Sob a Luz do Sol

Capítulo 23 - Decisão


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*tema: Roxette’s Almost Unreal*

_Onde está Beatrice? – A voz de Rudolph ecoou pelo salão dos híbridos. Se eu não pudesse ouvi-lo perfeitamente, eu saberia que ele havia retornado pela simples reação de Edward ao meu lado. O dia havia transcorrido sem maiores alterações, e os caçadores se demoraram a voltar. Edward ajudou-me a vestir algo, e eu finalmente pude abrir a mala surpresa de Alice, Rosalie e Esme. Dentro da pequena bolsa colorida havia roupas de bebê e utensílios que provavelmente seriam bastante úteis para alimentá-lo. Sorri ao ver o quão cuidadosas elas foram com meu filho… o quanto ele seria amado por sua família. Foi difícil escolher algo para vestir em Charles; eu não conseguia vestir nem a mim mesma sem ajuda. Mas Felicia divertiu-se ajudando-me a escolher algo para apresentá-lo aos híbridos. Nós sabíamos que logo os caçadores chegariam, e que a tão esperada decisão estava prestes a ser tomada.

Edward esteve ao meu lado, como um soldado. E Ferdinand era nosso homem de guarda. Realmente, Edward estava usando o pobre híbrido, manipulando-o cruelmente. Mas era visível a admiração que Ferdinand dirigia a ele, e a mim também. Como se ele nos adorasse, da mesma forma que eu via Edward adorando Charles. Mas o que deveria ser não poderia adiar-se por muito tempo, e quando o sol começou a desaparecer no horizonte, os caçadores estavam de volta. Eu senti a presença de Rudolph pela contração dos músculos de Edward; seus punhos cerrados ao redor de minha cintura. Sua pele ainda mais fria do que o esperado.

_Rudolph, nem pense em entrar no quarto dela. – Felicia bradou, desafiadora. – Ela é uma fêmea que acabou de parir, não existe ofensa maior.
_Mas ela está com um macho lá dentro. Posso sentir o cheiro daquele vampiro insolente desde a entrada do covil.
_Edward está com ela. – A voz de Ferdinand se fez ouvir. – Mas ele tem o direito, afinal é o pai do menino. Como foi a caçada, Rudolph?
_Como disse? – O tom de voz de Rudolph mudou da fúria iminente para a curiosidade. – Pai do menino?
_Sim… Beatrice pariu um macho, Rudolph. – Felicia decidiu explicar. – E ela ainda está fraca, apesar de completamente regenerada. Vocês precisam conversar, mas este não é o momento.
_Chame o vampiro. – Rudolph mantinha o tom de voz curioso. – Quero conversar com ele… Edward Cullen.
_Convocará o conselho, Rudolph? – Ferdinand parecia suficientemente insolente, também. – Quero dizer… para decidir se Beatrice deve ter o direito de deixar o covil?
_Beatrice não deixará o covil. Menos ainda com um macho tão… apurado como o que ela pariu.
_O menino não te pertence, Rudolph. – Felicia protestou. – Mesmo que ela fique, o pai terá direitos sobre ele.
_Vou até lá. – Edward levantou-se, ainda bastante contraído, respiração ritmada, olhar concentrado. – Você me permite pegá-lo, Bea?
_Charles? – Pressionei o bebê contra meu peito. – Pretende levá-lo a Rudolph?
_Eu jamais o colocaria em perigo. – Edward sorriu, para me incentivar. – Eu o amo como amo você… só precisamos resolver isso, Bea. Você disse, dar um fim a essa história. Foi por que vim até o covil.

