Ele me joga sobre a superfície da cama de casal, coberta por uma colcha florida. Seu corpo sobe por cima do meu, e sua boca escala sobre minha face e pescoço. Quase me entrego a este desejo profano, porém tento me concentrar no objetivo maior. Contudo, me entenda: um cara de pele bronzeada e físico perfeito, olhos marcantes e cabelos rebeldemente sexy em cima de você não é algo a se resistir com facilidade.

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Marco desabotoa a camisa xadrez, e a joga para longe. Ele esboça um sorriso, não do tipo sacana, mas um compreensivo. De repente, o italiano permanece parado com o rosto a milímetros do meu e os braços estendidos, com um olhar que me esquadrinha até a alma.

_ Se você não quiser fazer isso, eu entendo – Ele avisa, num tom meigo.

_ Mas eu quero sim – Respondo de prontidão, mal o deixando terminar a frase.

Ele arqueia as sobrancelhas, surpreso.

_ Tudo bem, então.

Paulatinamente, o observo descer as alças da minha blusa cor creme, e meu coração palpita tão forte que o posso escutar até o cérebro. Por um instante, vejo todo o meu plano se desfazer como uma teia de aranha destruída e tomar um outro rumo que me aflige exasperadamente: consumar um ato com Marco.

Quer dizer, não é como se fosse o pior acontecimento da minha vida. De fato, seria muito mais memorável do que o encontro com Fred, o filho do mecânico. Mas depois de muitos pesares, sonhos, planos mirabolantes e situações desconfortáveis, nunca realmente acreditei que pudesse chegar a este ápice, à épica conclusão da Operação Dionísio. Sinto-me exatamente como um cachorro que corre atrás de um carro pela cidade inteira, e finalmente o carro para e ele alcança o veículo: é quando o animal nota que não resta mais nada a fazer.

Sim, exatamente isso. Quando Marco e eu terminarmos nosso acasalamento após uma intensa troca de fluidos e atividade física, cada um de nós seguirá seu caminho como dois estranhos, porque não restará mais nada a fazer. Ele nunca me verá como uma futura namorada, apenas como uma amiguinha legal que o viu como um príncipe encantado que tirou sua virgindade. Numa aposta.

Ele termina de despir a sua bermuda, e o encaro vestindo apenas uma cueca boxer azul-marinho escrita “Tommy Hilfiger”. Meu rosto enrubesce, afinal de contas é a primeira vez que vejo um homem desta forma. Cubro meu tronco desnudo com os braços, escondendo o sutiã que tenho há pelo menos quatro anos e cujo fecho já está quebrado.

_ Você quer uma música? – Ele me pergunta, fazendo com que eu expresse um ar atônito.

_ Música? Como assim? Para quê?

_ Por que… - Ele hesita, mordendo o lábio inferior. Marco sai de cima de mim e deita ao meu lado com o rosto apoiado na mão, pronto para pousar numa revista erótica. – É a sua primeira vez, não? – Ele indaga num murmúrio. Seu timbre não carrega desprezo ou deboche, mas uma verdadeira preocupação, o que me espanta.

Solto o ar pelas narinas, perdendo meu olhar para o abajur cor de carmim que estranhamente não é acompanhado por um lençol azul, e tampouco por cortinas de seda.

_ É sim. – Eu digo, pesarosa.

_ Escuta, se quiser voltar atrás ainda há tempo. A gente até finge que aconteceu alguma coisa, caso não queira ficar constrangida...

Num estalo, logo entendo todo o plano de Marco para boicotar o meu. Deixo um riso nasal escapar, o qual gera confusão nele. As peças se encaixam feito a visão límpida de um céu azul: Marco Lorenzo Vittorelli nunca foi um pegador. Ele sempre foi um ilusionista. “Fingir” é a sua palavra-chave, e “mentira” seu maior cúmplice. Por isso se esconde atrás de dedos chupados e boatos grandiosos, provavelmente acobertado por comparsas.

Mas hoje será diferente: eu farei sua máscara cair.

_ Eu não quero fingir Marco, eu quero fazer.

Novamente o italiano arregala os olhos, totalmente perplexo. Ele anui com a cabeça, coçando o queixo. Escuto o som de um pé batendo acidentalmente na parede que divide o quarto do corredor, e este é o sinal que me avisa sobre a presença de todos atrás da porta.

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Então, este é o momento. O momento no qual Marco é desvendado, ou o momento no qual todos assistem, segundo mamãe, o meu desabrochar de mulher. Ai, que cafona.

Ele levanta da cama, e se posta em frente a mim que continuo deitada. Acompanho seus movimentos nervosamente, mal percebendo que meus músculos estão completamente contraídos. Com os polegares, ele abaixa lentamente o tecido da cueca, e eu desvio o olhar para o abajur cor de carmim novamente.

