Chamem os Bombeiros
Hard news
Estou sentada aqui no fundo. Continuo com os óculos escuros e sinto que há um burburinho ao meu redor. Provavelmente, eu e o desgraçado somos o assunto da vez. Aquele... aquele... aquele escroto se encontra lá na frente. Me ignorou e também fiz o mesmo. Hoje o chefe não está aqui, e a Lilian se encontra impaciente porque o Murilo, o Décio e o Felipe não entraram ainda na sala de reunião. Se conheço meu amigo gay vai contar tudo para o outro fotógrafo e o redator.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Enquanto isso, me sinto observada pelas pessoas. Tenho vontade de chorar, e olha que já fiz isso o suficiente, mas não passa.
— Esperem só um pouco que vou buscar os dondocos. – nos avisa e sai.
E atrás de mim, ouço:
— Oi! Você está bem? – quase num sussurro.
Viro para trás e dou de cara com o Alan. Por pouco tenho vontade de falar: “Estou ótima graças a você! E melhor ainda por ter descoberto algo que já desconfiava: o Júlio ter cozinhado a vapor a Melissa!”. Não consigo emitir uma palavra. Só assinto com a cabeça e me volto rapidamente para frente. Seguro para não abrir o berreiro. E num relance o vejo me observando e depois disfarça. Morra, Júlio Sardinha! Morra!
Nisso entram na sala o Murilo, o Felipe e o Décio. Quase simultaneamente os olhares dos três pousam no Júlio, depois em mim. Entreolham-se e se sentam.
— Muito bem! Consegui trazer a Madame de Pompadour e suas lacaias. – avisa a secretária do chefe sobre a entrada dos três, o que provoca risadas e mais burburinho.
O Felipe se senta do meu lado, e parece indulgente com a minha situação, mas assim que escuta a declaração da Lilian, pergunta:
— Bicha, sou eu a Madame de Pompadour, né?
— Hum, não! Você é uma das lacaias! Quem tem mais vocação ao cargo é o Murilo.
E escuto a Juliana segurar o riso. Ela tem ficado cada dia mais cínica com o redator. Para mim, aí tem!
— Ah, é? Que saiba quem tem a alma mais feminina sou eu! – retruca meu amigo.
— Podemos começar ou vai ser difícil? – indaga a sósia da Garcia do Criminal Minds.
O Felipe se senta e pergunta enquanto a secretária do chefe começa a falar o roteiro da pauta:
— Tudo bem com você, meu anjo?
Não tem como me segurar algumas lágrimas e mesmo que esteja com óculos escuros, é difícil conter a minha dor.
— Shuuu! Não chore! – diz o fotógrafo enquanto segura a minha mão entre as dele. – Você sabe que merece muito mais do que ... do que ...
Ele engole seco quando repara o Alan com a atenção na gente. O Felipe o encara e pergunta baixinho:
— Perdeu alguma coisa aqui, colega?
— Nada!
— Hum, é bom mesmo!
Dividida as matérias, hora da definição das equipes. Rezo profundamente para que não caia com ele. E conforme a Lilian fala, minha respiração fica acelerada, e meu coração próximo da taquicardia.
— O Alan vai com a Bárbara para campo. E para a reportagem paralela pode ser a Gi e o Júlio.
Como que é? Escutei isso!? Tiro os óculos e não sei o que me dá para falar:
— Me recuso!
— Eu também! Não pode ser outra equipe? – reclama o comedor de periguete.
— Mas o que há? Aliás, vocês não são...
— Posso substituir a Gi, Lilian. Até porque ela não me parece muito bem. – quem fala é o Murilo.
A atenção do pessoal da sala se volta a mim, inclusive aquele infeliz. A Lilian me olha com desconfiança, mas parece que pega no ar o que acontece. Ou será que ela é tão estúpida em não reparar que brigamos? Ou melhor, praticamente terminamos?
— Gi, você está bem? – pergunta a secretária.
Respiro fundo, mas tensa o suficiente para deixar a minha voz trêmula escapar com um:
— Sim!
A sósia da Garcia de Criminal Minds se vira para mim e diz:
— É evidente que você não está bem. Hoje vou dispensa-la do campo...
Escuto uma risadinha quase escárnio e de quem é a autoria?
— Algum problema, Melissa? – desafia a sósia da Garcia.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Me sinto queimando de raiva por dentro. Minha maior vontade é sair de onde estou e enfiar cinco dedos na cara dela. Arrombada!
— Hum, imagina! Desculpe, Lilian, é que lembrei de uma piada.
