A chuva caia sem parar desde as sete da manha de oito de novembro de 1965 e hoje já era dia 16 de novembro. As janelas estavam embaçadas por causa do vento frio e hora e meia elas tremiam, sendo que algumas já haviam até quebrado por terem o vidro fino demais.

Nos corredores ouviam-se os passos apressados do arcebispo e de uma criança, uma linda garotinha loira de olhos vermelho-sangue e que devia ter seus 10 ou 11 anos e de nome Haniel, levando as cobertas para as crianças que tremiam de frio e medo no pequeno cômodo que servia de quarto temporário, já que por causa da chuva repentina muitas crianças tinham se perdido de seus pais e sido ‘resgatadas’ pelo arcebispo Meehan que lhes servira comida e um lugar quente para ficarem.

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Já era a quinta vez que eles percorriam o caminho do porão até o ‘quarto’ que ficava ao lado dos aposentos do arcebispo, onde agora descansava um padre, que no meio da confusão de trovão, tempestade e as trevas que se apoderaram da cidade de Roma de uma hora para a outra, ajudou o arcebispo a resgatar as crianças perdidas da Piazza Barberini.

- Arcebispo... – A menina quebrou o silencio de horas, mas não parava nem um minuto de andar. – Qual o ultimo dia da semana?

- Sábado, eu acho. Por que a pergunta, Haniel?

- Tem certeza que não é sexta?

- Tenho, mas por que a pergunta?

- Eu vi em um livro que era sexta o ultimo dia da semana.

- Onde você viu esse livro? – O arcebispo olhava para a menina como se ela estivesse inventando uma historia apenas para descontrair, ele sorria para a menina que não tirava o olhar do caminho e caminhava no mesmo ritmo dele.

- Na biblioteca daqui, arcebispo.

- Impossível! Eu li todos os livros que tem em nossa biblioteca e nenhum dizia que o final da semana era marcado com uma sexta-feira.

Conversa encerrou por ali, pelo menos para o arcebispo que não ouvira mais nada da pequenina. Fizeram mais duas vezes o percurso com os cobertores e colocaram as crianças para dormir. Haniel se sentou na pequena cozinha, ou melhor um espaço pequeno com fogão a lenha, tochas que iluminavam o ambiente, uma mesa de centro e três cadeiras de madeira, aquilo era a cozinha.

O arcebispo preparava um café com leite para a menina e um café puro para si mesmo e depois iria finalmente descansar e juntar energias para o próximo dia. Haniel balançava as perinhas magricelas para esquentar-se, já que estava vestida apenas com uma camisola azul-bebê que ia até o joelho. Ela tentava se lembrar o que havia escrito no livro que lera na noite anterior a tempestade e que lhe chamara tanto a atenção por só estar escrito na ultima pagina e que todas as outras estavam em branco.

- ‘ Ao lado do anjo que carrega a criança inocente ficava a grande foice da discórdia. Lembre-se, pois toda a semana acaba as sextas e todo o mundo acabará ao sétimo toque do sino de almas e pecadores.

- O que isso significa, Haniel? – O arcebispo olhou a garotinha sério, perguntando-se de onde ela tinha tirado aquele texto.

- Era o que estava escrito no livro, o livro que diz que a semana acaba na sexta-feira.

- E onde se encontra esse livro?

- Na biblioteca! Eu já lhe disse...

- Onde é que ele fica na biblioteca, Haniel?

- Na fileira do fundo...

Meehan arregalou os olhos em direção a garota, a boca entreaberta parecendo que ia pronunciar algo, mas um barulho foi ouvido vindo do ‘quarto’ onde estavam as crianças, um barulho tão grande que imobilizou- o por completo. O barulho de um grito agudo de dor e um baque terrivelmente forte, como se algo fora jogado ao chão com uma força descomunal.