A Clarividente

Capítulo 5



Hazael andou distraído pelos arredores da casa, aliviando a mente e tentando não refletir tanto, mas era impossível. Sentia que muitas coisas estavam para acontecer.

Zahra havia voltado inesperadamente ao reino, justo quando Hazael esperava tentar contatar um antigo conhecido. Não poderia chegar perto de Zahra, ou ela sentiria a magia negra. “Agora, mais essa Nirina”, meditou. “Preciso dar um jeito de transformar essas duas em minhas aliadas”.

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Lembrou-se das palavras de Ian como um filme.

“Eu consegui sentir a presença dela, fraca, mas estava lá. Duvido até mesmo que ela saiba que é uma maga clarividente. Quando olhei para ela, ela estava olhando para mim. Então tive certeza que ela pode sentir minha presença. Assim que saí andando, ela veio atrás de mim. Pobre maguinha, nem mesmo desconfiou que eu a tivesse notado pela presença mágica, sem olhar para trás. Enquanto ela se perguntava para onde eu tinha ido no beco, voei para cima de um dos telhados e corri sobre eles até Riana, a garota que estava a seu lado. E então a conversa não demorou muito”.

Hazael coçou a cabeça. Sempre se perguntava como Ian conseguia ser tão esperto em relações sociais. O mago de fogo devia admitir, seu amigo era ótimo em persuadir as suas vítimas e sua boa aparência apenas tornava o trabalho mais fácil.

“Eu disse ‘Como é o seu nome? E o da sua amiga maga?’ e ela simplesmente respondeu. ‘Você tem vontade de aprender magia. Eu posso lhe ensinar’, chutei. Por sorte, ela confirmou! Acho que foi isso que a fez aceitar tão fácil o convite de vir até aqui. É claro, quando disse que podia ensiná-la, ela disse que não acreditaria tão fácil que eu era um mago. Assim que ela terminou de falar, ela apontou para Nirina, que provavelmente cansara da tentativa de me encontrar e estava de volta. Apontou para a amiga e, discretamente, disse ‘Como vou saber se você é um mago de verdade?’. Respondi com um ‘Hoje à tarde, na casa de madeira na clareira em meio às estradas da floresta’. Então saí voando. Só para que ela tivesse certeza. Acho que conquistar a confiança de Riana é um bom método para conquistar a confiança de Nirina também.”

Ian era mesmo exagerado às vezes. Hazael tinha certeza que as pessoas da cidade estavam acostumadas com magos, mas Ian devia conhecer melhor alguns limites.

De repente, enquanto observava as árvores, sentiu-se curioso em saber o progresso de Riana com a magia negra. A garota parecia, no entanto, incerta, e tinha quase certeza de que ela não teria conseguido invocar nenhum espectro àquela hora. Perguntou-se quanto tempo teria passado ali fora e decidiu que voltaria.

Quando abriu a porta, viu Riana sentada na mesma cadeira de antes e Ian a seu lado. Os dois estavam em silêncio e a aprendiz parecia descansar. Puxou Ian para um lado para que Riana não ouvisse a conversa e, de fato, ela nem deu atenção aos dois.

— Quantas tentativas ela fez até agora?

— Três — respondeu Ian.

— Algum progresso?

— Nada ainda. Ela está indecisa, cheia de dúvidas. Conheço bem esse sentimento.

— Eu também, Ian — riu Hazael. — Conheço bem esse sentimento. — O mago de fogo já tinha se virado para se afastar quando se lembrou de algo repentinamente e voltou-se ao amigo. — Não acha melhor mandá-la embora? Ela vai ficar exausta assim. Diga-a para voltar amanhã.

— Pode ser uma boa ideia.

Os dois caminharam até Riana. Ela ergueu os olhos aos dois e sorriu um tanto decepcionada.

— Acho que não tenho jeito para isso — disse.

Ian se comoveu.

— Não pense assim, Riana. Eu avisei que era mais difícil do que parecia e que requer prática. Mas não adianta praticar por tanto tempo, sua mente e seu corpo precisam de descanso — completou. — Por que não volta para casa hoje e vem aqui para mais aulas amanhã? Tenho certeza que isso ajudaria — acrescentou, em tom quase carinhoso.

