Pelo escuro

Tratamento de rainha


O mundo parecia correr em câmera lenta no momento. Houve um segundo em que ninguém pareceu agir, nem mesmo o monstro enorme que queria bater em Ethan. Então, a ação de verdade começou.

Primeiro eu puxei Ethan para o lado e o soco acertou a mesa. Depois, Tobias correu para cima do grandalhão, derrubando-o no chão. O feioso, quando se libertou, deu um belo soco em Tobias, que foi revidado. Então, Ian e Christopher seguraram o descontrolado, levando-o para fora do restaurante. Eu peguei Ethan pelo braço e o arrastei até a cozinha, para ver se ele estava bem.

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Quando chegamos o coloquei contra a parede, analisando seu rosto e seus braços. Aparentemente tudo estavam em ordem, menos a cabeça de Ethan. Ele ainda estava atordoado, boquiaberto. Sorri para ele e lhe ofereci um copo de água com açúcar.

—Você está bem?— perguntei tranquilamente. Ele apenas assentiu em silêncio. —Certeza?

—Sim. Aconteceu o que eu realmente acho que aconteceu?

—Que você quase foi esmagado por um grandalhão de um metro e noventa e músculos maiores que a sua cabeça? Sim! — relatei, até mesmo rindo da situação. A menina que estava saindo com Ethan apareceu na porta da cozinha.

—Você está bem?— sua voz era suave, mas aquilo não me deixou tranquila. Ao contrário, minha raiva ferveu e saiu pela minha boca.

—O que ainda está fazendo aqui garota? Já não nos trouxe problemas de mais não?

—Está tudo bem Evangeline. Eu quero ouvir o que ela tem para falar. — defendeu Ethan. Fuzilei-o com o olhar e bufei.

—Está bem então, vou deixar os pombinhos a sós. — pude ouvir Ethan me chamando, mas a única coisa que fiz foi sair da sala a passos pesados. Fui até o salão principal que ainda estava uma bagunça. Cheguei até o chefe que estava conversando com Tobias. — quer que eu faça algo chefe?

—Sim, por favor, passe gaze no ferimento desse rapaz aqui, enquanto os meninos e eu limpamos isso aqui. — Jacob ordenou. Olhei para Tobias que não me encarava.

—Hã, eu cuido da bagunça, não seria melhor? — sugeri.

—Não, você vai fazer o que eu te pedi agora Evangeline. — o chefe não estava brincando. Aproximei-me de Tobias e peguei sua mão. Ele apenas se deixou levar até o fim do corredor, sem nem mesmo soltar minha mão.

Quando chegamos aos armários, peguei o kit de primeiros socorros, mas não fiquei lá. Em vez disso, apenas segui com Tobias ainda grudado em minha mão para fora do restaurante, saindo pela porta dos fundos. Sentei-nos nas escadas, eu de frente a ele.

Comecei a passar a gaze com álcool lentamente no lugar que estava o corte. Era na sobrancelha esquerda e já não mais saía sangue. Fui limpando o ferimento enquanto o via soltar leves murmúrios quase imperceptíveis. Ele fechou a mão em punho cerrado e deixou seus olhos focados em algum lugar atrás de mim.

—Eu queria te pedir desculpas. E agradecer por ter levado um murro pelo Ethan.

—Fiz isso porque é o que eu faria por qualquer cliente que seja. — assenti.

—Mas não era um cliente qualquer. Então, obrigada. — continuei. — além do mais, você se moveu quando todos estavam paralisados.

—Isso não é totalmente verdade não é? Você tirou Ethan antes que o soco o atingisse. — ele olhou para mim pela primeira vez desde que nos sentamos. Então, tanto ele quanto eu, desviamos olhar.

—Posso te fazer uma pergunta? — questionei.

—Não. — ele foi direto. Apertei a gaze com mais força e ele gemeu alto. — tá, fala logo.

—Por que você não gosta de mim? — senti como se um peso de 50 KG tivesse saído do meu peito. E em seu lugar veio outro de 100 KG. Ele respondeu mais rápido que achei que fosse responder.

—Não é que eu não goste de você. Você é legal. Só tenho meus receios. — disse simplesmente.

—E quais são? — não fiz questão de me frear dessa vez.

