Um Herói Ainda Não Perdido

Capítulo III, Annabeth: Uma Vida Inteira Com Ele


Desliguei o celular e comecei a ouvir o som das buzinas. As ruas já estavam movimentadas, independentemente da hora. Fora assim a noite toda, provavelmente seria a manhã inteira. Manhattan. A cidade nunca para mesmo! Da janela conseguia enxergar bastante gente na rua, muitos correndo, muitos no celular, grande parte bem arrumada. Era raro de se ver um mortal que não usasse um aparelho eletrônico e que andasse sem pressa, sem esbarrar nos outros, sem olhar para o relógio. Dei uma olhada geral no quarto com uma careta. Não era exatamente o hotel em que eu gostaria de estar antes que as aulas começassem, mas era tudo o que e conseguia pagar com a ajuda de meu pai. Um hotel antigo e barato no meio do Upper West Side era o melhor que eu tinha conseguido. Os mais bonitos, com ruas iluminadas e atrações dia e noite geralmente ficavam em Downtown e perto da Broadway, mas extremamente caros. Os lugares como Greenwich Village, Little Italy e Soho, que ficavam mais abaixo junto com boa parte dos cidadãos que tentavam loucamente fugir dos turistas, ainda sim pesavam no bolso. Havia o Harlem, mas aí já era muito distante da minha rotina de todos os dias, e não compensava não gastar no hotel para gastar com taxis. O mais estranho era que a cidade em si não era extremamente cara. Era fácil de se economizar com comida e pequenas coisas, porém é só o local ficar perto do parque que aí pula dos oitos para os oitentas. Então aqui estava eu, quase grudada no rio, lutando para pagar a um hotel que nem servia café da manhã e quase nunca tinha água quente, do lado completamente oposto ao do meu namorado.

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Percy. Pensei, triste. Minhas últimas noites também não tinham sido para lá de boas, mas os pesadelos dele sempre me preocupavam. Não me interessava o fato de eu estar em um deles, aquilo poderia ser muito bem fruto da cabeça dele.

Mordi os lábios. Não, na verdade não tinha muita certeza, mas essa era a única resposta no momento. Só de pensar no medo e no sofrimento que deveriam ter causado a ele durante esses dias já me criavam sérias dúvidas sobre ir vê-lo o mais rápido possível ou esperar algo mais prudente. Ele não teria me ligado se não achasse que era algo sério e se não o estivesse desgastando. Por mais triste que fosse, ele não me colocaria em risco a esse ponto. O nosso próprio encontro já seria arriscado. Como seria possível manter a minha promessa dessa forma?

Algo começou a se formar na minha mente quando um homem louco deu um pulo e gritou algo parecido com “Vazem da minha frente! Olha a hora imbecil!” correndo com extrema rapidez, empurrando metade de Manhattan e quase sendo atropelado por vários taxistas alucinados. Olhei para o relógio, ele estava em cima do criado mudo do lado do móvel que o dono do hotel chama de cama, e provavelmente dei um pulo alguns centímetros mais altos que o do homem. Quase oito horas?!

Penteei rapidamente os cabelos e escovei os dentes. Juntei correndo as coisas, que joguei dentro de uma pequena bolsa atravessada, tirei o laptop da mesinha do lado da janela (já que o modelo de Dédalo carregava através de luz solar) e saí correndo em direção à rua.

(...)

Embora eu já estivesse atrasada, não podia me dar ao luxo de usar taxis a todo instante, mas isso não me incomodava exatamente. Gostava de andar por ali. Era como sair todos os dias de casa e se encontrar num lugar completamente novo, completamente diferente. A cidade parecia mudar do dia para noite, adquirindo novos ânimos aos moradores, novas atrações, cores e luzes, como um museu a céu aberto. Impossível de se ficar entediado.

