Rise Again

Capítulo 13


A escuridão era reconfortante. Não havia mais aquele calor que parecia dividir meu corpo ao meio. Não havia mais dor. Havia vozes.

Lentamente fui tomando consciência de estar deitado. Deitado em algo macio e tinha alguma coisa apitando num ritmo constante.

Bip.

Bip, Bip.

Bip.

E então a escuridão foi corrompida por uma luz muito branca.

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– Ele está acordando! – eu conhecia aquela voz. Em algum lugar na minha mente eu reconheci o timbre acolhedor.

Por que meu corpo inteiro estava dormente e minha mente parecia como gelatina?

– Está me ouvindo, Gale?!

Busquei minha própria voz para responder. Tudo o que consegui foi um grunhido que escapou por meus lábios secos.

– Não faça esforço, querido. Estou bem aqui. – senti dedos penteando meu cabelo. Também reconheci aquele gesto.

– Mãe? – grunhi.

– Sim, querido. Estou bem aqui.

Aquilo me trouxe conforto e, inconscientemente, suspirei.

Deixei meus olhos se acostumarem com a claridade – o que foi um esforço já que o carinho da minha mãe em meu cabelo quase me conduziu de volta à inconsciência. Vi outras três silhuetas no canto do quarto e tentei me sentar para identificá-los. Foi uma péssima coisa a se fazer porque aquilo doeu como o inferno.

– Não se mova! – apesar da repreensão da minha mãe e da dor, eu consegui me acomodar numa posição que me permitiu ver meus irmãos. Eles pareciam cansados, mas me sorriram quando os encarei.

– O que aconteceu?

Olhei pela primeira vez ao redor e para mim mesmo. Meu abdômen estava todo enfaixado em bandagens grossas e eu estava ligado a um aparelho que monitorava meus batimentos cardíacos, além da bolsa de medicação intravenosa.

– Você perdeu muito sangue. Nos chamaram para fazer uma transfusão. – minha mãe disse com um ar cansado.

– Viemos assim que fomos chamados. – Rory completou. Ela era a única dos meus irmãos que não usava uniforme militar, mas parecia ter vestido a primeira coisa que viu ao acordar.

– Katniss... Onde está Katniss? – lentamente imagens confusas vieram à memória, conforme o efeito da morfina estava aliviando.

– Ela está bem, na medida do possível. Não tem muito tempo que ela saiu.

– O que aconteceu? Exatamente?

– Pensávamos que você saberia nos dizer quando acordasse. – Vick disse sentado no braço do pequeno sofá do quarto de hospital. – A sua equipe de investigação não conseguiu descobrir nada ainda.

– Seja quem for que atirou em você, parece ter sumido no ar. – disse Posy, fazendo um ‘Puf’ desanimado com as mãos para enfatizar.

– Ninguém desaparece no ar! Tem que haver alguma pista! Ouch! – me exaltar, definitivamente, não era uma opção no momento.

– Será possível que eu vou ter que mandar te apagarem de novo para você ficar quieto?! – minha mãe empurrou meus ombros até que eu voltasse a me deitar numa posição que não comprometesse os pontos do meu ferimento - Vamos deixar para discutir de quem é a culpa do atentado depois!

Nesse instante a porta do quarto abriu e Katniss entrou. Seus olhos estavam fundos, ela estava meio pálida e mesmo com o cabelo um pouco desalinhado, estava linda quando sorriu aliviada ao me ver.

– Que bom que acordou. Como se sente? – ela fechou a porta atrás de si e caminhou até o outro lado da minha cama.

Procurei rapidamente algum sinal de que ela pudesse estar ferida, mas não dava para ter certeza por ela estar usando a grossa jaqueta do uniforme que deram aos tributos.

– Me sinto melhor em ver que nada te aconteceu.

Ela sorriu de novo, mas dessa vez havia algo em sua expressão. Eu poderia estar enganado por causa da lerdeza dos remédios e poderia ser apenas o cansaço, mas eu pude jurar ter visto culpa nos olhos dela.

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Vick pigarreou e Posy ficou em pé junto com ele, vindo em minha direção.

– Temos que voltar aos nossos postos. Mais tarde eu volto aqui pra ver como você está, ok?! – Vick disse, apertando levemente meu ombro.

– Não precisa. E isso é uma ordem direta, soldado. – disse e ele rolou os olhos.

– Aaah, vá dormir Gale! Nossa... Eu realmente acabei de desacatar um oficial?! Caramba, isso é muito bom! – vi minha mãe franzindo o lábio para não rir. – Se cuida, irmão.

– Obrigado.

Os dois andaram até a porta e então voltaram para Rory.

– Por que não vem com a gente?

– Eu estou de folga. – ela respondeu enquanto sentava-se no sofá.

– Vá com eles filha. Você precisa se alimentar, ainda está muito fraca. – então eu entendi por que ela parecia tão abatida: ela foi a principal doadora para a transfusão de sangue.

