You can't

Segunda noite


Dormir a tarde ao invés de a noite fazia o dia parecer consideravelmente mais curto do que realmente era, e Stan sentia como se não tivesse dormido nada. Passou todo o resto da tarde cansado, o dia fora bem improdutivo, apenas pagou as noites que ficou no hotel a beira de estrada e comprou alguns suprimentos, sendo que ele ainda precisava procurar algum apartamento para alugar. Mas poderia fazer isso depois, no final daquela semana receberia todo o salário, ai sim poderia procurar um outro emprego mais tranquilo e agradável que ser vigia noturno da pizzaria onde havia perdido seus amigos.

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Também iria tentar se encontrar com sua irmã depois do trabalho, esperava que ela estivesse em casa de manhã cedo, faziam anos que não se viam.

Dez para as dez da noite já estava na pizzaria, havia uma quantidade considerável de clientes aquele horário e as crianças ainda corriam por ai e brincavam, fazendo Stan lembrar-se da época que era ele correndo e brincando. Mas de algum modo o lugar estava diferente, não eram os bonecos animatrônicos Toys ou as paredes com pintura nova, o ar dentro do estabelecimento parecia pesado, com uma aura que quase denunciava o que havia acontecido ali e lhe deixava tenso ao ponto de quase agradecer por não se lembrar do que ocorreu naquela noite. De fato só trabalhava ali por falta de opção.

Observava o lugar sentado em uma mesa qualquer longe do palco e comia uma fatia de pizza, que Phillip gentilmente ofereceu mais cedo, esperando dar o horário do seu turno. Havia chegado um pouco cedo demais, mas não tinha muito o que fazer fora dali, a imobiliária da cidade já estava fechada a essa hora. South Park sempre morria cedo.
O tempo passava e as últimas pessoas deixavam o estabelecimento, mais ou menos dez e quarenta, aparentemente, não havia mais nenhum cliente. Então os funcionários - Phillip, Clyde e Tweek – começaram a arrumar e limpar o local e, como era um ambiente bastante frequentado por crianças, custou algum tempo. Os bonecos animatrônicos foram desligados e iniciariam automaticamente a meia noite, exatamente como na noite anterior. Para o desgosto de Stan, óbvio, que havia tido uma das piores e mais assustadoras noites da sua vida, odiando pensar que aquilo se repetiria por mais quatro noites.

Ao terminar de ajudar os outros a organizar e limpar o salão se dirigiu a uma outra sala junto de Phillip, também com a intenção de ajudar, mas Craig o chamou antes para ajudar em alguma outra coisa que envolvia Toy Foxy – Apelidada carinhosamente de Mangle pelos funcionários – que consistia basicamente em um boneco animatrônico destruído e sem a maior parte de seu traje, Mangle era apenas um amontoado de fios e peças metálicas que eram constantemente montados e remontados pelas crianças, sempre de maneira errada. Stan não entendia como os pais das crianças deixavam elas chegar perto de Mangle sendo que mesmo vista de longe parecia ter algumas partes perigosas naquele robô.

— Marsh, deve ter algumas peças espalhadas aqui, procure-as. – Craig ordenou assim que eles chegaram no lugar em questão.
Era um cômodo separado do principal por uma porta em formato de arco, as paredes e o piso eram iguais a todo o resto da pizzaria, mas haviam diversos desenhos infantis pregados em todas as paredes. Num dos cantos estava um tipo de caixa gigante de presente, no outro Mangle totalmente destroçada e espalhados por ai varias peças metálicas de robô junto com brinquedos. Começou a recolhe-las.

— Você vai remontar?

— Mesmo sabendo que os pirralhos vão destruir tudo de novo? Vou. Ordens do Token. – Craig, ajoelhado no chão, juntava as partes metálicas mais próximas e as montada de modo irregular em Mangle. – Sempre da um puta trabalho, mas paciência...

— Entendi...

— Você vai mesmo continuar trabalhando aqui Marsh?

— Pretendo. – Pegou do chão algo que parecia ser um tipo de cabeça de endoesqueleto, observou-a por alguns segundos antes de entregar ao outro homem.

— Eu realmente não trabalharia aqui se fosse você. – Pegou a cabeça e encaixou em um ponto qualquer, então falou com um tom de voz mais baixo, sem lhe encarar. – Especialmente você...

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Ele havia soado um pouco... perturbado, talvez? Não conseguiu identificar exatamente o que havia no tom da voz, muito menos o que poderia existir por trás daquelas palavras. No final decidiu não perguntar mais nada.

