Sob a Luz do Sol

Capítulo 21 - Redenção


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*tema: Tchaikovsky’s Piano Concerto 1 – B flat minor*
Um capítulo sob o ponto de vista de Edward Cullen.


Nunca imaginei que a noite pudesse ser mais torturante do que já vinha sendo. Noites sem tocar Edward, sem ser tocada por ele. Um acordo entre nós, satisfazendo o gosto de nosso ainda não nascido filho. Noites inquietas, de sono perturbado… noites as quais estava acostumada, no covil. Noites que eu havia esquecido, sob o sol. Noites que a vida sob o sol havia varrido de minha existência. E que retornavam impiedosamente com o estado da gravidez. O estado de consciência litigando com o estado de inconsciência; a batalha incansável do corpo com a mente. O desejo de manter-me acordada enquanto o organismo apagava e deixava de responder aos estímulos de meu cérebro.

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Nenhuma noite poderia ser pior do que uma noite sem Edward.

Ele não estava ali, e ele não chegaria. Ele não estava ali, e eu não sabia o que fazer. Meus olhos se encheram de líquido, e a visão ficou turva. Passei os dedos pelos olhos úmidos, assustada com a reação de meu corpo. Eu estava chorando. Lágrimas vertiam violentamente de meus olhos, e eu não conseguia fazê-las parar.


***** No dia anterior… Edward POV *****

Beatrice estava fora de seu juízo normal. Sim, ela estava grávida e aquilo já era suficiente para deixá-la desajuizada. Mas decidir ir com os híbridos era descabido e irresponsável. Na última semana de gravidez, tão frágil e desamparada. Ela não podia submeter-se àquilo. Ela não podia submeter-me àquilo. Mas eu desisti de colocar-lhe algum juízo na cabeça quando Alice a viu no covil. As visões de Alice não mentiam, a não ser que Bea mudasse de idéia completamente. Ela não me parecia disposta a reconsiderar sua decisão.

Eu não tinha muito tempo com ela até que os híbridos chegassem. Um turbilhão de pensamentos passou ao mesmo tempo por minha cabeça, misturando-se com as vozes da minha família, da mãe de Bea, dela mesma. Do meu filho. Todos tão perturbados, e eu querendo colocar as duas mãos nos ouvidos e ficar completamente surdo. Gritar pela floresta, correr em disparada sem rumo algum. Mas eu precisava ser estável, ou ninguém mais o seria. Eu precisava fazer algo para impedir Beatrice, mas não havia mesmo nada que pudesse ser feito.

Pensei em tomá-la nos braços e fugir. Ela estava tão suscetível que não seria tão difícil arrastá-la até a garagem e desaparecer com ela. Pensei em ir para bem longe, um lugar no qual os híbridos jamais nos encontrariam. Mas… ela estava para ter um bebê. Eu ignorava qualquer procedimento que fosse referente ao parto, porque aquele parto nunca fora realizado por nenhum de nós. Em verdade, somente a sua mãe, Felicia, poderia ajudá-la naquele momento. Eu sabia que Felicia sabia o que fazer. Ela já passara por aquilo; e tantas híbridas sob seus cuidados. Eu não podia arriscar a vida de Bea, ou do meu filho, em uma fuga ensandecida. Se ao menos Felicia visualizasse o que deveria ser feito; se eu pudesse roubar-lhe a informação nos pensamentos. Mas ela inconscientemente mantinha seu segredo escondido o suficiente de mim.

Pensei em lutar. Tão logo Rudolph aparecesse, eu o impediria de chegar perto dela. Eu o mataria, se fosse preciso. Eu duvidava que aquele vampiro falsificado fosse mais forte do que eu; que ele pudesse desafiar-me à altura. E meus irmãos estariam ao meu lado. Emmett, a máquina de ataque mais potente que eu conhecia. Jasper, o melhor estrategista. O que era Rudolph além de um vampiro solitário que passava a existência controlando híbridos? Mas Beatrice jamais me perdoaria se eu ferisse seu pai. Ou qualquer outro híbrido. Eu vi em seu olhar o pavor quando eu eliminei Connor, o caçador. E ele era apenas um conhecido, mas Bea mal suportou o que houve. Ela jamais me perdoaria se eu sujasse as mãos com o sangue de seu pai.