Tudo ao meu redor fazia-me lembrar de Percy. As pessoas desatentas, energéticas, felizes com o monte de atividades que realizariam no dia. Era tudo exatamente como ele sempre tinha me dito. Não que eu nunca tenha vindo à Nova York, já vim para diversos Conselhos dos Olimpianos durante os solstícios e utilizamos a própria ilha como campo de batalha, mas nunca fiquei tanto tempo. Não tanto quanto pretendo ficar agora. O tempo de uma vida inteira com ele.

Parei na entrada do parque, tocando as bochechas que estavam se abrindo em um largo sorriso que provavelmente mais parecia uma careta. Uma vida inteira. Pensei. Com ele ao meu lado. Corei pensando no assunto. Isso tudo era melhor do que eu imaginava! Passei cinco anos pensando e odiando o dia em que eu teria que lhe dizer adeus, o dia que a batalha o tiraria de mim, o dia que a profecia se realizasse. Ninguém conseguiria imaginar um final diferente, e com o passar dos tempos o fim parecia tão próximo e as coisas tão complicadas, não só para ele como para mim, que se tornara mais fácil esconder meus sentimentos, meus medos de perdê-lo, as palavras não dita s do que correr o risco de sofrer para sempre, com uma culpa dolorosa, sonhos perdidos e uma saudade eterna. Seria mais fácil para ele também. Todos nós sabíamos o defeito dele, de ser fiel demais aos amigos. Ele poderia colocar em risco toda a guerra por minha causa, coisa que Cronos quase o obrigou a fazer. Eu teria feito o mesmo por ele. Mas é claro que ele não sabia, da mesma forma que ele também não sabia do hotel em que estou morando. Ou talvez até saiba que eu o amo o bastante, mas tenha medo de perguntar em voz alta, ouvir o que não quer e tomar as providencias erradas. Era isso o que teria acontecido durante a guerra, caso eu tivesse lhe contado. Mas então, depois de tudo o que passamos, de quase morrermos em cada encrenca que nos metemos, de eu perceber que preferia morrer esfaqueada e envenenada a vê-lo morrer sozinho e me deixar aqui, nós sobrevivemos. Os dois.

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Forcei-me a continuar andando, afinal estava atrasada, mas não conseguia tirar o sorriso do rosto! Parecia uma dessas criancinhas que andam pulando na ponta dos pés, porém ninguém me olhava de modo crítico. O parque era lindo, havia muita gente fazendo sua ginástica matinal, estudantes de diversos colégios faziam o mesmo percurso que eu, provavelmente com a mesma ideia.

Mesmo preocupada com a hora, sentei-me num banquinho virado para uma árvore e comecei a observá-los. Muitos deles tinham a minha idade. Andavam em grupo, sozinhos, mandando mensagens, em cima de bicicletas ou skates. Devia ter muitos deles nas ruas também, já que com dezesseis pode-se dirigir. Iam em todas as direções com as mochilas apoiadas em um só ombro, mas com roupas, penteados e estilos diferentes. Escola. Senti uma pontinha de ciúmes. Estava presa naquele hotel nojento porque meu internato tinha algumas estátuas estúpidas que decidiram se juntar para a festinha de Cronos e inevitavelmente destruíram parte do colégio. Não sei que desculpa eles conseguiram inventar para os destroços causados e pelas estátuas sumidas, provavelmente culparam algum aluno encrenqueiro que, caso eu ou o Percy estivéssemos matriculados, seriamos nós. Percy. Ela ficaria pronta em pouco tempo, mas até lá... E se ele descobrisse?

Bufei, um pouco inconformada com minha falta de sorte, abri a bolsa e busquei no meio da bagunça de livros e papéis uma caneta e um caderninho. Em um momento de pura distração, cravei os dentes na caneta e olhei para árvore que estava à minha frente. Em poucos minutos tinha feito um rabisco bem aceitável dela. Ergui as sobrancelhas de modo crítico ao rascunho. Um garoto que devia ter uns dezessete anos parou na minha frente com um sorriso torto no rosto.

