Perfectly Wrong

Bêbado, drogado e abduzido


Eu estava roendo a unha do dedão nervosamente, enquanto mudava o peso de um pé para o outro, incapaz de ficar parada um segundo sequer. Estava no aeroporto de La Guardia, esperando James sair da sala de desembarque. Meu lábio inferior já estava tão mastigado que comecei a pensar em como iria beijar meu namorado sem sentir dor. Erin e Mitch haviam se oferecido para vir comigo, mas eu sabia que James iria querer descansar antes de encontrar com meus amigos, por isso havia dito para eles só aparecerem em casa de noite, para o jantar.

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Asher havia desaparecido na noite anterior, deixando apenas um bilhete que dizia que iria tentar não aparecer durante o final de semana – e que era melhor que eu tirasse fotos das nossas roupas juntas na máquina de lavar.

Como eu iria reagir se James descobrisse que eu estava lavando as roupas de outro cara junto com as minhas, eu ainda não sabia. O melhor era deixá-lo bem longe da lavanderia.

Quando eu pensei que iria acabar arrancando a unha do dedo, James saiu pelas portas automáticas, carregando uma pequena mala de viagem.

Meu coração disparou. Eu quase havia esquecido o quanto ele era bonito. Era mais de dez centímetros mais alto que eu, musculoso do jeito que você pensaria nele como um atleta, mas não como um fisiculturista, e com aquela pele que sempre me fazia babar, que parecia ser bronzeado, mas eu sabia que era só a cor natural da pele dele. Seu cabelo continuava curto e cheio, do mesmo jeito de sempre, e seus olhos verdes quase desapareceram quando ele me viu e sorriu largamente.

Seu sorriso era lindo, largo e sincero, como o de um garotinho.

Eu fui andando até ele, murmurando um “oi” sorridente, que foi abafado por seus lábios, quando ele se inclinou e me beijou. Seu beijo era suave e carinhoso, e eu podia dizer por ele o quanto James havia sentido minha falta.

— Amor, você está linda – ele disse quando me soltou.

Sorri, também achando-o muito bonito em seus jeans e suéter.

— Você também não está mal – falei, com uma sobrancelha arqueada.

Ele riu e passou um braço pelos meus ombros, andando assim comigo até a saída do aeroporto. Fazia um dia excepcionalmente agradável, o bastante para que eu pudesse usar um vestido azul de mangas curtas, com apenas um cardigã por cima.

James e eu pegamos um táxi e fomos para a minha casa. Era a primeira vez que eu iria levá-lo lá e estava meio nervosa. Já tinha arranjado uma desculpa para os livros e outros objetos pessoais de Asher, bem como os móveis. Diria que eram do meu locatário e que já estavam lá quando eu cheguei, e achei melhor não mudá-los de lugar. Esperava que não parecesse uma desculpa muito forçada.

O caminho que normalmente levaria uns vinte minutos, tomou quase quarenta por causa do trânsito de sexta feira. Durante o percurso, James havia me bombardeado com perguntas sobre meu trabalho, meus amigos, a gravidez de Erin e o casamento dela e de Mitch. Estávamos entrando no prédio – que eu não pude deixar de reparar que James olhou com suspeita – quando ele soltou a bomba:

— Eu estou realmente chateado por não poder vir pro casamento.

Só não gritei um “o quê?” totalmente indignado porque, nesse momento, o elevador se abriu e um casal de velhinhos saiu dele, então eu só fiquei calada até James e eu ficarmos sozinhos no pequeno espaço.

— Do que você está falando, Jamie? – perguntei, tentando soar calma, depois de apertar o botão do sexto andar. – É claro que você vai ao casamento. Eu sou a madrinha, você vai ficar no altar ao meu lado.

O elevador parou no nosso andar e eu abri a porta do apartamento. James entrou e colocou sua mala apoiada no balcão que dividia a sala e a cozinha. Bem no meio caminho, o que me irritou, mas eu não disse nada.

— Esse lugar é enorme, Max – foi dizendo, avaliando a sala. – Como você...

Eu sabia o que ele iria perguntar – como você consegue pagar por um lugar desses sozinha? – e realmente não sabia como responder a essa pergunta, por isso decidi que a melhor defesa era o ataque e o interrompi, dizendo:

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— Não pense que você vai mudar de assunto, James Clarke. Que história é essa de que você não vai ao casamento da minha melhor amiga?

Ele suspirou e se sentou no sofá, batendo no espaço ao seu lado, chamando-me para sentar ao lado dele. Eu não gostava do gesto, porque parecia que ele estava chamando a um cachorrinho, mas me sentei ao lado dele de qualquer jeito.

— Querida, entenda – começou. – O casamento é em dez dias, bem quando começam minhas provas do bimestre. E eu tinha que escolher entre vir agora ou ao casamento...

— E por que você não escolheu o casamento? – perguntei, irritada. – É a minha melhor amiga, James, você sabe o quanto isso é importante pra mim. Eu só não estou pessoalmente ajudando com os preparativos porque a Sra. Price sempre sonhou em fazer um casamento de conto de fadas para a filha, então Erin e eu só deixamos que ela fizesse tudo. Mas mesmo assim, você tinha que estar aqui.