Cedi, e permiti que Edward tomasse Charles em seus braços. O bebê estava sereno, sem emitir muitos ruídos. Os bebês que vi em filmes eram barulhentos, mas o meu por vezes parecia um brinquedo. Se eu não o tivesse visto mover-se, poderia jurar que ele não era real. Edward endireitou-se e saiu do quarto, deixando a porta entreaberta para me permitir participar.
_Fique aqui, Bea… por favor. – E ele saiu do meu campo de visão, imergindo na discussão que se travava no salão. – Saudações.
Houve um silêncio. Pude ouvir a respiração dos híbridos, os seus corações. Fechei os olhos, tentando me convencer de que tudo ficaria bem independentemente da minha intervenção, naquele momento.
_Este é o macho? – Rudolph não tinha ira em sua voz. Aquilo era bom, afinal.
_Sim, Rudolph. Primeiramente, gostaria de desculpar-me por entrar no covil sem a sua presença, mas Ferdinand me concedeu a sua permissão. Então, considerei que não seria uma afronta. E trouxe a você meu filho, Charles Henry Cullen. Gostaria que você o conhecesse.
Mais silêncio, e eu já estava preparando-me para levantar. Estava ansiosa e apreensiva demais; aqueles machos tolos brincavam com meu filho como se ele fosse a bandeira branca da paz. Um pequeno e indefeso ser recém nascido; onde eles estavam com a cabeça! Mas o diálogo recomeçou e refreei meus instintos.
_Ele se parece com Beatrice. – Foi o veredito de Rudolph.
_Mas ele tem muito de Edward. – Felicia implicou. Ela estava se saindo bastante desafiadora, para quem temia tanto o patriarca dos Caldwell. – Veja o formato dos olhos, o nariz…
_Ainda é pequeno demais para parecer-se com alguém. – Rudolph retomou sua postura rude, contradizendo-se. – Ferdinand, é verdade que deu sua permissão para este vampiro adentrar em nosso covil?
_Sim, Rudolph. Permiti sua entrada no covil, sua permanência com Beatrice, sua estada conosco.
_E você poderia explicar-me esta atitude?
_Sim, claro. – Ferdinand fez uma pausa, e eu pude imaginá-lo serenamente enfrentando Rudolph. – Eu permiti que Edward viesse buscar sua noiva. Eu pretendo desistir de Beatrice, e diante do conselho, se for preciso.

Eu prendi a respiração quando ouvi aquela frase de Ferdinand. Então era por aquele motivo que Edward disse que estava abusando dele. E por aquele motivo que eles andavam tão próximos. Ferdinand havia decidido desistir de mim! Talvez Edward não entendesse as implicações daquela decisão, mas eu entendia. Não haveria nada que Rudolph pudesse fazer, se aquela era a sua decisão. Senti uma angústia tão grande que não resisti, levantei-me cambaleante, ajeitando o roupão com o que estava vestida, vacilante em direção à luz que vinha do salão. Surgi na conversa antes mesmo que alguma reação à decisão de Ferdinand pudesse ser proferida. Minha aparição causou certo frenesi nos presentes. Edward caminhou para meu lado, em uma clara atitude de proteção, enquanto Rudolph encarou-me com alguma ferocidade. Ferdinand colocou-se entre ele e Edward, sem mover um músculo em sua face serena.

_O que foi que você disse? – Eu perguntei, ofegante, a Ferdinand. – Você…
_Bea… – Edward parou em minha frente, cobrindo-me com seu corpo. Estendi meus braços para receber Charles de volta, segurando meu filho com força.
_Está tudo bem, Edward. – Eu sorri. – Ferdinand… você vai mesmo fazer isso?
_Sim, Bea. – Ele me sorriu. Seus olhos castanhos nunca estiveram tão límpidos e tão sinceros. Eu conhecia aquele menino, eu sabia. Aquele jovem híbrido era meu irmão. Ele não poderia me decepcionar. – Eu vou desistir de você. Eu… não posso fazer nada além disso, não é?
Não, ele não podia. Mas eu não tinha certeza se ele sabia disso. Eu não tinha certeza se Ferdinand seria maduro o suficiente para tomar a decisão certa sozinho. Eu não tinha certeza do quanto Rudolph o havia influenciado. Eu não lia mentes, como Edward.
_Você não está falando sério. – Rudolph finalmente saiu de seu silêncio. Ferdinand tinha o semblante mais sereno possível, e encarou o vampiro enquanto ajeitava os cabelos loiros como os de Charles. Realmente, aquela deveria ser uma característica dos híbridos geneticamente modificados… só eu que deveria ser considerada uma aberração, porque meus cabelos, apesar de claros, não eram loiros.
_Estou sim, Rudolph. Pode convocar o Conselho, se desejar.
_Rudolph… – decidi apelar para o bom senso, se meu pai vampiro fosse capaz de ter algum. – você não precisa convocar nada. Basta desistir… você não percebe? Eu desejo outra vida, eu tenho outra vida. Ferdinand deseja outra vida… ele tem o direito de conhecer alguém e apaixonar-se, como eu o fiz. Felicia deseja o mesmo que nós… ela também não está satisfeita com o rumo das negociações. Edward… ele deseja nossa saída daqui mais do que qualquer outro. Só você parece não enxergar que não há esperanças para mim e Ferdinand. Somos irmãos, temos ciência disso. Não podemos simplesmente ignorar esse sentimento e dar a você o que deseja. É aviltante!
Rudolph franziu o cenho e encarou todos os presentes. Eu e Charles em meus braços; o bebê tão alerta que parecia já ter bem mais tempo de vida; Edward me abraçando com força, em uma atitude completamente protetiva; Ferdinand e seu sorriso angelical nos lábios, Felicia ansiosa e esfregando as mãos.
_Você tem idéia de que está me pedindo para desistir de séculos de planos? – Ele disse, expressão imutável. Estávamos todos tensos. – Eu tenho mais de quinhentos anos, Beatrice. Por séculos eu realizei experiências até conseguir realizar você. Você… a híbrida que me sucederia no comando do covil. E Ferdinand foi ainda mais difícil de produzir. Por algum motivo, eu não conseguia produzir um macho… e agora você pretende que eu simplesmente desista de tudo porque você se emprenhou de um vampiro?
_Porque eu me apaixonei por um vampiro, Rudolph! – Caminhei até ele, pés vacilantes, as mãos de Edward me segurando, eu me esforçando para afastar-me. – Olhe para mim… olhe para meu filho… eu amo Edward! Não se trata de machos, fêmeas, genética… estou falando de sentimentos, e eu sei que você os tem guardados. – Virei-me para Edward, respirando fundo, com alguma confiança em minhas palavras. Era o momento, e se eu não tomasse aquela decisão, ninguém mais a tomaria por mim. – Meu amor, pegue as coisas de Charles. Tudo que sua família preparou… vamos partir.

