Tempestuoso

Capítulo 15: Coisa de pele


Capítulo anterior: "Estávamos todos de volta a estrada agora."

POV DARYL:

"SEM SANTUÁRIO"

Thea pichava mais uma placa com spray vermelho.

– Eu sempre fazia isso, e eles sempre trocavam... - ela revira os olhos, entediada. - Agora não podem trocar mais. - sorri, vitoriosa, e sussurra algo como "otários" logo em seguida.

Dou de ombros, sem muito me atentar ao que a maluca falava, já que ela só abria a boca para soltar um monte de asneiras.

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– Você vai ficar enrolando? - pergunto impaciente, vendo o grupo se distanciar aos poucos.

Ela revira os olhos lentamente, me olhando ainda com a lata de tinta spray na mão, como se não pretendesse sair de lá tão cedo.

– Pode indo na frente, Daryl, eu não preciso de uma babá. - diz toda dona de si, voltando a atenção para a placa e continuando com o trabalho de gastar todo o spray em um só aviso.

Como para contestar sua afirmação, um errante aparece, saindo do meio das árvores, os gemidos famintos em nossa direção. Thea continua com o spray nas mãos, pintando a placa como um livro infantil para colorir, sem perceber aquele monte de carne podre se arrastando até nós.

Franzo cenho, irritado com o fato de ela ser tão sem noção daquele jeito. Será que ela não percebia que deveria ter o mínimo de atenção ou acabaria na boca de um errante? A ideia me faz ficar irritado como o inferno. Levanto a besta e, num movimento quase que automático, aperto o gatilho, vendo o errante tombar para trás com uma flecha em sua cabeça, atingindo o chão com um baque molhado.

Thea se assusta com o som, olhando de mim para o walker sem entender o que acontecera, deixando claro que não fazia ideia de que ele estava por ali, pronto para arrancar um pedaço de sua cara mimada.

– Não precisa de babá? - provoco, pensando seriamente em arrastá-la pelos cabelos até nosso grupo, que se afastava cada vez mais.

Thea dá de ombros, uma sobrancelha levantada como uma provocação sutil, que me deixava cada vez mais com vontade de pegá-la pelos cabelos.

– Eu teria me virado, Daryl. - fala, como se fosse dona do próprio nariz.

– Teria se virado antes ou depois que o saco de estrume arrancasse um pedaço desse seu braço magrelo?

Ela me ignora e, após um olhar fulminante, se volta para a placa a sua frente, analisando esta como se procurasse por alguma imperfeição ou algo do tipo.

– Sou super caprichosa, não sou? - sorri orgulhosa, como se me apresentasse uma obra de arte.

– Dá pra parar com essa merda e andar logo? - reclamo, impaciente. Minhas mãos coçando com a vontade de jogá-la em meu ombro e arrastá-la a força pelo caminho.

Ela suspira, sussurrando coisas sem sentido que prefiro não tentar entender. Ficaria maluco se tentasse.

Thea olha para o errante morto a alguns passos de distância com cara de nojo, caminha até ele sem um pingo de preocupação e retira minha flecha da cabeça do walker, uma bola de sangue podre e miolos acompanhando o movimento. Ela me entrega a flecha limpa sem muita animação e guarda a lata de tinta spray no cinto preso em sua cintura, ao lado de uma machete maior do que suas próprias pernas.

– Tem que arranjar um jeito de pendurar isso em suas costas. - comento, sendo traído pela minha própria língua.

Ela sorri presunçosa com a chance de me provocar.

– Olho você todo preocupado de novo, Daryl Dixon. Tem que começar a esconder isso, ou as pessoas vão perceber que está apaixonado por mim.

Meus olhos fulminam seu rosto delicado, numa repreensão muda que ela parece ignorar. Thea continua a sorrir, os olhos verdes brilhantes e divertidos, como se me deixar irritado fosse uma tarefa extremamente prazerosa. Pra ela talvez fosse.

– Só cala a boca e anda. - respondo, sem me sentir verdadeiramente irritado com sua provocação.

– Você é um troglodita, Dixon. - ela diz, com os olhos brilhando numa mistura de diversão e alguma coisa que eu não conseguia identificar.

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Balanço a cabeça, resolvendo não me atentar as sandices de Thea. Aquela mulher infernal ainda me deixaria louco.