- Belo desenho. Você tem... traços muito bonitos – Ele disse dando uma piscadinha com um olho e voltando ao grupo de amigos que continuavam a sua trajetória. Não tirando os olhos de mim, ele deu uma risada quando minha expressão crítica voltou-se para ele. Então o garoto-que-não-sabe-com-quem-se-meteu virou-se para os colegas dando um gole no refrigerante de lata que carregava nas mãos.

Um sorriso maldoso surgiu em meus lábios, juntei minhas coisas e levantei com pressa do banquinho, correndo em direção ao grupo. Acelerei o passo quando cheguei perto do garoto e esbarrei nele com tudo. PLAFT!

- Mas que...! – o sorriso torto já tinha desaparecido de seu rosto, suas orelhas demonstravam uma estranha tonalidade vermelha.

- Nossa! Me desculpe. – disse, forçando a simpatia e a culpa – Acho que não te vi, estava meio distraída...

Tentava freneticamente limpar a roupa encharcada do rapaz com o desenho que ainda estava na minha mão, fazendo o máximo para esconder a risada.

- Distraída... – ele respondeu, não fazendo o mesmo esforço que eu para disfarçar sua raiva.

- Pois é. Estou atrasada para um compromisso e fiquei um pouco desatenta depois de um comentário que eu ouvi. – Comecei a esfregar a cara dele com o papel. – Acho que o idiota que fez não tinha ideia que isso fosse acontecer com você.

Parei de limpá-lo por um momento para checar sua expressão, não conseguindo mais esconder o sorriso. A cara arrogante lhe caia muito bem.

- Que azar o meu. – completou ele secamente.

- Acho que sim. – Olhei para o desenho da árvore, que agora estava meio amassado e com manchas de Coca-Cola, com uma careta. Fiz uma bola de papel – Agora ele não presta mais. Pode ficar para você, já que gostou tanto.

Joguei a bola no seu rosto e segui meu caminho. Quando eu vi que ele estava a ponto de se recuperar do choque e reagir aos meus desaforos, girei os calcanhares e exclamei:

- A propósito, eu já tenho alguém para elogiar os meus desenhos. Você deveria tentar outra cantada. Mais sorte na próxima. – Acenei rindo e continuei andando, deixando-o indignado e pingando enquanto seus amigos gargalhavam sem parar.

(...)

Demorou um pouco mais do que imaginava, mas finalmente cheguei a umas das construções mais bonitas já feitas no mundo. Se você nunca viu ainda ao vivo e em cores o edifício tente apenas imaginar o que eu estou falando, pois quem já viu me entende. Talvez você fique um pouco decepcionado com a entrada do prédio, já que ele é cercado por lojas e espaços comerciais, mas o design e a vista lá de cima...

Esfreguei o suor da testa, tenho que desesperadamente pedir para o Cabeça de Alga me explicar como não se perder naquele parque! Os mapas não ajudam em nada, e eu tenho mais do que certeza de que ele também vai ter que me ensinar muitas mais coisas sobre essa cidade...

Sorri. Eu queria muito mesmo que ele me ensinasse tudo isso! Teríamos o nosso tempo. Talvez eu não tenha que aprender como lidar com as pessoas, porque aquele desenho certamente fez valer o atraso.

Entrei apressada no Empire State Building, pedi a chave ao porteiro e entrei no elevador já apertando o botão. Poucos segundos depois lá estava ele. O Olimpo. Bem, quase isso. Ele estava bem destruído, para falar a verdade. Com colunas caídas, mármore espalhado por todo lado, a passagem pela qual eu quase caí antes do Percy me segurar ainda estava sendo reconstruída. Mesmo assim era lindo. Templos gregos, o céu azul e nele várias nebulae, ninfas das nuvens, voavam apressadamente com materiais de trabalho. Os deuses pareciam ser os únicos seres na cidade que andavam com calma, sem gritar com ninguém, sem interesse em nada ao seu redor. Muitos deles caminhavam no meio dos destroços com seus próprios afazeres, deuses menores eram vistos com mais frequência, embora vez ou outra já esbarrara com alguns dos doze olimpianos. Às vezes acontecia de um deus surgir do nada no meio do pavilhão, provavelmente estava enganando algum mortal tolo e criando mais semideuses corajosos para que, no caso de uma grande guerra, possam salvar suas peles novamente.

