Simply Different

25° Capítulo - A carta e a escolha


Meses depois.

Ao chegar em casa, me joguei no sofá da sala. Estava exausta e meus pés doiam após mais uma tarde no shopping com a Dhully. E eu continuava a sentir uma dor aguda nas costas.

Haveria um baile de fim do ano no colégio. Um baile de máscaras.

E minha melhor amiga entrou em cada loja do maldito shopping até achar o tal "vestido perfeito", e achou. Ela também insistiu para que eu comprasse um vestido e me mostrou vários, porém nenhum me agradou.

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Talvez eu nem fosse nessa baile. Desde que Arthur foi embora, eu não sou mais a mesma, meus amigos fazem o possível e o impossível pra me ocupar ao máximo para que eu não tenha quase tempo de pensar em Arthur. Mas ele sempre vem em minha mente de alguma forma, até mesmo quando eu estou dormindo, tenho os malditos sonhos. O que eu acredito que sejam lembranças de nós juntos em outra encarnação, porém isso só parece me machucar mais, ao lembrar que demorou tanto para que a gente se encontrasse de novo e ele acabou indo embora do nada. Porque esperou tanto tempo até que me reencontrasse para no final ir embora? Não há lógica alguma nisso. E quanto mais eu penso, mais raiva eu sinto. Não dele, nem de mim. Mas raiva da vida por ter nos feito tão diferentes um do outro. É injusto demais.

Subi para meu quarto para tirar um cochilo, antes que mais memórias viesse a minha mente, apesar de ter a certeza que iria sonhar com ele. Mas em cima da minha cama havia um caixa. Abri-a e encontrei um vestido ali dentro, porém não havia nenhum bilhete ou algo do tipo junto. Tirando-o da caixa e o segurando na minha frente, me encantei e o vesti.

Escarando meu reflexo no espelho, encontrei uma garota parcialmente alta vestida com um maravilhoso e encantador vestido longo. Ele marcava as não muitas curvas que eu tinha e o grande decote em V deixava a mostra um dos lados dos meus seios, e minhas costas também ficavam à mostra. Ele possuía uma calda parcialmente longa e o tom azul do vestido combinava com a minha pele morena. Parecia ter sido feito exatamente para mim.

– Ficou lindo em você. - uma voz rouca e masculina me elogiou.

Girei os meus calcanhares para encontrar um homem familiar na porta do quarto.

Com seus cinquenta e poucos anos, era admirável ver como os seus cabelos grisalhos e a barba feita o deixavam ainda mais bonito do que quando mais jovem. Ele possuía os olhos castanhos claros assim como os meus e vestia uma calça, camisa social e um blazer.

– Pai? - murmurei surpresa.

– Minha menina!

Ele sorriu orgulhoso, andou em minha direção e me abraçou forte.

Depois te tanto tempo, o que ele faz aqui?

Hesitei por um momento, eu estava chateada com ele. Mas a saudade venceu e correspondi o abraço na mesma intensidade, talvez mais forte.

Depois de anos sem ter uma boa conversa com meu pai, nós finalmente sentamos e conversamos. Ele e a mulher com quem casou depois que se separou da minha mãe, também se separaram. E com isso parece que o pai da Dhu havia o convidado para trabalhar com ele na sua empresa aqui em Los Angeles, ou seja, meu pai vai voltar a morar aqui, digo, na nossa cidade e no mesmo bairro se conseguir. Eu estava chateada com ele por tudo que aconteceu e por ele nunca estar comigo quando eu precisei e fui sincera com ele quanto a isso. Finalmente nos acertamos e fui convencida por ele de ir ao baile.

Já minha mãe não parece tão feliz com a volta do meu pai como eu. E não é pra menos, ela foi quem mais saiu magoada com a separação e tudo mais. Porém, sendo um ótimo cupido como eu sempre fui, convenci ela de ir jantar com ele na mesma noite do baile. Quem sabe meus pais não se acertam?

Dizer que eu já não sinto tanta falta do Arthur depois de meses, ou que a volta do meu pai me fez esquecer tudo, seria mentira. Eu gosto do Arthur exatamente da mesma maneira que eu gostei desde o primeiro dia que o vi. E não serão alguns meses que irão apagar o que eu sinto. E a magoa pela ausência de meu pai na minha vida nas horas que mais precisei também será algo que ficara marcado em mim para sempre.

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– Sophia? - minha mãe gritou do andar de baixo me tirando dos meus devaneios.