Eu não precisava falar, para Edward saber o que ele deveria fazer. Mas eu quis falar; eu queria que todos estivessem prestando atenção em minhas palavras. Ferdinand moveu-se para o lado de Edward, e desapareceu no quarto escuro com ele. Definitivamente, Ferdinand estava possuído por algum tipo bizarro de entidade que o fazia admirar Edward como a um deus. Ficamos nós quatro, uma família nada convencional, e uma decisão sobre outra, para tomar.
_Adeus, Rudolph. – Eu disse, ainda sentindo aquele arrobo instantâneo de coragem.
_Beatrice… – Ele comprimiu os lábios, olhando para mim e para o bebê em meus braços. – Você sabe que só você considerei como minha filha. Você sabe que… sempre foi somente você, não sabe?
_Sim, por isso eu sei que você vai me deixar partir. Eu sempre soube, por isso retornei ao covil. Só pretendia que você compreendesse isso, e não que eu precisasse impor a minha decisão.
Meus olhos se perderam por um segundo no semblante de Charles, e tão logo dedos gélidos me tocaram o ombro. Edward já tinha tudo preparado, e segurava as duas malas que Alice me havia preparado. Ferdinand estava logo ao lado, os olhos faiscando.
_Vamos vê-la novamente? – Felicia perguntou, ainda ansiosa.
_Vocês sabem onde vou ficar. – Eu sorri, sinceramente, pela primeira vez. Parecia fácil demais, e talvez o fosse. O amor, aquele sentimento humano tão descabido, poderia ser a chave para tudo, afinal. – Podem ver-me quando quiserem.
_Será sempre bem vindo, Ferdinand. – Edward dirigiu a frase ao jovem híbrido que lhe observava ansioso. Provavelmente, em resposta a seus pensamentos. – Todos vocês. Nosso lar sempre estará aberto à família de Bea. – Edward beijou meus cabelos, e dirigiu-se para a saída do covil. Ferdinand pegou uma mala de suas mãos, e ele passou o braço por meu ombro, envolvendo-me em um abraço de alívio. – Vamos levar nosso filho para casa, meu amor.

A saída do covil não me trouxe o alívio imediato esperado. A imagem do Volvo prateado, que reluzia ao luar, não me trouxe o alívio esperado. A porta do veículo se abrindo, a despedida de Ferdinand, o ruído silencioso do motor, a arrancada. Nada daquilo parecia me trazer alívio algum, porque eu ainda parecia não acreditar que aquilo havia acabado. Ou pelo menos, que a minha decisão não causaria mais problemas. Edward a salvo, os Cullen a salvo, Charles a salvo, os híbridos a salvo. Nenhum caos formado por uma decisão repentina de uma híbrida em deixar seu covil. Nenhuma perda, nenhuma baixa numérica. Minha alma estaria em paz, e aquela paz não me pertencia. Não me parecia pertencer, porque por minha causa houve sofrimento. E eu não desejava sofrimento para nenhum ser existente.