Concentre-se na música do Dominó, Nora. O abajur está com você.

Ainda com a atenção voltada para os artigos de decoração do quarto (a propósito, desejo parabéns para à designer), sinto o seu calor se aproximar outra vez. Agora, com sua pele nua em contato direto com a minha, apodero-me de um arrepio que percorre desde os pés até os fios da nuca. Sua língua morna dança pelas minhas clavículas, e ele sutilmente abre o zíper do meu short.

Ai, caralho. Ai, caralho.

O short desce até meus pés e cai no chão, pelo menos é o que presumo. Ainda não tenho coragem de olhar para Marco, então fecho meus olhos e finjo curtir o momento. Suas mãos firmes abaixam minha calcinha, e engulo em seco. Minha vontade é de chorar, e não sei muito bem o porquê.

Bem, acho que é agora. Adeus hímen, adeus plano fracassado. Marco vencerá a sua aposta.

Ele volta a deitar por cima do meu corpo, agora ambos do jeito como vieram ao mundo. Marco continua a beijar meu colo, e crio forças para abrir as pálpebras por alguns milímetros. A visão embaçada me fornece os ombros largos do italiano, contraídos. Mais à frente, a silhueta de um bumbum.

Fecho os olhos automaticamente.

Sim, eu vi o bumbum do Marco. Ai, que vergonha, que vontade de morrer! Mas cá entre nós, que bunda linda.

Ele continua a enrolar por longos minutos, e embora eu seja inexperiente, de uma coisa talvez eu entenda: a preliminar é necessária, mas ele está beirando ao exagero. Sua boca reveza entre as clavículas e meus lábios, e suas mãos permanecem inertes entre minhas orelhas. Começo a me cansar da rotina, e Marco nota isso quando solto um esbaforido pelas narinas.

_ Algo a incomoda? – Ele pergunta, de imediato.

_ Hmm... a gente pode pular a entrada e... comer o prato principal? – Sugiro, e ambos rimos.

_ Claro, claro. Vamos direto ao... salmão grelhado com molho de maracujá.

_ Sim, mas prefiro molho de ervas finas.

_ Com certeza, porque você é uma pessoa muito elegante.

_ Até parece...

Ele rola sobre a cama e novamente me dirijo ao abajur cor de carmim, com uma onda de pânico me invadindo a cada nova ameaça de vê-lo completamente nu. Eu sei que é besteira da minha parte, mas não sou acostumada a ver homens pelados. Nem na televisão. Escuto-o abrindo a carteira, e logo em seguida reconheço o som crepitante da embalagem de preservativo.

Ai, caralho. Ai, caralho.

A cada segundo de ação vejo meu plano mergulhar cada vez mais por água abaixo. Já se passou tanto tempo desde que estamos aqui que começo a duvidar se o povo está ainda atrás da porta. Ouço o plástico sendo rasgado, e pela sombra na parede oposta a nós vejo os movimentos dele. Engulo em seco. É agora ou nunca.

Algumas dezenas de minutos se passam, e continuo a notar a sombra de Marco numa “tentativa”, diria até uma guerra, com o preservativo.

_ Tudo bem aí? – Interrogo, com o rosto virado para o outro lado.

_ Hmm... mais ou menos. Acho que vou precisar da sua ajuda.

No mesmo instante meu corpo entra em colapso, e sinto minha pele efervescer de nervosismo.

_ Como eu posso ajudá-lo? Você é o homem, você quem sabe colocar essas coisas! – Retruco, indignada.

_ Não estou com problemas em colocar... Nora. Estou com... outros problemas. – Marco responde, sua voz carregada de acanhamento.

_ Ah! – Deixo escapar sem querer, colocando a mão sobre a boca.

Repentinamente, meu plano dá uma guinada abrupta e sai do chão em direção aos céus. Se for o que estou pensando, meu plano será de 100% sucesso: a prova viva de quem é o verdadeiro príncipe libertino Marco Lorenzo Vittorelli, um impostor sem escrúpulos.

Mas para que eu alcance minha meta, preciso constatar a falha com meus próprios olhos. Respiro fundo, buscando coragem. Fala sério Nora, você já viu um desses centenas de vezes nos livros de Biologia, tento me convencer.

Mas não é a mesma coisa. Não, nunca é.

Cautelosamente desviro meu rosto, e o vejo sentado de costas na beirada da cama. Apanho um travesseiro para cobrir meu corpo e engatinho até ele, que olha para mim de esguelha ao perceber minha aproximação.

_ Acho que você vai ter que... – Ele pede, sem completar a frase. Eu franzo o cenho, não compreendendo. – Utilizar suas habilidades orais.

