-Portanto, ficarei na sua casa por tempo indeterminado, mulher.

A frase ecoou por todo o seu corpo. Ulquiorra ficaria em sua casa, em sua casa. Estava tão estática que nem se moveu para acompanhá-lo até o segundo quarto.

-Por tempo indeterminado...

Repetiu pra si mesma, em um sussurro.

Ela pousou dois travesseiros na cama.

-Bem, aqui estão as suas coisas. Geralmente esse quarto serve só pra quando Tatsuki-chan vem dormir aqui, mas você pode ficar o tempo que quiser.

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Em cima da cama tinham os travesseiros, um edredom e Ulquiorra sentado. Olhava pela janela, dando a impressão a Orihime de que ele não escutava nada. Mas ela continuava tagarelando.

-O banheiro é no final do corredor. Hm, er... o meu quarto... fica no mesmo corredor... Se, hm, precisar de alguma coisa...

Não queria ter soado tão dada, mas foi o que saiu. Suspirou e se virou, andando até a porta e colocando a mão na maçaneta, virando-se para Ulquiorra e sorrindo de orelha à orelha, desejando-lhe boa noite. Saiu e fechou a porta atrás de si, soltando o ar preso nos pulmões. Enterrou o rosto nas mãos e caminhou em direção ao seu quarto, entrando e fechando a porta.

...

Orihime não conseguira pregar o olho a noite toda, tanto por saber que um Espada poderia desintegrar sua casa em segundos, tanto por Ulquiorra estar dormindo num quarto ao lado do seu. Tinha certeza de que ele não faria nada de ruim a ela, mas ele era do campo inimigo, tinha – por mais que não achasse necessário – que tomar cuidado, ainda mais por saber do que ele é capaz.

Quando o sol bateu em sua janela e o vento da manhã soprou as cortinas de seu quarto, resolveu levantar. Morria de fome e, mesmo sem a certeza dele comer, deveria ser hospitaleira e preparar algo para Ulquiorra, certo?

Calçou os chinelos e rumou o banheiro, sem encarando no espelho. Tinha visita, mas não deixava de estar em sua casa, portanto, sairia de pijama mesmo. Penteou os cabelos e prendeu-os em um coque alto, lavando o rosto e escovando os dentes.

Quando finalmente saiu do quarto, encarou a porta do cômodo onde o Espada havia dormido. Estava entreaberta. Sentiu-se levemente tentada a espiar.

Será que ele estava acordado?

Aliás, ele dorme?

Ah, Orihime, como pode cogitar uma besteira dessas, espiar a privacidade alheia?

Mas ela estava tão perto da porta, e só uma espiada seria o bastante pra responder suas perguntas anteriores.

Se abaixou e olhou para dentro. Garantiu-se em fazer menos barulho e respirar mais baixo conforme chegava mais perto.

Não tinha ninguém deitado.

Aliás, o quarto parecia vazio, sem ruído algum.

Franziu a testa e se aproximou ainda mais, encostando as pontas dos dedos na porta e abrindo-a um pouco mais.

E então, a porta abriu tão rapidamente que seus cabelos que caiam no rosto voaram para trás. Orihime petrificou à frente do corpo de Ulquiorra, sem saber o que fazer, apenas vermelha.

-O que está fazendo?

Levantou os olhos e o viu parado a sua frente, com uma das mãos no bolso da calça jeans e outra na maçaneta, encarando-a com a mesma seriedade de sempre.

-U-U-Ulquiorra-kun! Desculpe, eu só estava abaixada procurando um... um...

Pensar rápido não era algo característico de Orihime.

-Procurando meu brinco! Veja só, ele caiu, quer me ajud-

Começou a tatear o chão, de olhos esbugalhados e rezando para que a desculpa esfarrapada colasse.

-Você está usando os dois brincos.

-É OUTRO! VAMOS COZINHAR? VAMOS ENTÃO.

Orihime deu um pulo e logo já estava de pé, correndo em direção à cozinha, abandonando Ulquiorra no corredor junto com a atmosfera constrangedora que aparentemente só ela havia sentido.

Se apoiou no balcão da cozinha, acalmando o coração depois da situação constrangedora que passara.

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Olhou para trás e viu Ulquiorra encostado na parede atrás de si, encarando-a. Orihime se virou pra ele e sentiu a bancada nas costas, convencendo-se de que teria que se acostumar com o silencio de Ulquiorra se quisesse que ele ficasse.

Se virou novamente e abriu a geladeira, começando a retirar os ingredientes para o almoço.