Ele franziu o cenho para mim.

— E perder nosso aniversário de namoro? Nós sempre passamos juntos...

— Eu preferiria que você tivesse escolhido vir ao casamento. Aniversários de namoro acontecem todos os anos, o casamento da minha melhor amiga, não.

Apertei a ponte do nariz entre os dedos, sem acreditar que James estava na minha casa não tinham nem trinta minutos e nós já estávamos brigando. Não éramos um casal que brigava muito, mas quando brigávamos a coisa costumava ser feia.

— Desculpe – ele disse, esfregando minhas costas. – Eu não sabia que você ia ficar tão chateada.

Levantei-me. O quê?! Ele não sabia? Como ele podia não saber? Era a minha melhor amiga desde a escola, droga! Contive a vontade de gritar com ele, porque sabia que se o fizesse, ele gritaria de volta e nós acabaríamos brigando de verdade. Eu só o teria aqui até domingo e não queria passar o final de semana todo sem falar com ele. Então só disse:

— Da próxima vez, pergunte minha opinião em vez de tomar a decisão sozinho.

Ele sempre fazia isso e já devia saber que eu odiava. Tomava decisões que afetavam a nós dois sem nem me consultar a respeito e ainda dizia que era para que eu não me preocupasse, que ele podia resolver tudo por nós dois.

Isso me deixava louca.

Consegui me acalmar o bastante para fazer um rápido tour com ele pela casa, evitando a lavanderia e o quarto de Asher. Quando James me perguntou o que havia no quarto, eu só respondi:

— Nada, ainda. O último dono o deixou uma completa bagunça e você sabe como eu sou. Decidi deixá-lo trancado até contratar uma equipe de dedetização...

Fiquei meio chateada por ele acreditar na mentira de cara. Eu era tão obcecada assim que esse seria considerado um comportamento normal a ser esperado de mim?

Como eu imaginava, James estava cansado e, logo depois de tomar um banho e se trocar, caiu na minha cama e dormiu. Eu ainda estava irritada, por isso deixei-o lá e fechei a porta, indo para a cozinha preparar o jantar.

Eu odiava cozinhar, mas era boa nisso. Minha mãe havia me ensinado e ela era a melhor cozinheira do globo. A mulher fazia as melhores tortas de amoras silvestres que eu conhecia. E eu nem gostava de amoras. E ela havia dito que um dia eu moraria sozinha e precisaria cozinhar se quisesse não morrer de inanição. Talvez ela não conhecesse o conceito de “comida para viagem”, mas o ponto era que eu, de fato, cozinhava muito bem.

E havia cometido o erro de deixar James descobrir.

Desde então, ele sempre me pedia para cozinhar para ele. Apesar de odiar, eu fazia para agradá-lo, até porque não nos víamos muito.

Eu já tinha feito quiches de queijo como entrada e meu famoso brownie com nozes para a sobremesa. Só faltava o prato principal, que era peixe crocante com purê de batata doce. Eu não era muito fã de peixe, mas Erin e James adoravam, então decidi agradar aos dois. Eu sempre podia encher a barriga com as quiches e pular direto para a sobremesa.

Eu coloquei meus fones de ouvido e comecei a escutar toda a discografia do Damien Rice, porque eu me sentia num clima de sofredora, enquanto começava a cozinhar. Talvez justamente por estar cozinhando. Ou por ter brigado com meu namorado. Eu só sabia que estava com vontade de chorar ouvindo “9 crimes” enquanto amassava as batatas e só Deus podia me julgar.

Temperei o peixe e deixei-os para serem fritos só quando estivesse quase na hora de Erin e Mitch aparecerem. Terminei tudo mais cedo do que pretendia e resolvi ir tomar um banho. Lavei os cabelos e demorei bastante, ainda tinha bastante tempo. Quando saí, enrolei-me na minha toalha, percebendo que a de Asher ainda estava lá, pendurada ao lado da minha. Amaldiçoando toda a linha da vida daquele idiota, peguei a toalha com a pontinha dos dedos e fui levá-la até a lavanderia, jogando-a com o resto das roupas sujas. Só pensar que teria de lavar as roupas dele com as minhas deixava meu estômago embrulhado. Não era como se eu tivesse nojo dele ou algo assim. Era só que o cara passava o tempo dele nos lugares mais decadentes da Terra e ficava com tantas mulheres diferentes que era surpreendente que não tivesse conseguido uma doença. Então, não era exatamente dele que eu tinha nojo, mas dos lugares – e pessoas – em que ele se esfregava.

Afastei o pensamento e fui andando, só de toalha, para o meu quarto. Mas, quando atravessava a sala, ouvi o barulho do trinco sendo aberto e, em seguida, Asher entrou no apartamento.

Meu coração congelou.

— Que porra você tá fazendo aqui? – falei no que pretendia ser um grito sussurrado, se é que algo assim existia.