– Oi mãe!

– Eu estou indo Ok? Qualquer coisa me liga. - avisou.

– Ok. Bom trabalho mãe, tchau.

Minhas costas doiam intensamente naquela manhã e eu acabei não indo à aula. Mas isso já estava me preocupando, minhas costas doiam quase que diariamente desde o meu aniversário e a dor parece ser cada vez maior.

Depois de tomar uma porção de remédios, a dor parecia ter aliviado um pouco, então aproveitei para descer e comer algo.

Tomei um caprichado meio café da manhã e meio almoço, e voltei para o quarto levando comigo salgadinhos e biscoitos.

Li alguns livros, atualizei minhas redes sociais e acabei pegando no sono novamente. Dormi a tarde inteira e acordei por volta das sete da noite. Logo minha mãe chegaria do trabalho.

Com um pacote de ruffles nas mãos, fui até a sacada do meu quarto e me sentei lá.

Observando o céu nublado após um dia de chuva, um filme se passou em minha cabeça. Fechei os olhos e apertei as pálpebras desejando com todas as minhas forças para que quando os abrisse, Arthur estivesse voando para cá. Uma esperança enorme invadia meu peito, mas quando abri os olhos, não havia ninguém lá. A não ser as nuvens carredas que já pingavam como chuva, e alguns poucos pássaros que voavam ao longe. Ele não vai voltar.

Mas, de repente algo veio em minha mente, aquele envelope com meu nome. Aquele que eu encontrei no meios das coisas da minha mãe. Tem algo escrito lá que ela não quer que eu saiba. Porém faz meses que o achei e nunca mais o vi, talvez nem estivesse mais lá. Talvez ela tenha notado que mexi em suas coisas e o escondido eu outro local, ou então possa ter até o jogado fora. Mas o que é que custa procurá-lo? Ele pode sim estar no mesmo lugar.

Fui até o quarto da minha mãe e encontrei a porta trancada. Tá' ai uma coisa estranha. Eu estava quase desistindo quando lembrei que havia uma chave reserva para cada cômodo da casa em algum lugar da sala. Depois de bagunçar toda a sala a procura das chaves, encontrei e testei uma à uma até achar a do quarto da minha mãe. Abri-o e vi o baú no mesmo canto do quarto, andei até lá devagar, mas algo confundia meus pensamentos. Era como se uma parte de mim, algo dentro da minha mente, dissesse para eu desistir de ler a carta que havia naquele envelope pois eu não estava pronta para o que estava escrito lá, porém a outra parte, avisava que por mais difícil que fosse, eu merecia respostas. E eu nem sequer sabia o que os dois lados do meu subconsciente estavam falando exatamente. Muito menos qual estava certo.

Mas se fosse para eu ler aquela carta, minha mãe teria me entregado não é? E se ela não me entregou apenas por falta de coragem? E se lá estiver todas as respostas que eu preciso e mereço ter?

Depois de segundos ou talvez minutos lutando com meu subconsciente, tentando saber o que fazer, decidi que iria sim descobrir o porque da minha mãe esconder aquele envelope destinado à mim, e eu só descobriria isso, lendo a carta que havia ali dentro.

Fui até o baú e me ajoelhei ali, respirando fundo na tentativa de manter a calma e rezando para que minha mãe demorasse a chegar, abri-o e tirei as poucas peças de roupas do meu pai que ainda estavam ali, encontrando embaixo uma caixinha. Tirei-a de dentro do bau e a abri, ocupada pelos mesmos papeis de antes aparentemente, o envolepe também estava lá, bem embaixo.

Respirei fundo novamente, olhei de canto do olho em direção à porta para ter certeza de que não havia ninguém ali, e assim tirei do envelope uma folha dobrada ao meio. Desdobrei e comecei a ler.

" Querida Sophia,

Caso você estiver lendo esta carta, será porque eu não tive a coragem necessária para lhe contar a verdade. Mas por favor não me culpe, é algo difícil para mim.

Tudo o que você ler aqui, poderá te responder todas as suas perguntas minha querida, ou talvez você apenas não acredite. Espero que sirva como a primeira opção.

Quando você completou seus cinco anos de idade, suas costas começaram a doer sem motivo aparente, você dizia sentir pontadas fortes, a ponto de não conseguir se levantar da cama por alguns dias. A preocupação parecia me matar, já que nenhum médico sabia explicar o motivo da sua dor. Era algo inexplicável para a ciência, mas não para a natureza.