Meu organismo ainda estava fraco, porque aquele sangue do covil era desagradável e não suficiente. Eu tinha marcas brilhantes sob meus olhos, que ficavam mais evidentes porque inchadas. Meu corpo estava regenerado o bastante, ao menos. Edward tinha o olhar disperso na estrada, uma das mãos sobre minha perna; eu podia sentir tensão nele também. Talvez porque eu não conseguia relaxar. Olhei para Charles, e ele tinha os olhos fechados e o corpo mole em meus braços. Sorri involuntariamente. Meu filho dormia.
_Exatamente, você. – Edward respondeu a nenhuma pergunta. Pude ver um sorriso em seus lábios, também. Deixei que meu corpo pendesse para o seu lado, e recostei-me em seu ombro. Ele ajeitou o braço ao meu redor, abraçando-me. Edward dirigia bem demais, eu não precisava preocupar-me em ocupar uma de suas mãos. Meu corpo fatigado acabou por também adormecer, apesar do lado consciente manter-se alerta ao pequeno ser que estava comigo.

Eu não vi chegarmos aos Cullen, mas sei que a viagem não foi tão longa quanto eu esperava. Edward dirigiu mais depressa do que usualmente, ele também desejava chegar em casa tanto quanto eu. Ou mais. Eu tinha certeza que tolerava o covil um tanto mais do que ele. Talvez ele me amasse de uma forma doentia, pois ele havia aceitado abrir mão de sua liberdade, de sua vida sob o sol, para acompanhar-me naquele covil insalubre. Talvez ele amasse Charles de uma forma doentia, e não a mim. Ou talvez ele nos amasse, ambos da mesma forma. Eu não sabia, e não importava. Edward me amar, era o fator relevante. Talvez ele nunca me amasse como eu o amava. Mas qualquer coisa seria suficiente.

A imagem da residência dos Cullen fez com que meus olhos sorrissem. Meu organismo estava relaxado, eu havia dormido por todo o trajeto. Meus olhos se abriram tão logo o carro parou, suavemente, no pátio de entrada dos Cullen. Edward beijou minha testa, e eu me sentei para permitir que ele saísse do carro. Minha respiração estava ritmada, mas ainda ansiosa demais. Olhei pelo para brisa e pude visualizar as faces da família de Edward; minha nova família, todos esperando no patamar da casa. A porta do carro abriu-se, e Edward estendeu as mãos para me ajudar a sair do carro. Eu me sentia bem melhor, apesar de sedenta. Meus olhos deviam estar muito escuros, e minha aparência não muito agradável. Eu precisava me alimentar de sangue fresco, ao qual já havia me acostumado.

_Bem vindos de volta. – Esme foi a primeira a descer os quatro degraus para nos receber. Ela parecia bem mais ansiosa do que eu, e sua reação foi um tanto inesperada para mim. Ela se lançou a Edward, abraçando-o como uma mãe humana abraça a um filho. Talvez eu fosse a única aberração mítica a recusar as emoções humanas. Os Cullen pareciam tão bem acostumados a elas… como se elas nunca lhes tivessem sido negadas. Eu desejava repelir aquelas emoções, mas elas me tornavam mais… satisfeita. Talvez repelir as emoções ruins, e manter as boas. Mas era impossível ficar somente com a parte boa da vida. Da existência. O que fosse.

A claridade do dia reluziu em Edward, e ele parecia tão brilhante quanto deveria. Ah, como ele ousaria esconder-se no covil e privar o mundo daquela beleza toda! O sol não seria tão contente sem a pele transparente de Edward para refletir seus raios, dia após dia. Eu não seria tão contente se não mais pudesse ver aquilo. Em poucos instantes, todos os Cullen nos cercavam, enquanto Esme encarava com total ansiedade o pequeno híbrido em meus braços. Charles estava coberto pelo tecido flanelado ainda, e todos pareciam curiosos para vê-lo. Edward sorriu, e estendeu-me os braços. Franzi os lábios e entreguei a ele nosso filho. O bebê moveu-se subitamente ao trocar de braços, retomando seu sono logo em seguida.
_Ele está… dormindo. – Edward disse, um tom de voz maravilhado. – Gostaria que vocês conhecessem nosso filho, Charles Henry Cullen.
_Edward, ele é lindo! – Alice sorriu, dando saltinhos. Rosalie tinha o olhar fixo no bebê, os olhos contraídos. Edward lhe lançou um olhar de solidariedade, muito mais terno do que eu estava acostumada a vê-lo. Talvez ele estivesse apto a compreender os sentimentos conflitantes da irmã, então.
_Ele é um híbrido… dorme, o coração bate…
_Esses cabelos completamente loiros! – Esme passou os dedos pelos fios finos dos cabelos de Charles. – Ele nem parece real… é realmente um milagre.
_Os híbridos modificados costumam ser loiros. – Aquela frase me saiu com alguma indignação. Eu não era loira.
_Você é especial, meu amor. – Edward dobrou-se para beijar-me a testa, em resposta aos meus lamentos. – Podemos entrar? Eu e Bea precisamos sair para caçar… logo.