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— Você pode estar certo — respondeu Riana com um sorriso fraco, jogando o capuz do casaco sobre a cabeça. — Eu voltarei aqui a essa mesma hora amanhã.

— Esperarei — disse o mestre.

Hazael apenas a cumprimentou com um aceno de cabeça e ela se dirigiu à porta. De repente, voltou-se a eles.

— O que pretendem fazer em relação a esse lugar? Não seria melhor se nos mudássemos?

— Olha — disse Hazael. — Ela já fala como se fosse uma de nós.

— Vou conversar com Hazael, mas qualquer coisa, avisamos, sem dúvida — respondeu Ian, ignorando o amigo com um aceno displicente da mão. — Não se preocupe.

— Obrigada — disse Riana.

Então se virou para a porta, ignorando mais um dos comentários de Hazael e deixou a casa definitivamente. Aquela sensação de que poderia estar sendo observada voltou e ela segurou com mais força o capuz, insegura. No caminho para casa, no entanto, decidiu que pensaria muito durante a noite e decidiria se continuaria seguindo o caminho da magia negra. Assim, acabaria logo com a tortura. “Serei uma maga negra e farei isso bem feito, ou direi a Ian que esquecerei tudo o que aconteceu e continuarei com minha vida”, decidiu-se. Suspirou satisfeita e ergueu a cabeça enquanto passava pelas estradas da floresta.



Nirina jantou feliz com Arthus, adorava as refeições que ele fazia. Conversaram sobre diversos assuntos, mas sempre por insistência do mestre. A aprendiz frequentemente ficava em silêncio, pensativa.

— Obrigada pelo jantar, mestre — disse Nirina, com pesar. Algo a dizia que ela não teria mais tanto tempo para passar junto de Arthus. Direcionou os olhos ao chão. — Tão pouco tempo sendo sua aprendiz e eu preciso ir — acrescentou. — Não é justo.

Arthus sorriu, comovido. Pensou em algo para animá-la e então se lembrou:

— Já pensou quem será sua nova mestra ao aprender magia clarividente? — disse.

— Pensei — respondeu Nirina enquanto seu rosto se iluminava com um sorriso sincero. — Mas isso não muda o fato de que precisarei te deixar.

— Vamos nos ver, Nirina, eu disse. Não poderei ir até a Corte, mas você poderá sair. Aliás, nem sabemos ainda qual será a decisão do Rei Nasser. Por que se preocupar tanto assim? Tem pensado em alguma coisa? Tem a ver com suas visões?

— Não, nada disso — disse, sorrindo sem graça dessa vez. — Só sentirei saudades suas. E se eu for embora, quem vai te proteger?! — protestou, permitindo-se brincar. — Você precisa da minha proteção!

— Preciso mesmo — respondeu Arthus, rindo. — Mas eu vou conseguir me virar, você vai ver. E vamos nos ver sempre.

— Bem — disse, por fim. — Vou me deitar, mestre. É uma pena que eu não tenha cabeça para estudar a água recentemente.

— Foi só um dia — consolou-a. — Não se preocupe com isso, existem coisas mais importantes a serem pensadas agora.

— Tem razão, senhor. Tenha uma boa noite de sono — ela desejou, sorrindo carinhosamente. — Até amanhã.

— Durma bem, Nirina.

Quando sua aprendiz tomou o caminho do quarto, Arthus abriu a gaveta de um dos armários da cozinha e pegou uma folha de papel, uma caneta e um tinteiro. Endereçando a carta ao Rei de Sira, Nasser, começou a escrever sobre Nirina.



Ao Rei Nasser, Senhor de Sira.



Venho através desta carta requisitar vossa atenção, Senhor, a uma aprendiz que tem desenvolvido habilidades peculiares. A garota esteve sob minha guarda durante todos esses anos desde que era apenas uma criança, e dez anos depois a iniciei no ensino de magia de água, como mago de água que sou.



Constatei, no entanto, que ela pode estar desenvolvendo habilidades de maga clarividente. Imediatamente imaginei que isso seria de seu interesse e da maga clarividente do reino, a senhora Zahra.



Peço, com todo o respeito, que envie alguém à minha casa para ver a aprendiz e para que possamos conversar melhor sobre o que será feito. Em um papel anexo seguem as instruções de como encontrar minha moradia, por mais que o Senhor saiba onde ela fica.