E eu não conseguia ver alternativa, além de implorar para que ela não me deixasse. Jogar para os cães qualquer orgulho que eu pudesse ter, e ajoelhar-me a seus pés para implorar que ela não fosse. Eu o faria, se aquilo fosse de alguma utilidade. Eu faria qualquer coisa, se houvesse algo que pudesse demover aquela híbrida teimosa de sua decisão tola. Tola, irresponsável, estúpida. A decisão mais ridícula de todas as decisões possíveis. Mas ainda assim era a decisão dela, e eu deveria respeitar. Por mais que aquilo fosse me matar. E eu já estava morto, mesmo.

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Enquanto ela adormecia em meus braços, aquele sono inconsistente que eu aprendi a observar dia após dia, a vontade de fugir era nítida demais à minha frente. Meus dedos delineavam a sua face serena, e acariciavam seus cabelos, enquanto ela sussurrava palavras ininteligíveis. O que eu faria sem ela? Eu não sabia. Pela primeira vez em toda a minha existência eu encarava um fato novo com o qual eu não podia lidar.

Quando o céu clareou por completo e o sol começou a escavar lentamente um espaço entre as nuvens claras, levantei-me e fui para a cozinha. Ao menos o prazer de preparar-lhe o café da manhã eu teria. Esme encarou-me em desalento. Eu provavelmente estava horrível, e sem vontade alguma de me sentir melhor. Arrastando-me pela casa como eu nunca estive, organizei os ingredientes para preparar-lhe as panquecas, uma receita nova que Rosalie me ensinara. Meus movimentos eram lentos e não tão coordenados como antes. Talvez eu também estivesse na oportunidade de vivenciar experiências humanas demais, então. O desespero da perda de Beatrice extrapolava os limites psicológicos e refletia no corpo físico. O meu imutável corpo de vampiro.

_Deixe-me ajudar, Edward. – Alice se aproximou, enquanto eu parecia incapaz de finalizar a tarefa.
_Eu preciso fazer isso, Alice. – Disse, olhos fixos no nada.
_Ela jamais saberá que ajudei – Minha irmã piscou um olho para mim, aquele gesto humano de companheirismo. – Quem lê mentes é você.
_Sou o único em agonia, nessa casa? – Protestei, deixando a frigideira bater no fogão. Alice tomou o utensílio de minhas mãos e franziu o cenho, irritada.
_Você não me parece muito objetivo, Edward. Afinal, ninguém melhor para saber como estamos sofrendo. Porém… – Alice terminou a tarefa de cozinhar as panquecas em instantes. – você sabe que nada mudará. Eu vi, você sabe. Deveria dar algum crédito a Beatrice, ela está tentando.
_Ele pretende martirizar-se… eu não pedi nada a ela.
_Talvez isso não seja por você, vampiro egoísta. – Alice entregou-me o prato com as panquecas e me olhou furiosamente. Aquela era minha irmã, sempre tão instável. Uma hora feliz e saltitante, outra hora infernalmente irritada. Respirei fundo, organizei os alimentos em uma bandeja e deixei a cozinha, pretendo acordar Bea… que já estava descendo as escadas. Talvez não fosse por mim. Eu era egoísta, tão egoísta que eu sequer poderia ser considerado uma boa pessoa. Vampiros maximizavam suas características humanas, e os humanos são essencialmente egoístas. Bea também o era. Se ela não fazia aquilo por mim, fazia por egoísmo. E desejar que ela não fizesse aquilo por mim era egoísmo meu.

Ela era adoravelmente teimosa demais para eu suportar. Mordi o lábio inferior em uma demonstração de irritação, desejando que ela entendesse o que fazia comigo. Mas ela me sorriu, e tão logo nada mais era importante. Eu desejava tanto tomá-la em meus braços… eu desejava tanto algo que estava tão instável em mim mesmo. Algo tão impossível naquele momento.
_Panquecas! – Ela disse, se aproximando lentamente. – Senti o cheiro lá de cima.
_Olfato apurado. – Beijei seu nariz, um gesto despretensioso de carinho. – Está com fome?
_Sede, fome, qualquer coisa. Preciso me alimentar. – Ela caminhou comigo até o salão, e se sentou novamente. Apoiei a bandeja sobre o sofá e liguei a televisão; um hábito tão pertencente a Emmett. Beatrice imediatamente começou a comer, e pude notar como ela estava enfraquecida. Ela precisava de sangue… eu temia que ela pudesse ter complicações no parto em razão da dieta forçada somente com alimentos humanos. Nos últimos dias ela não conseguia sair para caçar, estava muito debilitada. Seu corpo era fraco demais e ela mesma temia pela saúde do bebê. Seus olhos estavam púrpura, como eu só vira uma vez durante a gravidez. E as olheiras fundas denunciavam que ela tinha, mesmo, sede.