A carranca retornou em minha cara. Eu gostava de estar fazendo aquilo, desenhando edifícios, construindo algo permanente, algo como a casa dos deuses, mas esse comportamento folgado deles as vezes me tirava do sério. Muitos me parabenizavam pela vitória, mandavam agradecimentos ao Percy, mas outros simplesmente agiam como se nada tivesse acontecido e não fosse dever deles ajudar em nada.

Sacudi a cabeça e andei até um pequeno jardim que ficava ao lado da escadaria que levava ao templo principal, onde os deuses se reuniam para discutir o que fazer com seus pobres súditos que estavam presos abaixo deles, sem desconfiar de nada. Uma nebulae agitada mergulhou a meu encontro.

- Annabeth!

- Oi, Messy. – disse um pouco envergonhada, ela devia estar me esperando. – Desculpe o atraso, a cidade está...

- Uma loucura! Os mortais não sabem em que acreditar diante dos últimos acontecimentos, muitas estátuas ainda sumidas, a ponte... Ó céus! – exclamou ela, com uma cara deprimida. – Devem estar pensando que foi um atentado... Mas esqueça isso! Temos muitas coisas a fazer. Você trouxe os meus desenhos?

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- Meus desenhos – ela deu de ombros, não parecia ofendida. – Trouxe, sim. Aqui estão algumas ideias, fiz também uns esquemas pelo laptop de Dédalo para mostrar como ficarão...

- Perfeito! – ela os tomou da minha mão. – Não temos tempo a perder. Já mandei uma equipe de pégasus levarem os materiais pesados até o local onde será construído o bufê de saldas,...

Fiquei apenas lá, parada e de olhos arregalados enquanto aquela figura tremeluzente e de cabelos brancos ia recitando todos os meus deveres do dia, ideias e todas as coisas que ela já tinha feito sem a minha permissão. Não me levem a mau. Messy era legal e tal, muito prestativa e obediente, não pensava duas vezes antes de realizar o meu pedido e era superpontual. Mas muitas vezes usava essa organização toda para realizar tarefas sem me consultar para manter tudo no prazo, além de ser extremamente e agitada. Fazia com o melhor das intenções, claro, mas ainda assim... Percy diz que ela só está tentando me impressionar, mostrar que ela está disposta a qualquer momento para me ajudar. Ele me fez prometer que eu faria o possível para demonstrar orgulho pelo o seu trabalho e não a criticaria por seus momentos irritantes, que eram muitos. Estou dando o meu máximo para cumprir a promessa e lutando bravamente para não pular no pescoço dela e descobrir se nebulaes dissolvem ou não diante de extremo contato físico. Ultimamente ando resistindo bem aos seus momentos de loucura, portanto respirei bem fundo antes de responder:

- Nossa, você realmente andou ocupada, não? – disse rindo – Obrigada por tudo mesmo. Você tem se esforçado muito! Tenho sorte de te ter na minha equipe.

Seus olhos brilharam enquanto ela abria um grande sorriso orgulhoso.

- Não, não. Só estou fazendo o meu trabalho, sabe? – disse ela, sem jeito diante ao elogio. – Eu é que estou tendo a honra de trabalhar ao seu lado!

Retribuí o sorriso, mas também um pouco sem jeito, pois não esperava o gesto.

- Oh, acabo de me lembrar, - ela continuou para acabar com o momento estranho – acabaram de levantar aquela estátua caída da Rainha Hera, como eu os informei. – disse mais lentamente, com a mesma expressão, mas certamente escolhendo bem as suas palavras. – Agora estamos novamente dentro do prazo!

