RECONSTRUÇÃO

Os novos ventos começam a soprar...


Vasco recebe o chamado de Yasemine. A irmã estava do outro lado do espelho, com novidades para serem divididas.

— Como vocês estão? – Alda pergunta sorrindo ao ver sua família.

— Estamos todos bem. – Vasco sorri. Ele aponta para o lado. – Esta é sua tia Zelena e aquele é seu primo Galeano.

Alda acena com a mão, mas não se mostra entusiasmada com isso.

— Papai, Henry e eu vasculhamos o livro e descobrimos o que temíamos: uma receita que fala sobre dicotomia da alma. O Reverendo Kent dicotomizou a alma de mamãe e o que vimos naquele espelho, era verdade.

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— Do que está falando, meu amor?

— A imagem de mamãe desacordada, boiando nas águas, era real. Já que mamãe está viva e é novamente a Rainha Má, posso afirmar que Solon retirou a parte boa da alma de mamãe e deixou à deriva. Os amigos do meu padrinho Killian, não encontrariam mamãe, porque o corpo dela não estava lá mesmo.

— E certamente há como reverter isso. – Yasemine fala.

— Sim. Há como recuperar a parte boa da alma de mamãe e unir ao corpo dela. A luta interna ficaria a cargo dela. Mas para fazer isso, seria necessário o trabalho de alguém muito forte.

Estreitando os olhos, Vasco espera a resposta.

— Então, Henry, tia Mary e eu fomos conversar com o Sr. Gold! – Alda bate palma, como se desentupisse a passagem das palavras.

— Eu posso apostar que ele quis algo muito valioso como parte do acordo. – sugere Zelena.

— Sim! Ele quer o Grande Grimório! E eu fiz o acordo com ele e recuperamos o que estava solto sob as águas. Deveria ser posta em um invólucro que significasse para a vítima. Henry e eu escolhemos colocar a parte resgatada na caixa onde mamãe guardava o coração da vovó Cora!

Todos na sala se entreolham.

— Agora, vamos enviar a vocês, por intermédio de Ariel. Ela consegue criar portais submarinos. Segundo o Sr. Gold, basta abrir a caixa na presença da Rainha Má e deixar que a Rainha Boa faça o restante.

— Filha, meu amor. Diga para que Ariel encontre o seu padrinho Killian, no litoral da Floresta das Esmeraldas e adjacências. Estará seguro com ele e em breve conosco. – Vasco tenta controlar sua excitação, porque líderes precisam ser centrados. – Fique bem, meu anjo! Estaremos todos bem, aqui!

— Dê um beijão na mamãe, quando ela se recordar de nós. Diga que Alda a ama muito.

O comandante Esparviero entra na sala e para repentinamente ao ver a imagem da jovem no espelho. A olha com encanto e não controla seu sorriso, ao ver o sorriso da jovem em sua direção. Mas a imagem se dissipa e ele se torna o foco dos olhares.

— Outra aldeia foi incendiada. Desta vez, não tiveram a ajuda dos macacos falantes.

— Foram remanescentes dos soldados de areia?

— Não, Majestade. Foram soldados humanos. Os cavaleiros negros da Rainha Má.

Afastando-se do espelho, Vasco caminha para perto do soldado.

— Comandante, quero que escolha alguns de seus soldados para formarmos uma tropa que sairá da proteção. Vamos avançar para o castelo e provocar algumas perdas nas propriedades reias. – ele se vira para Yasemine e segura o rosto da garota entre as mãos. – Quero você comigo, meu amor. Pode ser?

— A vida toda, papai.

Numa das noites seguintes, Regina desperta de seu devaneio com a chegada de Solomon em seu quarto. Ela olha o noivo por cima do ombro.

— Não há como criar novos soldados de areia. Teremos de criar outro método, minha amada.

— Não perdi somente sangue com a ferida vinda do nada. Sinto-me fraca e com menos habilidades. – ela se volta e vai sentar-se na cama. – Perdemos toda a nossa frota de navios, certo?

O Reverendo afirma com um movimento de cabeça.

— Perdemos nossos soldados e os habilidosos libertados estão protegendo outras aldeias. Já fez contato com Cosima?

— Somente poderemos sair do palácio, os dois juntos. Enquanto você não se recuperar, minhas habilidades não serão fortes para enfrentamento, minha amada.

Regina cobre o rosto com as mãos. Ainda sentia muitas dores pela ferida não cicatrizada. Estava irritada e impaciente com as derrotas.

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— O comandante me disse que as entradas para as minas de diamantes e de ferro foram bloqueadas e tomadas por aldeões a favor dos rebeldes! A produção de grão para exportação também foi afetada. Sem navios, como enviaremos?

— Não enviaremos, amada. Os dois silos foram invadidos por aldeões comandados pelos macacos falantes.

Regina começa a rir.

— Estamos sendo derrotados por macacos falantes? Nossa vitória e nosso reinado estão curtos. Por acaso, os governantes dos outros reinos voltaram a assumir seus postos?

