Aquarela

Cansei de conter o avanço da caneta...

Cansei de segura-la longe do papel...

Pensei em desenha-la em aquarela...

Pensei já ter pintado o céu...

Nuvens negras borram a pintura,

Esqueça-se dessas cores, são todas lúdicas.

O roteiro dessa obra ainda configura

Incerteza sólida e verdade crua.

Há tempos pedi pelo clamor que traz a chuva...

Somos escrituras rúnicas, somos água mole,

Que continua a séculos gotejando em pedra dura.

Será que um dia ela venha a rachar?

Será que um dia os mares venham a acalmar?

Escolhi o verde para pintar a grama,

E o amarelo para explorar a fama

Do sol.

De negro pintei o rouxinol que canta sobre a árvore marrom.

Tela em branco, linhas vazias.

Letras tortas, tintas não vívidas.

Falta-me cor, falta-me sabor...

Se posso ir atrás da primazia da vida,

Talvez consiga achar sentido nessa folha em branco...

Só não sei se aquelas chuvas secarão o pranto.

Preferia escutar seus doces sons em mais uma canção,

Sujeita aos débeis assovios daquele rouxinol.

Tomo em mão a aquarela; tintas claras, escuras e belas...

Posso recita-la verde como grama de colina,

Ou alveja-las com o azul do céu profundo.

Entrego o amarelo do sol soturno,

E o vermelho do sangue em sina.

Cada tom de rosa é cor de vida,

Mas o branco ainda me desanima.

Vejo negro rondear às nuvens por cima,

E laranja no horizonte ímpar.

Quero o peculiar dos dias cinza,

E o marrom do barro em linha.

Cansei do arco-íris em minha folha,

Cansei de visão psicodélica e afoita.

Pensei em descansar os olhos na janela,

Olhando realidade monocromática fora da aquarela.

~Gabriel.