Deixei-a se alimentando para encontrar meu irmão em seu quarto. Meu corpo resistia em mover-se sempre que eu pretendia deixá-la em algum lugar, mas a mente precisava dominar a matéria. Eu precisava estar no controle de mim mesmo, ou nada do que eu construí por tantos anos teria valido à pena. O tão barulhento Emmett estava acalentando sua Rosalie de forma suave e gentil. Nem parecia a mesma pessoa. Vampiros apaixonados eram mesmo estúpidos.
_Em, você poderia me fazer um favor? Na verdade, um favor para Bea? – Disse, entrando porta adentro como eles invariavelmente faziam comigo.
_O que houve? – Ele pulou da cama, ansioso. Sempre.
_Ela tem sede, mas não deve sair para caçar. Ela está muito frágil, não a quero se arriscando com nenhuma presa… nem mesmo com coelhos. Você… poderia sair e pegar alguma coisa? Para ela?
_E por que não vai você mesmo, Edward Cullen? – Rosalie resmungou.
_Eu não quero deixá-la. – Era verdade, então. – Por favor, Emmett.
_Está brincando? – Meu irmão colocou a mão sobre eu ombro, sorrindo. – Você sabe que adoro sair e arrumar confusão. O que eu devo trazer? Ursos?
_Não… – eu tive então vontade de rir, mas minha face não se moveu. – Em, deve ser algo rápido. Cervos, coelhos, esquilos… o que estiver mais perto.
Emmett sorriu novamente, e se preparou para deixar a casa, pela janela de seu quarto. Antes, porém, virou-se para mim com uma sobrancelha franzida, os pensamentos tão nítidos que eu poderia desenhá-los. Emmett era sempre nítido como uma imagem de televisão. Eu nunca me enganava quanto a ele.
_Ed… – Ele iniciou meu nome, já sabendo que eu sabia.
_Eu só penso nisso, Em. Mas não seria certo.

Não seria certo. Nada do que eu pensava seria certo, e eu não podia tomar atitudes que desagradassem Beatrice. Ao lado de todo egoísmo, do desejo de mantê-la ao meu lado, estava a vontade de fazê-la feliz. De fazê-la sorrir todo dia, de vê-la radiante como o sol no verão. Só ela sabia ser assim. Só Bea podia dar-me a sensação de estar com um ser humano, vibrante, ao mesmo tempo de estar com um vampiro, durável e inquebrável. Eu não podia magoar Beatrice; de todas as feridas que ela pudesse ter, nenhuma delas poderia ser proporcionada por mim. Eu a amava demais para aceitar a hipótese de feri-la.

Mas o que fazer quando tudo que você ama está prestes a desaparecer? O que fazer quando, depois de um século de existência, depois de ter vivido acima do bem e do mal, e depois de finalmente ter-se encontrado, tudo que mais importa, e tudo que importará por uma eternidade, está prestes a ir embora, deixando nada no lugar?

O sol de meio dia raiava cintilante no céu quando Alice chegou à sala, olhar distante e fixo. Eu poderia ouvi-la à distância, mas ela tinha razão ao afirmar que eu perdera minha objetividade. Minha concentração estava fixada no semblante de Bea, que se recostava por sobre mim enquanto assistíamos à televisão. Não havia agonia maior do que aquela espera. Por um lado, foi bom que tivesse acabado.
_Edward. – Alice disse, olhar divagando. – Eles chegaram.
Em poucos instantes, todos os Cullen estavam reunidos novamente. Bea não moveu um músculo; manteve sua serenidade como se não tivesse realmente ouvido Alice. Se eu não soubesse que sim, eu podia crer que ela estava muito distraída com a programação diurna. O tormento parecia ter chegado ao fim, mas eu nem imaginava que aquele seria o começo. Não haveria fim no buraco ao qual eu me atiraria, no instante em que Beatrice decidisse levar adiante a sua decisão.
_Deixe que os recebo. – Jasper movimentou-se, pressentindo toda a apreensão. Era muito cansativo para ele manter um clima ameno na casa desde a chegada de Felicia. Eu podia ver meu irmão esgotado, mas era quase impossível evitar meu desespero. O desespero de todos. A agonia, principalmente do dia anterior. – Fiquem todos na casa.
Jasper olhou para Alice, esperando uma confirmação sua. Alice continuava em transe, como acontecia sempre com suas visões. Ela assentiu, fechando os olhos calmamente, e ele caminhou até a porta, intencionando receber nossos não convidados na varanda. Havia em Jasper a esperança de que ele conseguisse ludibriar os híbridos, enganando-os para que pensassem que Bea não estivesse ali. Eu não queria admitir, mas eu apostava todas as minhas fichas em Jasper.