– ... e está me olhando com aquela cara de psicopata mais uma vez. - continua. - Olha, Daryl, eu não sou de ficar falando esse tipo de coisa por aí, mas se você quiser me dar uns beijos é só me arrastar para o mato, não precisa ficar me olhando com essa cara de predador. Se bem que... Pode continuar sim, é bem sexy!

– Da onde você tira tanta besteira para falar de uma só vez, sua idiota? - retruco, afastando a vontade de aceitar sua proposta. Eu não daria a ela essa vitória.

– Me cérebro incrível produz tudo, bobinho. - ela diz, jogando os cabelos para o lado de modo dramático. - E eu não sou idiota! - completa, apertando o passo e tomando a dianteira em direção ao grupo, com aquele ar de mimada que só ela tinha.

"Eu sou uma lady, Daryl", sua voz ecoa em minha mente. Dou um meio sorriso divertido por conta de suas sandices. A maluca me deixava irritado como o diabo, mas conseguia tirar algumas risadas.

Caminho atrás de Thea, atento a tudo a nossa volta.

"Como uma perfeita babá", penso com ironia, mas acabo por dar de ombros.

Talvez eu estivesse mesmo me tornando sua babá, mas esta ideia me parecia mais confortável do que a possibilidade de ver a maluca atracada com um errante.

(...)

– Abraham ainda está tentando nos convencer a ir para D.C com ele, Rosita e Eugene. - Rick comenta, sentado a meu lado na estrada.

Tínhamos parado por um tempo para retomarmos as forças e discutirmos sobre que rumo tomar. Continuar andando sem um objetivo específico não nos levaria a nada, só nos deixaria mais vulneráveis e expostos aos errantes e ao inverno que se aproximava.

– Acha que é uma boa ideia? - pergunto, sem muito me convencer.

Uma cura parecia algo fantasioso demais até para Thea, quem dirá para mim.

– Nós não temos rumo, podemos arriscar. Washington D.C, de qualquer forma, parece um bom local para recomeçar, para construir algo como uma comunidade, mesmo que seja só pelo inverno. Não podemos passar mais um inverno na estrada, Daryl. Não com um bebê. - ele olha para a filha nos braços de Beth, sentada com Carl e Thea a nossa frente.

Assinto, me lembrando o quão ruim foi o ultimo inverno que passamos na estrada. Lori grávida, mortes frequentes, alimentos escaços, latas de ração e uma situação que não poderia ser sustentada com uma criança de colo.

– Você acha mesmo que Eugene tem a cura para toda essa merda? - pergunto, ainda ponderando.

Podíamos ir para D.C tentar a sorte, mas Eugene ter mesmo a cura eram outros quinhentos.

Olho para o homem de mullets sentado junto com Abraham, Rosita e Tara. Parecia ter medo até da própria sombra, se agarrando em Tara a cada barulho inofensivo que vinha da mata. Ele não parecia saber direito nem o próprio nome, quem dirá como resolver a praga de errantes.

– Não. - Rick diz, olhando para Eugene assim como eu. - Mas, há uma chance, Daryl, e chances são só o que temos.

– Não sei não, Rick. Eu vou aonde você for, sabe disso, mas não confio em Eugene.

O xerife assente, sem responder, deixando que o silêncio falasse por si só. Ele também não confiava em Eugene. Nós não confiavamos em covardes.

Meus olhos se movimentam até Gabriel, sentado sozinho em um canto, olhando para Thea a cada cinco segundos, como se aquele pingo de gente fosse sua salvação. Ela meio que era, no final das contas, já que, se não tivesse convencido o homem a nos seguir, talvez este não passasse de mais um saco de carne podre caminhando pelo mundo.

– Gabriel? - Rick pergunta, seguindo meu olhar. - Também não confio nele, mas você já sabe disso.

– Ele não é só covarde... Eugene é covarde, mas não acredito que chegaria a nos prejudicar diretamente, agora Gabriel...

– Também sinto isso. Carl acha que estamos exagerando, mas depois dos arranhões na igreja eu não posso simplesmente ignorar que ele é perigoso. Porém, o que podíamos fazer? Impedí-lo de nos seguir? Ele morreria no primeiro dia.

– Temos que ficar de olho nele. - começo. - E temos que nos proteger antes que seja tarde demais.

