Fay agora via o ponto final de sua relação com Krad. Ele colocara em xeque o grande assalto dos mafiosos, condenando a eles e também a ela. Compreendeu que não significava coisa alguma para o rapaz que amou. Krad provou ser um vampiro, um ser maligno sem coração. Que ela era mais uma de suas vítimas, a refeição que ele guardava para comer em uma ocasião especial. Fay era apenas comida, às vezes uma dama de companhia, talvez uma reles cortesã, nada mais. E a insignificância martelou sua mente, despedaçou seu espírito. Uma onda de melancolia a cobriu como um véu, acolhendo-a na escuridão do desafeto. Ela era o nada.

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O silêncio da menina, que mal ouvia respirar, preocupou Ryan. Quando tenta deitar sua mão no ombro dela, é impedido por uma onda faiscante. Com o choque estático, as pontas do cabelo dela frisam. Uma atmosfera mais negra que o escuro da joalheria congelou o ar em volta deles.

O ponto eletrônico na orelha de Ryan chia antes de emitir a voz de alguém do grupo do Cassino:

— Desirée não sinalizou ainda e já passou da hora. O chefe ordenou o cancelamento das missões, temos meia hora para chegar aos jatos... — ouve-se um alvoroço. — Droga, os federais estão aqui!... Como chegaram tão rápido?!... Escute, vamos tentar escapar, faça o mesmo!... — Com um baque surdo e sons de estilhaços, a conversa é interrompida.

De imediato, o filho de St.Clair avisa sobre o fracasso do roubo para a companheira.

— Temos que voltar para o helicóptero, Fay! — orienta apontando para a claraboia por onde desceram.

Mas ela não se move.

— Fay! O que há com você? — indaga com preocupação. Aproxima-se sem cautela, agarra-a pelos ombros e a faz se virar para ele. Ela está pálida e fria. Não sente um sopro de vida, nada se mexe. No entanto, ela ainda respira, e observa-o vidrada, em transe. Há um lampejo em seus olhos. Suas íris violeta parecem o sol após as nuvens negras partirem. O lilás nebuloso se transforma em rosa melancólica, e, aos poucos, traçados vermelhos iguais aos respingos de sangue rabiscam as íris.

A marcha do lado de fora está alta o suficiente para ser ouvida. Sirenes de polícia preenchem a noite em Bluzz. Arrisca-se presença de tanques.

— O que estão esperando para sair?! — Bill surge de um dos corredores junto de seus peões. Está furioso. — Planejamos um assalto a joias falsas e ainda estamos no meio de uma emboscada da polícia? Que palhaçada!

— Deve haver um traidor entre nós... — Ryan especula.

— Mas é claro que tem! E, se bobear, é essa garota aí! — rosna para ela que se encontrava imóvel mesmo diante da acusação.

—Não! — defende com raiva. — Ela tem minha total confiança. — vira-se para sua amiga e com voz gentil, pede: — Nos tire daqui, Fay.

A mutante olha para o amigo e parece não ter entendido o que ele disse. Um pensamento lhe ocorre: se Krad queria prejudicá-la e por isso aliou-se aos agentes do Estado, a culpa do fracasso do assalto, das joias falsas e da emboscada era mesmo dela. Tudo estava dando errado por culpa dela. “Ela tem minha total confiança”, não merceia essa confiança. No início, quis manipulá-lo, depois usá-lo para preencher o vazio que outro homem deixava e acabou de estragar o roubo que era tão importante para ele: Fay não merecia se quer ter Ryan St. Clair como amigo.

— A culpa é mesmo minha... — sussurra, mas todos ouvem.

Ryan fita-a incrédulo.

Irado, Bill não duvida. Saca da arma da cintura e aponta para aquela que acredita ser traidora.

— Por isso não gosto de pirralhos na minha equipe... — e aperta o gatilho.

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A joalheria está cercada de policias e armas de diversos calibres. Chamam uma, duas vezes pelos assaltantes que devem estar lá dentro, segundo o informante, que não é uma pessoa em quem confiam. O ânimo deles se acende quando chega o aviso do sucesso da emboscada ao Cassino Trevo da Sorte, capturando alguns dos mais procurados chefes da máfia e uma mulher morta no quarto do dono. Abandonado o descrédito das informações passadas, empunham as armas e preparam-se para invadir.

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Krad passa por eles em seu terno sob medida, direcionando até o comandante da operação.

O chefe da polícia é o homem de cabelos grisalhos, barba por fazer, olhos roxos de noites passadas em claro e colete a prova de balas bem colocado. Em meio à sirene, está concentrado nas informações transmitidas pelo pessoal da operação, porém, repara no vampiro.

— Ei, — chama-o com olhar superior. — Foi você quem matou a mulher que era o braço direito do chefe da máfia, não foi? Francamente, ela poderia nos oferecer informações importantes.

Krad pensa no por quê de não ter simplesmente atravessado por esses humanos com senso de justiça usando sua velocidade sobrenatural. Encara o chefe com rosto impassível.

—Ela falava demais. Além do mais, “não matar mais” não faz parte do nosso acordo.

— Se suas habilidades não fossem tão úteis para nós, não teríamos feito acordo algum, Monstro. — frisa a última palavra, para provocar.

— Não me culpe se vocês são incompetentes — devolve com irritação no olhar.

— Vocês precisa pegar um avião para outro continente, não? Deixa que nós cuidaremos da limpeza.

— Sim, e não pretendia colaborar com a limpeza. Mas preciso pegar uma coisa que me pertence, e está lá dentro — indica a joalheria com um aceno de cabeça.

— Recomendo que não entre, a ordem para invadir logo será dada. Se quer morrer...

— Eu não morro — contém as presas que pedem para estraçalhá-lo. — Mas quero acrescentar uma emenda no nosso trato.

—Emenda? O nosso acordo já foi assinado, não há nada para mudar!

— Eu não vou mudar. Apenas vou reformular minhas palavras: eu pedi por um humano para comer durante a viagem, e esse humano, perdão, essa humana está lá dentro. E se, por alguma estupidez de vocês, ela sair ferida... —Mostra ao chefe seu semblante mais cruel, que faz o velho empalidecer: — Eu mato todos vocês.

E adentra a joalheria iluminada por luzes inquisitórias pela porta da frente.

Antes de todos, ouve o disparar de uma arma de fogo. Suas narinas captam o cheiro de sangue humano fresco. Corre seguindo o convite do líquido vermelho que derramava-se.

No salão principal, com a lua penetrando seus raios como dedos na claraboia, um homem robusto empunha o revólver recém usado, enquanto alguns poucos agentes, mais magros e cobertos de preto, o observam. O corpo que cai é de um rapaz de terno negro, olhos verdes alerta e ombro ferido. A garota atrás tenta segurá-lo.

Temendo o próximo disparo, Krad impulsiona-se e, torcendo o braço de Bill, o faz largar a arma. O agente urge de dor, seus peões ficam em posição de ataque para salvá-lo. O vampiro mostra suas presas, pronto a combatê-los. Ao tentar quebrar o braço do humano, porém, seu corpo não lhe obedece. Nenhum homem se move, melhor, não conseguem se mover. O ar gélido se arrasta no chão, percorrendo-os. A respiração deles é constante, conseguem mexer apenas os olhos. Krad já sabe o por quê, contudo, fita-a para certificar-se: os cabelos tingidos de cor rubi, dançantes como heras; a pele toma um tom rosado; o vestido perolado e a capa esvoaçam criando o quadro de uma verdadeira bruxa; e das íris cor de sangue derramam-se as lágrimas de uma rosa.

O ser sobrenatural sente as carícias do medo:

Rose...