Uma cidade antiga, em estilo oriental, se estendia até onde a vista alcançava e a natureza dominava. Casas grandes e pequenas, palácios, ruas espaçosas, os mais variados comércios e serviços disponíveis, becos escuros, florestas da mais ampla diversidade de fauna e flora e, o mais importante, os residentes aproveitavam o fluxo pacifico da vida.

Estes residentes não eram simples pessoas; eram espíritos, personificações e divindades. Variando para forma humana e animal, em todos os tamanhos, personalidades e poderes, todos estavam entre as mais antigas, formidáveis e intrigantes criaturas que a história já viu e o tempo eternizou ou esqueceu. Ali era outro mundo, um outro lado do véu: o mundo para os espíritos antigos.

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Qualquer ser ali poderia se tornar um shikigami e, no topo de suas hierarquias, estavam os Doze Deuses. Quando um pacto era feito, aqueles que se tornaram shikis permaneciam em seu mundo e, apenas saiam, quando invocados por seus contratantes ou em defesa de suas vidas. Era necessário ter uma boa capacidade de autocontrole e disciplina para poder dominar uma parceria como essa e ainda mais para dominar a parceria com os Doze – esta, a que pertencia a Tsuzuki.

Seu mundo nem sempre ficava estável e, invariavelmente, pelo véu entre eles e os humanos ser mais frágil que o normal, acontecia de passagens serem abertas aleatoriamente e depois fechadas – podendo algum deles ir parar no mundo humano e causar problemas. Quando interferiam no mundo humano, seres de poder e sensibilidade espiritual – como exorcistas e shinigamis – os enviavam de volta ou abatiam. Sendo esse o caso, muito cuidado precisava ser tomado com essas aberturas infernais.

E era exatamente isso que os shinigamis estavam tentando controlar agora! Outra reunião de emergência com o Conde estava em andamento e, mesmo sem poder intervir diretamente, Tsuzuki foi chamado para prestar esclarecimentos – gostasse a maioria ou não, ninguém era melhor que ele para dar explicações sobre shikis e seres do mundo das personificações.

— Duas coisas são essenciais de se saber quando lidamos com shikis: suas personalidades e seus domínios. – Tsuzuki devia introduzir uma pequena aula sobre shikis aos envolvidos no caso – A personalidade vai te mostrar se é um ser agressivo, bom ou assustado, pois é isso que determina a forma como deve se aproximar dele para envia-lo de volta. – ele parou a espera de alguma questão, que não veio – Já o domínio é a grande questão que difere vida ou morte. Este fator mostra se o ser domina água, fogo, terra, ar, raio, gelo, sombra, luz, natureza ou véu. Esses são os dez tipos de categorias que temos. Aqueles que dominam véu, natureza e sombra são particularmente complicados de lidar, considerando-se que: ‘véu’ implica em domínio sobre tempo e espaço; ‘natureza’ implica em divindades, na maioria, que dominam sobre mais de uma categoria; e ‘sombra’ implica em seres parasitas, na sua maioria. – agora ele teve que parar, pois Watari interveio.

— Tsuzuki, qual seria a principal manifestação de um ataque por algum ser ‘parasita’? – ele foi bem direto no que queria saber.

— Se está perguntando isso por conta do par de shinigamis na ala médica, então já sabe a resposta – Tsuzuki sabia exatamente do que se tratava.

Estavam naquela reunião não apenas pelo alto índice de ocorrências de personificações no mundo humano na última semana, mas também por uma dupla de shinigamis ter lidado com seres do tipo parasita e estarem fora de ação por terem sito afetados pelo veneno deles. O conhecimento da maioria não era como o de Tsuzuki, o que levou o Conde a pedir que desse a explicação a todos.

Watari saiu imediatamente para repassar ordens de tratamentos novas na ala médica e Tsuzuki deu sequência à sua explicação.

— Todas as personificações possuem seus próprios poderes e a capacidade de ler o coração daqueles em contato. Está é a habilidade que usam para escolher seus contratantes e criar forças através deles. – essa parte muitos sabiam e não entenderam a relevância na situação – Como os espíritos estão aparecendo muito rápido, é preciso entrar em contato com todos que for possível para que entendam que devem voltar por conta própria. Se for preciso abrir caminho para cada um que for voltar, não haverá shinigamis suficientes para aguentar isso. – agora todos entenderam onde ele queria chegar.