— O que a sapato cheiroso ganha com isso? – o Felipe indaga baixinho.
— Bom, já que é assim, seria interessante focar sua atenção para aqui e agora, em nossa reunião de pauta, não? – a Lilian retruca de modo bem cínico.
— Pois não!
Pois não o cacete, maldita! Espero que você seja atropelada por um caminhão de lixo. Porque assim não vai precisar chamar o IML. É só joga-la lá dentro da caçamba, afinal você é do mesmo material!
*****
Saímos a campo, e através das minhas influências, consigo o Jura como motorista. Assim vou ter mais facilidade para conversar com o hipster.
Aparentemente, é um dia como qualquer outro: chegamos no ponto da reportagem, colho informações, o Júlio tira fotos e o Jura nos espera atento. Só parece, porque estou de olho em algum momento que terei uma brecha para arrancar algumas informações do fotógrafo. Para mim tem jogada da Melissa e do Alan na briga dos dois. O que eles ganham com isso? Ainda não sei muito bem. Uma das minhas suposições é algo bem clichê: a Melissa não engoliu que a Giovanna começou a namorar firme o Júlio.
Mas aí que entra um furo... Por que a repórter teria tanto interesse num suposto pobretão do jornal? A não ser que a Melissa sabe que a família do Sardinha é conhecida e poderosa no interior... Aí é outra história. O Alan? Bem, ainda não tenho uma opinião formada o que o motivou a fazer isso. Ou se realmente há algo combinado entre os dois. Mas que vou descobrir, ah, se vou!
Término das fotos, o Jura tentando desesperadamente aplacar a vontade de fumar mascando chicletes e eu... Bem, aí está o momento para entrar em ação.
— Oh, pessoal, quem tá a fim de um café?
— Boa! – responde o Jura. – Assim quem sabe dá uma espairecida do cigarro?
Para minha surpresa o Júlio continua quieto. Arruma os equipamentos para a próxima parada.
— Júlio?
Ele levanta os olhos como fosse acordado de um sonho. Estão inchados e é evidente que está sofrendo.
— Sim?
— Vamos lá? Um café?
— Para ser sincero? Não tenho a mínima vontade, Murilo. Sem contar que podemos estragar o almoço. – e volta a ficar entretido com o maquinário.
O Jura me encara e mexe os ombros como dissesse: “O que fazemos?”. Coloco as duas mãos nos ombros do rapaz e o forço a me encarar. Ele arregala com olhos de um modo furioso.
— Qual é, Júlio? Um give a break?
— Murilo, sem estrelismo, vai... – e me empurra com certa delicadeza.
Cara teimoso como uma mula! Como a Gi o aguenta? Perco a paciência e o chacoalho:
— Sua anta! Ela está sofrendo tanto quanto você!
— Falei um monte de merda! Já basta o que estou passando?
— Porra nenhuma, seu moleque!
— Moleque? A puta que te pariu!
— Oh, oh! Vamos parar? – o Jura tenta apartar a briga, mas quase leva um sopapo do Júlio.
Meu sangue sobe e como sou mais forte que esse magrelo, consigo segura-lo pelos braços e dou um grito:
— Chega, Júlio! Acorda, infeliz! Queremos te ajudar!
Ele treme, é evidente que segura o choro e do nada, como um bebê desmamado abre o berreiro.
— Falei um monte de merda, Murilo! Ela não vai me querer mais!
— Mas o que você falou homem de Deus?
******
A cena poderia ser um daqueles filmes antigos, estilo preto e branco. Sei lá, O ébrio? Ou até aquela cena de Casablanca em que Rick Blaine diz ao pianista Sam: “Em todos os bares de Casablanca, ela tinha que entrar justo aqui!”. Estamos no Starbucks do Paraíso, em frente ao HCor, Hospital do Coração. No sofá, eu, o Jura e o Júlio no meio. Em vez de bebidas etílicas, nos copos, cappuccino, crossaints e pães de queijo para acompanhar. E o fotógrafo conta em pormenores toda a briga. Uma hora ele tenta enxugar as lágrimas e quase o Jura chora junto. Aliás, o Jura chora, ponto.
— Então, você não dormiu com a Melissa? – indago.
— É claro que não! Sim, admito que eu a achava gostosa. Mas Murilo, quando ela abre a boca brocha qualquer um! Fala aí? Sem contar que é vazia, interesseira e mesquinha!
— Perai! Deixe-me me entender. Ela deu em cima de você, não foi?
— Foi! Ela disse com todas as palavras se a gente podia dar uma paradinha no motel. Mas eu não quis!