Arregalo os olhos, estupefata. Como assim? Nunca fiz isso na minha vida! Que... absurdo!

_ Marco, sou virgem. Eu...

_ Não, tudo bem, tudo bem. Posso resolver isso sozinho.

Solto um arquejo de alívio, e sento ao seu lado. Tentando conter um riso com os dedos de tanta vergonha, aguardo Marco solucionar seu problema de forma solitária. Após um minuto, dois, três...

_ Cacete. – Ele xinga, finalmente desistindo. – Acho que não tem jeito. Às vezes eu só consigo com uma ajuda. Foi mal. Tem certeza que você não pode tentar?

Viro para ele, perplexa. Até que pondero duas vezes, mas logo apago todas as alternativas como um quadro negro e vou direto para o xeque-mate.

_ Marco, assuma logo.

_ Assumir o quê? – Ele devolve, receoso.

_ Não se faça de bobo. Eu já sei sobre tudo desde aquela saída em Copacabana. O seu amor na Europa...

_ Espera, espera – Marco levanta de súbito, e pela primeira vez dou de cara com seu amigo.

Meus pensamentos resumidos em palavras:

AAAAAAAAIUDHIUDHCUWJHNDLKNEIWOEJDFEFJDJOWKMQPUTAQUEPARIU!!!

_ Até onde nossa conversa chegou? – Ele continuou, evidentemente preocupado.

_ Até a parte em que você me diz... que possivelmente é gay.

Marco se mantém boquiaberto, e em seguida enterra o rosto nas mãos.

_ Por que você insiste em esconder seu verdadeiro eu? Por que insiste em se passar por alguém que não é nem de longe?

_ Porque as pessoas não aceitariam, Nora! – Ele esbraveja.

_ Shiii, fala baixo, tem pessoas atrás da porta – Advirto, provocando uma expressão ainda mais consternada nele.

_ Como...?

_ Ah, eu me chateei por você colocar minha virgindade numa aposta, ok? Então acabei planejando uma cilada para você. Não fique magoadinho, tenho total razão para fazer isso.

_ Que tipo de cilada? – Ele interroga, numa perturbação exponencial.

_ Bem... eu queria mostrar para todos que você é uma farsa. Então topei transar contigo só para provar que é broxa... com mulheres ao menos. – Explico, a contragosto.

Marco permanece quieto por alguns segundos, absorvendo a informação.

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_ E essas pessoas atrás da porta estão esperando o quê, exatamente? Você abrir a porta e mostrar ele caído?

Balancei a cabeça para os lados, indecisa.

_ Não planejei muito bem essa parte.

_ Ah, que ótimo. – Ele solta um riso frouxo e desiludido, apoiando os braços na cintura. – Então vá em frente. Conclua seu plano, já conseguiu o que quer.

_ Não.

_ Como assim, não? – Marco questiona, aturdido.

_ Não quero mais fazer isso. Embora você mereça.

Ele senta ao meu lado na cama, e juntos ficamos com os braços cruzados sobre a barriga. Deve ser uma cena engraçada para quem vê de fora.

_ Então você é gay mesmo? – Pergunto num sussurro.

_ Sou, Nora. Sou gay.

_ Nossa.

_ Nossa o quê?

_ Que desperdício.

_ Não é a primeira a falar tal coisa. E agora?

_ Agora o quê?

_ Como vamos sair daqui?

_ Hmm... não sei. Eles estão esperando por algo da minha parte, sabe.

_ E também da minha, Nora.

_ Chegamos a um impasse.

_ Jura? – Ele bufa, derrotado. – Nora, eu faço qualquer coisa. Mas, por favor, te peço como um amigo, se é que um dia cheguei a ser um para você. Não conte a ninguém, absolutamente a ninguém. Se contar, sou um homem morto. Praticamente.

_ Como assim, Marco?

_ Meu pai… é homofóbico. Ele jamais entenderia meu relacionamento com o Augusto – De repente percebo sua voz ficar embargada, e fito os seus olhos verde-oliva voltados para o piso, marejados em lágrimas. – As únicas pessoas que o conhecem são Isabella e Renata. Todos os boatos... a orgia... são invenções dela – Ele dá uma risada fraca e fúnebre.

_ Por isso que elas vivem ao seu lado?

_ Sim. Elas meio que me protegem, sabe? Fazem parte do meu “teatro hétero”. Contudo você está certa, sou uma farsa.

_ Eu sinto muito, Marco.

Um silêncio perpassa o quarto, e agora desejo ajudar o alvo da minha vingança. Afinal, Marco está chorando. Há quanto tempo ele deve conviver com essa dor e repressão? Há quanto tempo ele precisou deixar de lado o que verdadeiramente é?

_ Acho que tenho uma ideia, Lorenzito. Darei meu braço a torcer.