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— Obrigado por explicar a eles, Tsuzuki. – Konoe veio a frente – Agora todos devem voltar ao trabalho e continuar com os relatórios diários. – ele dispensou todos e se voltou ao Conde.

— Vamos conversar daqui apouco Konoe. – o Conde olhou para Tsuzuki no outro lado do salão.

— Consegue ficar em pé, Hisoka? – Tsuzuki tentava ajudar o parceiro, que ainda não estava totalmente recuperado.

— Idiota! – Hisoka fez ele sorrir (Tsuzuki estava muito feliz que o amigo voltou a ter seus comportamentos normais) – Não fique me tratando como criança. Eu consigo voltar andando sozinho. – ele ainda não era acostumado a ter alguém ao seu lado daquela forma e precisava continuar na enfermaria do hospital.

Esse era um comportamento que os dois compartilhavam. Tsuzuki era o amigo e família que Hisoka nunca teve e sempre se preocupava com ele – sendo intrometido ao extremo muitas vezes. Hisoka era aquele que mais fazia Tsuzuki se sentir humano, seu atual motivo de estar vivo e aproveitando isso e que não havia fugido dele e sua tristeza.

Com os dois, conversando sobre shikis e se Tsuzuki poderia ajudar Hisoka a ter um, e seus reforços já fora da mansão, Konoe e o Conde voltaram a conversar.

— Conde, será que é sábio não deixar o Tsuzuki ajudar em campo? – Konoe estava muito preocupado – Ele é o com maior conhecimento em personificações que temos; além dos Doze Deuses serem mais que o suficiente para lidar com os mais perigosos.

— Eu entendo sua preocupação, mas não vou cair no jogo de Muraki! Ele tem aquele livro, Konoe! Justamente o que fala sobre as linhagens dele e do Tsuzuki. – o Conde estava muito sério – Não importa o motivo, Muraki não pode ter acesso ao Tsuzuki e vir a causar seu descontrole. Eu não vou permitir isso! – ele foi firme e Konoe acabou por concordar.

Konoe não estava bem! A situação estava tão ruim quanto quando Sagadalius possuiu Tsuzuki. As lembranças de seu primeiro encontro com ele, atormentavam seu coração.

[Lembranças ON]

Konoe foi enviado pessoalmente para averiguar um grande poder que vinha aparecendo no radar dos shinigamis esporadicamente. Estava nas ruas buscando anormalidades ou qualquer sinal de distúrbios... Nada, tudo tranquilo. Continuou suas buscas por mais alguns dias e continuou sem resultados; até uma manhã, em que teve certeza de cruzar com uma figura inédita na rua.

Ele passou por um jovem bonito e alto, cabelos castanhos curtos, usando um kimono verde um pouco maltratado e com aqueles incríveis olhos ametistas. Nunca viu aquela cor, tão viva e similar a uma joia – nem entre os shinigamis e espíritos que conheceu já viu aquela cor. O mais importante foi que, ao passar por ele na rua, sentiu uma pontada de poder espiritual. Sua única pista de algum poder desde que chegou.

Decidiu que valia investigar e começou a acompanhar o rapaz. Tinha 18 anos, parecia muito calmo e alegre, era gentil com todos a sua volta (fosse humano, animal ou vegetal) e era odiado por muitos também. Pessoas se esquivavam dele na rua, evitavam contato visual ou físico e chegavam até a expulsa-lo de estabelecimentos.

Nada disso parecia importar. Ele continuava a tentar ser bom com os outros e aceito por eles, mesmo continuando a ser menosprezado e escondendo sua dor. Tal rapaz tão bom não podia ser a fonte dos distúrbios que vinham aparecendo no radar. Era isso! Iria cancelar sua investigação e voltar a Enma Cho no dia seguinte.

Naquela noite, foi saindo do lugar onde jantara e encontrou uma pequena comoção. Eram alguns poucos jovens e adultos que estavam se juntando para fazer algo – Konoe sentiu seus instintos alertarem que deveria verificar a situação. Seguiu o grupo pelas sombras e descobriu o que faziam: estavam torturando o rapaz que viu de manhã. Ele estava sendo agredido e ofendido ininterruptamente.

Konoe estava para ceder e usar seus poderes em todos eles, quando o rapaz parou de se mexer, jurava que não deviam tê-lo mandado sem seu parceiro. Repentinamente sentiu um calafrio subir sua espinha, o vento mudou de direção, aves e animais fugiam e qualquer outro ser vivo foi silenciado. Sentia um poder agressivo e grande vindo do rapaz.