– O que quer dizer com isso?

– Você está certo, Rick, não temos muitas escolhas... Não conseguiremos mais nada aqui na Georgia. Concordo com você em ir para D.C.

Rick sorri, aliviado, como se dividir o fardo da decisão tirasse um peso de seus ombros.

– Vou conversar com Abraham. - diz, se levantando, ainda com um sorriso no rosto.

Rick não tinha disposição para liderar sozinho desde a morte de Lori, e eu tinha que dividir esse fardo com ele. Era isso que irmãos faziam.

– Vai ficar aí sentado pensando na morte da bezerra ou vai me arrastar pelo cabelo pro meio do mato pra gente dar uns beijos, Daryl? - Thea aparece em minha frente, arrastando sua mochila e a machete pelo chão, com um sorriso provocador.

Penso em mandá-la para o inferno, mas sua proposta parecia tentadora demais para fazê-lo. Sorrio de lado, vendo a mulher franzir a sobrancelha de modo confuso.

– Vamos caçar.

(...)

Olho para trás, me certificando que Thea ainda me seguia. Ela estava em silêncio, com uma expressão desconfiada desde que saímos do acampamento, e isso me deixava mais desconfortável do que quando ela se desembestava a falar sem parar.

– Você finalmente perdeu a língua? - provoco, ouvindo seu riso suave em resposta.

– Eu estou concentrada, Daryl, montando diversas rotas alternativas para fugir caso você resolva me matar e voltar para o grupo. Só pra avisar, eu corro muito rápido e não morro fácil.

Reviro os olhos com suas sandices.

– Onde você está me levando, afinal? Já não acha que andamos o suficiente? - reclama, com a voz manhosa.

– Você já pode calar a boca de novo, Thea. - retruco, parando em uma clareira.

Olho em volta a procura de algum errante, me mantendo em silêncio para ouvir seus gemidos.

– Não tem nada aqui, Daryl, se tivesse eu já teria ouvido.

– Onde estava sua super audição quando um errante quase te comeu viva hoje mais cedo? - inquiro, ainda a procura de qualquer carniceiro. Eu não iria arriscar.

Thea não responde por um momento, e eu podia simplesmente imaginar seus movimentos: os olhos se revirando lentamente, acompanhados de uma cara de falso tédio.

– Eu não estava concentrada, Daryl. Sem falar que minha babá estava lá para tomar conta de mim. - provoca.

– Idiota. - falo, me virando em sua direção.

Thea estava parada no meio da clareira com uma cara impaciente.

– Você me trouxe aqui para me ofender ou para me dar uns beijos, Dixon?

Reviro os olhos, andando em sua direção. Ela abre a boca para falar algo, talvez me xingar de algo como troglodita ou ogro, mas eu a impeço, puxando-a em minha direção.

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Ela prende a respiração, os olhos verdes grandes e brilhantes me engolindo aos poucos, e depois sorri maliciosa.

– Pensei que íamos caçar, Daryl. - ela provoca. Prefiro encarar como um desafio.

– Se é o que prefere... - digo, me afastando um passo. Thea revira os olhos.

– Vamos logo dar uns beijos, Daryl Dixon.

Ela não precisa falar duas vezes. Colo sua boca na minha de modo um tanto quanto bruto, mas ela não parece reclamar, pois se agarra mais em mim. Suas mãos vão para meus cabelos, puxando-os com força, as unhas arranhando minha nuca. Minhas mãos correm por seu corpo, sentindo cada curva por sobre a roupa. Minha boca desce por seu pescoço, meu nariz aspirando seu cheiro doce.

– Quando eu te convidei para vir pro meio do mato eu pensei que você ia me xingar ou me dar alguma patada, Daryl, não que iria aceitar. - ela diz, a voz risonha saindo em meio a gemidos.

– Arrependida? - pergunto, ainda sem me afastar. Passo o nariz por seu pescoço, e ela se arrepia, soltando um gemido leve.

– Não mesmo. - ri, mordendo meu queixo.

Olho para ela, que me sorri confusa. O rosto de feições delicadas levemente vermelho, a boca inchada e os olhos verdes brilhando como se esperassem por algo. Malditamente linda.

