Undead Revolution

Grandes Problemas


Localização: Posto de gasolina nos subúrbios

4 dias após o Surto.


Germany e Sam correram em direção à caminhonete, o walkie-talkie apertado com força nas mãos do menino. A voz de Red desaparecera junto com o sutil ruído, indicando que ela não mais se comunicava com eles. A morena tentou chamá-la novamente pelo aparelho, mas não obteve sucesso – isso apenas intensificou a sensação gélida em seu estômago.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Road, problemas! – Proferiu a garota, se aproximando da caminhonete.

– É, e dos grandes. – Respondeu Road, largando a mangueira da bomba de combustível. – Eu consegui ouvir a conversa.

– Será que dá tempo de chegarmos antes dos zumbis? – Perguntou Sam, enquanto sentava rapidamente no banco traseiro da Ford Ranger.

– Só tem um jeito de saber. – O ruivo entrou com violência no veículo, já dando a partida conforme Germany batia a porta do banco do carona. – Vocês dois estão armados?

Ela assentiu positivamente, mostrando o revólver no shorts e a espingarda que repousava a seus pés. Sam engoliu em seco e desviou os olhos para o bastão de críquete e um pequeno punhal caído no tapete do assento ao lado.

– Sam. – Chamou Germany, virando-se para ele. – Você fica no carro, não importa o que aconteça, está bem?

– O quê? Mas por quê? – O menino levantou os olhos arregalados para ela.

– Você não acha mesmo que vai sair por aí matando zumbis, né, garoto? – Manifestou-se Road, manobrando o veículo apressadamente.

O menino primeiramente soltou um muxoxo de descontento, mas logo agradeceu mentalmente por ficar escondido – não sabia como reagiria se precisasse matar zumbis que aparecessem em sua frente, ainda mais se eram dezenas deles. Os poucos que encontrara no dia anterior já foram assustadores o suficiente para o garoto decidir que não seria nada agradável ficar perto deles, especialmente para enfrentá-los.

A caminhonete partiu do posto de gasolina com um rugir de pneus e acelerou violentamente em direção ao mercado. Conforme os três passageiros se aproximavam do cemitério de carros à frente do 7-Eleven, adentrava em seu campo de visão o grupo de zumbis que se aproximavam lenta e gradativamente. Puderam ver que se tratava de um número assustadoramente grande deles.

– São... tantos. – Balbuciou Sam, se encolhendo no assento.

– Isso tudo tá acontecendo tão rápido. – Suspirou Germany, pesarosa.

– Rápido demais. – Disse Road, com os dedos cravados ao volante e o cenho franzido em tensão.

Um novo bipe chamou a atenção dos três. O menino baixou os olhos para suas mãos e pôde ver a pequena luz do walkie-talkie brilhando novamente.

– A Red tá tentando falar de novo!

– Dá aqui pra mim, garoto! – Pediu o ruivo, esticando a mão por trás de seu ombro. O menino obedeceu prontamente, entregando o dispositivo para ele, que logo apertou o botão pequeno e pôs-se a falar no aparelho. – Red, me...

– - Road! – Interrompeu a voz da garota, esta pouco mais que um sussurro. – Road, escuta, mudança de planos! Fiquem aí onde estão.

– O quê? Lógico que não. – Respondeu o rapaz, ríspido. – Estamos indo praí ajudar vocês!

– - Não precisamos de ajuda, estamos escondidos! Os zumbis ainda estão longe e acho que sequer vão olhar pro mercado quando se aproximarem. Então é só esperarmos a horda se afastar para fugirmos!

– Aquele é o Hollywood? – Interrompeu Germany, levantando uma sobrancelha enquanto observava o loiro cruzar a estrada com velocidade, carregando o machado em mãos e se escondendo embaixo de um dos carros abandonados.

– O que aquele idiota tá fazendo?

– - É uma ótima pergunta. – Red soltou um suspiro. – De qualquer forma, é bom a gente se esconder!

– Não vamos enfrentá-los, então? – Voltou a falar o ruivo, na direção do walkie-talkie, e agora desacelerando a caminhonete.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– - Lógico que não! Tem milhares deles, não daremos conta. – Desta vez foi a voz de Molotov, ligeiramente mais distante, que se fez ouvir pelo aparelho.