Ele se levantou, de uma forma automática e assustadora, e começou a matar todos os humanos em volta. Simplesmente olhava ou estendia seu braço para quem queria matar e pronto. Konoe não conseguia reagir e sentia seu ar faltar conforme o rapaz liquidava todos, sem se importar com gritos ou o sangue. Quando ele terminou, o viu parar em pé e começar a cambalear desorientado.

O rapaz voltou a sanidade e prestou atenção a sua volta. Tantas vidas que ele tirou e a sensação do sangue o fizeram agoniar. Ele gritava em desespero e tentava chamar por alguém ali, sem resposta. No desespero, ele saiu correndo e chorando, floresta a dentro, na calada da noite. Os corpos ficaram para trás e Konoe não sabia como iria reportar aquilo.

Ainda seguiu o rapaz o máximo possível e foi quando o encontrou desmaiando na beirada de um lago, ainda agonizando palavras que jamais sairiam de sua memória: “Porque eu não posso viver com eles? Eu só queria estar com todos e ter amigos. Se esses meus olhos não atrapalhassem eu não precisaria fugir. Eu quero realizar meu desejo... Como posso pensar assim depois de fazer algo tão horrível!? Eu vou morrer aqui, sozinho neste lugar tão frio?”.

Ali o rapaz perdeu seus sentidos e Konoe ficou com uma cicatriz em sua mente para o resto de seus dias. Voltou a Enma Cho e reportou que o poder pertencia a um humano que era constantemente torturado por outros, o que podia faze-lo se descontrolar um pouco. Konoe omitiu os assassinatos que o rapaz cometeu, contou apenas ao Conde.

Oito anos depois do ocorrido, Konoe já estava em seu atual posto de chefia e deu entrada nos documentos de um shinigami que o fez chorar. A ficha destacava: Nome – Tsuzuki Asato; Idade – 26 anos; Óbito – 20 de janeiro de 1925; Escalação – Shinigami da Enma Cho. Na foto estava o rapaz de olhos ametistas que ele não conseguia esquecer e, nos registros, constava que a causa de sua morte foi suicídio, após 8 anos de internação em um hospital onde ele não comeu, bebeu ou dormiu esse tempo todo, enquanto tentava inúmeras vezes se matar.

Em um ano de convivência, quando Konoe realmente já estava para perder a sanidade com o jovem rapaz continuando a ser gentil e alegre a cada passo que dava em seu novo emprego, o Conde decidiu que era hora dele saber sobre o que Tsuzuki era de verdade. Foi quando lhe revelou os livros e um segredo que aprofundou ainda mais sua cicatriz.

[Lembranças OFF]

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Muraki estava se divertindo muito com a destruição que os espíritos causavam, porém também estava irritado! Tsuzuki ainda não tinha saído da Enma Cho. Talvez precisasse de um espirito mais forte ou perigoso para que os shinigamis fossem forçados a requerer sua ajuda. Seria arriscado ele encontrar os Doze Deuses no mundo das personificações, portanto não podia ir até lá. Bem, talvez aproveitar a brincadeira mais um pouco não fosse uma má ideia – quanto maior o resultado, melhores suas chances de abalar o psicológico de Tsuzuki e, no processo, pegar Hisoka.

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Enquanto planejava mais espíritos para enviar ao mundo humano, Muraki se lembrava das palavras do livro e a história que lhe revelaram – sendo um detalhe, em particular, extremamente interessante.

Tsuzuki ainda não tinha 1 ano como shinigami, quando fez seu contrato com os Doze Deuses e já podia usar feitiços com excelência. Foi em um caso com personificações no mundo humano, que ele foi arrastado diretamente ao mundo delas e lá conquistou o respeito e a força dos Deuses. Pelo registro, ele passou um mês com sua localização apontando que estava lá e, ao voltar, apresentou os resultados de sua visita ao Conde diretamente.

A perseverança que tinha na vida e em suas convicções, o coração puro que sofria e sentia por tudo e todos, o espirito forte e potente e, acima de tudo, sua honestidade, conquistaram com sucesso a mais alta hierarquia de espíritos. Muraki não achava possível desejar Tsuzuki ainda mais, até ler essa parte do registro.