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Eu não podia levantar-me do lado de Bea. Não podia e não queria. Ela continuava recostada em meu peito, respirando calmamente, cantarolando uma canção. Mentalmente. De novo, se eu não soubesse, eu poderia dizer que ela estava alheia aos acontecimentos recentes. Aprisionada em seu próprio mundo. Concentrei-me então no diálogo que acontecia, enquanto a porta da casa estava apenas entreaberta.

_Saudações. – A voz grave cumprimentou meu irmão. – Sou Rudolph Caldwell, estou em busca de duas mulheres. O rastro de uma delas termina aqui, nesta casa.
_Saudações, Jasper Cullen. – Eu podia visualizar Jasper oferecendo a mão para Rudolph, em cumprimento, enquanto mantinha o ambiente calmo e pacífico. – Lamento, mas não compreendo suas intenções.
_Felicia Caldwell. Ela está aqui, com vocês?
Felicia contorceu-se, levantando-se imediatamente. Ela se culpava pelo fato de Rudolph tê-las encontrado, e a culpa era mesmo dela. Se Felicia não tivesse vindo por Bea, o patriarca dos Caldwell não a teria encontrado. Mas encontrar culpados não ajudaria em nada naquele momento.
_Devo ir falar com ele… talvez ele me leve de volta e esqueça Beatrice.
_Esperemos. – Esme confortou Felicia. Eu tinha os braços ao redor de Bea, como a minha prisão privativa para ela.
_O que deseja com a Sra. Caldwell? – Jasper finalmente respondeu Rudolph, depois de ter pensando em diversas formas diferentes de abordar o vampiro. Jasper pensou até mesmo em eliminá-lo, e se aquela possibilidade passou por sua cabeça era porque não havia grande risco a se considerar. Poderíamos eliminá-los, então. Mas novamente a razão dominou a tentação, e o controle prevaleceu à insanidade.
_Vim buscá-la. Ela me pertence, assim como a híbrida por quem ela veio.
_Vou até ele. – Felicia foi até a porta, e ninguém a interrompeu. Era mentir ou deixar que ela fosse. Mentir – e lutar – ou permitir. A híbrida saiu porta afora, deixando-a aberta, e saiu do meu campo de visão. – Rudolph… não esperava que desse pela minha falta tão rapidamente.
_Felicia, você me desaponta inacreditavelmente. Onde está Beatrice? Ela não virá falar comigo?
_Bea não quer falar com você. – Felicia o desafiava, mas com total subserviência. Era impressionante como seu tom de voz era contraditório à sua atitude. – Vamos embora, o covil não pode ficar sem três caçadores desnecessariamente.
_Assim que Beatrice juntar-se a nós, iremos.

Bea então decidiu reagir aos estímulos externos. Seu corpo contraiu-se todo, e ela levou uma das mãos ao ventre, fechando os olhos. Cerrei os punhos… mas eu precisava estar calmo. Eu gostaria de poder conversar com meu filho e fazê-lo compreender que ele precisava respeitar os limites de sua mãe. Eu sabia que ele estava desconfortável, crescendo de forma acelerada e ficando gradualmente sem espaço dentro do ventre de Bea. Eu sabia que ele desejava deixar aquele lugar. Mas ele ainda não sabia como fazê-lo… e eu não podia ajudá-lo. Eu queria poder falar com meu filho, e dizer a ele que convencesse sua mãe a ficar. Para que ele pudesse ficar comigo. Eu não conseguia resistir à sensação de perda que a decisão de Bea me causava.