– M-milhares? – Sam estremeceu-se por inteiro.

Road subitamente deu uma freada brusca na caminhonete, arremessando os corpos de Germany e do menino para frente devido à inércia. A garota olhou assustada para o rapaz, que agora se soltava do cinto de segurança.

– Muito bem, então. Red, estamos parados perto do cemitério de carros. – Disse ele, sem desgrudar os olhos verdes dos zumbis que se aproximavam metros à frente. – Eles ainda não nos viram, os desgraçados nem devem ter percebido a Ranger em movimento.

– Road, o que está fazendo? – Perguntou a morena, franzindo o cenho.

– Fiquem aí, mana. Nós também vamos nos esconder. Se precisar, é só chamar no walkie-talkie, vou deixá-lo com a Germany.

– - O-ok... tomem cuidado. – Disse a ruiva, e cortou a transmissão.

– Road!

– Vocês dois, fiquem aqui. – O ruivo repousou a mão na maçaneta da porta. Entregou o aparelho para a garota. – Fique com isso, Ger. Nós vamos esperar eles irem embora.

– E você vai ficar aonde?

– Na caçamba.

– Você tá louco?! – Ela se exaltou, enquanto o rapaz descia rapidamente do veículo. – Eles vão te ver ali!

– Se me verem vão receber uma bela duma bala na cabeça. – O rapaz levantou o rifle Winchester com um sorriso sombrio no rosto. – Assim que todos passarem voltaremos para o mercado e buscaremos os outros.

– Mas...

– Só não façam nenhum barulho, está bem? – Road desviou o olhar para Sam, que assentiu freneticamente com a cabeça. – Eu aviso quando estiver seguro para sairmos.

Dito isso, o rapaz fechou a porta do carro antes que a garota pudesse retrucar. Correu para a caçamba, pulando a beirada com rapidez e se deitou em meio às sacolas, malas e galões de combustível. Germany fitou a porta do motorista por uns instantes e arqueou as sobrancelhas. Deslizou para baixo no assento, tentando manter-se o menos visível possível para quem estivesse ao lado de fora, enquanto Sam deitava-se no banco, agarrado ao bastão de críquete, e com uma das mãos tapando sua boca, tentando abafar o barulho de sua respiração.

Após alguns segundos calada e imóvel, a morena esticou a cabeça, procurando avistar alguma coisa por cima do porta-luvas. Os mortos cambaleavam ainda a muitos metros à frente, então provavelmente os três teriam de ficar ali, escondidos, por um bom tempo, até todos chegarem onde estavam e passarem. A ideia da caminhonete ser circundada por seres irracionais, infectados e violentos fez a garota arfar brevemente e pedir mentalmente por forças e proteção.

– Ger. – A voz trêmula de Sam a sobressaltou, apesar de não passar de um sussurro.

– Oi, Sam.

– Eu... eu tô com medo...

– Eu também, querido. – Respondeu ela, remexendo-se no banco para olhar o menino e lançar um sorriso abatido para ele. – Mas vamos sair dessa, ok? Em último caso, quero que você saia da caminhonete e corra bastante.

– T-tudo bem... acho que posso fazer isso.

A garota sorriu novamente. Voltou a encostar-se no estofado, ainda encolhida no banco, com a espingarda apoiada em suas pernas e o walkie-talkie repousando em seu colo. Ela sabia que ficar ali era extremamente arriscado, mas não tinham outra opção; se tentassem chegar ao 7-Eleven a chance de serem vistos pelas dúzias de mortos-vivos eram bem maiores... então ela suspirou, conformada. Voltou às suas preces silenciosas, cerrando os olhos com força e escutando apenas a respiração ruidosa do menino no banco de trás.



Localização: Mercado 7-Eleven

4 dias após o Surto.