– Eu gosto de estar com você, Daryl Dixon. - ela diz, os olhos me engolindo lentamente, sem que eu pudesse impedir. - Você me traz segurança, fico feliz quando está por perto... - suspira lentamente ao sentir minha mão apertando sua cintura possessivamente. - Sem falar que me deixa excitada como o inferno.

Eu não preciso ouvir mais nada, seus olhos me absorvem e a única coisa que tenho consciência é de seu corpo colado em mim.

Beijo Thea sem nenhuma delicadeza, é um beijo faminto, necessário. Ela ri em meus lábios, soltando um gemido intenso ao sentir minha mão de encontro a seu seio, por dentro da camiseta. A deito no chão, tentando ser o mais cuidadoso que podia, se é que essa era uma tarefa possível.

As mãos de Thea correm pelos meus braços até o cós de minha calça, seguro um rosnado ao sentir seus dedos em contato com minha pele, enterrando meu rosto em seu ombro. Ela morde minha bochecha, desabotoando a calça com um pouco de dificuldade, resmungando palavras desconexas com a voz embargada, me fazendo soltar um riso rouco.

Começo a fazer o mesmo com suas calças, mas suas mãos me afastam delicadamente após um suspiro frustrado.

– O que foi? - pergunto, tentando entender o que acontecia.

– Errantes. - diz com um desapontamento evidente na voz, apontando para o lado.

Não demora muito para eles aparecerem por entre as árvores, arrastando os corpos em decomposição até nós, lentamente. Um monte de carne podre faminta por carne humana. Era tão patético que aquelas coisas ainda nos matavam.

– Eles nunca vão dos deixar em paz? - Thea diz irritada, já se levantando com uma faca de arremesso na mão.

Não lhe respondo, não consigo pensar direito para isso. Minha mão alcança a besta e, sem que eu pudesse tomar consciência do que fazia, aperto o gatilho.

O primeiro errante cai, o som de folhas secas e gravetos se quebrando ecoando pela floresta. Coloco mais uma flecha na besta em outro movimento automático e o segundo errante cai para o lado, fazendo o terceiro tropeçar. Thea logo o acerta com sua faca. Disparo mais uma vez, acertando o quarto errante em um dos olhos. Recarrego a besta agilmente mais uma vez, preparando-a para mais um tiro.

– Daryl, o que você está fazendo? Morreram to...

– Cala a boca. - sibilo, disparando contra o tronco de uma árvore. Caminho até lá, puxando a flecha do tronco com um esquilo de brinde.

Thea arqueia as sobrancelhas, ainda sem entender. Retira minhas flechas e sua faca dos errantes, com uma expressão quase triste.

– Nós viemos caçar. - é só o que consigo responder, caminhando na direção que nos levaria de volta para o acampamento, ouvindo os passos de Thea me seguirem.

(...)

– O que acha de pararmos por hoje? - Rick me pergunta.

– Acho bom, já vai anoitecer. - respondo, sem muito interesse.

Havíamos andado o dia inteiro, cobrindo um curto espaço em direção a Washington D.C.

Abraham havia ficado satisfeito ao ouvir que o acompanharíamos até onde Eugene dizia ter um laboratório pronto para formular e sintetizar uma cura. O idiota de mullets não parecia muito confiante sobre o assunto, mas não abriu o bico.

De qualquer jeito, a Capital do país parecia um bom lugar para haver sobreviventes em caso de epidemia global, logo, iríamos acabar indo para lá de todo jeito, pelo menos para dar uma olhada, ter certeza de que não haviam comunidades resistentes.

Olho para Thea, caminhando ao lado de Beth e Carl. Após voltarmos da clareira ela não havia mais me procurado, na verdade, parecia estar me evitando a todo custo.

Ela ri de algo que Beth e Carl falam, virando o rosto em minha direção, talvez sentindo meu olhar. Seu sorriso se fecha assim que me vê, dando lugar a uma expressão estranha. Beth segue o olhar de Thea, olhando para mim com reprovação.

Agora o clube da luluzinha havia se virado contra mim?

Passo a mão pelos cabelos de modo nervoso, sentindo que, de certa forma, toda aquela pirraça de menina mimada era por minha culpa. Dou de ombros, no fim das contas. Thea não era nada minha e eu não tinha nada a ver com seus problemas, ela que os resolvesse sozinha e, de preferência, sem me envolver no meio de suas malditas oscilações de humor.

