Riotalia

Facebook, caipivodka e outras vibes


Jan estava muito ocupado fazendo coisas ilícitas no banheiro. Coisas bastante ilícitas. O chuveiro estava ligado sem ninguém sob a água, algo que era unicamente um disfarce. Não era ele quem pagava a conta da Cedae mesmo. E se ele desse sorte não estaria no mundo quando a água acabasse de vez (brincadeira, questões ambientais tinham um lugar reservado nas preocupações dele - economizar as coisas era com ele mesmo, mas Jan precisava da maconha tipo que pra caramba). O engraçado é que Emma nunca perguntara o porquê daquela quantidade exagerada de banhos que ele tomava. Mas ela já havia desconfiado da higiene excessivamente minuciosa. Era uma questão de tempo até que ela irrompesse em perguntas sobre a mesma e investigasse o caso até arrancar a cenourinha da verdade, que na horta de Jan tinha raízes profundas, mas fracas... Ele precisava de mais cuidados. Estava se arriscando (ainda mais no meio de uma crise hídrica).

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Maldição, o cubículo berrava exigindo uma reforma! A falta de espaço era um problema quando você fingia que estava tomando banho, mas na verdade estava plenamente enfiado em suas roupas, com as costas bem firmes em uma parede, pé na outra por ser alto demais, o outro pé no chão e... Marijuana (maconha, marijuana, tanto faz, só que marijuana é um bocado mais sonoro e chega até a ter uma pronúncia charmosa, refinada). Apesar de reclamar, obviamente ele não estava muito disposto a desembolsar a quantia da reforma de expansão, não; necas! E gostava dos azulejos atuais, que tinham um padrão... Interessante. O aroma de Bom Ar Lavanda inundava cada centímetro daquele cômodo minúsculo, o que estranhamente dava a impressão de que o cômodo era ainda menor, como se o produto se manifestasse na forma de um monstro flutuante com alguns tentáculos e estivesse se esparramando, pesaroso, pelas paredes e ocupando espaço. O Bom Ar era, na verdade, apenas um pequeno truque, um disfarce, assim como a água do chuveiro, caindo sem ninguém para atingir e sem sujeira corporal para arrastar consigo para as profundezas dos esgotos. O aerossol prometia liquidar odores de cigarro, mas será que era capaz de eliminar as marcas deste tipo de cigarro? Era o que Jan descobriria agora, em mais um episódio mirabolante de "Fumando Maconha Quando Sua Irmã Louca Tá Em Casa".

Caramba, aquele banheiro era a versão miniatura do inferno. Ele viraria uma poça e escorreria pelo ralo. Era possível. Parou de reclamar mentalmente e apanhou o isqueiro no bolso da calça. Já ia acender o cigarro quando um grito meio abafado (e cantarolado?) veio lá de fora, fazendo-o ter um sobressalto e mandando o maldito cigarro de marijuana para o chão molhado. O isqueiro foi junto, rodopiando.

Oh, demasiado drama para só um Jan.

– Jaaaaan, eu fiz bolinhos! Se eu fosse você saía logo desse banheiro, porque eles vão esfriar se você se demorar, hohohoho!

Jan rilhou os dentes. Teve de observar o troço sendo varrido pela água e se esvaindo pelo ralo em um cena que durou rápidos, porém dolorosos, segundos. A maldita erva que ele comprara com seu querido dinheiro! Mas era um sujeito prevenido e tinha outro. Em outro bolso.

– Não, Emma, eu não quero bolinhos! - ele disse com impaciência, sua voz ofuscada pela água que batia no chão do box onde ele se banhava quando não estava dentro do banheiro para ler pornô, fumar ou tirar a água do joelho.

– Você não quer comer bolinhos na agradável companhia do seu amigo Antonio?

– Eu não quero comer bolinhos com o Antonio! - ele berrou de volta enquanto recuperava o isqueiro e colocava o cigarro na boca agilmente. Uma pequena chama nasceu no utensílio, pequeno brilho dançante de esperança, e Jan levou a ponta do cigarro até ele.

Um movimento rápido de seus dedos, e ele dispensou o isqueiro, apagando-o.

Deu uma tragada curta, e em seguida uma tragada longa.

Ah.

Fumar maconha era uma arte.

Silêncio.

E findou-se seu querido silêncio, tão previamente.

– Mas por que você tá demorando tanto nessa droga de banheiro!? É número um ou dois? Ah, já sei, o senhor comprou revista pornô de novo, seu safado? - ela berrou, um berro tão colérico que Jan chegou a dar um pulinho de um milésimo de segundo, mas sem colocar em risco o caniço entorpecente imprensado entre seus lábios. - Fica aí trancafiado lendo revistinha indecente, né? Arruma uma namorada!