Red Rock se encontrava sentada no chão frio da loja, encostada em uma das prateleiras de salgadinhos e bolachas e com os joelhos prostrados para cima, próximos de seu corpo franzino. Segurava o revólver com as mãos trêmulas e apoiadas em seu colo, um de seus dedos já próximo do gatilho. Seu coração não havia desacelerado um minuto sequer desde a notícia dada por Molotov - quando o rapaz adentrou o mercado com um semblante aterrorizado, avisando aos outros dois que eles logo teriam a companhia de dezenas de mortos-vivos vindos de Coparo Hills.

O moreno não estava menos tenso do que a garota. Rangia os dentes constantemente e empunhava a espingarda com tamanha força que a cor dos nós de seus dedos havia sumido. Estava sentado com as costas na parede abaixo de uma das janelas quebradas. Virava ligeiramente sua cabeça vez e outra para espiar a estrada pela abertura, mas logo se encolhia novamente, por medo de alguém vê-lo ali. Trocava constantemente olhares assustados com Red, que se encontrava à sua frente, a uns dois metros de distância, e parcialmente visível pelo pequeno corredor principal da loja.

– Molotov! – Chamou ela, aos sussurros. – É melhor sair daí, alguém... algum pode te ver!

– Não vão me ver, Red. – Respondeu ele, esgueirando-se por baixo da janela e observando o cenário lá fora. – Só estou aqui para o caso de alguma coisa acontecer com o maldito do Hollywood e eu precisar atirar mais de perto.

– O que ele tem na cabeça, afinal, pra ir pra lá? – Bufou a garota, espichando o pescoço para tentar enxergar o carro no qual o loiro havia se escondido.

– Olha, não faço ideia. – Molotov voltou a repousar as costas na parede. – Só espero que ele não tente fazer nada ainda maisidiota.

A ruiva concordou silenciosamente e suspirou, temerosa. Desviou os olhos para o canto próximo da entrada da loja, vendo a enorme quantidade de sacolas cheias de mantimentos e objetos coletados ali, assim como uma das mochilas e o binóculo que Molotov encontrara. Não poderiam esquecer aquelas coisas, senão todo o esforço seria em vão – mas a garota pôs-se a pensar se realmente teriam tempo de pegar todas as sacolas caso precisassem encarar os mortos-vivos. Um arrepio incômodo se instalou em sua espinha.



Localização: Estrada nos subúrbios

4 dias após o Surto.


Hollywood, assim que ouviu a notícia de Molotov sobre aproximação da horda de mortos-vivos, pôs-se logo a correr para a estrada com o machado em uma das mãos e o revólver na outra. Ignorando os protestos dos outros jovens, o loiro saiu do 7-Eleven com rapidez e se aproximou de um Toyota preto parado do outro lado da estrada, tratando de logo se esconder embaixo do veículo. Após finalmente recuperar seu fôlego e conseguir se ajeitar adequadamente, com a arma a postos e o machado colado ao corpo, que ele realmente parou para refletir sobre o que acabara de fazer, tentando convencer-se de que não fora tão estúpido assim.

Sua intenção era ter uma visão mais privilegiada da horda, tanto para atacá-la, se fosse necessário, quanto para avisar seus amigos se havia sobrado algum morto-vivo retardatário. Porém, pretendia, em último caso, estar preparado para atrair os zumbis no intuito de proteger os que estavam no mercado; a visão de Molotov e - especialmente - Red Rock presos num lugar cercado de dezenas de zumbis sanguinários lhe provocou calafrios na espinha.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Depois de deitado no asfalto quente por alguns segundos que se deu conta que havia saído correndo imprudentemente pela estrada, e que poderia ter atraído olhares mortos para si. Porém, para sua breve felicidade, nenhum dos zumbis pareceu ter-lhe avistado, já que estes continuavam a se aproximar alheia e vagarosamente. Como estava de costas para a horda, o rapaz pôde ter visão da Ford Ranger que acabara de estacionar bruscamente metros à sua frente, com Road descendo do banco do motorista segundos depois e correndo para a caçamba com o rifle nas mãos. O loiro suspirou em alívio, ao ver que eles também aguardariam escondidos.