_Rudolph, deixe Beatrice em paz… – Felicia tentava dissuadir o vampiro de suas intenções. – Ela está feliz, ela está bem… você a permitiu sair, por que isso agora? Você pode usar outra… você tem tantas como ela…
_Nenhuma como ela. – Rudolph corrigiu, interrompendo Felicia. – Bea é única, você sabe. Ferdinand… gostaria de conhecer sua prometida?
_Saudações. – Carlisle, que já estava fora do meu campo de visão, surgiu na varanda. Bea continuava a contorcer-se em dor, porque o bebê estava muito agitado. Ansioso, como a mãe. Como eu. – Sou Carlisle Cullen, patriarca da família.
_Carlisle! – Uma outra voz, com bastante surpresa.
_Richard!! Richard McKellen… – Eu não pude ver, mas imaginei que Carlisle estava realmente satisfeito em ver um antigo companheiro. – Quantas décadas…
_Desde os Volturi! Mas diga… você é o patriarca do covil…
_Pai. – Carlisle e seu vocabulário humano. – Sou o pai, Jasper é meu filho… bem como os outros aqui. Essa é nossa casa. Vocês são bem vindos… entremos. Mas por favor, o… cachorro poderia ficar do lado de fora?
_Certamente.
_Jasper… você poderia levar Ferdinand à garagem e mostrar o presente de aniversário de Alice? – Carlisle disse, antes que os vampiros entrassem.
_Mas o que…
_Richard, confie em mim. Eu gostaria que Ferdinand fosse com Jasper. Será melhor assim.
_Venha comigo, Ferdinand… – Jasper moveu-se, porque sua voz começou a desaparecer. – Você conhece algum carro?
Minha atenção foi imediatamente distraída pelos visitantes que entraram porta adentro, seguindo Carlisle. Além de meu pai, três outros vampiros trajando roupas antigas e botas, e Felicia. Beatrice respirou fundo, afundou o nariz em meu peito, pressionou suas mãos em minha cintura e ajeitou-se no sofá. Ela parecia buscando a força que precisava para tomar as atitudes que teria que tomar. Esme colocou-se ao lado de Carlisle, e ele começou a apresentar a família. Em poucos segundos, o olhar atento de Rudolph capturou a imagem de Beatrice, sentada quase em meu colo. Ele caminhou lentamente em nossa direção, independentemente da tentativa de Carlisle em chamar a sua atenção, comentando sobre a família.

Naquele momento, controlar-me foi muito difícil. Ter acesso aos pensamentos de Rudolph e ter acesso à sua figura, saber o que ele pensava e pretendia, era cruel demais. A cada passo que ele dava, eu sentia um monstro crescer dentro de mim. Um monstro que se alimentava de ira, que se alimentava do meu desespero. Meu peito se inflou; um rosnado feroz se soltou de minha garganta. Baixo, mas feroz. Meus músculos se contraíram todos, eu sentia o corpo tremer. Eu estava à beira de um ataque, fosse de nervos, fosse de fúria. O ódio crescia dentro de mim como se a simples imagem de Rudolph pudesse desencadear o armagedom.
_Beatrice! – Sua voz chamou a atenção de minha noiva, que finalmente abriu os olhos e encarou a luz do dia.
_Olá, Rudolph. – Ela sorriu, e ela realmente queria sorrir. Como se ela estivesse feliz em poder vê-lo outra vez. – Como vai você?
_Levante-se, vamos para casa. – O vampiro derramou as palavras, sem mal olhá-la.
_Já estou em casa. – Ela sorriu mais, tentando desprender-se de meus braços. Eu os mantive na mesma posição, sem conseguir mover-me. – E muito feliz.
_Rudolph, por que não se senta para conversarmos? – Carlisle se aproximou do vampiro, seguido pelos demais, pretendendo por algum senso naquela confusão toda. Mas eu sabia que aquilo não aconteceria. O meu rosnado se tornou mais alto, e Beatrice me encarou com irritação.
_Não tenho tempo para cordialidades, infelizmente. Vamos, Beatrice.
_Edward, solte-me. – Ela disse para mim, olhos nos olhos. Como ela poderia me pedir para soltá-la, se eu sabia que ela não retornaria para meus braços depois? Alice se aproximou, talvez intencionando prestar algum apoio moral a quem fosse preciso, mas eu tentaria a todo custo controlar-me. Com alguma dificuldade, relaxei meus braços e Beatrice pode levantar-se, para encarar seu pai. – Você se atreve a vir à casa dos que me acolheram e me dar ordens? Acha mesmo que pode chegar aqui e me arrastar com você como se tudo estivesse como antes? Acha mesmo que eu não sei de todas as suas mentiras? Seja ao menos educado com os Cullen, eles são a minha família, agora.
_O que contou a ela? – Rudolph olhou para Felícia, com alguma fúria nos olhos. Eu não conseguia mais controlar o rosnado que saia de minha garganta, eu estava a um fio de perder completamente o controle. Alice colocou as duas mãos em meus ombros, e Emmett aproximou-se. Todos percebiam a minha irritação crescente, e o que aquilo poderia significar. – E… o que aconteceu aqui???
_Você vai me dizer agora que nunca viu uma fêmea prenhe? – E Bea conversava com ele em seu próprio vocabulário. Bastante rude, mas palavras que ele poderia compreender, então. – Eu não estou nada satisfeita com você, Rudolph. Eu sei de todas as suas mentiras, e não estou nada satisfeita. Não gostei de você ter vindo buscar-me agora, também. Eu não quero voltar, você me permitiu sair. Eu não quero voltar.
_Por isso você não quis que Ferdinand entrasse… – Aquele que tinha a voz do nome Richard falou com Carlisle, que apenas assentiu com a cabeça, um tímido sorriso. – Ela foi violada por outro.
_Violada? Que grosseiro… eu estou grávida, Richard. Eu não fui violada, tudo aconteceu por minha vontade e de acordo com ela. – Bea dirigiu-se a Richard com a mesma ferocidade que a Rudolph. – Aliás, como sou mal educada. Deixe-me apresentar vocês a meu noivo.