– Os malditos pornôs eram do Lovino! - berrou Jan em resposta. O banheirinho já se estava enchendo-se com a fumaça; agora o odor de erva sendo tostada, um poderoso gerador adocicado de prazer, enrolava-se aos tentáculos do fedor detestável chamado Bom Ar Lavanda que, puta merda, Jan odiava. Ele estava considerando opor-se permanentemente às listas de compras da irmã Emma, por alguns simples motivos:

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1) Emma era uma maldita gourmet e pessoas de classe média não podem ser malditos gourmets, porque ser um maldito gourmet é simplesmente caro demais.

2) Emma apreciava o aroma de Air Wick Lavanda, algo que o olfato de Jan considerava uma profanação.

Talvez ele apenas fosse um cara muito legal (e idiota) por gastar dinheiro com as frivolidades gastronômicas fraternais e aerossóis com aroma de lavanda, sem rebelar-se, sem nenhum questionamento.

E talvez ele fosse um gourmet nasal. É, fazia sentido, já que ele preferia sprays mais suaves, como o fabuloso Cheirinho de Talco, Brisa Tropical... Mas Lavanda não, Lavanda nunca.

Se ele tinha de suportar isso aí, Emma então teria de lidar com os supostos pornôs. Maldição, ele tinha escolhido uma péssima hora para fumar.

...

Na prole de Yao era forte o apego pela maluquice. O pasteleiro precisava aprender a controlar os filhos (com urgência). Os aborrescentes estavam se rebelando! Ele havia pensado que apenas Kiku fazia cara azeda para seus amados pastéis, mas os outros três andavam visivelmente insatisfeitos, encarando Yao com aqueles olhos estreitos e repletos do desejo de insurgência! Ou Kiku andara manipulando os irmãos e estava maquinando um complô, ou talvez Lee, Mei e Leon nunca tivessem gostado de fritar pastéis... Pensar nisso o fazia arrepiar-se. E pensar na bizarra cartinha de Lee, encontrada e lida algumas horas antes, o dava mais arrepios, alfinetadas no estômago, um aperto na garganta e outras mil sensações indesejadas. Fazia-o pensar "Onde foi que eu errei?". Ele seria assombrado por aquelas palavras. Só ficaria mais aliviado quando tivesse uma conversa com Lee; logo o maldito moleque chegaria do colégio, e provavelmente chegaria com seu gigantesco sorriso patenteado, se encostando em Yao com ares de felino carente (todo filho quando quer pedir ou mencionar alguma coisa monstruosa e sabe que as chances são mínimas, ou que a reação não vai ser das melhores). Yao Wang tinha esperanças de que Lee risse de sua cara pálida e enrugada de desespero e o chamasse de velhaco, porque tudo havia sido uma grande travessura juvenil, e o velhaco fora ludibriado direitinho!

"Papai, eu... Papai, eu não acho que a pastelaria esteja me fazendo bem. Não aguento mais ser zoado na escola com piadinhas patéticas sobre flango, digo, frango. A pastelaria está acabando com meu ritmo, papai, e o gingado está escapando do meu corpo (e a gordura com minha pele). Isso não é bom. Parece que você desconhece meu maior sonho, então vou me abrir para você, finalmente. Espero que depois disso você reconheça e valorize esse meu talento. Sabe, a dança está no meu destino e no meu sangue; eu daria mais que minha alma para estar ao lado de uma diva, balançando meu corpo artisticamente junto a ela. Uma diva em particular... Entende aonde eu quero chegar? É isso aí. Papai, meu lugar é ao lado da perfeita, maravilhosa, Rainha Valesca. Então por favor me liberte! Assim como para a Valesca também há espaço para você em meu coração gigantesco de popofã. Eu só não quero que você tenha vergonha de mim. Com amor e beijinhos (no ombro), Lee."

Um dramático flashback foi se formando na cabeça de Yao. Oh, pobre e iludido velhote, navegando nas ondas revoltas da memória.

No colégio, Lee era bom em quase tudo. Seus boletins chegavam estampados com notas como 10, 9 e 8, jamais abaixo disso. O guri era o orgulho dos professores e prometia a si e a todos que um futuro brilhante estava o aguardando - um futuro de engenheiro ou empresário, qualquer coisa com renumeração alta que pudesse transformar o negócio do pai em uma rede internacional de lanchonetes conhecida por suas deliciosas frituras! "O Rei do Pastel vai se tornar O Imperador", brincava Lee, e Yao quase era derrubado pelo orgulho massivo que sentia pelo filho, ou então quase caía porque estava ficando velho, e seus joelhos, fracos. Seu filho mais promissor acabara de perder o juízo, ou então nunca o tivera.

No momento quase caía por não acreditar que Lee, em segredo, preferia requebrar em um shortinho apertado do que fritar pastéis, um alimento sagrado, tradicional, apesar de não muito nutritivo...

E o que diabos é um popofã? Yao precisava criar um Facebook. Um Face, como constava na boca do povo.