Desviou a cabeça ligeiramente para trás e viu que os mortos se aproximavam. Logo os primeiros começariam a passar por ali, pelo 7-Eleven e pelos lados do Toyota, desatentos aos dois escondidos no mercado e a ele. Pelo menos era isso o que o rapaz pedia fervorosamente; que todos passassem sem resolverem darem uma espiada em baixo dos veículos ou dentro das construções. Como eles não pareciam dotados de qualquer tipo de raciocínio, imaginou que não seriam espertos o suficiente para procurar minuciosamente por comida - apesar de já terem sido seres pensantes em algum momento de suas existências. Era isso o que mais intrigava o rapaz: como as criaturas mais racionais do planeta poderiam se tornar cascas vazias, tão inteligentes quanto uma pedra, de maneira tão brusca? A única coisa a qual ele tinha certeza é que eles seguiam seus instintos, pelo menos os ligados à fome e à sede - estas relacionadas ao canibalismo, outro fator que o incomodava deveras.

Refletiu sobre como eles se comportavam como carnívoros quaisquer. Era como se tivessem regredido na escala evolutiva e não se tornado muito diferentes de mamíferos comedores de carne que estivessem em uma época de escassez de comida, resultando na caça e deglutição dos mais fracos do bando - estes, no caso, os humanos ainda vivos. Porém, lembrou-se de que não se tratavam de organismos vivos, eram apenas carne putrefata e sacos de ossos ambulantes, com os corações parados e os cérebros perecidos. Compará-los ao restante dos animais era, no mínimo, ofensivo à mãe-natureza; e eles com certeza não pareciam obra dela.

Por fim, só conseguiu concluir que a passagem transcendental da vida para a morte parecia crucial para aquela mudança tão significativa; mas o como permanecia um mistério. Tratou de espantar os pensamentos filosóficos, tentando focar-se apenas em como ele e seus amigos escapariam daquela situação delicada e extremamente perigosa. Uma falha sequer seria fatal para todos – especialmente para ele, no local menos propício para se proteger.

Logo viu um par de pernas cambaleando ao lado do carro, bem próximas do seu rosto, e se sobressaltou, arregalando os olhos. As pernas rapidamente sumiram de seu campo de visão, mas ele permaneceu com uma mão cobrindo sua boca - precisava manter-se calado o máximo possível, não sabia o quão sensível eram os ouvidos daquelas criaturas. Agradeceu mentalmente por não estar sangrando; caso o estivesse e eles possuíssem o olfato apurado, ele estaria perdido. Mais um par de pernas, e mais outro. Todos marchando sofregamente pelo asfalto; alguns descalços, exibindo pés acinzentados e purulentos, outros com sapatos empoeirados e manchados de sangue. Mais ao fundo pôde ver mais deles caminhando próximos da entrada do mercado.

Dezenas, milhares se arrastavam pela estrada, alguns mais rapidamente, outros com esforço, devido a ossos quebrados ou cortes profundos pelo corpo. Eram tantos que o loiro logo se confundiu com a quantidade de pernas que atravessavam por seus dois lados e que a cada segundo se multiplicavam, deixando rastros vermelhos por onde passavam e grunhidos aterrorizantes no ar. O cheiro ferroso de sangue tornou-se insuportável e causou fortes enjôos no rapaz, que ainda cobria, inutilmente, a região do nariz e da boca com uma das mãos.

Pôde ver que alguns deles já se aproximavam da Ford Ranger. Não pareciam nada interessados no cemitério de carros e muito menos no 7-Eleven, para alívio do rapaz. Assustou-se mais algumas vezes graças aos gritos que alguns emitiam para o céu ensolarado - pareciam ter adquirido uma forma terrivelmente macabra de se comunicarem entre si.

Dois agora rodeavam a Ford Ranger. Provavelmente não viram Road deitado na caçamba, já que ainda não expressaram nenhum interesse pelo veículo. Os três na caminhonete ainda estavam a salvo. Hollywood desviou os olhos arregalados para a sua direita, a fim de focalizar o 7-Eleven que tremeluzia devido ao calor escaldante que emanava do asfalto.

Pôde ver um homem alto, mais alto do que Molotov, se dirigindo para a entrada do estabelecimento, se deslocando da passeata de zumbis. A massa de pernas que passavam à sua frente dificultou a visão daquele morto em particular, mas o loiro conseguia identificá-lo vez e outra graças à blusa de um vermelho-vivo que vestia – uma mistura de sangue à cor original da vestimenta. Aquele homem emitiu alguns grunhidos e adentrou sozinho o 7-Eleven com passos moribundos. Hollywood prendeu a respiração involuntariamente.



