And please don't stand so close to me
I'm having trouble breathing
I'm afraid of what you'll see right now

"Distance" - Christina Perri (Feat. Jason Mraz)

Sarah Reese

—Oi Jessica
Jessica era a garotinha mais linda que eu já tinha visto. Com os cachinhos louros emoldurando o rostinho de anjo, com grandes olhos verdes, ela sorria mesmo cheia de aparelhos em sua volta. Os pais estavam ambos ao seu lado.
— Oi. - ela me disse com a vozinha cansada - Tia pega meu ursinho?
Ela me apontou um urso marrom colocado na poltrona. Era comum termos um bichinho de estimação como objeto transitório na infância. Eu tive um cobertor que a minha mãe ainda guardava.
— Não entendo o porque da presença da Dra Reese aqui- Eu ouvi a mãe perguntar ao Dr Rhodes.
— Podemos conversar um minutinho? - Ele disse a ambos - Jessica você faz companhia pra Dra Reese? - Ele perguntou sorrindo com ternura para a garotinha e piscando de um jeito fofo que fez a menina sorrir e balançar a cabeça. Ele tinha jeito com os pacientes, e já havia ganhado aquela garotinha.
— Então Jessica o que você gosta de fazer? - eu perguntei sorrindo e lhe dando o ursinho.
— Gosto de brincar com o Ted em casa. - ela disse devagar.
— Sabe eu também tinha muitos bichinhos de pelúcia quando tinha a sua idade.
— E você ainda tem? - ela me disse enquanto segurava o bichinho entre os braços.
— Sim na minha casa.
— Mamãe e papai não gostam de bichinhos - ela me disse com uma carinha de tristeza. Não era difícil imaginar como alguns pais não suportavam animais em casa. A válvula de escape acabava sendo um brinquedo ou um passa tempo.
— Os meus também... - foi de repente que aconteceu e os aparelhos começaram a apitar. Ela estava tendo uma parada. Eu não pensei. Apenas posicionei a cama para a posição normal e acionei o botão de emergência enquanto começava com os movimentos, com delicadeza, com receio de quebrar algo. Eu me lembrava angustiada do primeiro caso de emergência que peguei no meu 4º ano de medicina. Eu sentia o panico começar a querer vir novamente a tona e respirei profundamente me ordenando calma. Aquela garotinha ainda tinha a vida toda pela frente.
— Reese 1mg de epinefrina - Dr Rhodes e um bocado de enfermeiros entraram no pequeno quarto e ele assumindo a ressuscitação - Ajuste a 100 joules.
Eu apertei as mãos e passei a ele o desfibrilador.
— Dra Reese assuma o ritmo. - Ele me olhou seriamente parecendo me ler, repreendendo-me com o olhar.
Finalmente após algumas tentativas conseguimos fazer com que o coraçãozinho de Jessica finalmente voltasse a um ritmo estável. Eu me senti gelar quando Dr Rhodes me pediu para acompanha-lo até a sala dele. Quantas vezes aquelas cenas iriam se repetir?
— Não pode hesitar Reese - Ele me disse sério e eu ouvi o que provavelmente seria um sermão. Eu havia me metido onde não deveria sendo residente da psiquiatria. - Podia ter custado a vida da garotinha.

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— Eu não hesitei. - eu me defendi firmemente. Eu tinha dificuldade com crianças, e por um segundo engoli em seco pensando que talvez eu devesse continuar na psiquiatria. Era tranquilo e eu não precisaria me preocupar em encontrar uma criança cuja vida estivesse nas minhas mãos. Será que eu havia de fato hesitado? Culpa era um sentimento que devíamos evitar de sentir nessa profissão. O nosso fracasso quase sempre independia de nossas vontades.
— Certo. - Ele me olhou e eu me senti de repente exposta, como se ele pudesse de fato enxergar o que eu sentia. - Há algo de errado?
— Não Dr Rhodes. Se me der licença - Senti de repente uma necessidade de sair dali. Eu precisava de uns minutos sozinha para me acalmar, para raciocinar, antes que deixasse que meu emocional viesse a tona ali. Eu não precisava da pena dele. Ou da irritação.
— Dra Reese - Ele me parou segurando meu braço. O toque firme e quente da sua mão mesmo por cima do jaleco enviou uma onda de arrepio pelo meu corpo. Eu me enrijeci surpresa e com medo do que aquilo vinha me causando. Me virei e me senti presa pelos olhos atentos que me encaravam. Ele tinha olhos de uma cor azul cristalina, como o céu límpido da cidade, Connor parecia ver todo o meu ser... Toda a irritação passou sendo substituída por um sentimento que me fazia cativa, quente e segura...
"Ele tem uma namorada Sarah! E você também." Eu me desvencilhei de Connor, embaraçada com essa situação.
— Nos encontramos na sala da Sra Goodwin. - Eu disse o mais firme que consegui e sai.