***

Ivan era um cara que gostava do verão, e verão e Rio de Janeiro são melhores amigos famosos e felizes. Gostava do aprazível ventinho marítimo e dos guarda-sóis pontilhando a areia fofa, cuja quentura era um agrado aos seus pés. Podia beber caipivodka aos montes enquanto observava o ir e vir teimoso das ondas (sua querida vodka preparada daquela maneira ficava 10 vezes mais maravilhosa). Adorava os cariocas, que tinham um jeitinho de ser bem diferente daquele dos paranaenses, porque sabiam sorrir. Era uma raridade pensar na cidadezinha que havia abandonado, lá nas profundezas do interior sulista, cidade povoada por gente branquela e insossa. Mas não fora pelas praias de cartão postal, nem pelo calor constante, que ele estava ali agora, razoavelmente distante do Paraná e de suas temperaturas baixas invejáveis ao resto do país... Era uma longa, bizarra história de terror. Ivan não gostaria de relembrar-se dos pavorosos detalhes, então contaremos-na por ele.

Ivan era um fugitivo. Não estamos a falar de perseguições empreendidas por agiotas sedentos, tampouco nosso camarada sulista obteve problemas enquanto contrabandeava utilíssimas muambas paraguaias de curta duração. Fugira porque não aguentava mais sentir-se vigiado pelos olhos onipresentes... De uma de suas irmãs. Eram uma dupla: Natalia, uma jovem bonitinha que teria chances com metade dos rapazes de sua cidadela natal, não fosse o fator Ivan, e Katyusha. Esta inconscientemente dominava a outra metade dos rapazes utilizando-se de uma técnica milenar de nome "seios", vulgarmente "peitos". Katyusha era dona de seios fartos, mas a fartura era demais, e ela reclamava com frequência de todo aquele volume concentrado e entalado em seus sutiãs. Não que ela não gostasse dos seus seios... Eles eram tão bons de se apalpar, e...

Seios são bem legais, mas não podemos desviar do objetivo original desta narração (regras do patrão, infelizmente). Retomando, desta vez com um ponto de vista feminino: Natalia teria chances com metade dos rapazes da cidadezinha patética, não fosse a obsessão, disfarçada até certo momento no passado, pelo próprio irmão - que ironicamente era o único dos homens, pelo menos nos limites daquela região, que jamais a aceitaria (por motivos óbvios). Recorreu a Katyusha para tirar o peso do coração, mas o discurso da irmã só fortificou os grilhões. "Por que logo ele...? Olha, Natasha, há tantos caras livres, eles são fofos e legais, e além do mais Ivan é seu irmão, nosso irmãozinho..." Maldita peituda, não sabe mesmo o que diz! Jamais resignada, Natalia buscou deixar por aí sinais sutis de seu amor, onde o irmão os pudesse ver. Algum dia, fazendo uma correspondência entre os sinais, ele iria entender.

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Tal correspondência nunca fora realizada, e Natalia, em desespero, havia imposto uma perseguição atroz a Ivan. Havia sido drástico, como ela percebeu mais tarde; ele agora andava inquieto, todo ressabiado, e talvez até com medo. Aquele era seu segundo plano, contendo todo o desespero que deveria ser pertinente apenas a um plano C. Um dia, comprara alianças prateadas e fizera a proposta usando todo o drama que conseguira empregar e um pouco mais. Apesar da adorável atuação de "Natasha", ele recusara-se a colocar a sua no dedo, e seus olhos pareciam até mostrar que ele preferiria descer ao inferno. "Irmãos não se casam! É doentio! Que absurdo, Natalia, como você pôde sequer ter isso em mente?" Ele não esperava que sua recusa fosse destruí-la tanto. Com isso, Natalia aproximou-se de seu futuro colapso e pôs-se a se comportar de modo ainda mais estranho, isolando-se e então fazendo aparições inesperadas. Apesar de todas as negações, atiradas como pedras, aquilo só crescera e crescera...

O matrimônio é a única saída. Una-se a mim, ela sussurrava nos sonhos dele. Ivan só conseguia pensar na irmã; a voz dela ecoava sem parar, e estaria lá mesmo com uma centena de bongôs sendo espancados ao mesmo tempo.

"Mande-a para um psicólogo, mande-a ao hospício, faça alguma coisa, antes que ela faça alguma coisa!" Katyusha desmanchava-se toda, uma torrente de lágrimas.

Então Ivan foi-se embora. Era isso ou ficar louco. Caramba, contando daquele modo parecia até que o grande monstrengo da história é o pobre Ivan. Favor perdoar o equívoco do indivíduo que lhes narrou a história acima, porque ele o fez usando o ponto de vista errado e se prolongou demasiadamente com o peitos de Katyusha. Maldita terceirização. A historinha deveria ser apavorante, caramba!

O simpático camarada escolheu o Rio de Janeiro justamente por desejar descontrair, o que perde a lógica quando pensamos nos engarrafamentos e balas perdidas. Mas fora na Cidade Maravilhosa que Ivan experimentara a caipivodka, e depois da saideira podia ir pra casa de táxi, mesmo.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.