— Caraca! – quem solta essa foi o Jura.
— E por que você não foi? – o desafio.
— Por que já estava caidinho pela Giovanna! Responde sua pergunta?
— Oh! Bem que percebi que rolava um clima bonito entre vocês dois. - completa o Jura.
— Agora, seu estúpido: por que você confirmou que dormiu com ela?
— A gente perde a cabeça no meio de uma discussão, não? Vocês me conhecem, fico meio irracional na hora que o bicho pega.
— Mas no trampo, você não é assim! – justifica o motorista.
O fotógrafo dá de ombros.
— Na altura do campeonato, confirmar uma asneira dessas é próximo de um assassinato. Parabéns, Júlio Sardinha! – e dou um tapa na cabeça dele que o faz ir para frente.
— Como tu é energúmeno, amigão! – diz o Jura ao mesmo tempo em que mexe a cabeça com um não.
— Eu sei!
— Ainda bem que sabe! – eu e o motorista falamos juntos. Se tivéssemos combinado, não iria sair tão bem.
O fotógrafo segura o choro e praticamente se joga no encosto do sofá. Respira fundo como tivesse nadado quilômetros.
O encaro e digo:
— Faz assim, Júlio. Levamos você para casa.
Ele me encara surpreendido, mas não emite uma palavra.
— Cara, vai por mim. Descanse por hoje e amanhã...
Ele se vira para frente e diz absorto em seus pensamentos:
— Não vai ter um amanhã...
— Rapaz, você não irá se matar, né? – indaga o motorista.
— Não é isso que ele quis dizer, Jura. É que amanhã não haverá um relacionamento... – e sou interrompido pelo choro do Júlio.
Sugestão de trilha: Ocean’s Thirteen Soundtrack – Not Their Fight
Mesmo relutante, o Júlio é levado para seu apartamento. Subo junto com ele, o ajudo com equipamento e ainda dá tempo para brincar com o Mozart. Não é à toa que ele é querido pelo fotógrafo. Ele é muito gente boa!
Desço e o Jura me espera.
— Você me dá um minuto? – pergunto a ele.
Ele me encara desconfiado.
— Calma, Jura, vou dar um jeito lá na redação para a gente se safar e ir ao encontro dos garotos.
— Como assim? – me indaga ressabiado.
— Jura, eu, o Décio e o Felipe iremos investigar qual é a relação da Melissa e o Alan nessa briga entre o Júlio e a Gi.
Ele levanta a sobrancelha e faz uma cara satisfeita.
— Sério isso?
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Só aceno com a cabeça. Saco o meu celular e me afasto.
— Cara, por mais bacana que você seja, você é misterioso. – o escuto pelas costas.
Me viro e digo:
— Sempre fui, Jura. – e pisco pedindo cumplicidade.
Mais adiante, ligo para o meu tio. Um, dois, três toques.
— Alô?
— Edgar?
— Orrrrraaaa! Até que enfim acertou, hein?
— Pois é, com erros a gente aprende.
— O que manda, rapaz?
— Posso pedir um favor para o senhor?
— Fala!
— Vou ter que fazer uma investigação pessoal... E vou precisar do dia de hoje. Pode ser?
— Pessoal, é? Bem, não tem nada a ver com a...
— Com quem?
— Deixa para lá! Você pode me contar depois?
— Posso, tio!
— Porra, Murilo!!!
******
Sugestão de trilha: Alien, Alien - Sambaca
Bicha, que loucura! Quase dei um piti para chegar no horário e ver o que o bonitão e o gordinho pretendem fazer. Bem, sei que quero ajudar a Gi de qualquer jeito. Sem contar que a minha curiosidade grita por essa reunião.
Entro na padaria, tiro meus óculos escuros como uma diva. Aliás, sou uma diva. Dou meus passos certeiros em direção à mesa onde estão o Murilo e o Décio.
— OOOOOOOOOiiiiiiiiiiiiii!
— Sente-se, Felipe! Bora que vamos pedir nosso almoço e... – me informa o Murilo.
— Bicha, vocês só pensam em comida, é? – e olho para Décio que dá um sorrisinho como confirmasse: claro, né?
Primeiro coloco a minha bolsa-carteiro na cadeira. E puxo uma outra para me sentar.
— Sabe o que estava pensando? – indaga o bonitão. – Topam pedir uma vaca atolada?
— Hum! Isso me lembra a Melissa. – falo sem pensar, o que provoca boas risadas no Décio.
— Calma que iremos chegar lá, beleza? – o Murilo me diz com um sorriso cínico.