Rick se pronuncia, avisando que iríamos parar para dormir por ali mesmo, num canteiro ao lado da estrada. Glenn, Maggie, Michonne e Abraham seguem em frente para se certificarem de que estava tudo certo, enquanto o resto do grupo começa a montar o acampamento.

– Finalmente! Já estou descadeirada de tanto andar. - Thea diz, parando onde estava e se sentando no chão de forma um pouco desengonçada. Carl e Beth fazem o mesmo, se sentando a seu lado.

– Está descadeirada por conta dessa machete de dois quilos pendurada em sua cintura. - Beth rebate, tirando Bravinha do colo de Carl e oferecendo a menina um pouco de água.

– Você está andando toda torta. - o garoto completa.

Thea dá de ombros, revirando os olhos com seu drama característico e uma expressão falsamente ofendida, e tirando o cinto, colocando-o de lado. Carl retira a machete do protetor, sentindo o peso do objeto com as sobrancelhas levantadas.

– Isso deve pesar mesmo uns dois quilos, cara! - passa o objeto para Beth, que parece indignada com o peso. - É óbvio que está descadeirada.

– Não pesa dois quilos. Talvez um quilo e meio, mas não dois. - retruca, tentando se defender. Beth e Carl se entreolham, achando-a absurda.

– Coloca isso na mochila de uma vez, você nem tem força pra usar direito. - Carl provoca, recebendo um olhar reprovador de Thea.

– Você não sabe de nada, Carl. Eu matei um errante de dois metros com ela! Foi uma coisa meio He-Man, sabe? "Eu tenho a força" e tal...

– Pra começar, He-Man não usa uma machete, usa uma espada. E ele não tem dois gravetos no lugar dos braços.

– Você é muito chato, cara. - ela responde revirando os olhos, e mordendo algo que parecia uma bolacha.

Carl sorri, jogando nela uma embalagem vazia e recebe como resposta um dedo do meio.

– Ouvindo a conversa alheia, Daryl? Eu pensei que você já tivesse saído dessa fase há alguns anos. - Carol me provoca, parando a meu lado com seu inseparável fuzil.

Reprimo uma careta para seu comentário, fazendo-a rir.

– Brigaram? - pergunta.

– Quem?

– Você e Thea. Saíram para caçar e voltaram com um esquilo magro e expressões nada animadas. Brigaram?

– Não é da sua conta, Carol. - digo, sem querer soar rude.

– Vocês estão tendo alguma coisa, não estão?

Estreito os olhos em sua direção, tentando conter a vontade de mandá-la arranjar algo para fazer. Carol era uma boa amiga.

– Isso também não é da sua conta.

– Não estou te repreendendo, Daryl, mas... - ela começa, o tom crítico aparecendo aos poucos. - Thea é toda maluca, mas não é uma pessoa briguenta. Aposto duas latas de sopa que foi você que começou.

– De que lado você está, afinal de contas? - retruco, começando a me sentir culpado.

– Se eu devo escolher um lado, isso quer mesmo dizer que vocês brigaram, logo, que estão tendo alguma coisa.

A enfrento com o olhar, pensando em mil xingamentos para lhe dizer, mas somente consigo dar de ombros.

– Não estamos tendo "alguma coisa", não estamos no ensino médio.

– Thea sabe disso?

– Como é que eu vou saber?

Carol me olha séria, como se tentasse me mostrar algo. Continuo em silêncio, esperando por uma resposta.

– Devia ter perguntando, para começo de conversa.

– Nós não perguntamos coisas, Carol. Não somos Glenn e Maggie.

– Nós? Já se refere aos dois como um conjunto? Isso sim é um avanço! E depois ainda quer dizer que não parecem Glenn e Maggie... - provoca.

Balanço a cabeça, tentando manter o fio de paciência que me restava.

– Por que você não vai cuidar da sua vida, Carol? - pergunto, tentando soar o menos rude possível.

– Cuidado, Daryl. Além desse vírus, só há mais uma coisa tão mortal quanto... e ela também não tem cura. - alerta.

Franzo o cenho, sem entender o que ela queria dizer. Carol me olha divertida, saindo em direção a fogueira que Tyreese acabava de ascender.