Ele deu de ombros, os olhos me percorrendo de cima a baixo, com aquele seu olhar malicioso que deixava claro que ele estava tendo pensamentos impróprios. Só por tê-lo me olhando assim, eu me sentia corar. Maldito!

— Eu esqueci uma coisa muito importante, monstrinho – ele disse, dando de ombros. – Quer dizer que as coisas já começaram a ficar animadas? Me diz, ele te fodeu no chuveiro? Fazia muito tempo que você não tinha um pouquinho de diversão...

Eu senti meu corpo todo ficando quente e sabia que meu rosto devia estar fazendo cosplay de tomate. Minha vontade era arrancar as bolas daquele desgraçado com uma pinça, mas eu não podia fazer barulho e correr o risco de acordar James.

Pena, teria de deixar a tortura para outro dia.

— Pega o que você precisa – consegui murmurar, mesmo com minha mandíbula apertada. – E some daqui ou eu não vou lavar as suas roupas, eu vou queimá-las!

Ele só sorriu e pegou a chave do quarto dele em cima do balcão e foi andando calmamente para lá, murmurando:

— Pelo nível de estresse, ou ele ainda não fez nada com você ou não fez direito.

Fechei os olhos e respirei bem fundo, para me impedir de fazer alguma coisa estúpida como gritar de frustração ou jogar uma panela no Lockwood.

Ele desapareceu dentro do seu quarto e voltou minutos depois, com nada visível nas mãos. Trancou a porta e veio até mim, depositando a chave de volta em cima do balcão e se encostando calmamente nele, cruzando os braços no peito e me fitando com a mesma malícia que exibia desde o momento que havia entrado pela porta.

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— O que você está esperando? – perguntei, sem acreditar que ele estava tendo a cara de pau de ficar ali, me olhando daquele jeito. – Vai embora!

Asher não fez um movimento para ir e eu já sentia minhas pernas tremendo de nervosismo e internamente estava rezando para todas as divindades que conhecia, que não permitissem que James acordasse e visse aquele ser parado na sala como se o lugar o pertencesse...de fato, pertencia, mas James não sabia e – se existia alguma justiça nesse mundo – continuaria sem saber.

— Para ser sincero – ele disse, a voz estranha. – Eu queria dar uma olhada no famoso James.

Eu não podia acreditar naquilo. Tomou toda grama de autocontrole que eu tinha no corpo para me impedir de começar a gritar com o maldito e furá-lo com o primeiro objeto pontiagudo em que eu conseguisse colocar as mãos. Ele estava brigando comigo. Aquela era a minha vida, meu futuro e ele...ele tratava como se fosse um maldito jogo!

— Por favor – eu implorei, minha voz soando frágil com o medo, aproximando-me dele e apertando as mãos em punhos. – Vai embora, Asher. Se James acordar e ver você aqui...

— O cara está dormindo? – ele perguntou antes que eu pudesse sequer terminar de falar, soando incrédulo.

Assenti.

Asher me surpreendeu ao se aproximar e segurar um dos meus pulsos com uma mão e a passar provocativamente os dedos da outra no nó que eu havia feito na toalha para mantê-la no lugar.

— Se eu tivesse uma namorada – ele começou, olhando-me profundamente nos olhos, já que tínhamos a mesma altura – e tivesse passado meses longe...atravessar o atlântico não me cansaria o bastante pra manter minhas mãos longe dela.

Por algum motivo, minhas pernas começaram tremer mais e eu me sentia tão nervosa por ter Asher tão próximo que James havia quase desaparecido da minha cabeça.

— Isso porque você é tão tarado e pervertido que não fica cansado. Mas não importa, você não tem uma namorada – consegui sussurrar com meus lábios trêmulos. – Você não deve nem saber como ser fiel.

Ele deu de ombros, como se não significasse nada.

— Verdade – seus dedos agora tocavam meu ombro úmido, tão levemente que eu mal sentia. – Mas pra tudo existe uma primeira vez...e esses seus grandes olhos marrons podem fazer um cara perder a cabeça.

Que merda...? Qual era o problema do cara? Em um momento ele agia como se fosse meu amigo, no outro só faltava me fuzilar por ter trancado o maldito gato dele no quarto e agora parecia que estava tentando entrar nas minhas calças. Não que eu estivesse usando calças. Ou qualquer outra coisa. Eu não podia acreditar que estava tendo aquela conversa com o cara e nem estava vestida!

Só havia uma explicação para aquilo. Ou Asher estava bêbado. Ou sob forte efeito de narcóticos.

Ou tinha transtorno bipolar.

Ok, três explicações.

Quatro, se eu contasse que ele podia ter sido abduzido pelo mesmo alien que estava fazendo o reconhecimento do local na barriga da minha melhor amiga.

— Asher – eu disse suavemente. – Você bebeu?

Eu tinha que começar com a primeira opção...

Ele riu, mas não por muito tempo. Antes mesmo que eu pudesse perguntar se ele tinha cheirado alguma coisa, uma voz soou atrás de nós e eu senti meu estômago despencando.

— Que porra é essa, Max?