Deveria puxar conversa? Queria conversar com ele, mas não sabia o que falar. Ulquiorra quase sempre a deixava sem reação ou sem qualquer deixa para uma resposta. Porém não gostava de silêncio.

-Como vai fazer para achar o Espada?

Pegou uma faca e começou a cortar os legumes.

-Ele não é muito sutil, não vai ser muito difícil.

Orihime parou de cortar os legumes por uma fração de segundo.

Se não será muito difícil, ele passaria menos tempo ainda aqui.

-Ah, sim.

-Espero que o encontre antes de seus companheiros chegarem.

Orihime sorriu e balançou a faca de um lado para o outro, imprudentemente, em vista de ser tão desastrada.

-Ah, quanto a isso, nem precisa se preocupar! Tatsuki-chan e Sado-kun viajaram com o resto dos meus amigos da escola para passar o ano novo longe, a Kuchiki-san está na Soul Society com o... Kurosaki-kun...

Ainda achava triste Ichigo não voltar no Natal. Ignorava o motivo egoísta para isso e se concentrava em dizer que o motivo era Yuzu e sua família, quando na verdade era por que sentia falta dele.

-Eu ficaria sozinha esse tempo todo se você não tivesse aparecido.

Ulquiorra prestava atenção nas suas palavras, embora não conseguisse sentir o teor emocional na ultima frase solta pela jovem. Orihime estava grata por ele ter aparecido; acalmara seu coração e ainda por cima não ficaria sozinha pelo menos uma parte do tempo que ficaria antes.

Uma imagem de Ulquiorra com um gorro de Papai Noel na cabeça sentado perto de uma árvore de Natal apareceu na cabeça da garota. Sacudiu-a discretamente, afastando o pensamento com um sutil riso.

Percebeu que a conversa havia morrido desde sua última fala.

Não tentou restabelecê-la; se calou e cozinho o almoço todo em silêncio, com Ulquiorra às suas costas.

No final, só ela comeu. Ulquiorra se sentou em frente à TV e permaneceu lá até ela acabar de comer e tirar a mesa.

Olhou de relance para Ulquiorra sentado no sofá, assistindo a um filme de ação. Ele parecia tão estranhamente normal e familiar. Como um irmão. Não parecia um arrankar que poderia matá-lo tão facilmente quanto respirar. Parecia quase um humano, ainda mais com aquele gigai.

Esse pensamento lhe ocorreu outro. Já havia se questionado antes se Ulquiorra não sentia por opção ou se ele de fato não sentia nada. Ele sempre mostrou indiferença quanto a certas coisas que faziam Orihime chorar fácil, como dor. Nunca o vira sorrir. Nunca o vira corar de vergonha.

Ulquiorra percebeu seu olhar esquivado nele e olhou para Orihime. Essa se virou totalmente para frente, sentindo o sangue subir para a cabeça e esquentar, secando o prato com mais rapidez. Perguntou-se se ele estaria corado também. Não tinha coragem de olhar de novo.

Mesmo sendo um pouco anti-social, Orihime ainda achava que para ela seria fácil se acostumar com ele ali, sentado no seu sofá, tranqüilo. Parecia loucura, até mesmo depois de como ela já o viu, em sua ressurrecíon tão assustadora, mas ele lhe transmitia segurança. Com ele perto, não temia nem mesmo esse Espada que passou por sua casa.

A única coisa que a perturbava era aquilo. Aquilo que crescia a cada dia dentro do seu peito mesmo antes de saber que ele estava vivo. Aquilo que sufocava qualquer outra coisa dentro de si. Oras, se mesmo antes de vê-lo vivo aquilo que ela ainda não sabe o nome era tão vivido e presente, imagine agora e depois, acordando e dando de cara com aquele par de olhos verdes? Ameaçava tomar conta de si.

Passou a mão pelos cabelos que soltaram. Pousou o prato e prendeu o cabelo de novo, dando um passo para trás e esbarrando em algo.

Em alguém.

-Não fique tão distante.

Segurou-a pelos cotovelos. Orihime gelou dos pés à cabeça, seu coração batia tão rápido que parecia sair do peito. Estava tão perto, suas mãos a tocavam e ela sentia sua face tão quente que parecia febre.

-Fica vulnerável, fácil de atacar.

Sussurrou em seu ouvido.

Ela tinha certeza de que ele não fazia de propósito, mas não deixara de fazê-la se arrepiar. Sua visão periférica ainda via seu rosto perto do seu, deixando-a mais nervosa ainda.

-Não quero ter que proteger você de algo evitável.