Localização: Mercado 7-Eleven

4 dias após o Surto.


Molotov tinha as mãos agarradas à espingarda e os olhos arregalados colados na figura que subitamente adentrara a loja e sobressaltara a ele e a Red. A ruiva arfou baixinho e mordeu com tamanha força o lábio inferior que sentiu o característico gosto de sangue invadir sua garganta. Encarou o alto zumbi que começava a vagar pela loja. Era como se procurasse alguma coisa lá dentro, inconscientemente e com os olhos vazios. Dirigia-se para a extrema esquerda do estabelecimento, ainda alheio ao rapaz vivo encostado na parede abaixo da janela - rapaz este que podia facilmente adentrar seu campo de visão.

Red apontou as portas fechadas ao fim da loja, com a cabeça, para Molotov, mas este devolveu um olhar repreensivo para ela – fique onde está diziam os orbes castanhos claros. A menina escancarou os lábios, incrédula, e logo passou a desviar constantemente os olhos repletos de medo do rapaz para o morto-vivo. O moreno, ignorando o fitar desesperado da ruiva, passou a se deslocar muito vagarosamente para a direita, ainda com as costas coladas à parede, na direção contrária onde se encontrava o moribundo que babava e grunhia para os balcões dos caixas.

Molotov se arrastava com dificuldade, temeroso em ser avistado pelos zumbis que também passavam lá fora. Resolveu, então, se deitar com as costas para o chão frio, já com a espingarda apontada para o homem morto de dentro da loja, e passou a arrastar-se para trás apenas com a força das pernas. A sola de seu tênis soltou uns dois esganiçados ruídos quando em contato com o piso liso, e foi o suficiente para o zumbi parar instantaneamente o que fazia e erguer a cabeça. O moreno parou subitamente, apenas encarando as costas rasgadas do homem a poucos metros à sua frente. O zumbi permaneceu imóvel por longos segundos, como se tentando se certificar de que não fora apenas os barulhos que ele próprio fazia ecoando pelo seu crânio oco.

A ruiva sentiu algumas lágrimas escorrerem por seu rosto. Desviou os olhos para a janela quebrada e pôde ver aquela massa morta ambulante se descolando em conjunto para sabia-se lá Deus onde. Qualquer rebuliço a mais no 7-Eleven seria o suficiente para chamar a atenção de todas aquelas pessoas ensanguentadas. Engoliu em seco e resolveu ignorar o aviso de Molotov, também passando a se movimentar para longe do zumbi que estava ali dentro. Como este continuava estático, resolveu engatinhar rapidamente pela extensão daquele corredor onde estava, tentando se dirigir às portas que ficavam no canto do estabelecimento – eram a única chance de real abrigo para ela e Molotov. Diversas pragas e maldições circulavam por sua mente enquanto ela se movia, sempre olhando para trás tentando identificar se o morto-vivo a seguia.

Chegou no outro pequeno corredor formado entre outras prateleiras. Viu Molotov deitado no chão, mirando o zumbi inerte. O rapaz logo devolveu o olhar à garota, esta de gatinhas no chão, o revólver repousando abaixo de uma de suas mãos, o walkie-talkie no bolso da frente de seus shorts e os cabelos alaranjados caindo em seu rosto. Os dois trocaram olhares apavorados e Red logo apontou as portas fechadas novamente. O rapaz negou com a cabeça e voltou a mirar o zumbi. “Vamos, seu idiota!”, pensou ela, cerrando os olhos e os dentes em desespero.

Assim que voltou a olhar Molotov, pôde ver que uma garotinha japonesa a encarava do lado de fora da loja, pela abertura da janela que ficava acima do rapaz. A menina tinha o rosto, antes delicado, desfigurado por um enorme e aberto corte que ia do alto de sua bochecha até seu queixo pequeno. Os cabelos lisos e de uma negritude intensa estavam bagunçados, os fios parcialmente grudados em algumas porções das madeixas, como se aderidos entre si graças a sangue ou suor. Os grandes e injetados olhos castanhos da menina fizeram Red arrepiar-se por inteira e sentir um doloroso pavor em seu estômago.