Os Cullen ainda tinham mais surpresas reservadas para nós. Entramos na casa e ela nunca pareceu tão linda para mim. As paredes claras, os móveis sóbrios e os adornos coloridos iluminados pelo sol que já brilhava no céu. Esme nos fez subir as escadas e nos apresentou o quarto de Charles. O quarto de hóspedes, o que tinha me servido tão convenientemente por algum tempo, estava completamente modificado. Prateleiras brancas, paredes em tons de azul, enfeites com temas infantis, e um pequeno leito no meio do quarto. As cortinas brancas de tule cobriam as enormes paredes de vidro que davam para o sul. Meus olhos pareciam não acreditar no que eles prepararam, em tão pouco tempo.
_Rosalie decorou. – Esme confessou, enquanto a irmã loira e linda de Edward parecia constrangida com o fato. – Ela também escolheu os móveis… espero que esteja a seu gosto, Bea.
_Eu nem sei o que dizer. – Era verdade. Edward caminhou com Charles até o leito, o berço, e o deitou entre as almofadas macias que ali estavam. O bebê moveu-se um pouco, mas continuou dormindo. Edward o observou por alguns instantes, sob os olhos atentos dos Cullen, novamente com aquele semblante de adoração. Seus dedos correram levemente pela pele lisa de Charles, e ele sorriu.
_Acho que podemos deixá-lo aqui… certo? – Edward voltou para meu lado.
_Tomaremos conta dele. – Rosalie aproximou-se, finalmente, do berço. – Vocês podem ir caçar, sem preocupação.
_Não teremos nenhuma… de fato, precisamos trazer… suprimentos? – Edward riu do emprego da palavra.
_Suprimentos? – Carlisle não entendeu.
_O bebê se alimenta de sangue. – Eu entendi. – E ele ainda não caça, então…
_Vocês devem ir. – Esme abraçou Edward novamente, e depois a mim. – Vejam essas olheiras… que alimento vocês tinham naquele covil!

Na verdade, eu ansiava por mais do que sangue. Eu tinha sede, e muita. Eu precisava de sangue fresco, porque eu estava consideravelmente enfraquecida. E aquele sangue engarrafado do covil não parecia conter todos os nutrientes necessários para nossa sobrevivência. Então, sangue era uma necessidade naquele momento. Eu sentia a garganta arder, o desejo pelo sangue era implacável. Novamente, até um humano seria alimento. Mesmo sabendo que Edward me impediria de uma besteira. Porém eu queria mais além de me alimentar. Eu queria Edward. Um exagero de sentimentos me havia incendiado desde que eu deixara aquele covil, voltando para o lugar onde pertencia. Eu sentia tudo ao mesmo tempo, e era extremamente difícil conciliar a razão com a emoção. Era extremamente difícil raciocinar o suficiente para compreender que eu precisava cuidar de algumas necessidades básicas antes de assaltar Edward onde ele estivesse. E que aquilo não poderia ser feito em qualquer lugar.

Fazia tempo que eu não me preocupava em esconder pensamentos do meu vampiro, e daquela vez todos eles saíram de mim como se estivessem gritando. Eu também pensava tudo ao mesmo tempo, e minha mente parecia um ambiente inóspito. Edward riu, canto de boca, enquanto procurava comigo uma presa que me satisfizesse a sede. Foi quando percebi-me pensando em tudo aquilo, de forma nada polida. Em minha mente, as coisas que eu pretendia não eram gentis ou delicadas. Talvez eu desse a Emmett motivos para falar, então. Derrubar uma casa poderia fazer sentido naquele momento. Acostumara-me a ter Edward noite após noite, e aquele hiato que a gravidez me obrigou não foi suficientemente absorvido.
_Podemos caçar qualquer coisa, se você preferir… – Edward parou, olhando para mim, olhos nos olhos. Ele não deveria ser tão insuportavelmente desejável quando meu humor estava daquele jeito. – Podemos voltar logo para casa…
_Estamos longe da cabana? – A pergunta atropelou o raciocínio. Eu não estava apta a retornar para casa. Apesar de tudo, eu não queria dar a Emmett motivos para falar.
_Não. – Edward continuava a me olhar nos olhos. Ele piscou uma vez, passou os dedos em minha face e sorriu. – Mas precisamos nos alimentar e voltar, Bea… não sabemos quando Charles vai acordar, e ele terá sede logo.

