Mileena: Hm?

Mileena estava deitada. Ela abriu os olhos, mas não podia ver nada. Estava tudo escuro. Ela então levantou o tronco, ficando sentada no chão.

Mileena: (Que estranho... Eu... Achei que tivesse morrido, mas...)

Mileena não ficou se indagando por muito tempo a respeito de sua sobrevivência, pois havia um detalhe que estava a incomodando. Além da escuridão, estava tudo quieto demais. As trevas daquele lugar pareciam quase físicas, como se fossem uma massa que a envolviam completamente. Era assombroso.

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Mileena: (O que está acontecendo? Onde eu estou? Será que eu fiquei cega? Ou é alguma outra coisa? Que sensação esquisita...)

De repente, ruídos desfizeram o silêncio absoluto. Eram ruídos curtos, pesados, se repetiam com certa regularidade e ficavam mais nítidos com o passar do tempo. Pareciam passos. Mileena logo se levantou e se pôs em prontidão. Ela procurou confiar em seus outros sentidos para tentar perceber quem se aproximava.

Mileena: (Quem está vindo? Não... Não é quem... É o quê.)

Mileena logo percebeu que os passos eram pesados demais para serem de alguma pessoa. Eram passos de alguma criatura grande, maior do que a própria Mileena. Em meio aos ruídos de passos, surgiu um contínuo e medonho bramido. A criatura misteriosa, porém, não atacou a moça, mas se limitou a rodeá-la, como se estivesse a analisando. Isso não deixava Mileena mais tranquila; pelo contrário, só a deixava mais assustada. Pra piorar, mais ruídos de passos e bramidos surgiram, indicando a chegada de mais criaturas, que passaram a fazer a mesma coisa que a primeira fez, rodeando a moça de manopla. Esta procurava manter a calma e ponderar sobre o que fazer.

Mileena: (Eu não sei se estou mesmo cega ou se isso tudo é puro breu... Se for o segundo caso...) Sexta bên-

"Parem!"

Um poderoso brado retumbou no local inteiro. Os bramidos imediatamente se cessaram. Confusa, Mileena olhava ao seu redor, tentando perceber de onde veio a voz misteriosa. Esta novamente se pronunciou.

"Esta jovem alma é minha convidada. Afastem-se."

As criaturas que cercavam Mileena foram embora, uma por uma. A mulher então ficou só. Antes que ela se pronunciasse, linhas fracamente luminosas surgiram diante dela, formando um portão, que se abriu.

"Entre, jovem alma. Quero muito falar com você."

Mileena: Me diga antes, quem é você?

"Eu me apresentarei depois que você entrar aqui."

Mileena: E se eu não quiser?

"Então terá que se entender com os meus dragões. A escolha é sua."

Sem ter como contra-argumentar, Mileena se pôs a andar e passou pelo portão. O local onde ela estava naquele momento não era tão escuro quanto o lado de fora, e isso a permitia ter uma melhor noção do lugar onde estava. A moça de manopla se viu num corredor com paredes e teto de cor verde bem escuro e profundo. Após poucos minutos caminhando, Mileena chegou a um salão grande e espaçoso. A moça andava vagarosamente, olhando para todos os cantos do salão, cujas paredes e teto mal eram visíveis por causa da escuridão; o piso, porém, emitia uma fraca luminosidade esverdeada e tinha um aspecto de vidro polido. Mileena andava em direção oposta à saída do corredor, embora não pudesse ver o que tinha em frente.

Depois de um tempo, Mileena ficou estática. Ela sentia uma imponente e esmagadora presença logo à frente. Da escuridão diante dela, saíram o que pareciam ser mantos feitos de puras trevas e que avançavam, flutuando pelo salão. Depois destes, surgiu um indivíduo que mais aparentava ser a personificação daquelas trevas; era tão escuro que mal dava para definir suas feições. Possuía uma coroa negra, cujas pontas se remexiam sobre sua cabeça, como se a própria coroa estivesse viva. Seus mantos se estendiam e envolviam o salão inteiro. De seu rosto, só era possível ver seus olhos, que tinham a forma de dois pontos ligeiramente iluminados. Mileena olhava para o sujeito paralisada de temor. Nunca viu nada parecido em toda a sua vida nem sentiu um poder tão opressor antes. Como uma pluma ao ar, o indivíduo desceu calma e vagarosamente em direção à moça, que olhava para ele, sem reação.

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????: Jovem alma... Bem-vinda à minha morada, Hellspire, o coração de Everdark.

Mileena: ...

????: Como eu havia dito, vou me apresentar a você. O meu nome é Void. Sou o regente que comanda este domínio e todos os outros acima dele.

Mileena: P-Peraí... Regente? Como assim? Não estou entendendo...