Beatrice moveu-se para o lado, e me puxou pela mão, colocando-me à sua frente. Contive os impulsos animalescos e ergui a mão para cumprimentar os vampiros.
_Saudações. – A voz saiu de dentro de mim sem qualquer motivação. Era como o eco dentro de um corpo vazio. – Edward Cullen.
_Essa brincadeira é de péssimo gosto, Beatrice. – Rudolph sequer teve a decência de cumprimentar-me. Minha mão ficou estendida no ar, e eu a recolhi assim que percebi a animosidade presente. – Você é a prometida de Ferdinand, e ele está lá fora. Como pretende mostrar-se a ele dessa forma, prenhe de outro? É uma desgraça, uma desonra… tudo pelo que trabalhei todo esse tempo… é mesmo uma ingrata.
_Eu sou ingrata? – Bea parecia finalmente irritada com seu pai vampiro. Talvez aquela irritação fosse a meu favor, então. – E se eu me recusar? – Ela jogou, mas eu sabia que era apenas um jogo. Ela não pretendia recusar definitivamente. Segurei-a por um dos pulsos, como que aquela amarra pudesse mantê-la comigo para sempre. – E se eu não quiser ir, e se não pretender unir-me a Ferdinand nunca?
_Você pretende arrumar problemas?
_Não, eu só pretendia saber se teria que lidar com problemas. Rudolph, eu não pertenço mais àquele lugar, não pretendo viver lá. Agora tenho minha família, meu noivo e meu filho.
_Você volta comigo, não há argumentação cabível. Vamos.
Em um movimento rápido, Rudolph segurou Beatrice pelo outro pulso e a puxou consigo. Foi tudo muito rápido. Ele a puxou, e eu perdi definitivamente o pouco controle que me restava. Ele a tocou, e eu deixei a razão perder-se completamente por um instante. Coloquei-me entre Beatrice e Rudolph, rosnando da forma mais feroz que eu podia. Emmett movimentou-se para impedir-me de cometer uma besteira, mas era tarde. Foi realmente rápido. Em segundos, Rudolph estava com uma das mãos em meu pescoço, segurando-o com uma força praticamente incompatível com qualquer força; eu suspenso alguns centímetros do chão, Carlisle em posição de ataque, Emmett em posição de ataque, Richard e Brandon em posição de ataque. Talvez sim, aquele fosse o armagedom. Meu armagedom particular, o fim dos tempos criado por Edward Cullen.