Continuo parado, sem entender o que aquilo queria dizer. Quase instintivamente, desvio meu olhar para Thea novamente, que agora me olhava com o cenho franzido, o rosto delicado dividido entre curiosidade e irritação. Beth fala algo e as duas vão se sentar em volta da fogueira junto com o resto do grupo.

Continuo onde estava, atento aos movimentos a minha volta.

POV THEA:

– Vocês se conhecem desde quando? - Maggie pergunta para mim e para Mich, após esta me dar um puxão de orelha por conta de uma besteira qualquer.

– Desde os meus dezessete. - respondo, tomando um longo gole da água.

Estávamos todos envolta da fogueira, num jogo de perguntas e respostas bem engraçado, para não dizer ridículo.

– Ela se mudou para meu prédio e eu precisava de alguém para tomar conta de Andre uma vez por semana, então eu meio que fiz a cagada de pedir por sua ajuda e, espaçosa do jeito que é, ela foi ficando, tomando lugar e até hoje ela não me deixa em paz... Sorte a minha. - Mich continua, com um sorriso triste no rosto de expressões nostálgicas e amarguradas.

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Sorrio para ela, encostando a cabeça em seu ombro, pensando em como me deixava deprimida ver aquele sorriso triste e amargo em seu rosto toda vez que falávamos dos velhos tempos, principalmente quando falávamos de Andre.

Relembrar o passado não devia nos deixar triste... Eram tempos melhores.

"Uma visão até que bonita de toda essa merda, Thea, mas não foi você que perdeu o filho", minha mente acusa, e é como um soco na boca do estômago.

Desvio o olhar, desencostando a cabeça de seu ombro, um pouco sem fôlego com o pensamento. Meus olhos se cruzam com os de Daryl, que me olhava com os olhos azuis profundos e uma expressão que me faz engolir em seco. Não era sua cara sexy de psicopata, mas era tão bonita quanto.

Meus músculos tentam se contrair em um sorriso, mas eu consigo impedi-los a tempo.

Era tão injusto me sentir toda afetada por um olhar dele enquanto ele agia como um completo ogro logo após quase termos feito sexo!

Mas, o que eu podia pedir dele, no final das contas? Nós não tínhamos um relacionamento, não era como se ele me devesse satisfações, nem como se ele tivesse que ficar todo sorrisos comigo depois de uns beijos. Não era assim que funcionava com um cara como Daryl Dixon e também não era assim que funcionava comigo.

Meus relacionamentos sempre eram todos baseados em nada mais do que beijos e sexo e, por mais julgamentos que houvessem, para mim aquilo estava mais que de bom tamanho. Então, por que diabos eu estava toda afetada com a atitude de Daryl? Agindo de bico pelos cantos como se ele me devesse explicações?

Ele era lindo, sexy como o inferno e tinha uma pegada de dar inveja em qualquer idiota que eu já havia me relacionado quando o mundo era mundo, mas só essas explicações não me deixavam satisfeita.

"Talvez por que ele é o único homem que sobrou depois que os mortos resolveram comer os vivos?", minha mente tenta explicar, mas não parece convincente.

Daryl não era o único homem sobrando no mundo. O mundo ainda tinha muitos homens, talvez até mais simpáticos que Daryl, ou mais bonitos, ou até mesmo mais faladores...

"Mas nenhum deles é Daryl Dixon, Thea", minha mente soluciona. Era uma boa resposta.

Nenhum deles me atraia, quente como o inferno, como Daryl Dixon fazia; nenhum deles caçava com uma besta e tinha aqueles traços fortes que gritavam "perigo"; nenhum deles tinha um colete de asas e passava tanta segurança; nenhum deles me olhava com aquela cara irritada e com olhos azuis tão intensos; nenhum deles me fazia querer implorar por mais beijos e por mãos calejadas percorrendo meu corpo.

Eu não tinha que ficar tentando explicar o inexplicável. O lance entre mim e Daryl era atração, coisa de pele, química.

"E você nunca foi lá muito boa em química, Thea", alerta minha consciência, como uma explicação para o fato de eu ficar sempre arranjando tanta confusão onde não tinha. Simplesmente aceito sua teoria, dando de ombros.

Sorrio para Daryl, largando mão da frescura sem sentido.

Daryl Dixon não me devia nada além de beijos quentes e sexo no chão de uma floresta e aquilo me deixava, estranhamente, satisfeita.