Void: Ora, é fácil. Não sou dos 5 regentes de Utopia...

Mileena: Que... Quer dizer que... Eu estou em...

Void: Sim. Agora mesmo, você está diante do imperador de Pravus.

Ao ouvir aquilo, Mileena sentiu suas forças sumirem e caiu de joelhos, jorrando lágrimas em seu rosto vidrado de angústia. Começou a entrar em desespero ao sentir que estava condenada.

Mileena: Eu me lembro... Eu fui envenenada por Jasmine e... Heh... Eu sabia... Desde a maldita hora que coloquei essa luva... Eu sabia...

Void: Jovem alma, acalme-se... Você não morreu.

Mileena desfez o rosto vidrado ao ouvir a frase proferida por Void, passando a olhar para ele, se mostrando confusa.

Mileena: Eu não morri? Como assim?

Void: No momento, seu corpo está em estado de comatose, mas já está em processo de recuperação. Você logo voltará a Realia.

Mileena: Então... Como eu vim parar aqui?!

Void: Apenas aproveitei a sua condição atual para lhe trazer aqui. Simples.

Mileena: E pra quê você fez isso? O que você quer, me destruir?

Void: Se eu lhe quisesse destruída, você já estaria destruída. Porém, lhe reservei a honra de ser a primeira alma humana a pisar em Everdark.

A essa altura, Mileena se pôs de pé e encarava Void, mesmo com a sensação de peso causada pela tenebrosíssima presença do regente.

Mileena: Até parece que vou me sentir honrada por estar em Pravus!

Void: Tem coragem de se dirigir desse jeito arrogante ao imperador de Pravus?

O tom sério de Void fez Mileena ter um frio na espinha, temendo uma reação violenta de Void. Afinal, considerando que era o maioral dos regentes de Pravus, qualquer coisa poderia servir de motivo para uma retaliação. Porém, ele apenas mostrou descontração.

Void: Huhuhuhu... Eu aprecio um trato genuíno de coragem. Você é mesmo admirável, jovem alma.

Mileena: Me poupe dos seus elogios. Diga logo o que quer.

Void: Pois muito bem. De fato, temos pouco tempo. Permita-me ir direto ao ponto. Como você se sente em relação à sua luva?

Mileena: Minha luva?

A princípio, Mileena iria retrucar, pois, considerando que Void afirmara ter pouco tempo, embora não soubesse para quê, achava estranho que Void a tenha trazido ali apenas para conversar. Porém, enxergou ali uma excelente chance de saber mais sobre a sua luva. Por isso, resolveu "dar corda" ao regente maligno.

Mileena: Bom... Eu confesso que me acostumei bastante com ela, apesar de dizerem que ela era de origem demoníaca... Aliás, já que você me trouxe aqui, talvez você possa me dizer a respeito dela...

Void: Claro que posso. Afinal, quem criou essa luva fui eu.

Mileena ficou temerosa ao ouvir a revelação de Void e passou a desconfiar ainda mais da situação em que se encontrava.

Void: Você na verdade é muito afortunada. O que você tem em sua mão é um dos itens que chamamos de Relíquias Regenciais.

Mileena: Relíquias Regenciais?

Void: São objetos que nós regentes criamos e deixamos em Realia. Alguns deles foram criados nos tempos primordiais, antes da criação de Utopia e Pravus. É o caso dessa luva.

Mileena: E pra quê vocês criaram essas relíquias?

Void: A princípio, cada um teve seu motivo particular. No meu caso, era para ter o que eu mais queria ao alcance de minhas mãos.

Mileena: Ter o que mais queria...

Void: Sim, este é o poder da luva que criei; o poder de compensar o vazio de seu coração com aquilo que você mais deseja. Você por acaso se lembra do seu maior desejo quando colocou esta luva?

A moça olhou surpresa para o regente maligno. Ela obviamente não se esqueceu do dia em que colocou a luva. Mas, ao ouvir a pergunta de Void, um detalhe veio em sua mente.

Mileena: Eu me lembro sim... Eu queria controlar meu próprio poder. Até então, só conseguia mantê-lo sob controle com a magia de supressão da minha mãe, Midea... Mas, depois que eu coloquei a luva, nunca mais tive problemas com o meu poder!

Void: Assim como você desejou. E também, antes de cair, você lutou com todas as forças para não morrer. A luva considerou isso.

Mileena: Então é por isso que eu não morri... Mas, se é assim, por que ela não estava com você ou com algum adorador de Pravus?