Duas semanas depois, duas semanas sem dormir por passar a noite inteira cuidando de você, suas costas aliviaram um pouco e nós duas conseguimos dormir. Então eu tive um sonho.

* Eu estava em um lugar completamente escuro, não enxergava absolutamente nada à minha volta. Comecei a chorar descontroladamente e apenas chamava por você. Mas um homem apareceu vindo de algum ponto da escuridão, ele deveria ter seus cinquenta anos ou até mais, tinha um cabelo bem cortado e uma barba comprida, completamente brancos. E vestia um impecável terno da mesma cor.

O homem então se aproximou de mim sem desviar os seus olhos dos meus em momento algum. Ele enxugou minhas lágrimas e segurou minha mãos. As suas eram macias como bunda de bebê. (Foi a melhor comparação que eu achei.)"

As minhas lágrimas já escorriam, e um sorriso brotou em meus lábios com a comparação da minha mãe. Enxuguei o rosto e continuei lendo.

" Ele falou com q voz rouca um "não chore querida" e aparentava estar mais calmo do que qualquer pessoa que já conheci na vida.

E assim ele explicou tudo o que eu precisava saber. *

Você foi escolhida minha querida. Você não é e nem nunca foi uma mera humana sem um motivo aparente para estar aqui, não que eu esteja ofendendo os humanos, afinal, eu sou uma mera humana. Mas você é diferente meu amor, você tem uma missão à cumprir.

A partir dos seus dezoito anos, suas costas voltarão a doer e não irão parar após um sonho meu, como aconteceu quando você tinha cinco anos, a dor só irá parar quando você libertar das suas costas o que precisava urgentemente ser libertada. Suas asas.

Por favor não duvide das minhas palavras e não pare de ler aqui por falta de coragem, muito menos queira que eu conte à você pessoalmente o que está escrito a partir daqui, eu não conseguirei. Apenas leia meu amor.

Você é um anjo, um ser escolhido por Deus, o senhor de branco, para cumprir a missão mais gloriosa que você poderia ter: proteger a vida de alguém.

Caso você queira mais respostas, novamente eu lhe digo, não queira que as te dê. Você as terá em uma noite dessas. Acredite.

Espero que no momento em que estiver lendo isto aqui, Arthur já tenha entrado em sua vida. Peça ajuda à ele para libertar suas asas. Ele saberá exatamente o que fazer. Confie nele mais do que em si mesma minha filha.

Para cumprir sua missão, você terá de ir para sua verdadeira casa, que com certeza não é aqui. Entende o porque eu não ter tido a coragem de contar à você? Não que eu não queira que você descubra o que realmente é, eu apenas tenho medo de nunca mais vê-la.

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Você é a minha menininha, minha e do seu pai, e eu te amo meu amor. Também não duvide do amor de seu pai, mesmo que ele não demonstre e não te dê a devida atenção.

Me perdoe por descobrir tudo isto através de uma carta.

– Da sua mãe que te ama mais que qualquer outra pessoa. Um beijo. "

O papel já estava molhado por milhares de lágrimas que insistiam em sair sem parar dos meus olhos. Ao mesmo tempo em que tudo aquilo ali me trazia muitas respostas, também me trazia várias outras perguntas. E medo. Medo de ter perdido o Arthur para sempre graças à minha mãe, que não me contou nada antes. Mas não ache que estou ocupando ela, de forma alguma, isso foi apenas uma maneira de dizer. O que ela poderia fazer? Olhar para mim e dizer: " Filha você é um anjo e precisa ir para sua verdadeira casa. Vá embora e abandone a sua mãe. " Não teria cabimento algum. E ela escreveu uma carta e deixou escondida aqui em casa, sabendo o quanto eu "fuço" nas coisas. Ela queria que eu à encontrasse. Queria que eu sou soubesse tudo a partir das suas palavras, mesmo que elas saíssem de uma folha de papel e não de sua boca, caso a coragem à abandonasse. Eu não a julgo por isso, não fico chateada nem nada. Também tenho medo de ter que ir embora para algum outro lugar longe daqui, o céu? Sei lá. E se eu não puder mais ver as pessoas que amo? E seu encontrar Arthur lá?

Eu não sei, a única coisa que eu tenho certeza, é que a partir de agora eu só preciso buscar o meu caminho, o caminho certo.