Em mais ou menos vinte minutos conseguiram juntar tudo e levar o robô destroçado para os fundos da área dos funcionários, a sala de manutenção, onde também ficavam os animatrônicos antigos, Mangle seria remontada no dia seguinte. Craig foi embora as onze e quarenta e, mesmo faltando poucos minutos para o turno de Stan começar, ele passou antes na cozinha para pegar um pouco de café. A maior parte das luzes da pizzaria estavam apagadas e o salão onde ficava o palco terrivelmente escuro, e os Toys muito mais sombrios naquele ambiente agora com pouca iluminação, quase podia sentir como se aqueles robôs estivessem seguindo-lhe com os olhos.

Talvez eu esteja ficando paranoico, pensou antes de dar uma última olhada e apressar o passo na direção da sala de vigia. Ao entrar sentou na cadeira giratória e colocou o caneco branco cheio da bebida quente e amarga na mesa de madeira antes de pegar o tablet por onde vigiava as câmeras, faltavam cinco minutos para a meia noite no momento em que o telefone tocou. Era uma gravação como na noite anterior.

"Olá amigo! Eu não pensei que você realmente voltaria aqui para a segunda noite, quase não acreditei quando me avisaram para gravar uma outra mensagem, mas parece que você conseguiu ter sorte, bem, eu disse que você se sairia bem.... Mas todos se saem bem na primeira noite..."

O homem do telefone sussurrou a última frase e Stan achou melhor não pensar muito sobre isso.

"Sugiro que você veja as câmeras enquanto eu falo, repito que não tem perigo algum, mas só por garantia..."

Stan achou melhor seguir o conselho dele, mas felizmente todos os bonecos animatrônicos estavam em seus lugares.

"Ei, você já chegou a ver os antigos? Eles são até bem tímidos nas primeiras noites e na minha opinião já deveriam ter sido desativados totalmente, mas o Craig insiste que para manter algumas peças boas eles precisam ficar ligados pelo menos de noite, mas, cá entre nos, ele so fala isso porque nunca viu aquelas coisas nesse turno."

A voz deu um riso amargo, Stan não sabia que Craig nunca havia estado na Freddy Fazbear naquele horário, talvez ele fosse somente o mecânico mesmo. Então por que ele havia lhe avisado outro dia para não trabalhar ali, agindo como se soubesse?

"Eu sempre vou preferir o designer dos Toys, mas os antigos tem uma historia interessante... Antes deles terem sido desligados definitivamente da pizzaria, três meses depois do desaparecimento daquelas crianças, além de os problemas com a vigilância sanitária, os bonecos animatrônicos pareciam estar com um tipo de e-erro no computador interno... As vezes eles falavam palavras, frases, que n-não estavam em suas programações... Parece coisa de filme, não é? Robôs agindo independentemente dos humanos, inacreditável."

Completamente inacreditável, Stan só considerava chances disso ser verdade pelo fato dos animatrônicos saírem andando de noite para tentar entrar em sua sala. Pelas câmeras viu que Toy Bonnie já havia deixado o palco e agora se encontrava parado no corredor da área dos funcionários, encarando a câmera. O moreno sentiu um arrepio subir sua espinha, não era de frio, o aquecedor estava ligado.

"Os que mais demonstraram esse erro foram Freddy e Chica... Através de brigas. Sim, brigas sutis, mas preocupantes no ponto de vista dos funcionários na época, isso sem falar no quanto eles agiam estranho perto de qualquer adulto... Enfim, Freddy costumava interromper Chica quando ela falava com frases programadas e as vezes aleatórias, era engraçado principalmente quando o timbre das vozes também mudava. A 'segunda voz' da Chica, nas raras ocasiões que apareceu, era sem duvidas a mais estranha e hilária! Eles funcionaram até bastante tempo nesse estado, a administração da Freddy Fazbear era incompetente se comparado com a atual."

Stan precisou concordar, mas não prestava muita atenção, Toy Chica sem seu bico estava agachada perto de um tubo de ventilação, perto do chão, sem grade. Uma possibilidade assustadora passou pela sua mente, mas felizmente as grades das tubulações na sala estavam muito bem parafusadas. Perguntou-se por um momento se aqueles robôs possuíam força suficiente para arrebentar a grade, tinha esperança que não.