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_Parem com isso agora!!! – Beatrice disse. Não, Beatrice exigiu. Seu tom era ameaçador; ela acabara de emitir uma ordem. Para mim, era uma ordem. – Rudolph, solte Edward imediatamente. Em, Carlisle, por favor… e vocês dois, saiam daqui! Vão lá para fora com Ferdinand. Eu não vou pedir novamente. – Eu poderia soltar-me e matar Rudolph. Rudolph poderia matar-me. Tudo poderia acabar tão rapidamente como começou. Mas todos nós obedecemos Beatrice, de uma forma inexplicável. Ela havia definitivamente emitido uma ordem. Seu olhar era mais feroz ainda do que o meu, e seus olhos púrpura eram assombrosos. Rudolph soltou-me, e Beatrice colocou-se entre nós dois. Meu pai e meu irmão acalmaram-se, enquanto Brandon e Richard simplesmente deixaram a casa, indo para a varanda. Provavelmente estariam à procura de Ferdinand, como ela exigira. – Vocês me irritam! – Ela retomou o discurso. – Eu não posso me submeter a esse desgaste, sabiam? Eu… tudo bem, Rudolph. Façamos um trato.
_Não temos trato nenhum a fazer, Beatrice.
_Eu não estou pedindo, eu estou determinando. – Beatrice então estava assustadora, de verdade. Todos a olhavam com real assombro, até mesmo admiração. Eu ouvia seu coração bater tão rapidamente que nem parecia o mesmo coração. – Eu retornarei ao covil com vocês, temporariamente. Falarei ao conselho, e depois irei embora. Eu não pertenço mais àquele lugar.
_Beatrice… – Eu precisava insistir, mais um pouco.
_Edward, não torne isso mais difícil do que já é para mim. – Ela não me encarou. Seu olhar era dirigido a Rudolph, como se ela não o pudesse perder de vista.
_Vamos então. – Rudolph deu-nos as costas. Eu olhava para baixo, mas não via nada. O vazio, apenas.
_Em alguns minutos. – Ela finalizou. – Vocês… preciso conversar com Edward. A sós.

Todos obedeceram, mais uma vez. Eu não sabia o que sentir ao ver Beatrice reagir daquela forma ao pequeno caos que se formara na sala, naquele instante. A híbrida tola e assustada que chegou meses atrás à minha casa deu lugar a uma mulher de fibra impressionante. Em um instante, em apenas uma fração de segundo, Beatrice transformou-se. Eu sabia que aquela era uma reação ao ocorrido. Por um minuto Beatrice ficou em branco. Eu não pude lê-la, era como se nada passasse por sua cabeça. E então era retornou com todo aquele potencial destrutivo. Dando ordens, falando com segurança, controlando a situação. Os Cullen, Rudolph e Felicia deixaram a sala, indo para outros lugares. Eles realmente nos deixaram a sós, como ela tão decididamente exigiu.

_Beatrice, você precisa tirar da cabeça essa idéia absurda! – Eu disse, tão logo me peguei sozinho com ela. – Você não vai a esse covil, você está prestes a ter um bebê!
_Eu sei. – Sua fisionomia era frágil e suave, novamente. – Edward, meu amor… você tem idéia do que eu sofri, nesses segundos em que Rudolph o tinha em suas mãos? – Eu franzi o lábio, negando. Eu não tinha, pois ela estava em branco. A primeira – e eu esperava a única! – vez em que eu não conseguira lê-la. – Então você não vai entender o porquê da minha partida. Eu não posso colocar ninguém que eu amo em risco.
_Não estamos correndo risco algum. – Protestei, mais parecendo uma criança contrariada. O garoto de dezessete anos em mim estava de volta.
_Se você estivesse pensando com objetividade, saberia quais as minhas intenções. Eu vou voltar, Edward. Mas eu preciso colocar um fim nessa história. Eu já deveria ter retornado ao covil e enfrentado o problema, mas eu fui covarde. Você vai esperar-me?