Connor Rhodes

— Connor?
Eu poderia reconhecer a voz sorridente de Robin as minhas costas. Não era fácil as vezes trabalhar com um envolvimento romântico. As vezes se tornava difícil raciocinar com clareza, eu já sabia que isso seria um tanto quanto inevitável com colega de trabalho. Me peguei lembrando de Sara. Era adorável a maneira como ela sempre ruborizava quando falávamos, ela tinha mais força do que as vezes achava ser real. Eu já havia visto aquela expressão de desafio no rosto dela em pessoas determinadas, soldados que não tinham medo de enfrentar uma batalha. O medo não a fazia retroceder, dava impulso pra seguir em frente.
— Sim querida? - Eu instiguei sabendo que era aquilo que ela queria ouvir.
— Precisamos conversar - ela pôs as mãos no jaleco e sorriu nervosa.
— Sou todo ouvidos. - Sorri para ela tentando adivinhar o motivo para que ela estivesse ali.
Robin gostava de manter a privacidade dela, e eu respeitava. Dormíamos em nossas casas, era fácil conviver com ela. O que fazia me sentir culpado por pensar na residente do pai dela. A verdade é que eu começava a reparar mais em Sara desde aquele encontro no Molly's. Eu não sabia da amizade dela com Erin e Jay.
— Podemos conversar mais tarde? - Ela disse e eu concordei.- Podemos ir jantar? - ela disse sem surpresas e eu assenti.
— Preciso ir querida - eu disse roubando um selinho dela.