Ah sim, claro. Havia algo a se fazer, mais importante do que sucumbir aos desejos mundanos. Sacudi a cabeça tentando livrar-me do que não estava ali, tentando afastar-me daquela onda de calor que havia dominado meu corpo frio. Minhas narinas imediatamente sentiram a aproximação de animais, e eram animais grandes o suficiente para mim. Lançar-me à caçada era uma boa forma de suplantar um desejo por outro. Deixei Edward buscar o seu alimento e fui atrás do meu, tentando balancear minhas necessidades.

Em menos tempo do que esperado, estávamos de volta à casa. Charles ainda dormia, mas as mulheres da família Cullen pareciam bastante desapontadas com o fato. Foi divertido vê-las cercando o berço onde estava Charles, enquanto os homens não pareciam compreender tanta adoração por um ser tão pequeno. O instinto maternal do qual Esme me havia falado, e o qual eu havia experimentado desde que descobrira estar grávida. Talvez porque as coisas deveriam ser como estavam, eu não senti nada estranho em ver toda aquela atenção exagerada sobre meu filho. Todas seriam mães de Charles, era como deveria ser. Eu era a mãe biológica. Aquela que o suportou no ventre e que o permitiu… existir. Elas seriam simplesmente mães, como Esme era de Edward.
_Irmãzinha, você parece que foi a uma guerra. – Emmett mencionou as marcas de sangue espirradas em minhas vestes.
_Eu tive que trazer alimento para meu filho… – Protestei. – Houve um pequeno incidente. – Sim, uma híbrida desastrada e um cervo em fuga. Um ataque que não significaria o mesmo dos anteriores… eu não iria sugar aquele cervo, e sim drená-lo para levar o sangue a Charles. Somatório que nos levava ao meu estado físico deplorável.
_Armazenamos o sangue em temperatura adequada, Bea. – Carlisle chegou, noticiando que havia terminado a tarefa que lhe fora incumbida. Estávamos então no salão… apenas os homens e eu, porque as mulheres definitivamente esperariam Charles acordar. – Não conhecemos a sua sede, mas creio que ele tenha alimento suficiente para algum tempo… ele é muito pequeno.
_Você quer ir, agora? – Edward colou os lábios em meus ouvidos e proferiu aquela frase desconexa, como se falasse sobre algo que havia sido dito muito tempo atrás. Ou sobre algo que ainda não havia sido dito. Só depois percebi que ele falava sobre meus pensamentos. Sobre o que eu queria, naquele momento. Olhei para ele, olhos arregalados, e balancei a cabeça assentindo. – Carlisle… você poderia pedir a Esme… Rose e Alice que cuidem de Charles por algumas horas? Caso ele acorde…
_Claro que sim, filho. Decerto elas terão o maior prazer em fazê-lo, considerando o fato que ainda não saíram do quarto do bebê. Aconteceu algo?
_Preciso sair com Bea um instante.
_Arght! – Emmett atirou uma das almofadas de Esme sobre nós. – Você ainda diz algumas horas? Não pretende afastar-se por dias? Semanas?
_Cale-se, Em… – Edward repreendeu o irmão, olhar ferino. – Temos um filho para cuidar, agora. Responsabilidades…

Brincando, Edward segurou em minhas mãos e me conduziu até o Volvo prata, que ainda estava parado no pátio. Emmett ficou na casa, rindo como uma criança humana, enquanto meu vampiro me colocava no carro, um tanto apressado. Talvez ele tivesse finalmente se encontrado no mesmo humor que eu, ou talvez antes ele estivesse apenas sendo responsável antes. Eu ainda era muito inexperiente para ser responsável. Era mais velha do que Edward, em vários aspectos, mas muito menos experiente do que ele.
_Eu estou novamente coberta de sangue. – Protestei, olhando para minhas roupas. – Aonde vamos?
_Você está linda. – Edward disse, sem olhar-me. – Nunca esteve tão linda, Bea. Acredite e mim. – Sua mão direita segurou a minha, enquanto ele apenas se concentrava em chegar logo. Em instantes, reconheci o caminho que já havíamos feito tantas vezes. Ele não precisou responder a segunda pergunta.
A urgência em que nos encontrávamos era quase patética. Não era razoável aceitar que Edward me fizesse tanta falta, e que aquela necessidade física fosse tão importante para se suprir. Tão logo Charles estava seguro em casa e com alimento o suficiente, tudo que nos tornava conscientes se apagou e deu lugar a um monstro. Aqueles monstros que nos assombravam, e que têm nome. Luxúria, desejo, fome. Os humanos chamavam aquilo de várias formas, mas o fato era que chegava a ser patético. Não tivemos tempo exatamente de entrarmos na cabana até que fôssemos consumidos. Edward tomou meus lábios tão logo seus braços me alcançaram fora do carro, e beijou-me com tanta violência que eu poderia machucar-me. Mas não. Eu estava forte o suficiente. Eu também estava violenta, não podia questionar. Foi difícil resistir à tentação de eliminar cada peça de roupa que ele vestia antes mesmo de sairmos do meio da clareira. Foi quase impossível permitir que ele me arrastasse – literalmente – até a cabana, e me atirasse por sobre a cama. Até que o lugar vinha se mantendo organizado o suficiente. Eu cheguei a considerar se Edward não estava mantendo aquela cabana limpa e organizada exatamente para situações como aquela.

