquilo! Para sua sorte, havia chegado.