Um olhar mais atento a permitiu ver que não era apenas um gigante, mas dezenas deles. Dezenas. Monstros com mais de seis metros de altura, esculpidos em pedra fria e negra, com feições rudes, mãos rudes, pés rudes... Parecia que uma própria montanha tinha levantado da terra, viva, adquirido braços, pernas e algo similar a um rosto, e então começara a se mover. Ao longe, uma voz lenta e profunda, de mulher, ecoou:

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“Exércitos, se preparem. Começaremos nossa invasão.”- a voz parecia surreal, como se viesse de um outro mundo ou de camadas profundas do subconsciente; de um sonho. Causava medo, aflição e terror. Lara estremeceu. “Onde estou?” Então os gigantes começaram a se mover. No instante em que um deles veio em sua direção, Lara correu e saltou para o lado, escondendo-se em uma saliência de rocha. Para sua surpresa, a pedra era “quente”. Quente como se lava passasse por ali. Quente como se pulsasse, emanando um calor próprio, vindo de seu interior. Como se estivesse “viva”.

“Maldição”. Afastou-se lentamente da pedra, como se temesse acordá-la. Um pé, depois o outro. A terra tremeu, oscilou e rachou. Primeiro um racho fino, que depois foi se alargando, alargando... A alguns metros notou que mais terra rachava, quebrava, estralava e subia. Não tinha tempo para correr e sair de cima do gigante. A criatura já estava se levantando.

Agarrou, com toda força, uma ponta da rocha e ficou ajoelhada, subindo, subindo e subindo no ombro de uma muralha de pedras que se mexia, rosnava, bufava e emergia, soltando-se da terra, tomando forma. Primeiro um rosto disforme, lábios grossos, olhos profundos, negros, vazios; depois ombros largos, braços compridos, e, por fim as pernas. “Não olhe para baixo” pensou, com urgência. Sabia que se olhasse, o medo e o pânico a consumiriam. Concentrou-se em manter a respiração regular e ficou bem quieta, na esperança de que a criatura não a notasse ali. De repente, o “chão” oscilou sobre seus pés, inclinando-se para trás, e ela foi arremessada. “Estou caindo” pensou. Seus pés derraparam pelo ombro do gigante, e, milagrosamente, sua mão direita conseguiu agarrar uma pequena protuberância rochosa, o que a impediu de cair.

O “chão” inclinou-se para frente, depois para trás, e para frente novamente... O gigante andava. Então, mais calma e segura, Lara teve tempo de olhar para frente, para o horizonte. Perdeu o fôlego.

Ao longe o céu estava tingido de uma coloração vermelho-sangue, escuro, parado e denso. Nuvens cinza de fumaça rodopiavam pelo ar. Os gigantes marchavam sobre um vale cercado por montanhas e vulcões. Rumavam para o norte, em direção ao vermelho no horizonte, caminhando numa fila ordenada, os pés batendo como tambores e levantando poeira do chão. Bump, bump, bump... Os passos seguiam. Havia alguma coisa diferente, ao longe, muito longe, e que não se encaixava na paisagem de montanhas negras e grosseiras. Uma ponta fina, Lara percebeu, estreitando os olhos. Aproximava-se mais e mais, e aos poucos ela identificou uma torre surgindo à distância, tomando forma. Depois outras torres tornaram-se nítidas; e mais cinco delas, dez, vinte... Tantas que finalmente ela desistiu de contar. Depois avistou um lago... Seria um lago laranja? E sobre ele uma ponte, cercada nas laterais por paredes pontudas que rasgavam o céu e brilhavam de forma sinistra: vermelhas, em fogo, ardendo... Pareciam lanças banhadas de sangue.

Quanto mais se aproximava do castelo, mais consciência ela tinha do tamanho e da grandiosidade da construção. Notou também que o lago era feito de lava, que borbulhava quente, espessa e ameaçadora, rodeando o castelo, separando-o do resto da terra, lambendo suas paredes e muralhas. A ponte era o único caminho para entrar.