Em pouco tempo eu já havia completado a tarefa de livrá-lo das vestimentas, a parte que eu consideraria divertida. As mãos cravadas em suas costas não demonstravam qualquer delicadeza; havia eu superado o medo de machucá-lo? A parte do meu cérebro que me comandava não poderia ser chamada de consciente, então. Talvez a parte consciente completamente entorpecida pelo desejo que eu sentia de ter Edward em mim? Ele me causava um efeito ainda mais assustador do que o Martini. Algumas horas, ele prometeu. Algumas semanas, Emmett cogitou. Eu só o queria por um instante, mas que fosse por completo.

_Podemos ficar até a noite? – Eu disse, percebendo o sol alto no céu e considerando que horas seriam.
_Podemos fazer o que você quiser… – Ele me beijou, os lábios percorrendo toda a linha de minha face até o pescoço, e subindo novamente. – Mas podemos continuar isso em casa, agora. Creio que já estamos aptos a retornar…
_Eu não sei se estou. – Impliquei, levando os meus lábios aos dele. – Mas sim… Charles deve estar acordado, eu suponho.
_Estou longe demais para saber. – Edward olhou pela janela que ficava pouco acima de nossas cabeças, o corpo esticado para olhar o lado de fora. – Mas é provável. Quer que eu ligue, para perguntar?
_Tudo bem. – Segurei suas mãos, que já se moviam para buscar o aparelho telefônico. – Ele está em boas mãos.
_Bea… – Edward beijou meu nariz, e quando ele fazia aquilo eu sabia que ele pretendia contar-me algo. Algo que eu deveria saber, e que ainda não sabia. – Há uma coisa… eu sei que você se preocupa com isso, então eu… procurei saber… na verdade eu ouvi, de suas irmãs híbridas.
_O que foi, Edward? – Meu humor subitamente se voltou para a curiosidade. – Esses enigmas me deixam profundamente aborrecida! – Ele riu, olhando-me nos olhos.
_Nenhuma híbrida teve mais de um filho, até hoje. – Foi a notícia. Abri os olhos com alguma surpresa, porque… ele não deveria saber que eu tinha essa preocupação. Até porque eu não pensei exatamente nessa possibilidade… eu temi, sinceramente, que tudo aquilo se repetisse com frequência, e que em pouco tempo houvesse uma superpopulação de Cullens. Afinal…
_E isso significa que… – Eu queria que ele dissesse, que ele colocasse com todas as sílabas de todas as palavras. Eu queria que Edward me confirmasse… ainda mais porque eu posteriormente confirmaria com Alice.
_Significa que nossa família será sempre eu, você e Charles. E os Cullen, claro. – Edward me beijou os lábios; eu ansiando por aquilo cada vez mais e mais. – Você não precisa preocupar-se.

Eu estava feliz que Charles tinha tantas mães à sua disposição, e que ele era apenas uma pequena criatura que provavelmente não causaria nenhum problema aos Cullen. Porque bastou Edward terminar a sua frase para que eu me rendesse a ele novamente, fazendo-me crer que não chegaríamos à casa dos Cullen antes do por do sol.