– Filha! - minha mãe disse ao me ver sentada no chão chorando e correu até mim. - O que houve? - indagou me abraçando forte.

– Mãe. - eu sussurrei.

Ela me olhou nos olhos enquanto enxugava minhas lágrimas com a ponta do seus dedos. Ela estava preocupada, mas sua expressão mudou, ela pareceu aliviada quando seu olhar desviou para o papel que eu segurava em minhas mãos.

– Espero que não me odeie por isso. - disse calma.

Eu chorei mais ainda, e murmurei um " jamais" quando já estava em seus braços novamente. Entre soluços da minha parte e carinhos da parte de minha mãe, adormeci ali e assim pude ter todas as respostas que ainda faltavam.

Eu estava em um lugar completamente branco que parecia não ter fim e estava calma como nunca. Não sentia dor, mágoa, medo ou qualquer coisa a não ser paz. Eu viveria ali para sempre, será que esse é o verdadeiro lugar onde devo ficar?

– Minha querida Soph. - uma voz rouca e calma chamou.

Girei meus calcanhares para encontrar um homem com as mesmas descrições que minha mãe disse na carta. Deus.

– Você é... - comecei mas parei sem saber o que dizer.

– Alguns me chamam de Deus, outros de O Criador e os Anjos como você costumam me chamar de Pai. - o homem disse e um sorriso simpático brotou dos seus lábios.

Eu o encarava curiosa, mas não havia medo, nem sequer a vontade interminável de o encher de perguntas. Eu só queria estar ali para sempre.

– Pai. - foi a única palavra que saiu de minha boca, tornando o sorriso do homem ainda maior.

O que me fez sorrir junto com ele.

– Você quer enterder o que realmente é, certo?

Eu acenti com a cabeça.

– Os anjos são escolhidos a partir de uma linhagem de séculos passados, a cada três séculos, uma pessoa encontrará seu verdadeiro amor, que será um anjo caído, mas acabará morrendo pouco tempo depois de encontrá-lo. Sendo assim, trezentos anos depois, a pessoa voltará a vida como filha de um amor verdadeiro da sua própria linhagem mas seus pais não serão anjos. Após essa reencarnação, você será escolhida por mim. Mas apenas se o anjo por quem você se apaixonou esperar trezentos anos e reencontrá-la. O amor precisará permanecer após três séculos separados. E foi exatamente isso que aconteceu com você e Arthur minha querida.

Eu estava tentando assimilar aquilo tudo, e abri a boca por diversas vezes mas palavra alguma saia delas.

– Arthur sabia disso tudo? - consegui dizer após longos segundos processando tudo.

Ele negou com a cabeça.

– E o que eu faço agora? Viro a guardiã de algum humano e esqueço todas as pessoas que amo? Isso é injusto.

O homem que até então não havia tirado os olhos dos meus, passou a encarar o chão.

– Na verdade não exatamente. Isso é real querida, não é apenas mais um livro ou filme, não é uma lenda antiga ou qualquer coisa do tipo.

O olhei mais confusa do que já estava.

– Você tem duas opções: viver aqui conosco, digo, eu e os anjos que fizeram esta escolha, e eu irei escolher seu protegido, mas tu apenas sairá daqui para protegê-lo quando necessário. Sabe a paz inexplicável que você está sentido? Será apenas isso que você sentirá aqui. E amor é claro, caso Arthur tenha feito esta mesma escolha. Mas de qualquer forma não haverá dor.

Ele disse e voltou a me olhar nos olhos.

– E a outra opção? - incentivei-o a continuar.

– Você poderá voltar à Terra e viver como humana, mas há duas coisas que eu não posso mudar: você sempre terá as suas asas e terá de proteger alguém.

Ele parecia firme e calmo como sempre, mas algo em seu olhar dizia que ele preferia a primeira opção. Ele me queria perto dele.

– E eu terei de viver atrás de alguém que eu nem conheço e protegê-lo?

Ele negou.

– Nesse caso você poderá escolher algum humano próximo à você, alguém que você ame.

– Eu... - ele me interrompeu.

– Minha querida, eu imagino que tudo está ainda muito confuso para você. Mas tu saberás o que responder quando tiver suas asas forem libertadas, e Arthur o ajudará com isso.

– Mas ele...

Ele pousou um dedo em minha boca e eu automaticamente parei de falar.

– Até logo minha querida. - disse por fim e com um estalo de dedos, eu acordei.