Os gigantes começaram a parar antes de alcançarem o fogo. Um paredão deles. “Uma muralha viva”, Lara pensou. A fumaça e o calor tornavam-se mais intensos a medida que avançavam, até que, por fim, o gigante no qual estava montada estacou. Ficou ali, quito e imóvel.

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Lara piscou algumas vezes, os olhos ardendo e lacrimejando devido a fumaça. Estava muito difícil respirar, com o ar denso, quente, espesso...

Foi quando o cavaleiro apareceu na porta do castelo. Ela não conseguia vê-lo com nitidez, mas por algum motivo, sentiu-se em pânico. Era como se o conhecesse: a figura saída de seus piores pesadelos. Como se ele fosse o homem que a afogara, num sonho de criança, quando ainda tinha medo de nadar. Como se ele fosse a própria morte levando sua irmã, em seus pesadelos mais recentes. Como se fosse o assassino que matara sua família, num pesadelo de anos atrás. Tudo o que ela mais temera em seus sonhos... Todas às vezes que acordava suada e trêmula depois de ver uma mulher, definhando e morrendo enquanto guardava-a no seu ventre... Ele estava lá. Estava lá para tirar sua família, amigos, esperanças, sonhos, felicidade... Sua vida. Quase podia sentir a mão dele segurando e apertando-lhe o coração, pronto para fazê-lo parar de bater. Sentiu-se tonta, sonolenta, e fria. Muito fria.

E o cavaleiro negro segurava um refém... Apesar da distância, Lara sabia quem era.

Alex.

E ela gritou desesperada, chamando-o.

***

– Shh, tudo bem. Estou aqui, Lara. Fique calma... – Mãos fortes a agarravam, segurando-a, tentando mantê-la deitada. Ela se debatia violentamente, a consciência e a razão retornando aos poucos. Escutou o aparelho medindo seus batimentos: bip, bip, bip, bip, bip, num ritmo acelerado. Sentiu a nuca molhada de suor frio, os cabelos grudando no pescoço. Ainda era difícil respirar.

_Q-que... – ofegou, mas não parecia capaz de organizar as palavras, de fazê-las sair. Sua mente rodava e a cabeça doía como se tivesse recebido uma pancada. Olhos ardendo. Garganta seca. E nada de ar. “Não consigo respirar”. Estava afogando na lava, caindo das costas do gigante, caindo, caindo, caindo... E o cavaleiro a pegou. Enfiou a espada cor de sangue, longa e fina, no coração de Alex.

E foi como se a lâmina a matasse, perfurasse seus pulmões, fazendo-os encher de sangue... Ardendo. Queimando. Fogo. E nada de ar.

_Não respiro – sussurrou, numa voz praticamente inaudível. – Ar.

_Lara... – havia mais pessoas no quarto. Elas conversavam, algumas andavam de um lado para outro, mas era tudo um borrão de cores, uma sombra de consciência. Um fio de sanidade. “Vou morrer. Bem aqui. Agora.” Não tinha certeza de quem estava ali e se alguém poderia ajudá-la.

E a dor começou a parar, cedendo, aos poucos. Ela foi recuperando a sensibilidade nas mãos, pés, pernas, braços e no corpo todo. Seus pulmões se encheram, felizes e gratos, de puro e bom oxigênio. A cabeça foi parando de doer, e o pavor foi minguando dentro dela. Por alguns segundos, tudo o que fez foi respirar. “Como é bom”, pensou. Ouviu o bip, bip, bip, medindo sua frequência cardíaca, já mais branda. Escutou um choro baixinho e sufocado: o choro da sua mãe.

_Está bem?- um homem de barba e cabelo ruivos, olhos claros e gentis (o médico), aproximou-se dela. – Consegue respirar? – Ele colocou uma luz forte e laranja na direção dos olhos, verificando os reflexos. Lara ainda respirava com intensidade, aproveitando o ar fresco e reconfortante.

_Consigo- murmurou baixinho. Sentiu que um tubo estava conectado às suas narinas, facilitando a respiração. – Foi... Foi só um pesadelo. – disse, por fim. Algumas enfermeiras saíram da sala, respirando fundo, aliviadas. O médico assentiu e disse, inclinando-se para mais perto dela:

_Vamos fazer alguns exames. Vou deixá-la descansando agora, se tem certeza de que está bem. Depois eu volto. Qualquer coisa, não hesite em chamar.