"Tudo terminou definitivamente quando a família Black comprou os direitos da empresas a alguns anos, e por todo esse tempo a pizzaria nunca esteve melhor, eu digo isso com certeza pois já trabalhei ai até mesmo na época do Fredbear's Family Diner. Os Toys são claramente melhores, mas posso admitir ao menos aqui que eles não tem o mesmo carisma que os antigos tiveram nos últimos meses de funcionamento, se ignorarmos o cheiro e os líquidos suspeitos que saiam deles. Acredite, eu vi isso pessoalmente."

Era bastante estranho que o homem do telefone tivesse gravado tudo isso apenas para lhe informar, mas não reclamaria.

"Não esqueça das câmeras, preste atenção nos corredores e lembre-se de economizar energia. Boa sorte."

— Vou precisar...

Sussurrou para ninguém em especial depois de beber um gole do café, mas quase engasgou quando escutou os passos metálicos no corredor esquerdo e, sem fazer questão de ver qual dos robôs era, fechou imediatamente a porta. Sentiu o coração acelerar pela a adrenalina quando viu, no tablet, todos os Toys fora do palco e o antigo Bonnie de pé no meio da sala de manutenção com os dois pontos vermelhos no rosto acesos, encarando a câmera. Puta merda, pensou, engoliu com dificuldade a saliva e decidiu que não gostava de nenhuma das duas versões do animatrônico coelho, ambos eram assustadores os mais assustadores de todos na sua opinião.

Mudou para a câmera da cova do pirata e se deparou com as cortinas totalmente abertas, sem o Foxy onde ele deveria estar, então começou a procurar o robô pelos locais e teve tempo de ve-lo se aproximar por um dos corredores. Poucos segundos depois de fechar a porta ainda aberta escutou batidas, reprimiu um grito, foi impossível não se assustar. Apertou a tela do aparelho eletrônico em mãos, eram duas da madrugada e a energia ja estava em setenta e quatro por cento, em seguida abriu ambas as portas, precisava economizar naquela noite.

Um sopro na orelha de Stan o fez se arrepiar completamente, ouviu uma voz conhecida, uma voz que escutara poucas vezes em sua vidas e mesmo assim era inconfundível.

Você precisa nos ajudar Stan, só você pode fazer isso...

A voz era de Kenny ou estava mesmo ficando louco?

~*~*~

Observando superficialmente a pizzaria parecia estar vazia e escura, não havia um único som além de o zumbido de algumas maquinas ligadas e os passos do robôs. Qualquer um que visse o lugar assim jamais imaginaria as atrocidades que aconteceram entre aquelas paredes, o sangue de inocentes que fora derramado por algum tipo de prazer doentio e sádico, dos crimes imperdoáveis que ficaram sem justiça. Ninguém jamais imaginou que existia um assassino se escondendo naquele meio, que esse assassino mataria as inocentes crianças pelo insano prazer de matar e como ele ficaria impune por isso.

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Ao observar mais atentamente, ou melhor, escutando mais atentamente pode-se perceber sussurros, lamentos, vozes raivosas e choros de todos aqueles que tiveram suas vidas ceifadas ali pelo cruel assassino. Suas almas ainda estavam na pizzaria, perdidas, vagando sem esperança. Havia um tipo de desejo louco, uma necessidade beirando a existencial, de vingança cravada naquelas pobres almas. Elas descansariam em paz somente e se somente o assassino pagasse por cada um dos seus graves pecados.

Porém, quem era o assassino?

Como era o seu rosto?

O nome?

As almas não se lembravam, o assassino usou covardemente uma máscara enquanto lhes matou. Entretanto havia uma única coisa marcante e inesquecível nele, um par de incomuns e artificiais olhos vermelhos. Então as crianças se agarraram naquela única pista, e por ela iriam conseguir a tão almejada vingança para, finalmente, serem livres.

Mas elas não conseguiram sua vingança sozinhas, as almas não tinham a presença necessária no mundo dos vivos e elas precisavam de alguém que tivesse.

Até que Stan reapareceu e as almas se lembraram de quem ele era, da época que ele era uma criança e brincava com Kyle, Kenny, Eric e Butters, quando todos estavam vivos.

As almas decidiram, Stan precisava ajudar, só ele poderia fazer isso. Entre todos os outros, somente ele havia visto o rosto do cúmplice do assassino na noite da matança.

Toda aquela obscura história de assassinato aconteceu na Pizzaria Freddy Fazbear, e por mais que anos e anos tivessem passado, a marca do que ocorreu dificilmente desapareceria. Os possuidores de ouvidos mais sagazes escutariam as vozes das crianças mortas, os mais observadores enxergariam as cicatrizes terríveis no lugar e apenas os fortes não iriam ignorar cada um daqueles sinais.