Atenciosamente, Arthus de Sira.



Lacrou devidamente a carta e decidiu que acordaria de manhã, cedo, para levar a carta às casas de entrega e ter certeza de que ela seria entregue tão rápido quanto possível. Arrumou-se para deitar e pensou com carinho em Nirina. O caminho em que seus dons a estavam levando não seria assim tão fácil.


Arthus levantou cedo como havia planejado, sem acordar Nirina, tomou seu café da manhã e foi até a cidade. Lamentou-se um pouco por ter de fazer tal caminho apenas para entregar uma carta e desejou morar na cidade pela primeira vez em muito tempo, mas não se incomodou tanto assim. Podia estar envelhecendo, mas ainda tinha energia de sobra para as tarefas cotidianas.

Passou pela frente da casa de Riana na volta, mas não observou nenhuma movimentação. Decidiu que não incomodaria e tomou o caminho de volta à sua casa, paciente.

Caminhou devagar pelas estradas laterais enquanto voltava. O dia estava agradável, nem sinal da chuva que havia caído no dia anterior. Arthus sentiu o vento fresco em seu rosto enquanto sua túnica voava ao redor de suas pernas, fazendo-o parecer um mago para qualquer um que o olhasse.

Quando mais novo, havia sido um homem atraente. Nirina se perguntava se ele sempre tinha vivido sozinho ou se chegara a ter companheiras. Arthus e ela nunca falaram sobre isso, pois a aprendiz achava melhor não perguntar.

Agora o mago já tinha o cabelo um tanto grisalho e a expressão do rosto amena. Não expressava severidade, ele era simpático e alguém que aparentava ser naturalmente feliz. Era paciente, dificilmente erguia a voz para algo: um professor nato. Havia ensinado outros aprendizes antes de Nirina, não muitos, mas era realmente bom nisso. Ela se perguntava às vezes se teria chance de conhecer um de seus aprendizes algum dia.

Assim que Arthus chegou à sua casa, Nirina ainda estava dormindo. Pegou um de seus livros e se acomodou no sofá, planejando ler até a hora de fazer o almoço. Sua aprendiz não dava sinais de querer acordar cedo aquele dia, e o mestre pensou que seu descanso era bem merecido.



As horas passaram rápido para Riana enquanto ela ajudava sua mãe com os afazeres domésticos pela manhã. Ela ansiava pela tarde e ainda não estava certa de que veria Ian e Hazael. Pensou várias vezes em deixar para ir somente no dia seguinte.



Havia pensado muito no que fazer durante a noite e considerado novamente o quanto odiava ter uma vida comum. Continuar se encontrando com os dois magos negros parecia uma boa alternativa quando pensava em fugir da rotina.

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Ajudou sua mãe com o almoço e em tudo o que precisava. Conversou sobre coisas banais com seu pai e brincou um pouco com o irmão mais novo, Remi, antes de ir para seu quarto e passar mais um tempo trancada lá, com a desculpa de que iria descansar.

Ao encarar o relógio ao lado de sua cama, viu que ele marcava aquela hora: a mesma de ontem quando saiu para encontrar Ian na casa da floresta. Se decidisse ir, já estaria atrasada. Levantou-se da cama e começou a se vestir, fazendo o mesmo que havia feito na primeira vez: colocou roupas confortáveis para a caminhada e deixou o sobretudo preto com capuz dentro de sua bolsa. Arrumou as coisas e desceu as escadas da casa, encontrando a mãe no sofá da sala.

— Mãe — disse Riana. — Estou indo ver Nirina.

— Tem certeza de que não quer passar a tarde em casa hoje, minha filha? — disse, inocente. Por um instante Riana sentiu a pele arrepiar, como se sua mãe soubesse de algo.

— Claro, mãe. Só vou fazer uma visita rápida à Nirina e logo estou de volta.

— Nesse caso, tudo bem. Cuidado pelas ruas.

A mãe de Riana se despediu dela com um beijo carinhoso no rosto. Riana sentiu o coração doer por estar mentindo para ela e tomou o caminho para as estradas da floresta. Ao se afastar da cidade, vestiu o casaco e jogou o capuz sobre a cabeça.