_Ok. – Lara fechou os olhos. – A luz... Muito forte.

_Ah, claro- ele desligou-a.

_Melhor – ela esboçou um sorriso. Então o médico se virou para Alex. “Oh, ele está aqui”, pensou, embaraçada. “Graças a Deus foi um sonho... Não suportaria se...” Sentiu um nó na garganta e um aperto no estômago. Parecia que a espada estava furando-a outra vez, rasgando-a, fazendo com que sentisse dor. Mas então se lembrou de que foi um sonho, só um sonho. “Talvez pense que eu sou surtada e vá embora.” A ideia deixou-a triste e a espada pareceu golpeá-la de novo. Depois se sentiu brava e irritada por importar-se com ele e levar em consideração se estava ou não preocupado.

_Talvez queria ficar aqui, rapaz. – o medico se dirigiu a Alex e este assentiu, devagar. “O que? Não disse que eu poderia descansar?” Ela revirou os olhos. “Droga. Acabei de vê-lo morrendo, se quer saber. E isso quase me matou. Literalmente.” Mas havia uma parte dela que queria, intensamente, e implorava para que Alex ficasse. E essa parte gritava tão alto dentro do peito, que ela acabou por não protestar. Respirou fundo e viu que sua mãe ainda estava parada no quarto, a alguns passos de distância da cama, secando umas poucas lágrimas que restavam no rosto. Agora ela sorria.

_Estou bem, mãe. – Lara sorriu- Posso... Posso me sentar? -Arqueou as sobrancelhas para o médico, e ele assentiu lentamente.

_Acho que não vai ser um problema. – Ajudou-a a sentar e Lara sentiu-se muito grata por perceber que seu corpo ainda podia se mover e que podia controlá-lo novamente. Mexeu as mãos, pés e os dedos. Depois sua mãe aproximou-se, beijou-a na bochecha e dirigiu um olhar travesso para Alex. – Vou deixar vocês conversarem. – E saiu, junto com o médico.

Lara sentiu as bochechas esquentando enquanto o olhar dele a penetrava. Sabia, ou pelo menos assim supunha, que estava sendo analisada. Apesar de branda e um tanto preocupada, a expressão dele tinha algo de perturbador. Algo que mexia com ela, brincava com seus sentimentos, deixando-a calma e agitada, feliz e chateada, tímida e à vontade. Aquilo era perturbador.

–Lara... – ele começou, aproximando-se da cama. O modo com fazia seu nome soar suave e doce... Naqueles lábios... Ela corou de novo e abaixou o olhar. Alex sentou-se na cama, deixando um pouco de espaço entre os dois. “Sabe que estou irritada. E que tenho razão. Sabe que a briga que tivemos foi séria. E que eu não estou disposta a ceder”. Sentiu-se um tanto feliz; vitoriosa, na verdade. Encontrou os olhos dele, puxando-a para mais perto, num tom calmo e cálido de azul. Envolvente, cativante, lindo. E continuava puxando-a, puxando-a, até tocá-la, abraçá-la, protegendo-a de tudo e todos. Os cabelos loiros e espessos estavam bagunçados, mais de um jeito lindo e sensual, contornando o rosto dele. “Controle-se. Você ainda está zangada.”

_Como... Como você está? – ele parecia um pouco embaraçado, envergonhado. Culpado, talvez, pela briga que tiveram, mas ainda sim preocupado.

_Bem – ela mentiu.

_É sério, Lara. Ouvi você gritando e se debatendo. Não me venha com essa de “bem”.

_Se me viu e sabe como estou, por que perguntou? – sentiu-se subitamente irritada.

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Ele fez uma pausa.

_Você gritou meu nome.

Ela estremeceu ao lembrar-se do cavaleiro e da sua áurea sinistra de medo e terror; da espada no coração de Alex... Apertou os braços contra o corpo e fechou os olhos. Desejou não ter sido tão rude com ele. “Só está preocupado.”

_Foi só um pesadelo. Um sonho muito ruim. Frio. Dolorido. E eu me assustei.