Como Beatrice era tola! Estava de volta a minha Beatrice, tão ingênua e tola. Aquela pergunta não podia ser mais ridícula do que toda a situação já o era.
_Essa pergunta é ridícula. – Eu repeti meus pensamentos. Afinal, ela não podia lê-los. – Você tem idéia do que eu sofri, nos segundos em que Rudolph a segurou e pretendeu arrastá-la consigo?
_Estamos empatados, então. – Ela curvou seu corpo frágil para mim e me beijou. Seus lábios tocaram os meus com tanta suavidade que ela parecia temer machucar-me. E ela efetivamente estava temendo por minha segurança. Por minha incolumidade física. Eu desistiria de argumentar. Beatrice não estava sendo lógica há semanas, e nada do que eu falasse para tentar dissuadi-la daqueles pensamentos seria útil. Eu apenas a deixaria irritada. Deixei que seus lábios fizessem com os meus o que ela queria, tentei correspondê-la da forma como ela esperava. – Eu te amo. Prometa-me que ficará bem.
_Não posso prometer-lhe algo que sei que não cumprirei.
_Tente, ao menos. Eu retornarei logo… talvez com nosso filho nos braços, mas retornarei.
_Vai privar-me até disso…
_Edward! – Beatrice assustadora, novamente. – Entenda, é a primeira vez que tenho a chance de fazer a coisa certa e a coisa certa não é o que eu quero. Deixe-me ter a minha redenção, Edward… deixe-me fazer a coisa certa. Deixe-me mostrar a Rudolph que ele está errado, deixe-me mostrar a Ferdinand que não sou adequada para ele, deixe-me mostrar a Felicia que minha vida é aqui agora, deixe-me sair da minha vida anterior com dignidade. Eu preciso fazer isso, por todos vocês. Pela felicidade de todos, não pela minha. É a primeira vez em que não desejo ser egoísta e colocar-me em primeiro lugar.

Eu não podia mesmo argumentar com ela. Talvez ninguém ali pudesse. Beatrice caminhou até a porta, abrindo-a e demonstrando sua intenção de acompanhar os vampiros. Alice desceu as escadas com duas malas, uma bem pequena. Eu pude sentir a tristeza. Minha irmã estava experimentando uma dor a qual não estava acostumada. Jasper juntou-se à nós, pois de nada adiantava esconder o menino, então. Menino… por mais maduro que o híbrido pudesse ser considerado, ele aparentava ser um menino.
_Bea… você prometa não abrir antes do bebê nascer! – Alice entregou as malas aos vampiros. – A mala com roupas para o bebê… com coisas que ele pode precisar. Não abra! São surpresas… minhas, de Rosalie, de Esme.

Eu não queria ver aquela cena. Saí pela porta, caminhei apressadamente para o meio do pátio. Eu me recusava a ver Beatrice despedir-se de minha família. Eu não queria ouvir, não queria ver, não queria estar presente. Não importava, ela dizer que voltaria logo. Não importava, ela dizer que voltaria, apenas. Coloquei as duas mãos nos ouvidos, e tentei abstrair qualquer coisa que pudesse ser um pensamento. Até dos animais próximos; eu não queria ouvir nada. Lutei contra mim mesmo por alguns minutos, até que tudo ficou em silêncio. As mãos mornas de Beatrice me tocaram a cintura, e eu desejei repeli-la. Poderia ser uma boa defesa, afinal. Senti o abraço, o beijo em minhas costas, o carinho das suas mãos espalmadas em meu estômago. Ela compreendia meus sentimentos; ela tinha que compreender. Ela estava me deixando, como queria que eu me sentisse? Então eles passaram por mim, e eu vi Beatrice fazer um gesto para Emmett, sorrindo. Meu irmão se aproximou e segurou minhas mãos atadas em minhas costas. Posição padrão de defesa de um vampiro. Era completamente desnecessário pedir que Emmett me mantivesse sobre controle. Eu não tinha forças nem mesmo para sair do lugar.

_Esperem. – Carlisle disse, alcançando os vampiros. – Por favor, deixem-nos levarem vocês de carro. Beatrice está muito debilitada para caminhar até o covil.
_É uma boa idéia, Rudolph… – Felicia interveio sem ter muita certeza.
_Meus filhos Alice e Jasper conduzem vocês… aceitem como um gesto de boa vontade.

Eu não vi mais nada. Eu estava em total silêncio, e a paz finalmente se abateu sobre mim. Como um meteoro caindo do céu, a paz desabou sobre minha cabeça e me fez sentir dormente. Anestesiado, talvez. Meu pai disse qualquer coisa sobre Alice e Jasper conduzirem os híbridos até o covil, e eu ouvi o barulho dos motores ligando, mas nenhum pensamento. Nenhum pensamento… nada além do barulho dos motores. Quando tudo ficou escuro demais para que os olhos enxergassem e frio demais para que o corpo suportasse, eu me senti desmoronar no chão. Meus braços puxaram meus joelhos para meu peito, e eu me fechei como se aquilo fosse proteger-me da solidão.

Não importaria se eu conseguiria viver aqueles dias sem Beatrice. Eu não queria nem tentar.