Ok, vamos de vaca atolada em homenagem à periguete da Melissa.
— E para beber, galera? – indaga o Décio.
— Eu vou de cerveja. – escuto do Murilo.
— Uau, bonitão! Cerveja, mas ainda estamos a trabalho, não? – o lembro.
— Estaremos a trabalho para outro tipo de reportagem, Felipe.
Então, tá, né? E o garçom nos traz ligeiro duas garrafas de cerveja. E o cheiro de comida no ar desperta as lombrigas do meu intestino. Gente, estou ficando como o gordinho.
— Well! – bato as palmas e continuo: - Vamos direto ao ponto, queridos. O que rola aqui?
O Murilo se ajeita na cadeira e coloca os braços cruzados apoiados na mesa e inclina o corpo para frente e começa:
— Bom, vocês sabem que estive com o Júlio hoje de manhã.
— Sim, aquele comedor de periguete. – digo e bebo um gole da cerveja.
— Hum, que saiba ele não é, não!
— Não é? – pergunto cínico.
— Ele está em frangalhos. E ele contou a versão dele na briga.
— Hum, então pode desembuchar, lindão!
Enquanto isso, o Décio quase cai da cadeira olhando a comida da mesa ao lado. O Murilo coloca todo o assunto em dia!
Ao final:
— Então é isso! Ele pegou bem na hora que o Alan estava beijando os cabelos da Gi? – indago.
— Sim! E agora me explica aí, Felipão: o Alan simplesmente sumiu no meio da discussão, então para onde ele foi?
— Depois que ele jogou a dúvida que o Júlio tinha dormido com a Melissa? – pergunta o Décio.
— Mas perai, o Farofa contou outra coisa! Aliás, a versão que disse para vocês. O que ele ganharia em mentir?
— Tá! E depois disso, por onde andou o Alan?- ele pergunta para nós dois e nos encara simultaneamente.
Eu e o Décio ficamos perdidos e o Murilo completa o pensamento.
— Ele provavelmente foi se encontrar com a Melissa. Entenderam agora que esses dois estão metidos em algum rolo?
— Mas o que cada um ganharia com isso? – pergunta o Décio.
— Bem, primeiro nós sabemos que a Melissa não se dá com a Gi e...
— Ela tem tesão recolhido pelo barbudinho! - completo.
— Isso aí!
— Mas olha, Mu, o Júlio é um pobretão! Ela só joga charme para quem tem...
Sou interrompido pela o redator bonitão que nos revela:
— Aí que você se engana... O Júlio é um Schiavon!
O Décio quase se engasga com a mandioca, ops, digo, aquelas de palitinho de comer. Não que a outra não seja... Bem, você entendeu! E eu? Bem, fico completamente boquiaberto.
— Como que é? – quase grito.
— Olha a compostura, né? - reclama o ursinho.
— Bicha! Aquela família riquíssima dona de edredons, travesseiros e etc, etc, etc?
— Isso aí! – responde e depois toma mais um gole de cerveja.
— Então é por isso que aquela periguete de quinta não suportou perder para Gi?
— Golpe do baú?
— Eu iria mais fundo. – revela o bonitão. – Acho que ela queria dormir com o Júlio e vir com papo de estar grávida...
Não me aguento e abro a boca para dizer:
— Bicha, vá! Você acha que o Júlio iria cair no conto do vigário?
— Quem te garante que não? A gente conhece o Júlio. Por mais investigativo que ele seja, com faro de detetive e tudo mais, quando tem mulher no jogo, fica meio bobão. Senão não teria feito toda aquela grosseria quando entrei, pensando que estava dando em cima da Gi.
— Bem, isso é!
— E espera aí, bonitinho... – e completo com coragem: - E o Alan na jogada? O que seria?
— Vai ver que ele gosta da Gi...- fala o ursinho da turma.
— Não é de todo mal sua visão, Décio. Mas pelo que conhecemos o Alan, essa motivação é pequena demais para movimentar esse estardalhaço...
— Ah? Espera aí, Mu! Repete o que você disse, cão!
— Isso aí! E por isso que os chamei aqui. Topam fazer uma investigação paralela sobre esse caso?
— Opa! Se pararmos sempre para um lanchinho tô dentro! – avisa o Décio.
— Hum! Lá vem o saco sem fundo! – reclamo mesmo, né?
— E aí, Felipe? Topa?
— E o que ganhamos com isso, Bee?
— Execração pública da Melissa e o Alan? Tá bom para você? – indaga o Murilo.
— Hum! Seria ótimo! Bem, então... I’m in! – e pisco.
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