Não demorou muito a chegar. Assim que bateu na porta da casa na clareira, Ian a abriu, sorridente como sempre. Olhou para trás e disse:

— Viu, Hazael! Eu disse que ela viria! — virando-se para Riana, cumprimentou-a. — Boa tarde, Riana. Seja bem vinda.

Abrindo espaço para a nova aprendiz, estendeu um dos braços, convidando-a a entrar. “Então ele duvidou que eu viria” pensou, lembrando do comentário de Ian. “Ele duvida de mim. Agora é que virei todos os dias, sem dúvida”.

Quando Riana olhou para a sala, observou com surpresa que havia outra pessoa ali além de Ian e Hazael. Olhando um pouco mais, percebeu apesar das roupas largas que se tratava de uma mulher. Ela não era exatamente bonita, mas seus cabelos, sim. Eram tão longos quanto os de Riana, mas escuros como os de Nirina. Seu sorriso era quente e receptivo, e foi com ele que recebeu a aprendiz quando direcionou seu olhar a ela.

— Você deve ser Riana — disse, sem abandonar o sorriso.— É um prazer conhecê-la. Eu me chamo Selene.

— O prazer é meu, Selene — cumprimentou-a sorrindo também, sendo o mais segura que conseguia. — É muito bom ter outra mulher por perto.

— Imaginei que se sentiria melhor mesmo quando Hazael me contou que tinham uma nova aprendiz. Resolvi vir para ajudar e, embora eu não seja capaz de ajudar Ian com as aulas, posso te ajudar conversando. Sinta-se à vontade para falar comigo, tudo bem?

— Certo, muito obrigada — disse, sentindo-se cheia de carinho pela mulher de repente. — Mas — acrescentou, com uma expressão interrogativa no rosto — por que não poderá ajudar Ian com as aulas?

— Selene não é uma maga negra — respondeu Hazael, se antecipando. — Ela é uma maga de água que tem um papel importantíssimo entre nós.

— Que papel é esse? — perguntou. Estava cada vez mais curiosa sobre aquele grupo e queria saber mais sobre aquelas pessoas.

— Ela é uma maga de água a serviço do reino. Algumas vezes o Rei requisita seus serviços como mestra.

— Por isso você é tão carinhosa? — observou Riana. — Deve ser uma ótima professora.

Selene não respondeu, apenas sorriu novamente. Deixou que Hazael falasse, mas logo Ian interrompeu:

— Então, Riana, antes de saber se você está pronta para novas tentativas, deixe-me perguntar outra coisa — Ian se aproximou da aprendiz, olhando-a nos olhos. — Você sinceramente quer continuar aprendendo magia negra? Lembre-se que ainda dá tempo de dizer não.

— Eu quero — disse Riana, determinada. — Hoje vou tentar invocar os espectros com toda a minha força — acrescentou. — Eu vou conseguir.

— Esse é mesmo o caminho! — Ele estava animado. — Não tenho dúvidas de que logo você será bem sucedida.

— Pegarei bebidas — disse Selene, deixando a sala.

Riana achou graça. Eles estavam parecendo um grupo de amigos que se reunia na floresta para conversar, mas, em vez disso, praticavam magia negra. Ela não parecia de fato uma magia má, mas era arriscada para quem a usava. O resultado podia ser bom e também era perigoso. Podia custar a vida do invocador.

Seu carinho por Ian apenas crescia. Gostava até mesmo de Hazael e de seus comentários sarcásticos e às vezes carregados de um tom ofensivo, mas com um tom inteligente. Hazael parecia inteligente.

O mago de fogo tinha o cabelo escuro como seus outros colegas, mas comprido. Era comprido até abaixo de seus ombros e seus olhos eram um pouco mais claros que os de Ian. Talvez ele fosse nascido ali em Sira mesmo, talvez em Nali, país descoberto pelos antepassados de Nasser, colonizado pelos moradores de Sira. Nali tinha várias características físicas do povo de Sira, mas havia uma mistura de alguns países ali por ser um território novo se comparado com Sira e Earine, por exemplo.

Ian se aproximou com a faca novamente e a entregou para Riana. A aprendiz pegou a faça sem hesitar e cortou a mão sem o medo que geralmente sentia. Seu mestre percebeu.

— Está melhorando — ele a encorajou, olhando-a fixamente. — Prossiga.

