Dois Quartos de Vinho
O vento invadia o cômodo
O vento invadia o cômodo fazendo as cortinas dançarem e arrepiando todas as extremidades do corpo da mulher. Essa que em algum momento da madrugada perdeu o cobertor e agora como proteção só tinha sua lingerie de renda cor-de-rosa.
Ainda estava escuro quando seu celular começou a tocar. Ela tateou cegamente o criado por um tempo até que o encontrou e atendeu a ligação.
— Alô?
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!— Bom dia flor do dia.
— Quem é?
— O amor da sua vida.
— Marco?
— Marco? Não Lia, é o Elídio! - Seu tom ficou alterado - Por que achou que fosse ele?
— Já tá querendo demais, não acha? Me ligando de madrugada e exigindo que eu saiba quem é. Por que motivo você tá me ligando às... que horas são?
— 4h45.
— 4h45? Porra... o que você quer?
— Só queria ouvir sua voz.
— Você me ligou pra isso?
— Sim, mas pelo jeito é melhor desligar.
— Não. Desculpa, eu não sou a pessoa mais indicada para se acordar, sabe?
— Vou anotar isso. Mas sério, eu desligo.
— Não, tudo bem. Vamos conversar. Aí tá frio?
— Um pouco, por quê?
— Por que eu tô morrendo de frio, roubaram meu cobertor.
— Você está me dizendo que invadiram seu apartamento de madrugada e a única coisa que levaram foi um cobertor?
— Com toda certeza foi isso que aconteceu.
Ela sentou na cama, tateou o chão até encontrar o cobertor e voltou a deitar se cobrindo com o mesmo. Fitou o teto por um tempo.
— Você não vai viajar hoje?
— Meu voo é as 7h00.
— Maceió, né?!
— Você decora nossa agenda? - Ele perguntou rindo.
— Talvez. - Ela riu também.
— Agora eu vou te deixar dormir, Lia, e tentar descansar um pouco também.
— Boa viagem.
A jovem colocou o celular novamente no criado, virou para o lado oposto e adormeceu rapidamente. Ainda tinha algumas horas de sono.
Assim que acordou foi direto para a sala, sentou-se no tapete e passou a brincar com Rumple, que mais uma vez estava solto pela casa. A amiga não demorou para se levantar, tomou um banho, comeu alguma coisa e logo estava junto dos dois.
— Bom dia flor do dia.
— Acho que já ouvi isso hoje...
— Eu ouvi que te ligaram de madrugada, tá tudo bem?
— Tá sim, foi o Elídio que ligou.
— E o que ele queria?
— Segundo ele, queria escutar a minha voz.
—Awn.
— Awn nada gata, conheço o joguinho dele, não caio nessa e se cair, levo ele junto.
— Você definitivamente não é romântica, né?! Não se deixa apaixonar nem pelo próprio Sanna.
— Aline, quem é que desde a sétima série te dá conselhos amorosos?
— Você.
— E algum desses conselhos alguma vez deu errado?
— Não. - Ela respondeu torcendo a boca.
— Então presta atenção que eu tenho um ótimo conselho hoje.
— Oh sabia guru, me diga por favor.
— Ame alguém e ele destruirá seus sonhos.
— Meu Deus Lia, meu Deus! Vamos mudar de assunto que você tá parecendo uma velha amarga de 76 anos. Foi trabalhar ontem?
— Sim. - Ela respondeu rindo- E você?
— Também. E em qual momento do dia você percebeu que ontem era dia 1° de maio, um puta de um feriado?
— Adivinha. - Lia estava tentando controlar a risada.
— Eu também.
A duas começaram a gargalhar, o furão, que brincava no tapete com uma bolinha amarela, olhou para as duas e deitou a cabeça, confuso.
— Eu só fui descobrir que era feriado quando cheguei na porta da Impactos e vi tudo fechado, não só ela né, a rua toda estava deserta sem nenhum comércio aberto. - Lia ainda estava rindo.
— E eu que entrei no restaurante, guardei minha bolsa, troquei de roupa e fui pra cozinha, eu tava picando a cebola quando meu chefe chegou e me falou que eu tava de folga. Imagina a minha cara.
— Ai Line, eu xinguei tanto tu não tem noção. Devo ter parecido uma louca reclamando sozinha no meio da rua.
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— Palestra, muito chata por sinal.
— Mas pelo menos a noite rendeu, hein?!
— É, talvez sim.
— Me conta como foi.
— Ele foi me buscar na porta da facul...
— Awn.
— Você vai ficar falando "awn" a cada frase que eu disser?
— Talvez...
...
Seis homens no quarto de hotel, cinco sentados na cama e somente um em pé. Andrei, Anderson, Daniel, Jeferson e Tauszig ouviam Elídio falar com seu tom de indignação.