_ Ainda não entendi....

_Você morreu. Na minha frente. Assassinado com uma espada no coração por um cavaleiro sinistro que me fez paralisar de medo. – encarou-o com o olhar desafiador. Os olhos dele arregalaram-se um pouco e uma nota de surpresa pairou em sua voz:

_Uau. Isso parece ruim.

_Foi horrível. Eu... – parou. O que diria a seguir? Não sabia; sua mente parecia branca, apagada. – eu fiquei... – procurou as palavras com cuidado. A única coisa que realmente sentira naquela hora foi dor. Como se estivesse morrendo também. “Mas aquilo foi a falta de ar”, justificou.

Ela surpreendeu-se com o toque suave dele, os dedos quentes e macios roçando sua bochecha. Alex aproximou-se mais um pouco, olhos brilhantes, sedutores, apaixonantes... Com certeza queria dizer alguma coisa, mas parecia procurar as palavras.

_Eu sinto muito por hoje, mais cedo. – Disse, por fim. – Não queria brigar com você. Não queria magoá-la. Entendo que esteja zangada, Lara. Mas...

Ela arqueou as sobrancelhas, esperando, o coração acelerado. “O que ele quer dizer...? Provavelmente espera que o perdoe. Mas não posso. Não depois do que pode ter acontecido com Allice. Ela pode estar grávida dele.” Aquilo fez com que tremesse e perdesse o ar por um momento. Seu estômago dava cambalhotas, como se travasse uma batalha para sair pela boca. “Droga. Ela não pode estar grávida dele... Não pode...”

_Dom quer fazer o exame de DNA. – ele disse por fim, suspirando – Lara, Allice suspeita, de verdade, que o bebê seja meu. – Abaixou os olhos, um tom de tristeza pairando em sua voz. – Eu espero que não.

_Mas pode... Pode mesmo ser seu filho? – Lara não conseguia acreditar. Não podia imaginar ele e Alice, esta carregando o filho dele na barriga, os dois comprando coisa para bebês e passando o sábado juntos na casa dela, aprendendo a trocar fralda e esquentar leite... Fechou os olhos e suspirou. Aquilo doía, doía muito. “Ah, céus, não pode ser.”

_Pode sim, Lara. Eu contei a você como era... Bem, antes de nos conhecermos. Eu estava triste, mal, infeliz... Não pensava muito no que estava fazendo. Só queria afastar a dor. Nunca pensei que isso – pausa – que isso pudesse acontecer. – abaixou os olhos de novo. Agora parecia envergonhado, triste e culpado. Para ser honesta, Lara nunca tinha o visto daquele jeito, nem quando eles se conheceram. Sentiu pena dele por um momento.

– Vamos torcer para que o bebê não seja seu, então. – ele assentiu. – O pai dela deve estar doido pelo resoltado do exame, não? – Lara concluiu.

_Sim, com certeza. Ele não se importa com os gastos da filha, os mimos e até a má educação, mas agora que Allice está grávida... parece ter virado uma fera. Sério, você tinha que ver. Ele está muito mal pelo que aconteceu com a filha. E a mãe dela... Juro, Lara, eu não quero ter causado toda essa discórdia. Não mesmo. Nunca.

– E Allice, como está? – surpreendeu-se com a pergunta que saíra de sua boca. Talvez, por um momento, tivesse sentido pena de Allice. Uma adolescente como ela, que sempre teve tudo do bom e do melhor, mimada, riquinha, nunca teve que passar uma dificuldade na vida... Agora grávida. Dezesseis anos, no colegial, saindo, curtindo, bebendo... E agora grávida. Em casa, enjoada, de repouso... Nem sabe quem é o pai. “Tomara que não seja nenhum drogado por aí.” Lara pensou, com um quê de compaixão.

_Está mal – ele respondeu, também surpreso com a pergunta. – Disse que vai abortar.

– Abortar? – Lara levantou a cabeça e arregalou os olhos.

–O que você esperava? – Alex arqueou a sobrancelhas.

Abortar... Mesmo conhecendo Allice como conhecia, Lara estava chocada. E preocupada também.