Riana juntou as duas mãos após fazer o corte e concentrou seus pensamentos. Ainda fazia isso preocupada, no entanto, se sua magia teria efeito. Ficou daquele jeito por alguns segundos até percebeu que ainda não tinha conseguido nenhum progresso. Suspirou, mas estava obstinada a tentar pelo menos três vezes mais. Sentiu-se intrigada ao perceber que, mesmo quando a magia não dava certo, o corte em sua mão já estava cicatrizado e pronta para uma nova tentativa. Sorriu discretamente e pressionou a faca contra a pele mais uma vez.



Nirina passou a manhã inteira e metade da tarde dormindo. Quando acordou, Arthus não estava em casa. Andou letárgica pela casa, indo até a cozinha buscar algo para beber. Apesar de tanto tempo dormindo, não sentia fome.

Estava estranhamente incomodada. Para onde Arthus poderia ter ido? Ele nem mesmo deixara um bilhete. Será que havia saído com pressa? Alguém havia vindo buscá-lo?

Sabia que Arthus tinha sido um mago a serviço do Rei Nasser quando era mais novo. Chegou a viver na Corte durante alguns anos, servindo como feiticeiro do exército do Rei. Não sabia se ele tinha chegado a participar de batalhas, no entanto.

Apesar de carinhoso, Arthus era extremamente reservado. Conversava pouco sobre seu passado com Nirina e ela não se sentia disposta a perguntar.

Com um suspiro, a jovem maga decidiu que voltaria para cama. Apesar de estar sem sono, não estava disposta a passar o dia estudando. A ideia de se mudar para a Corte indicava que sua vida mudaria de um jeito radical e ela não sabia se estava preparada para isso. Voltou para o quarto e deitou na cama, tentando imaginar como seria sua vida a partir dali. Se conheceria outros magos, outros aprendizes, e se teria novos amigos. De repente, pensou em Riana. Não havia conversado com a amiga novamente e elas raramente passavam um dia sem se falar. Logo seus pensamentos se voltaram a seus dons novamente, e ela adormeceu sem querer.

Acordou assustada com batidas à porta, seguida pela voz de Arthus.

— Nirina — anunciou. — Posso entrar?

— Sim — disse, levantando-se rápido e cobrindo sua camisola com o lençol.

Arthus abriu a porta levemente e encarou Nirina com um sorriso.

— Pretende passar o dia inteiro dormindo? Caso não tenha notado, já é noite.

— Não, senhor! — disse Nirina, um tanto assustada. — Não pretendia dormir tanto, desculpe.

— Não precisa pedir desculpas — respondeu o mestre, acalmando-a. — Apenas se vista e venha até a sala. Você tem visita.

Nirina o encarou com um olhar interrogativo, mas nem teve tempo para perguntar. Assim que Arthus terminou de falar, deu as costas ao cômodo e fechou a porta para que ela pudesse se aprontar.

A aprendiz colocou uma calça comprida e uma de suas túnicas azuis, que desciam até a metade de suas coxas. Amarrou o laço à cintura e foi até o banheiro de seu quarto, lavando o rosto. Encarou sua imagem no espelho: não estava assim tão ruim. Escovou os dentes e passou uma escova pelos cabelos, rápida. Enfiou os pés em suas pantufas e saiu do quarto. Não se arrumaria tanto assim, nem precisaria sair de casa.

Nirina foi andando devagar até a sala. Assim que chegou, viu que uma mulher acompanhava Arthus. Ela parecia ter 30 anos, não muito mais do que isso, e não era exatamente atraente. Era baixa e magra e usava uma túnica preta com um capuz que era bem larga. As mangas eram compridas. A mulher estava com o corpo todo coberto e o capuz jogado para trás enquanto conversava com Arthus sobre Nirina. Os dois não a viram se aproximar.

A visitante não tinha nada de especial. Não usava nenhuma joia e parecia absolutamente comum. A aprendiz sentiu um arrepio estranho pelas costas, no entanto.

— Boa noite — disse Nirina, cumprimentando os dois.

Arthus manteve-se em silêncio, e a visitante abriu um sorriso simpático.

— Saudações, jovem aprendiz — disse ela, sem abandonar o sorriso. — Sou Zahra, a maga clarividente de Sira.