Void: Eu não preciso mais dela e, ainda que eu precisasse, eu não poderia. Quando minha grande mãe, Prima, destruiu minha forma física, eu perdi a capacidade de usá-la. Quanto aos adoradores de Pravus, muitos deles certamente tentaram usá-la. Na verdade, todos os outros humanos que tentaram colocá-la pereceram logo em seguida. Tudo porque desejaram poder...

Mileena: Não estou entendendo. O que aconteceu exatamente?

Void: Eles de fato conseguiram poder, mas como a luva se corrompeu com a minha queda em Pravus, eles absorviam poderes demoníacos numa quantidade tão grande que seus corpos acabavam dizimados no ato.

Mileena: Entendi... Sendo assim, e quanto a você? Você conseguiu o que mais queria?

Void: Sim, embora, no fim das contas, não precisei da luva para tal. O que eu queria eu sempre tive comigo.

Mileena: Como assim?

Void: É uma longa história; não posso comentar isso com você. Mas cheguei a fazer um teste com Argenta.

Mileena: O que você fez com ela?

Void: Obtive uma mecha do cabelo dela. Só isso.

Mileena: Você mexeu com o cabelo dela? Ela não ficou zangada?

Void: Bem, ela não se tornou o aspecto da morte à toa, minha jovem.

A moça explosiva deu uma risada sonora, que reverberou por todo o local, o que acabou assustando a própria moça. Porém, Void mostrou satisfação com a reação dela.

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Void: Ah, quem dera este belo riso durasse eternamente aqui... Uma pena que você já esteja de saída.

Mileena: Hã?

Foi quando Mileena se deu conta de que estava ficando translúcida, parecendo que estava para sumir.

Mileena: O que está acontecendo?

Void: Seu corpo está completamente recuperado do envenenamento. Digamos que ele está lhe chamando de volta.

Mileena: Tsc... Confesso que queria perguntar mais coisas, mas...

Void: O mais importante você já sabe. Basta desejar sabiamente e de todo o coração. Assim, você ficará bem.

Mileena: Você fala como se estivesse querendo me ajudar...

Void: E se eu estiver? Há problema nisso?

Mileena: Sim, você é o imperador de Pravus.

Void: Heh... Acredite no que achar melhor. Eu tenho ciência de minhas escolhas; pagarei por elas quando chegar a hora. Se lhe serve de consolo, digo que, se você estivesse mesmo condenada, a própria Argenta teria acabado com você há tempos. Como não é assim, é seguro dizer que ela tem um propósito pra deixar você usar essa luva. Não concorda?

Mileena olhou surpresa para Void de novo. Enquanto ela sumia, ela sentiu um alívio indescritível ao considerar a afirmação de Void. Assim, ela nada respondeu. Porém, Void não acabou.

Void: Um presente de despedida pra você...

"Você não é a única Darphai que resta."

Com os olhos arregalados de tamanho espanto, Mileena tentou falar algo, mas não teve mais tempo. Ela finalmente desapareceu.

—---

Marjorie: Chuif... Chuif...

Sentada no chão e próxima a uma parede, abraçada às próprias pernas e de cabeça abaixada, Marjorie chorava sem cessar. Mileena jazia no chão, não muito longe dali. Seus cogumelos olhavam tristes para ela, sem saber como consolá-la.

Mushofofa: Mamãe, não chore...

Mushibento: Não chore, senão eu vou chorar também...

Marjorie: Me deixem... Chuif...

O cogumelo de chapéu verde, Mushirambo, deu sinal para seus irmãos se afastarem de sua mãe. O de chapéu vermelho, Musholoco, foi o primeiro a virar para ir embora, mas logo se assustou com o que viu. Mileena estava sentada, pondo a mão na cabeça.

Mileena: (Eu ouvi aquilo direito? Ele disse que eu não sou a única Darphai que resta?)

Os outros cogumelos logo viram a mesma coisa que Musholoco. Após alguns segundos olhando uns para os outros, fizeram em seguida um alvoroço.

Cogumelos: MAMÃE! MAMÃE! OLHA, MAMÃE! OLHA!

Levantando a cabeça vagarosamente, a pequena bruxa viu Mileena sentada no chão, a qual a observava de volta. Por um momento, a moça deixou as ideias de lado e, sem ter muito o que dizer, se limitou a sorrir.

Mileena: Oiê.

Marjorie estava incrédula e emudecida. Sua irmã recém-adotada não estava morta, mas sim viva e sorrindo para ela. A menina se levantou às pressas, correu em direção a moça e a abraçou, chorando muito, mas dessa vez de alegria. Mileena retribuiu o abraço com ternura e alegria, mas pouco depois, enquanto ainda abraçava sua irmãzinha, dirigiu seu olhar para sua luva. Um misto de sentimentos surgiu em seu coração, mas logo depois também surgiu uma certeza: Ela tinha que ir ao fundo de toda a história.