— Ainda não. Nossos enviados ainda controlam os reinos invadidos. – Solomon toca o rosto de sua amada. – Não poderei ir pessoalmente conversar com Cosima, mas enviarei Paco. Ele falará por mim e levará nosso recado à líder dos rebeldes.

Ainda inconformada com as batalhas perdidas e sentindo muita dor, Regina se mostra ainda mais impaciente.

— O que perdemos mais com o avanço das tropas rebeldes?

— A fazenda de produção de cavalos foi invadida e os animais roubados. Restaram somente os cavalos que estavam em campo com o exército. Nossos aliados que controlavam o litoral, não existem mais. Foram depostos ou foram mortos.

— Estamos ilhados? Nem poderemos sair pela floresta porque a tal habilidosa que conversa com a natureza, deve ter dado ordens ao nosso respeito. Isso não pode ser real! Você me prometeu que se uníssemos forças, seríamos imbatíveis! Você subestimou os outros habilidosos!

A verdade era que o castelo criado com alicerce de areia estava desmoronando. Solomon se sentia fraco por não ter seus dois amores e por saber que jamais seria amado por eles. Mesmo tendo somente a Rainha Má para si, e ela não amando Vasco, sabia que o amor que ele sentia, encheria os dois corações. Ele amava pelos dois. E mais uma vez, depois de ser libertado de sua prisão, Solomon sabia que sua condenação continuaria. Por que continuar, então?

As tropas de Vasco e as de Cosima seguiam em direção opostas, angariando simpatizantes à causa da libertação e destruindo ou usurpando o que pertencia à realeza. Silos, rebanhos, minas de exploração de minério, habitações, tudo estava sendo apossado em nome do movimento rebelde. Os aldeões sentiam-se fortalecidos e eram incentivados a lutarem pela sua pátria, sem esperar pelo surgimento de algum salvador que derrotaria a tirania dos nobres.

Lá pelas tantas, Killian, David e Ruby se unem às tropas de Vasco e apropriam-se do controle da produção de sal e dos paióis que ficavam numa estratégica região do litoral. Os fortes de vigilância também são retomados.

Quando o inverno começa, as tropas retornam para a Floresta das Esmeraldas, sob a proteção da chamada Rainha Zelena.

Yasemine não se controla e agarra seu amigo Cesar, quando o reencontra. Os dois saltitam como se fossem crianças bobas, brincando num recreio de escola. Conversam em algum idioma desconhecido e permanecem abraçados por muito tempo.

“É tão lindo! Não precisa mudar, é tão lindo! E eu adoro, adoro! Difícil é a gente explicar! Que é tão lindo!”- cantarola Yasemine segurando o rosto de Cesar entre as mãos e apertando suas bochechas para que ele faça bico.

— Sua tropa foi de grande valia para nossa luta, Cesar.

— Senti que deveríamos agir, Majestade. Unir...nossas...h-habilidades às suas. – ele tem as bochechas espremidas. Acha engraçado e continua pacientemente recebendo as brincadeiras da garota, como se fosse apenas um boneco. – Eram muitos lamentos tristes e não...poderíamos...ignorar.

Abaixando a cabeça, Vasco brinca com seus dedos. Estava cansado demais e precisava encontrar repouso, mas a história de reestabelecer a ordem política e econômica daqueles reinos, estava sendo divertida.

— O senhor tem grande capacidade de sedução e de angariar simpatizantes, Majestade.

— Os aldeões são servis demais. Encolhiam-se, sendo que estão em maior número. Os governantes nunca foram desafiados e quando aconteceu, também se encolheram e fugiram porque não foram treinados para a luta.

— O senhor tem um poderia bélico invejável! – Cesar sorri quando Yasemine começa a brincar com suas orelhas. – Conseguiu unir num só espaço os homens-gaviões, macacos voadores, soldados humanos, elementos da natureza, habilidosos...está trabalhando com Zelena, Galeano e Cosima, depois de tudo o que fizeram à sua família. Eu o admiro, Majestade!

Um dos soldados de Cosima se aproxima do pequeno grupo e saúda a todos com um movimento de cabeça.

— Vim informar que o Capitão Gancho e seus companheiros já retornaram pelo portal aberto, Majestade. Permita-me dizer, mas são pessoas incríveis!

Vasco alarga um sorriso e acentua seus traços infantis.

— É minha família. Temos nossos arranhões, mas é minha família.

— Quero informar também, que há um emissário do Reverendo, do outro lado da redoma. Ele quer ver o senhor.

Vasco se entreolha com a filha e o chimpanzé, que se esquece do sorriso e torna-se sombrio, como de costume. Ele se afasta cuidadosamente de Yasemine, mas não retira a mão da cintura dela.

— Vamos ver o que ele quer.

Do outro lado da redoma verde, Paco aguarda serenamente. Vinha acompanhado pelos temidos cavaleiros negros.

Acompanhado por Cosima, Cesar e pela filha, Vasco se aproxima do limite e da divisória que separava a Floresta das Esmeraldas dos outros pontos geográficos. A equipe vem receber o visitante, mas não se preocupa em esconder seus rostos, como faziam durante as batalhas.