Mesmo contrariada, ela se levantou e, antes de sair, depositou um beijo na minha testa desejando melhoras.

– Eu vou aproveitar e falar para o médico que você acordou. – minha mãe anunciou poucos segundos depois de Rory sair pela porta. Eu fiz uma nota mental para agradecê-los por me deixarem a sós com Katniss. – Qualquer coisa, não hesite me chamar!

– Pode deixar Hazelle. – Katniss respondeu.

– E mais uma vez, obrigada querida. Se você não estivesse por perto... – minha mãe sacudiu a cabeça, espantando qualquer pensamento sobre o desfecho do atentado e então apontou seu ameaçador dedo indicador na minha direção – E você, descanse! Vai ter muito tempo para trabalhar quando o ferimento cicatrizar!

Depois de dar um beijo em meu rosto, ela saiu também. Assim que a porta se fechou, Katniss sentou-se na cama com cuidado e buscou minha mão.

Eu realmente não esperava aquele gesto, mas eu gostei. Seus dedos entrelaçados aos meus me transmitiam um calor que irradiava por todo meu corpo. Não era o mesmo calor da dor de se levar um tiro, era um calor muito diferente. Eu poderia facilmente desejar me perder naquele calor.

Katniss ficou olhando para nossas mãos unidas por um longo tempo e então levou meus dedos aos lábios. Deixei eles lá até que senti lágrimas indo de encontro ao meu polegar, que acariciava seu rosto.

– Não faz mais isso comigo, ok?! – ela sussurrou e havia desespero em sua voz – Não vou aguentar se tiver que passar por isso de novo.

– Shiii... Não diga uma coisa dessas. – segurei seu rosto, enxugando algumas lágrimas e me lembrando vagamente de ter feito esse mesmo gesto, porém sujando seu lindo rosto de sangue. Com certeza essa imagem ficaria marcada por um bom tempo na minha memória. – Você é a pessoa mais forte que eu conheço. E eu não pretendo te deixar tão cedo.

Ela pareceu aceitar minhas palavras. Sua mão livre foi em direção ao curativo, erguendo um pouco da borda para ver como estava o ferimento. Pela careta dela, soube que aquilo estava feio.

– Como você está se sentindo? De verdade.

– Ainda estou sonolento, mas acho que o efeito dos analgésicos está passando. Alguém sabe, pelo menos o tipo de calibre da bala?

– Não era uma bala comum.

– Eu estava de colete... – me lembrei – Não era para ter perfurado.

– Paylor já revisou e reviu todos os arquivos que você preparou sobre o arsenal militar de Panem. Nada se encaixa à tecnologia daquela munição. Beetee está tentando mapear baseado nos componentes, mas até agora não descobriu nada também. O médico disse que você teve muita sorte e por pouco não foi preciso fazer uma gastrectomia, mas foi preciso colocar pinos na costela fraturada.

Katniss suspirou cansada. Depois de alguns segundos, eu suspirei também.

– Quanto tempo eu fiquei fora do ar?

– Dois dias. Você também é a pessoa mais forte que eu conheço. – ela elogiou e então sorriu. Mas seu sorriso não durou – Tem uma coisa que está me incomodando demais... Eu fico pensando e pensando, e revivendo toda a cena de novo e de novo...

– Chegou a alguma conclusão? – perguntei, embora não tivesse mais certeza de que ela estava falando comigo ou pensando em voz alta.

– Talvez se eu não estivesse lá, nada disso teria acontecido a você.

– E talvez se você não estivesse lá comigo, você estaria chorando minha morte agora. Não tem como saber, Katniss.

– Quando eu relatei exatamente o que aconteceu, sabe o que o médico me disse? – ela não esperou minha confirmação para continuar – Que você teve sorte de ter se levantado no momento certo, ou a bala poderia ter acertado sua cabeça. Você tem noção do quão perto da morte você chegou por minha culpa?

– Não é a primeira vez e eu te garanto que nem vai ser a última.

– Isso é sério, Gale.

– E o que eu estou dizendo também é.

Ela soltou sua mão da minha e passou a mão na testa, afastando algumas mechas que se desprenderam da trança e caíam sobre seu rosto.

Um longo minuto passou onde só era possível ouvir o monitor cardíaco, dessa vez num ritmo um pouco mais acelerado.

– Você ainda acha que Snow está envolvido nisso, não é? – quebrei o silêncio.

Katniss deixou os ombros caírem.

– Quem mais desejaria me ferir dessa maneira?! – ela olhou novamente na direção do meu curativo. – Mas que diferença faz? É loucura. Eu o vi morrer. Todos viram.

– Sim. Snow está morto. Mas ele viveu por muito tempo e teve muita gente de confiança trabalhando para pôr em prática sua ideologia política. Muitos foram mortos depois que tomamos o Capitol, mas dizem que alguns de seus mais fiéis conselheiros fugiram e mudaram de identidade.