Então a menininha gritou. Foi um grito estridente que pareceu ecoar por todo o estabelecimento e pela estrada repleta de mortos-vivos, também chamando a atenção de Hollywood e dos outros que estavam escondidos da Ford Ranger. O quase grito sobressaltou a ruiva e Molotov, que ergueu os olhos arregalados para cima e viu parcialmente a menina zumbi. Esta continuava a grunhir e chamar por seus companheiros mortos, avisando da existência de carne fresca a poucos metros de distância. O homem que já estava no 7-Eleven pareceu sair de seu transe e se virou rapidamente para onde estava o moreno, também se unindo à sinfonia de grunhidos guturais.

Molotov pôs-se rapidamente de pé ao ver que a menina tentava escalar a abertura da janela para pegar o rapaz, sem se importar com os pequenos cacos de vidro que cortavam suas mãos pequenas e acinzentadas. Ele viu que mais zumbis se aproximavam do 7-Eleven, todos com as mãos prostradas em garras e os lábios famintos escancarados. Alguns continuavam a se arrastar para a estrada, ainda alheios ao que acontecia, como se surdos aos chamados ou apenas conformados por saberem que não conseguiriam alguns pedaços da refeição para si. Ainda assim, a visão das dezenas que se dirigiam ao mercado foi o suficiente para o sangue de Molotov gelar.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

O zumbi alto tentava caminhar rapidamente em direção do rapaz, mas parecia incapacitado graças a seus pés todos retalhados. Red soltou um esganiçado arfar e também se pôs em pé, mirando com as mãos trêmulas o homem que se aproximava de seu amigo. Por fim, apertou o gatilho e o som do tiro repercutiu tanto quanto o grunhido da menina morta-viva. Molotov permaneceu estático, com os olhos arregalados ainda colados nas figuras da estrada; estas subitamente pararam, como se brevemente atentas ao tiro, mas logo recobraram sua caminhada em direção ao mercado. O morto que antes ameaçava o moreno caiu com um baque no chão, um buraco de bala formado na altura de seu peito.

– Red, corre! – Foi tudo o que Molotov proferiu, antes de começar a atirar naqueles que tentavam escalar o buraco da janela quebrada.

A ruiva encarou a cena por alguns instantes - todos aqueles corpos moribundos caindo inertes aos montes, um em cima do outro, enquanto o rapaz desferia balas furiosas em todos eles, dando passos para trás a cada novo tiro. Os olhos dela rapidamente vagaram pela estrada à frente e ela identificou o esconderijo de Hollywood, o Toyota preto agora totalmente ignorado pelos mortos vivos atiçados. O loiro a encarava de volta com olhos igualmente aterrorizados. Alguns ruídos a desprenderam do fitar desolado do rapaz, e a garota pôde ver alguns zumbis adentrando o 7-Eleven pela porta aberta. Numa fração momentânea de coragem, Red ergueu a pistola e passou atirar nestes.

Tendo se livrado sofregamente dos três ou quatro que ameaçavam entrar no mercado, a garota cravou os dedos na camiseta de Molotov e puxou o moreno com força em direção a si. O rapaz, confuso, cessou os tiros para encará-la. Ela continuou a puxá-lo e eles logo se encontravam à frente de uma das portas fechadas do fim da loja. Finalmente cedendo à vontade da ruiva, Molotov voltou a atirar nas pessoas moribundas e ensanguentadas, que agora adentravam em massa o lugar, para dar cobertura à garota que girava a maçaneta com violência.

– Puta merda, puta merda, puta merda! – A voz de Red tremia tanto quantos seus dedos longos. Ela passou a jogar seu corpo franzino contra a porta que aparentava emperrada à parede. – Abre logo, seu pedaço inútil de madeira!

– Vai logo, Red! – Gritou Molotov, praguejando para si mesmo quando alguns tiros não acertavam seus alvos. Apesar de cravar muitas balas com sucesso nos zumbis, ainda não tinha tanta facilidade para tanto, errando diversas vezes – também graças a seus braços que tremiam violentamente.