Os olhos de Paco brilham com a imagem de seus dois conhecidos e não consegue formalizar frase alguma. O Reverendo deveria ter avisado que encontraria Vasco e Yasemine.

— V-você é o l-líder dos rebeldes?

— Não. Sou apenas um colaborador. A líder é Cosima. – Vasco esconde as mãos às costas e ergue o queixo em desafio ao habilidoso. – Você correu muitos riscos ao vir em nosso encontro sem ser convidado. Poderia ter sido decapitado pelos machados dos homens-gaviões, ser dilacerado pelas garras dos macacos voadores ou ser asfixiado por alguma família de cipós furiosos.

— S-Solomon não m-me disse que sabia de vocês. Eu jamais imaginaria que vocês fossem tão bélicos, assim!

O grupo de rebeldes acha graça na fala do servo do Reverendo.

— O que você quer conosco, Paco? O Reverendo já percebeu que incendiar aldeias, não nos intimidará. – Vasco fala suavemente. – Por acaso tem algo que queremos e quer negociar?

Desta vez, Paco consegue mostrar-se mais tranquilo. Sorri e desce seus olhos à meia-visão.

— O Reverendo quer conversar com vocês sobre uma possível trégua. É um período delicado e ele reconhece que batalhas não causarão bem algum aos reinos.

— Ele quer a rendição nossa ou dele?

Paco mantém o sorriso.

— Entendo porque ele insistiu para que eu viesse conversar com os líderes e formalizar o convite para uma audiência em seu palácio e com a Rainha Zelena. Ele sabia que você e Yasemine estariam aqui.

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Nenhuma resposta. Percebendo que os rebeldes não se pronunciariam, Paco coloca no chão, junto à redoma, um pergaminho.

— Este é o pedido formal do casal real, para uma audiência em suas terras. – ele começa afastar-se, mas antes, olha os rebeldes por cima dos ombros. – O Reverendo pede que a audiência seja para o final do inverno, porque não quer arriscar a saúde da Rainha. Deduzo agora, que ele quer isso, porque a amada Rainha Regina está esperando um filho.

O coração de Vasco muda de lugar e vai bater dentro da cabeça e a raiva cresce em sua alma. O desgraçado do reverendo havia engravidado sua esposa? Ou ela já estaria grávida quando fora raptada pelo maldito? Ele sente a mão de Yasemine apertar a sua, pedindo controle. E é do contato com a filha que Vasco consegue retirar forças e segurar o desejo de gritar e chorar.

Nenhuma resposta dos rebeldes. Nenhuma reação do belo homem de olhos celestes. Ele permanece impávido e apenas observa os visitantes afastarem-se em seus cavalos escuros. E assim permanece até encontrar-se totalmente sozinho, em seu quarto.

Ali, Vasco desaba num choro sentido e doloroso. Seu peito estava rasgado e poderia sentir o cheiro do sangue que escorria de seu coração que se derretia.

Zelena abre a porta do quarto e entra ali, sem cerimônias. Aproxima-se da cama e senta-se ao lado do homem que aprendera facilmente a amar. Toca-lhe as costas e em poucos segundos, vê seus braços ficarem cheios pelo corpo dele. Acaricia suas costas e seus cabelos, enquanto ele chora, chora e chora.

- Você ouviu o que Alda falou sobre a dicotomização da alma de minha irmã. Quem está no castelo não é a sua Regina.

— Eu...sei disso...- ele se empertiga e enxuga os olhos com a manga da blusa. – Já desconfiávamos de uma gravidez, antes do acidente de carro. Caso o corpo esteja mesmo carregando uma criança, foi concebida comigo.

— Isso deveria deixá-lo feliz, meu amor.

— Regina ficaria imensamente feliz, mas a Rainha Má tentará ceifá-lo da vida...demorei tanto tempo na dedicação ao salvamento das vidas de aldeões e negligenciei meu próprio filho!

Acariciando o rosto molhado do homem, Zelena sorri e beija-lhe os cílios demoradamente.

— Mande um mensageiro ao Reverendo e diga que o faremos a reunião na próxima lua cheia. – Zelena segura firmemente aquele rosto bonito em suas mãos. – Marcaremos num ponto neutro e eu estarei sempre ao seu lado, lá.

— Zelena...

— Vasco, não decidi lutar pelo meu reino ou pelos aldeões. Caso eu percebesse que iria sucumbir, levaria meu filho para longe e viveríamos bem onde quer que fossemos. Aceitei lutar por você, para proteger você, e por amar você. – ela se levanta e caminha para a porta. Volta-se e olha o homem. – Estive pesquisando sobre esse crime que o Reverendo cometeu contra Regina e descobri que depois de abrir a caixa citada por Alda...o ciclo somente estará completo, caso haja um ato de incondicional amor.

— Ato de incondicional amor? Mas que tipo de amor? E ato a favor de quem? Meu em favor de Regina? Ou dela para mim?

— Não saberia especificar, meu amado. Mas no ato de abertura da caixa, enquanto a luta estiver sendo travada, este ato de amor precisa ser efetuado. Acredito que a situação deverá explicar do que se trata.