– Por que alguém tentaria nos ameaçar dessa maneira? Pra quê?

– Vingança. Poder. Admiração ao trabalho de Snow. Controle político. Ataque externo. São muitas razões...

Katniss ficou em silêncio, absorvendo a teoria que eu tinha lhe apresentado. Desde que ela tinha dito que gostaria de cuidar de tudo pessoalmente caso fosse comprovado que Snow estava envolvido, eu passei a analisar todas as possibilidades de razões por trás do ataque ao almoço da presidente. Tentei descartar sua teoria, mas meu instinto sempre apitava em alerta.

Havia fundamento. Snow oprimiu muita gente e quem trabalhava para ele por vezes era regido à base do medo. Mas ele tinha um pequeno grupo de admiradores que ia desde assessores e conselheiros até prefeitos de distritos que sempre apoiavam sua causa. Certamente alguém achava que o trabalho de Snow não poderia acabar e que a população deveria pagar pela rebelião há 15 anos.

Se isso fosse realmente verdade, todos os envolvidos na revolta, desde a presidente Paylor até Katniss e seus filhos estariam em perigo.

– Eu fui ao Setor 5 da Noz há dois dias porque pretendia conversar com você sobre uma coisa... Uma ideia que eu tive. Eu acabei não tendo oportunidade, mas o que aconteceu até vem a calhar agora. – tentei rir, mas isso fez meu ferimento latejar de dentro para fora.

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– Por acaso tem algo a ver com Beetee?

– Então ele já...

– Chegou hoje pela manhã. – ela sorriu demonstrando satisfação - Por que você pediu para entregá-lo para mim?

Ela se referia ao seu arco Mockingjay.

Quando fui ao Treze para a reunião com os capitães e prefeito, fiz uma visita noturna ao laboratório de Beetee antes de investigar a antiga e abandonada biblioteca subterrânea. Eu já tinha pedido outras vezes para que ele tirasse o arco e a armadura Mockingjay do esconderijo que somente nós dois conhecíamos – a presidente Paylor havia mandado destruir os dois depois que assumiu o poder, mas Beetee desobedeceu e anos depois, quando eu assumi o comando, ele partilhou seu segredo comigo. Mas naquela noite eu soube que havia chegado a hora do arco acordar e voltar às mãos de sua dona.

– Eu fiquei preocupado com a segurança das crianças. Acho que nenhum batalhão de Panem será capaz de assegurá-los como você é capaz quando empunha um arco. O seu arco Mockingjay. Mas tem mais...

– Mais?

Me mexi na cama, buscando me acomodar. Não sabia como Katniss reagiria com o que viria a seguir.

– Quando eu passei pelo Distrito Oito, conversei com sua mãe.

– Minha. Mãe?

– Na verdade, com nossas mães. Caso alguma coisa aconteça comigo e com você, quero deixá-las preparadas para cuidarem das crianças.

Se fosse antes do tiro, talvez Katniss esbravejaria e me daria outro soco por me intrometer na conturbada relação dela com a mãe. Mas com tudo o que aconteceu, ela apenas respirou fundo, balançou a cabeça uma vez para assimilar a informação e mordeu o lábio.

– E ela? – perguntou.

– Ela não foi de falar muito. Escutou tudo o que eu tive a dizer e, depois de um tempo para absorver tudo, disse que aceitava ajudar a cuidar de Prim e Fin, mas que precisaria de pelo menos uma semana para se mudar para o Dois.

– Ela... aceitou? Por quê? Por que agora?

– Por que todo mundo sente a tensão no ar. Posso ter apagado por dois dias, mas tenho certeza que a situação piorou desde que eu levei um tiro, certo? – ela meneou fracamente a cabeça concordando. Ela poderia até não querer aceitar, mas eu tinha razão – Estamos prestes a entrar em uma guerra, Katniss. Uma guerra contra pessoas que sequer conhecemos. Nossos inimigos podem estar ao nosso lado, nos oferecendo apoio sem sequer sabermos de seus planos, mas também podem se manifestar a qualquer momento e mostrar quem são e o que pretendem. Precisamos nos preparar. Eu preciso deixar você preparada para isso.

– Mas já estamos recebendo treinamento.

– Do Tenente Blake?! Não é suficiente. Eu quero deixar você pronta, porque se alguma coisa acontecer comigo ou com a cúpula do governo, os tributos é que vão ter que controlar a situação com a população. Vocês serão o governo, Katniss.

– Não. Não diga isso. Nada vai te acontecer. Você mesmo disse que não pretende ir a lugar algum.

– E no que depender de mim, não pretendo mesmo. Mas SE acontecer, você tem que estar pronta. E eu vou cuidar pessoalmente disso, como você queria.