— E eu fui lá, todo romântico, parecendo um idiota, só faltou levar flores e um ursinho e nada, vocês ouviram? NADA! Busquei ela na faculdade, levei pra uma apresentação de orquestra. EU NEM GOSTO DE ORQUESTRA. E pra quê? Todo investimento não deu em nada.
— Já passou pela sua cabeça que talvez ela não queria dormir com você? - Daniel perguntou.
— Por que é que ela... bem, passou a mão lá? Não se passa a mão num lugares desses e não termina o serviço.
— Talvez ela queria avariar o produto e quando viu que era pequeno perdeu a vontade.
— Vai se ferrar, Jeff.
Todos que estavam na cama riram alto.
— Continua sua história dramática.
— Liguei pra ela hoje de manhã, né?! Ai falei que queria ouvir a voz dela, que tava com saudade. Mas nada funciona com essa mulher!
— Mas não vale o tempo que estão passando juntos? Aparentemente ela não é qualquer uma pra você - Daniel comentou.
— Claro que é! - Afirmou Elídio.
— Não, não é. E você sabe disso, porque se fosse você já teria desistido e não estaria tão preocupado. Mas não, você está obcecado por ela, só não quer admitir.
— Daniel e sua mania de romantizar as coisas. - Jeferson reclamou.
Tauszig, até então o mais calado dos seis, levantou o dedo indicador e logo depois disse:
— Eu concordo com o Dani. Todos aqui, inclusive o próprio Elídio, devem concordar que não lembram dele ficar assim por mulher nenhuma, muito menos uma fã e, justamente por não querer assumir isso para nós e para si próprio, ele prefere fingir indiferença.
— Finalmente um adulto no recinto, toca aqui Tauszig. - Daniel disse estendendo a mão para que o músico tocasse.
— O politicamente correto deve ser um mal dos Danieis. - Observou Jeff.
— Hum... estou atrapalhando a reunião dos mocinhos? - Anne, esposa de Andrei, perguntou entrando no quarto.
— Não amor, só estamos aqui ouvindo o Elídio reclamar.
— E qual seria o problema? - Ela perguntou se referindo ao homem em pé.
— Mulheres, na verdade uma mulher.
— E o que essa mulher fez de tão terrível?
— Ah ela fica se fazendo de difícil.
— Talvez ela não se faça, talvez ela esteja avaliando se vale a pena, mas ainda não se convenceu.
— E o que você sugere que eu faça?
— Você pode desistir e partir pra próxima.
— Desistir? Desistir? Não, agora é questão de honra! Hoje é dia 2, me dá um mês só pra você ver.
Faltavam 20 minutos para o espetáculo começar, o Barbixa estava sentado sozinho no camarim olhando para a tela de seu smartphone até que começou a digitar uma mensagem.
Olá, eu sou representante da PAM S/A e estou aqui para lhe oferecer algo que vai revolucionar a sua vida. Eu venho lhe oferecer este maravilhoso morcego morto.
Mandou a frase mas, logo depois se arrependeu, era pouco provável que a jovem entendesse sua piada. Se sentiu um babaca. Começou a bater os pés e dançar os olhos pelo local.
O camarim era espaçoso e muito bem iluminado, tinha um espelho que ia de ponta a ponta em uma das paredes e a frente cadeiras e uma bancada, alguns armários na lateral e um extenso sofá de couro sintético na parede oposta a do espelho. Sofá esse que o Barbixa ocupava.
Sentiu o aparelho em sua mão vibrar, seus batimentos aceleraram levemente. Ela havia respondido.
Lia: Pra que que eu iria querer um morcego morto?
Elídio não teve certeza se a jovem tinha entendido a brincadeira mas, resolveu continuar:
Você: Porque ele vai revolucionar a sua vida.
Lia: O que que ele faz?
Você: A pergunta não é o que ele faz, e sim o que ele não faz.
Lia: E o que ele não faz?
Você: Ah! Você fez a pergunta certa!
Ele não te acorda de madrugada e fala que queria ouvir sua voz.
Lia: Só isso?
Você: Você também pode adquirir um manual de "Como Não Magoar o Cara que Está Afim de Você".
Lia: Idiota haha
— Elídio, dez minutos. - Daniel entrou no camarim.
— Eu já estou indo.
Você: Preciso subir mas, antes de ir quero te contar uma coisa.
Eu realmente não sei o que está acontecendo, mas você acaba comigo, me deixa fascinado e desconcertado. É estranho, mas gosto. Se pudesse me afogaria nos seus sorrisos.
Ele bloqueou o celular antes da resposta da outra, se levantou e guardou-o em sua mochila, antes de sair, se olhou do espelho por um bom tempo, tentando perceber alguma mudança, mas viu que não e entendeu que tinha mudado apenas por dentro.
Sorriu ao perceber que suas últimas palavras para a jovem haviam sido totalmente sinceras. Não sabia o que estava acontecendo com ele mas, se isso significava mais doses de sorrisos arrebatadores, ele definitivamente queria mais.
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