A porta finalmente cedeu e, com mais um empurrão, a ruiva conseguiu abri-la totalmente. Adentrou o apertado banheiro seguida de Molotov, que ainda apertava o gatilho, derrubando os mortos que estavam mais à sua frente. A garota conseguiu fechar a porta com um violento baque segundos antes de uma mão acinzentada agarrar o rapaz. Girou o pequeno trinco, na esperança dele ser suficiente para segurar os mortos famintos do lado de fora.

Os dois jovens se encararam por alguns segundos, arfando alto e em uníssono, ambos tremendo violentamente. Red ficou com as costas coladas à porta e Molotov abaixou a espingarda, sentindo grossas gotas de suor escorrer por sua testa e pescoço retesados. A garota subitamente soltou um grito agudo, virando a cabeça para a porta atrás de si ao sentir arranhadas e empurrões na madeira, promovidos pelos mortos furiosos. Ela então, pôs-se a chorar, ainda de costas na madeira, e fechando os punhos trêmulos.

O moreno fitou a garota por alguns instantes e também sentiu o desespero abater-se em seu peito. Então chacoalhou a cabeça. Não podia perder o restante de coragem e sanidade que ainda possuía. Rapidamente passou a pensar em algum plano para saírem dali com vida. Virou-se para a parede contrária e viu uma pequena janela de vidro - parecia ligeiramente apertada, mas era larga o suficiente para Red conseguir passar por ela. Antes um deles se salvar do que os dois serem condenados ali.

– Molotov! – A voz esganiçada da ruiva, embargada pelas lágrimas, sobressaltou o rapaz. – Eles estão t-tentando entrar! Oh, meu Deus!

Ele correu em direção à porta, também se escorando na madeira para tentar evitar a entrada indesejada dos zumbis. Estes não pareciam estar conseguindo pôr a porta a baixo, mas o moreno temeu que, se continuassem tentando por mais algum tempo, teriam sucesso. Logo baixou os olhos para a ruiva chorosa e viu o walkie-talkie caído aos pés dela. Com um abaixar rápido, sacou o aparelho e pôs-se a falar, tentando se comunicar com os sobreviventes da Ford Ranger.

Mas o dispositivo não parecia funcionar. O rapaz apertava o pequeno botão, mas nenhuma luz acendia e nenhum ruído característico saía das pequenas aberturas de som para avisar que estas estavam sintonizadas. Perdendo mais um fio de sanidade, o rapaz urrou uma maldição, assustando Red, e afundou um dos dedos com violência no aparelho. Uma fraca luz vermelha piscou brevemente e ele arregalou os olhos.

– T-tá funcionando! – Disse a ruiva, soltando mais um grito após sentir novas arranhadas e ouvir mais grunhidos. – Fala, rápido!

– Germany! Germany, tá me ouvindo? – Chamou o rapaz no walkie-talkie, mas recebendo apenas o silêncio em resposta. – Caralho! Ger, pode me ouvir?

Molotov permaneceu gritando palavras ao léu, tentando comunicar-se com Germany, mas não obtendo sucesso. Ela, Road e Sam provavelmente já estavam cientes do que acontecia no 7-Eleven e talvez já estivessem enfrentando os zumbis que ainda estavam na estrada, assim como Hollywood. Estavam todos ocupados, não conseguiriam vir ao resgate dele e de Red sem antes passar pela população morta do lado de fora do mercado. A ruiva escorregou pela porta, sentando-se no chão frio, mas ainda pressionada na madeira, tentando inutilmente conter os zumbis junto do moreno.

A garota chorava abertamente, rogando pragas furiosas vez e outra. Molotov voltou a encarar a pequena janela do banheiro. Red sairia por ali, tinha que conseguir sair por ali, assim surpreenderia os zumbis do lado de fora e ajudaria os outros. Eles só tinham aquela opção e teriam de prender-se a ela rapidamente, já que os muitos mortos-vivos do outro lado da porta continuavam enlouquecidos tentando capturar suas presas. O rapaz suspirou e franziu o cenho. “Agora ou nunca”.