_Alex... O que ela sabe sobre isso? Sabe como é feito? Como é arriscado? – sua voz tinha um tom sério. Lara conhecera algumas mulheres que tinham pensado em abortar seus bebês, e apenas uma o tinha feito. E se arrependeu. Houve um problema na cirurgia e a moça ficou estéril e separou-se do marido, depois de meses de discórdia. Entrou em depressão. A mulher estava internada num setor da clínica de reabilitação onde Lara trabalhava, por isso conhecia sua história. Achava terrivelmente triste. – Ela sabe? – Insistiu.

–Claro que não – Alex revirou os olhos. Um músculo da sua mandíbula se contraiu e ele estreitou os olhos – Acha que será a solução para todos os problemas. Ela não quer o bebê, de jeito nenhum. Os pais dela acham que está tomando a decisão certa...

–Como é? – Lara inclinou-se para frente e jogou a cabeça para o lado – Isso não pode ser sério. Os pais dela deviam ajudá-la...

–Estão ajudando, Lara. Ela não tem condições de criar a criança. Vai crescer sentindo-se indesejada, sem família, sendo sempre um empecilho e ouvindo isso da mãe constantemente. Talvez vire um órfão por aí.

Lara sentiu-se irritada e indignada. “Como os próprios pais dela podem apoiar isso?” Não compreendia. “Devem ajudar a filha... Ela pode ficar doente, sofrer uma hemorragia... Além disso, é tão nova. E se nunca mais puder ter filhos?” Lara não gostava de Allice, mas ainda sim sentia dó dela.

– Se o bebê for seu... – as palavras ficaram presas em sua garganta. “Não é.” Dizia a si mesma. “Não é, não é, não pode ser.” – Se for... Vai deixar que ela o mate?

Ele suspirou.

_Vou. Vou sim – a resposta foi curta, grossa e seca. “Nem pensou no assunto” – Já considerei isso, por pior que possa parecer. Não posso cuidar dessa criança. Nem ela. É melhor que nem venha ao mundo. Não desse jeito.

Lara limitou-se a assentir. Não sabia por que, mas sentia-se triste.

_ Lara... É impressão minha, ou você está preocupada com a Allice? – um pequeno vinco de concentração formou-se entre as sobrancelhas dele. Lara achou aquilo muito fofo, mas obrigou-se a manter o foco.

– Eu acho que sim – sentiu-se envergonhada e amaldiçoou baixinho. “Idiota... O bebê pode ser dele e você está ai, toda preocupada com a patricinha metida.” Mas não conseguiu evitar o sentimento de pena.

– Ah, Lara – Alex aproximou-se dela, tocando seu rosto, levemente. O toque era tão suave, quente, reconfortante... Ela fechou os olhos e suspirou.

_ Me perdoa. Por favor. – ele sussurrou no ouvido dela. Lara sentiu um arrepio percorrendo seu corpo quando os lábios dele roçaram sua orelha. Ficou sem fôlego por um momento. Não sabia se poderia perdoá-lo. “E se o exame de DNA der positivo?”

_ Estou tentando – respondeu num murmúrio rouco. – estou tentando, de verdade.

Ele fechou os olhos e beijou-a na bochecha. Lara se contraiu um pouco, mas gostava da sensação dos lábios quentes dele tocando sua pele.

– Tudo bem. Obrigado. – ele sorriu. “ah, esse sorriso”. Algo derretia dentro dela. Algo doce, quente, que a preenchia por dentro. Olhou bem fundo nos olhos dele, ainda cheios de tristeza. Azuis, pálidos e vermelhos. De repente vermelhos. “O que...?” Piscou. Olhos azuis de novo. “Juro, estavam vermelhos há um segundo!”

_Alguma coisa errada? – Alex perguntou, notando a confusão estampada no rosto dela.

–Não, tudo bem. – “Só um reflexo da luz. Provavelmente a minha imaginação, pregando peças em mim de novo.” E de repente estava tão cansada, tão cansada que sentiu seus olhos fechando-se, devagar, com as pálpebras pesadas.

– Vou deixá-la descansando um pouco. – Alex levantou-se e simplesmente saiu.