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Mais Uma Vez Amor...


— Está procurando o que?

Me virei e dei de cara com duas jovens sentadas à mesa, na sala. Eram muito bonitas, deviam ter seus 18 anos. Vestiam um conjunto de blusa de manga até antes do cotovelo e saia até o joelho, e tinham cabelos com ondas, curtos até acima do ombro. Pareciam estar estudando pois tinham alguns livros abertos em cima da mesa. Sabia que tinha voltado ao passado, e já estava mais esperta dessa vez.

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— Eu to procurando o calendário — respondi sem saber o que responder na verdade.

— Tá ali na parede — apontou uma das meninas.

— Não vai falar comigo Fernanda? — perguntou outra menina, levantando e vindo em minha direção — Nossa, você tá branca. E gelada. — disse após me abraçar e me dar um beijo no rosto.

— A Ângela veio estudar comigo. Achei que tivesse morrido, você dormiu como uma pedra.

Procurei o tal calendário e agora datava o ano de 1948. Dessa vez não desmaiei, mas um frio me percorreu todo o corpo. Agora vejamos o que aconteceu em 1948: Carmem Miranda ainda estava viva, Marilyn Monroe era um símbolo sexual e o presidente era o Marechal Eurico Gaspar Dutra. A Segunda Guerra Mundial tinha acabado de acabar! Calma que é muita informação.

Eu só precisava saber quem eram aquelas meninas e quem era eu mesma. Sentei com elas à mesa e fiquei esperando qualquer pista. Eram brincalhonas e divertidas. Emília era minha irmã, descobri por que de vez em quando me chamava de mana. E Ângela era sua melhor amiga, se conheciam a anos e sempre saiam juntas, por que estavam a lembrar as aventuras que já passaram. Eu amava ouvir elas e suas histórias e amava a ideia de ter uma irmã mais velha tão legal. De repente abre a porta uma mulher, com algumas sacolas na mão. Vestia um conjunto com um blazer e saia reta até o joelho.

— Bom dia meninas.

— Onde a senhora estava? — perguntou Emília

— Vim do mercado. Oi Ângela, como vai sua mãe?

— Tá ótima. Melhorou a pouco tempo de uma gripe, e a senhora?

— Estou bem, querida! — respondeu beijando sua cabeça e indo em direção a cozinha.

Esta mulher era minha mãe. Devia ter uns 40 anos, por mais que não aparentasse. Era doce, terna e carinhosa. Eu logo me apeguei a ela.

Abri a janela da sala e dei de cara para uma rua bastante arborizada, com alguns prédios simples. O vento era fresco, como se estivéssemos perto da praia. O céu estava claro, e o tempo quente. Então perguntei:

— Podemos ir à praia hoje?

— Boa ideia! O que você acha? — Emília perguntou a Ângela

— Só se eu for junto! — minha mãe grita da cozinha.

Foi uma das melhores coisas que eu poderia ter feito. Fomos até o quarto para pegar as roupas de banho. Eu me sentia a Taylor Swift com aquele biquini retrô, com a parte de baixo que ia até a cintura. Mamãe pegou um maiô preto particularmente apertado, o que acentuava suas curvas (juro, ela tinha um corpo lindo), de alça larga que amarrava no pescoço. Aquelas rudículas não tinham uma barriga, acho que se deve ao fato de que naquela época haviam menos produtos industrializados, com gordura e hormônios.

Fomos a pé até a praia. Vários cavalheiros nos cumprimentavam na rua, em atos educados e gentis. Os que usavam chapéu o tiravam em ato de cumprimento. Todos nos davam bom dia e nós dávamos bom dia a todos. Eram tão educados!

Foi um dia incrível, nos divertimos tanto. Jogamos bola o dia inteiro e quase me afoguei. Saímos de lá já na hora do almoço e corremos para casa para comer. Acho que estávamos no sábado por que á noite, mamãe nos levaria ao cinema. Inclusive, fazia muito tempo que eu não ia ao cinema, minha mãe do futuro não gostava. Achava perca de dinheiro já que depois de algum tempo o filme já estaria disponível na internet.

Enquanto estavam se preparando e Ângela ligava avisando seus pais, fui até a sala e fiquei olhando algumas fotos. Entre elas, tinham algumas de um homem. Pendurado na parede, um quadro do mesmo homem vestido de uniforme da Marinha.

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— Você sente saudades dele né? — perguntou mamãe me abraçando por trás — todos nós sentimos, seu pai foi um grande homem. Um homem do bem, só queria ver quem amava feliz. Era um ótimo pai.

— Como foi que ele morreu mesmo? — perguntei

— Ele foi trabalhar lá para onde estava em guerra, e seu navio foi invadido por aqueles monstros nazistas. Ele só queria ajudar quem não tinha nada a ver com isso, e acabou indo junto.

A Segunda Guerra Mundial matou meu pai do passado. Agora eu sentia na pele o que milhares de pessoas sentiram, mesmo não tendo nem conhecido ele.

Logo as meninas estavam prontas, lindas e ansiosas. Estava passando um filme nacional com algum ator que elas gostavam muito. Pegamos um táxi e ainda estava anoitecendo. Como o Rio era lindo nos anos 40, principalmente no anoitecer. Me dá arrepios bons só de lembrar o quão lindo era o sol se pondo entre os prédios já construídos.

Chegamos num prédio onde era o cinema. Entramos, compramos algumas pipocas e escolhemos os melhores lugares. O filme era incrível durante os primeiros 30 minutos, ai depois eu adormeci. Talvez filmes em preto e branco me deixem sonolenta. Pegamos outro táxi para ir embora. Mamãe pediu que o motorista desse uma volta na cidade, para passearmos um pouco, e o moço muito educado aceitou. Passamos por ruas e avenidas, da Urca ao Leblon. Sentei na janela, mamãe foi na frente conversando com o motorista e Emília e Ângela foram conversando sobre o filme.

A cidade já era tão linda, as pessoas andando na rua tranquilamente, sem violência, casais românticos e apaixonados andando abraçados sem maldade nenhuma, as luzes dos prédios me davam frio na barriga, era algo tão esplendido, tão incrível. O mar escuro sob a luz da lua, o Cristo Redentor cuja construção não era tão velha naquela época. Eu havia me encontrado. Finalmente.

Coisas do Brasil, coisas do amor
Luzes da cidade acendendo o fogo das paixões
Num bar à beira-mar
No verde-azul do Rio de Janeiro

Chegamos em casa e eu estava morta de cansaço. Ângela dormiria lá conosco, então fomos dormir. No outro dia, acordamos umas 10:00 e almoçamos. Sim, bem cedo. Estava acostumada a almoçar quase às 14:00 da tarde. Almoçamos ouvindo rádio, e foi uma das melhores sensações que já tive, qualquer dia ainda quero sentir isso novamente.

Passamos o domingo conversando, limpando a casa e à tarde fomos caminhar pela orla, visitar alguns lugares, esse era o lazer dos anos 40. Eu lembro de ter andando uns 10 minutos e estava quase desmaiando, enquanto as meninas pareciam nem sentir nada. Ficamos brincando de amarelinha numa pracinha. Exato, amarelinha. E pega-pega. Nem lembro a ultima vez que brinquei disso, acho que nunca brinquei. Mas nos anos 40 era tão normal.