Sarah Reese

— Dr Charles?
Havia se passado meia hora que eu tinha saído da sala do Dr Rhodes e tinha ido ali falar com ele antes de ir pro escritório de Sharon Goodwin. Eu acabava de ser bipada para ir até lá.
— Podemos ir conversando - ele disse se levantando e saindo comigo para o elevador. - E então o que você achou?
— Eu não observei muito. A garotinha teve uma parada - Eu havia passado rapidamente na UTI e visto que ela continuava sedada mas estável. - Não acho que ela resista muito tempo porem.
— E os pais?
— O pouco que eu vi eles se importam com a filha. - Não havia tempo suficiente para fazer mais que isso. A garotinha iria morrer se os pais não aceitassem uma cirurgia.
— É estranho Dra Reese os mecanismos de defesa que o ser humano desenvolveu. Os pais com receio daquelas que podem ajudar. Mas me diga com tantos escândalos e noticias ruins quem pode culpa-los?
Dr Charles disse e eu concordei.
— Acredito que o hospital deve fazer algo, mas isso implicaria o conselho tutelar também.
— Sabe Dra Reese - ele disse parando próximo a sala da diretoria. - A parte ruim do nosso trabalho é que há casos em que não podemos fazer nada.
Eu entendia o que ele queria dizer, já tendo visto aquilo acontecer outras vezes.
— Dr Chales, Dra Reese por favor se sentem.
A Sra Goodwin nos convidou a ocupar nossos lugares na mesa com Dr Rhodes, Os Florence, um homem que pelo que vi era advogado deles, o Dr Andrew advogado do hospital e ela.
— Senhores Florence o Dr Rhodes diz que vocês se recusam a autorizar um procedimento cirúrgico necessário para salvar a vida da filha de vocês.
— Isso é o que ele diz - O Senhor Florence se pronunciou irritado - Eu e minha esposa consultamos um outro médico que disse que Jessica precisaria de mais avaliações para determinar a necessidade de uma cirurgia. Ela é muito pequena. A cirurgia é um risco que pode ser desnecessário.
— A sua filha esta morrendo - Dr Rhodes disse calmo. Eu podia sentir o perigo que cada palavra sua denotava, contendo a censura que não podíamos demonstrar. O rosto sério encarando os dois.
— Dr Charles? - Goodwin questionou o Dr Chales prática.
— A Dra Reese acompanhou-os - ele me indicou - O hospital pode tomar como bem sabem os advogados a decisão de pedir na justiça a custódia médica em favor da garotinha, tendo em vista que quem recusa o tratamento são os responsáveis e não o paciente que corre risco de vida.
— Dra Reese concorda?
Eu olhei para os pais que me lançavam olhares furiosos.
— Bom. Eu acredito que os dois queiram o melhor para Jessica, mas vocês deveriam considerar o estado dela. E confiar no Dr Rhodes. - Eu me dirigi aos dois me forçando a ser objetiva - Sra Goodwin os pais gostam da filha, mas acredito que eles estão negligenciando a vida da filha em favor do que eles acham ser o melhor. Eu estava presente quando ela teve aquela parada. - Os Florence estavam determinados e o advogado cochichava algo para Patrick Florence - Ela não vai aguentar uma transferência de Hospital instável como está.
— Bem, Senhor e Senhora Florence eu pedirei ao Senhor Andrews que entre com uma ação contra vocês dois no juizado de menores pedindo que seja retirada de vocês a custódia médica de Jessica por entender que a vida da garotinha esta em jogo. E acionaremos o conselho tutelar.
— Ela é nossa filha - Gail disse as lagrimas - Não podem tirar nosso direito.
— Vocês vão se arrepender disso - Patrick disse se levantando e levando sua esposa e o advogado deles da sala.
— É uma pena que pensem isso - Connor censurou.
Esperava que o hospital ganhasse aquela batalha contra os dois.
— Fez um bom trabalho Dra Reese - Connor me disse quando sai da sala.
— Espero que aquela garotinha possa continuar a viver.
Estávamos os dois indo em direção ao elevador.
— Sim. Pais como aqueles me deixam furioso. Pensam que podem jogar com a vida dos filhos.
Havia raiva nas suas palavras. O que me fazia lembrar vagamente que ouvi a muito tempo que ele e a família não se davam bem.
— O pior de tudo é que eles acreditam que estão agindo pelo bem dela.
— Bem, vamos ver como está Jessica.
Entramos na UTI pediátrica do hospital e Dr Rhodes foi em direção a estação de enfermagem pegar o prontuário. Não eram permitidas visitas aquele horário de modo que apenas a mãe estava ali do lado de fora observando a filha.
Jessica estava sedada ainda. Parei ao lado de Gail e observei-a pelo vidro. Ela parecia uma boneca de porcelana dormindo. Connor verificava os aparelhos e anotava no prontuário dela algo. Pelo que eu via ela parecia estável.
— Você acha que como psiquiatra pode me julgar. Mas você não entende-nos. Eu e meu marido já perdemos mais dois filhos antes de Jessica. Morreram numa sala de cirurgia.
Fui pega de surpresa pelas palavras daquela mãe.
— Eu sinto muito. Mas Jessica tem ótimas chances de ter uma vida normal após o procedimento. - Eu assegurei. - Sua filha vai ser operada por dois excelentes médicos.
— A vida é Dom de Deus - Gail disse sem me olhar. Observei a sua expressão abatida e triste ao observar a filha - Tenho medo de perde-la.
— Como seus filhos faleceram? - Eu perguntei.
— Eram gêmeos. Natimortos. Dois anos antes de termos Jessica.
— O que tem que fazer é ter fé - Eu não podia garantir que ela sobreviveria - É a melhor chance dela. Acho que você e seu marido precisam conversar sobre isso. Se quiserem posso pedir ao Dr Charles que converse...
— Nós não precisamos de análise.
— Claro. - Eu disse me afastando. Me sentia impotente, mas a decisão era deles.
— Já vi muitos desses. - Uma enfermeira com ascendência oriental e já de meia idade me disse. Acho que ela trabalhava na cardiologia.
— Infelizmente não podemos obrigar os dois.
— Beth conhece a Doutora Reese? - Connor havia se aproximado de nós e eu mal havia notado.
— Já nos vimos antes pelo hospital.
— Então vamos nos preparar, vai acompanhar o procedimento de Jessica Doutora Reese.
— Como é? - Eu estava confusa. - Acredito que não seja necessário...
— Já foi conversado. Você assistira o procedimento. - eu observei Beth sorrir com simpatia - Beth ajude-a a se preparar.

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Eu estava surpresa. Depois do que Connor havia me dito e como havia soado irritado comigo, participar de uma cirurgia era a ultima coisa que esperaria.
— Se anime. - Beth me disse quando ele saiu. - Ele é um bom professor.
— Eu sou residente de psiquiatria Beth.
— Quem sabe futuramente não se anima para área cirúrgica?