Renascer.

5. Furacões e Tempestades.


Xander se assusta com o estado do apartamento assim que pisa dentro do mesmo.

Parecia que um furacão tinha passado por ali. Pedaços coloridos e nudes de variados tecidos se emergiam com papéis rabiscados e brancos por todo o lado, e uma dúzia de agulhas e rolos de linha se espalhavam na mesinha de centro. O tapete cinza, peludo, estava quase sumindo sob as telas de pintura e o coração de Xander palpita, prevendo o pior, quando os olhos verdes se focam na fileira de tintas para tecido na ponta do braço do sofá.

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Algo branco se move do meio de todos os papéis, fazendo o garoto pular de susto afora do estupor: Chiclete pula do tapete para o sofá, e o longo rabo branco passa rente às tintas que balançam precariamente. Xander chupa uma lufada de ar entre os dentes, mas os potinhos não caem. Suspirando, o garoto fecha a porta com cautela e agarra as tintas, pousando-as com igual cautela na mesa baixa, coberta de jornais velhos.

A mão esquerda aperta sua própria cintura fina enquanto a direita coça os cabelos louros, e Xander olha em volta confuso, as sobrancelhas grossas franzindo. Ele sabia que Marjorie tinha alguns rompantes de criatividade, mas nenhum deles nunca se compararam a isto. Balançando a cabeça em cansaço, os dedos longos prendem as mechas embaraçadas pelo vento em um nó atrás da cabeça. Ainda atava o cabelo crespo quando alguém solta um risinho, fazendo-o virar o rosto. Se depara com sua colega de apartamento sorrindo timidamente para ele.

"Desculpe pela bagunça. Prometo que irei limpar assim que o furacão passar."

Xander não tinha dúvidas quanto a isso. Marjorie era um tanto doida com limpeza.

"Sabe," a garota diz, atraindo a atenção de Xander enquanto ela reúne papéis do chão, "eu estava pensando... bem, eu não gosto muito de me meter no assunto dos outros, mas há um tempo um amigo meu me ajudou a me descobrir e, bem," a loura limpa a garganta, gaguejando. Xander a observa juntar a bagunça nervosamente, e cai de joelhos para a ajudar, "o que você acharia de uma transformação?"

O garoto para em suas ações. Levanta as sobrancelhas, pensando sobre o assunto, e senta nos próprios pés, as mãos longas apoiadas nas coxas grossas e cobertas pelo jeans preto.

"Uma transformação?"

Marjorie acente, não controlando o sorriso largo que toma conta de seu rosto animado.

"Sim! Não estou dizendo que você está com uma mau aparência agora, mas, sabe, já que você conversou sobre o porquê de estar aqui, com a transformação sua e tudo, e-eu pensei que poderia ser ótimo ter uma transformação na aparência. Não que você seja f-feio! Pelo contrário, mas como eu disse é uma transformação para te deixar c-como, bem, Hailey, e tamb-"

Xander ri, levantando uma mão na frente da loura para a silenciar. A garota sorri sem jeito, prendendo uma mecha de cabeço atrás da orelha vermelha pelo embaraço.

"Marjo, eu adorei a idéia de um UP."

O rosto da mais velha se ilumina.

"Sério?!"

O garoto solta um riso, acentindo.

"Mas como seria essa transformação?"

Marjorie, sem ar, sorri largamente para Xander. O louro ri para a garota.

×××

Fusuke O'Rell não estava acostumado com uma manhã calma e parada. Parte disso era pela colega de apartamento irritante e doida, mas ela ainda estava dormindo e sua cantoria não ecoava pelas paredes azuis pasteis.

Não que o homem esteja reclamando. Era só... estranho. Suas manhãs eram sempre corridas, cozinhando um café da manhã para dois que a colega sempre devora sem nem degustar, levando o cachorro para andar e então correndo para o ponto de ônibus para chegar a tempo à faculdade.

Mas o refrigerador estava vazio porque a colega esqueceu de fazer as compras do mês, ele já tinha levado Akamaru na noite passada para passear e as aulas foram canceladas por causa da inesperada tempestade de neve que caiu durante a noite, deixando New York inteira sob camadas frias de branco e os cidadãos impedidos de saírem de suas casas por causa da neve exagerada. Fusuke suspira e se arruma confortavelmente no sofá marrom claro com almofadas de espuma. Bocejando, coça um olho azul claro enquanto olha intensivamente para a TV desligada. O vira-lata que pula no seu colo o tira do estupor. Coçando o cachorro de pêlo ralo marrom, Fusuke não levanta nem uma sobrancelha fina quando ouve a voz profunda e levemente raspada que ecoe pelo apartamento. Meses ouvindo a mesma música toda manhã, o garoto sabe que é algo do artista Joe Cocker. Não faz idéia do nome da música, porém. Fusuke agradece quem quer que esteja lá em cima por sua colega ter uma ótima voz.

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A voz diminui para um murmúrio de garganta quando a garota pisa para fora do quarto e na sala. Lábios carnudos sorriem para Fusuke, que sorri de volta.

"Você demorou a acordar hoje, Val."

Valentina balança os ombros sardentos à mostra. Puxa a manga caída da camisa de dormir branca para cima, mas ela logo desliza para baixo do braço novamente. Ela anda levemente para atrás do balcão de mármore branco e abre a porta inox da geladeira, apoiando o queixo na mesma.

"Não há nada para comer. Alguém deveria ter ido fazer a compra ontem, mas pelo jeito esqueceram."

A menina fecha a porta com um estrondo e inclina a cabeça para sorrir largamente em desculpas para Fusuke. O japonês, não aguentando, gargalha levemente da expressão facial e também do embaraço que é o cabelo negro da garota. Balança a cabeça e se estica para agarrar o controle remoto, ligando a televisão.

Mal percebe quando a menina desliza para dentro do quarto novamente. Depois de alguns minutos, sai do estupor de que um episódio antigo de Cavaleiros do Zodíaco o tinha e levanta o olhar para a garota que passa na sua frente. Um cardigã cor vinho estava abotoado até a metade, expondo a camisa simples e preta embaixo. Uma meia-calça preta borrava as tatuagens em suas pernas torneadas, aparecendo dos canos do All Star branco e encardido e sumindo por baixo de um short jeans desaparecido sob o cardigã.

Fusuke franze a testa para a garota, que bebe um copo do último gole de um suco de abacaxi. Chama o nome dela assim que a vê se dirigindo até a porta escura. Valentina vira para ele, as sobrancelhas arqueadas em questão.

"Aonde pensa que vai?"

Valentina arquea as sobrancelhas mais ainda.

"Sair?"

"Tá louca?! Tem neve pra tudo quanto é lado lá fora, e você não está agasalhada!"

Valentina sorri abertamente para ele, os olhos verdes cristalinos se fechando e a cicatriz apagada se esticando ao lado dos lábios pintados de um roxo escuro. Agarra seu chapéu azul néon e o bota sobre o emaranhado encaracolado de seus cabelos.

"Não se preocupe, Fuse. Eu tenho o meu chapéu!"

E, piscando para o garoto em estupor, sai do apartamento. Fusuke só acorda quando a porta bate com um estrondo. Balança a cabeça em descrença para o cachorro.

"Essa garota ainda vai se meter em uma encrenca tão grande, 'Maru, e eu vou estar lá para dizer 'Eu avisei.'"