Ela deu palmas para si mesmas aos pulos e só parou quando analisou melhor a minha cara. Praguejei em silencio e prometi a mim mesma que pensaria duas vezes antes de prometer algo a Percy a partir de agora. Não tinha jurado nada para ele sob o rio Estige, então não podia garantir a ninguém a saúde daquela criatura. Cerrei os dentes:

- A estátua que atingiu Thália? A que era, supostamente, para me acertar? – A expressão de Messy dissolveu-se e ela ficou um pouco constrangida, talvez assustada.

- Eu...

Minha raiva toda explodiu, mas de alguma forma milagrosa, manejei controlar a voz, de modo que, ao invés de um grito seguido por vários barulhos de socos e sons engasgados, saísse apenas um som seco e firme do fundo da minha garganta, demonstrando real e controlada fúria:

- Você devia ter jogado os restos daquela estátua estúpida no Tártaro para apodrecer. Se a Rainha Hera quisesse o pedaço de mármore de pé, – falei duramente para Messy, que ainda estava paralisada – ela que a levantasse.

Um trovão explodiu no céu. Olhei para cima, enquanto o último rastro de luz cruzava as nuvens. Eu tive a intenção de dizer tudo aquilo, ela podia reclamar o quanto quisesse.

Suspirei, ainda bem nervosa. Fechei o punho e voltei a olhar para Messy. Seu rosto tornou-se sombrio, os olhos estavam bem arregalados, me encarando de modo trêmulo. A boca semiaberta não encontrava palavras para pronunciar. Ela havia trazido os braços bem colados no peito, ou muito surpresa ou tremendamente assustada com os futuros raios que, provavelmente, viriam a cair em nossas cabeças.

Sua forma tremeluzia, como se estivesse pronta para desaparecer. Engoli seco:

- Pode voltar a fazer o seu trabalho. – eu disse por fim, sem mudar a expressão. – Nos veremos mais tarde.

Saí batendo os pés contra um tapete de nuvens fofas, o que deve ter sido uma imagem meio esquisita. Andei até o ponto mais longe que pude. Longe de Messy, longe dos deuses, das estátuas, dos problemas.

(...)

Parei quando me vi isolada de tudo e de todos, num terraço a céu aberto, com piso de pedra, colunas quebradas de mármores e nelas trepadeiras verdíssimas crescendo e se contorcendo numa dança emaranhada. O cheiro de uvas infestava o ar e pequenas estátuas de cupido de bronze apontavam suas flechas para mim.

Debrucei-me de leve no parapeito de pedra e suspirei. No meio de véus de nuvem era possível ver pedaços do Central Park e do resto da cidade. Suavizei a expressão, que se transformou em uma mistura de tristeza e cansaço. Voltei a olhar para trás, pousando os olhos em uma das flechas apontadas para mim onde um Eros de metal olhava de modo divertidamente malicioso em minha direção, como se seguisse meus passos. Chequei o perímetro, que encontrava-se completamente vazio.

Duas vezes. Pensei. No mesmo dia. Não era correto, muito menos inteligente. Mas era como se eu precisasse ouvi-lo, só mais uma vez, saber que ele estava bem, que se lembrava de mim. Dizer que sentia sua falta e ouvir o mesmo do outro lado da linha. Saber que ele ainda estava lá para mim, e eu para ele. Dizer eu te amo de novo.

Engoli seco. Abri a pequena bolsa atravessada e busquei meu celular. Encaixei-o em minhas mãos, pensando novamente no meu próximo ato. Em resposta, apenas mordi o lábio sorri de leve, com o canto da boca.

Comecei a discar os números com cuidado. Uma brisa leve e gelada soprava em meus ouvidos. Estava prestes a apertar o próximo botão quando ouvi um som quase tão frio e suave quanto o vento:

- Você não merece sofrer de amor, querida. – A voz dançava em minha cabeça. – Não merece sofrer por ele.

Um arrepio correu por todo o meu corpo. Desliguei rapidamente o celular e me virei flexionando as sobrancelhas, desafiando quem pronunciou aquelas palavras.

Minha mãe estava parada bem atrás de mim. Seus olhos cinzentos tinham a mesma expressão que os meus.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.