_Por sorte não lemos mentes. – Jasper estava no alpendre, quando chegamos. – Ou eu teria que desaparecer até que vocês retomassem o controle. – Ele franziu a sobrancelha.
_Estamos bem, Jazz. – Edward resmungou.
_Charles? – Eu perguntei, olhando para o céu já praticamente escurecido, algumas estrelas cuidadosamente colocadas no vazio horizonte rosado.
_Rosalie acabou de alimentá-lo. – Jasper entrou conosco na casa, meus olhos buscando meu filho. Após finalmente sentir-me satisfeita de Edward – se aquilo fosse consideravelmente possível, eu queria meu filho. Desde que entrara no Volvo, rumo aos Cullen, meu instinto maternal decidiu sobrepor-se ao desejo.
_Ah, aí estão vocês! – Esme nos recebeu com mais abraços. Aquele comportamento era natural? Eu não me recordava de ver Esme tão… humana. – Vejo que caçaram e estão…
_Satisfeitos. – Edward franziu a sobrancelha, olhando para os presentes com alguma inquietação. – Bea quer ver o bebê… ela está um pouco ansiosa. Onde está Rosalie?
A pergunta não precisou ser respondida, pois a vampira loira apareceu na sala, sorrindo, seguida por Emmett. Charles estava em seu colo, e eu pude ver suas mãozinhas pelo invólucro flanelado.
_Sua mãe finalmente chegou. – Rosalie disse, para meu filho, de uma forma quase imperceptível, como se ele fosse o único capaz de compreender suas palavras. – Pensei que ficariam mais tempo fora… Emmett disse. – Ela implicou. Edward cerrou os punhos, e estendeu os braços, tomando o bebê para si. Lábios franzidos, ele observou Charles por alguns instantes e sua face subitamente se transformou em um sorriso expressivo. Eu não havia visto Edward sorrir espontaneamente daquele jeito, ainda. Ele parecia… admirado. Ansiosa, eu estava. E ele me entregou Charles quando sentiu que eu estava prestes a pegá-lo de qualquer jeito.
_Alice? – Edward olhou para Jasper, que apontou o andar de cima. Edward me olhou, sorrindo ainda, e caminhou para a escada. – Ele sentiu saudades. – Os dedos longos apontaram para Charles, o bebê com a mãozinha estendida para mim. Meus olhos se encheram de júbilo, enquanto eu entendia o olhar de admiração de Edward. Ele era simplesmente perfeito demais para ser descrito por palavras.

***** Alice e Edward: a festa *****

_Entre Edward! – A pequena Cullen disse, antes mesmo de o irmão bater à porta. A conversa mental que sempre tinham e tanto irritava Beatrice.
_Alice, precisamos conversar. – Ele disse, coçando o queixo, semblante concentrado. – Sobre meu casamento…
_Claro! – A vampira caminhou até o irmão, dando saltinhos em celebração. – Definitivamente, está na hora do casamento…
_Eu pedi Beatrice em casamento da pior forma possível… eu a presenteei com um topázio ao invés de um diamante… eu preciso fazer alguma coisa direito, nesse casamento. Algo que se assemelhe a um casamento entre humanos… tudo, de preferência.
_Sabe que é só deixar comigo, certo? – Alice sorriu, empolgada.
_Sim, por isso queria lhe falar. Veja bem, não se trata de um segredo… Beatrice tem direito de participar de tudo. Ela é o personagem principal do evento. Ela precisa estar feliz… é tudo por ela.
_Eu sei, Edward! – Alice lhe deu um tapinha gentil no ombro. – Você sabe que eu sou a Cullen que organiza eventos. Prepararei tudo… para quando?
_Breve. O mais rapidamente possível… para podermos convidar os amigos humanos, dela.
_Os humanos! Claro… mas precisa ser rápido?
_Alice, pensei que você fosse mais esperta. – Ele zombou, e Alice emburrou. – Vamos… não seja infantil. Os humanos não viram Beatrice grávida. Eles podem até aceitar a desculpa de um nascimento prematuro… significativamente forçado. Mas o que diriam se Charles aparentar… meses de idade? Da forma que ele cresceu no útero ele crescerá externamente… eu sei. O híbrido Ferdinand levou aproximadamente dez anos para chegar à maturidade física. Em semanas, Charles parecerá ter meses. Não pretendo fazer uma festa sem convidados, não pretendo arriscar expor a família, e não pretendo esconder Charles de todos. Não agora… Bea ficaria muito insatisfeita. Precisamos de um casamento… para ontem.

Alice franziu o cenho e encarou o irmão. Abriu bem os olhos, Edward parecia apreensivo. Porque ela estava apreensivo, e ele podia saber seu humor sem nenhuma dificuldade. Alice então sorriu, imaginando todas as formas possíveis de conseguir um casamento em poucos dias. Um casamento que pudesse representar tudo que Edward desejava… agradar Beatrice… satisfazer seus desejos consumistas e ainda apresentar Charles aos humanos. Edward baixou a cabeça, assentindo, e deixou o quarto.