—Antes de você aparecer eu tinha certeza que seria o gerente daqui sabe? Agora já não estou mais tão certo.

—Mas eu estou aqui há um mês. É óbvio que não serei a gerente.

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—Eu não duvido muito. Jacob pode ser bem incoerente quando quer. Além do mais, os clientes te amam, os meninos te amam e até o chefe te ama! Estou me sentindo ameaçado.

—Então, é tudo ciúme? — perguntei.

— É tipo isso. — soltei uma gargalhada sem humor, mas relaxante.

—Fica tranquilo que eu não vim roubar nada de seu ninguém. Eu só quero uma grana no fim do mês. Mas ajuda mais quando você deixa as coisas mais agradáveis no ambiente. — sorri para ele. Então, coloquei o curativo fixando bem. — Prontinho! Tá novinho em folha. Quer dizer, quase.

—Obrigado Eva. — ele sorriu, olhando para mim. Então estendeu a mão. — amigos?

—Amigos. — eu disse indo mais além e puxando-o para um abraço. Ele ficou espantado no começo, mas depois deu leves tapas em minhas costas.

—Então, vamos? Falta uma hora para irmos para casa!

—Isso tudo? — perguntei com preguiça.

—Claro. Agora sem preguiça. — ele levantou e entrou no restaurante, comigo logo atrás.

***

O expediente finalmente terminou. Não aguentava mais. Além de ser um dia naturalmente movimentado, esse havia sido especial. E tudo que eu queria era cair na minha cama de modo especial para celebrar esse dia. Ethan tinha ficado para me esperar. Ele me acompanharia e era exatamente isso que estava fazendo.

—Então... — começou ele, sem saber exatamente o que dizer.

—Então... — continuei sem saber como prosseguir.

—Rita se desculpou comigo. — disse ele, sorrindo.

—Você ainda vai sair com ela? — perguntei, sentindo meu peito aquecer.

—Talvez.

—Trouxa.

—O que? — perguntou ele espantado.

—Nada. Só não acho certo você sair com a garota que quase te fez levar uma surra hoje. — argumentei.

—Mas ela é legal. E disse que vai terminar com o grandalhão, que só ainda está com ele, porque tem medo de terminar.

—Ah qual é, e você caiu nessa? Ela quer te usar Ethan. E quando terminar vai dizer adeus sem hesitar. — minhas palavras soaram grosseiras, mas não me importei.

—Então eu só presto para ser usado?

—Não foi isso que eu disse.

—Mas é o que parece. Está agindo como se não acreditasse que alguém realmente pudesse se apaixonar por mim. — ele também estava irritando.

—É claro que eu acredito que alguém pode se interessar por você, tanto que estou te ajudando a achar essa garota. Mas com certeza não é essa Rita.

—E porque não?

—Porque não ora. — ele parou e segurou meu braço, virando-me para ele.

—Por que não Eva? — meu rosto aqueceu. Ele nunca me chamava de Eva, então deveria estar realmente bravo. O que só aumentou minha raiva.

—Porque ela não é certa para você. Foi sua exigência uma moça de família e você acha que moça de família teria saído contigo sem contar a verdade? — perguntei destemida, mas por dentro estava tremendo. Era nossa primeira briga de verdade e aquilo me deixava mal. Ethan ficou calado por um tempo.

—Desculpa. Você só tá querendo ajudar. — pediu ele.

—Desculpado. E desculpa também, afinal eu não devia me intrometer tanto. — ele assentiu. Não trocamos abraços e apenas continuamos andando sem nos encarar e sem conversar.

Entramos na casa que estava silenciosa e escura. Eu fui à frente, mas não acendi as luzes. Estava louca de vontade de cair em minha cama, mas não conseguia achar o caminho certo. Estava meio desorientada e confusa então fui apenas caminhando e tateando os móveis. Ethan também pareceu não querer ligar as luzes e por isso achamos a escada no escuro mesmo.

Daí me lembrei de que não tinha pegado meu celular e por isso virei-me para ir busca-lo. Mas não sabia que Ethan estava atrás de mim, então quando eu o fiz bati de frente com ele. Recuei um pouco, zonza.

—Ai Senhor! — exclamei. Minha cabeça tinha batido com força com a de Ethan.

—Tá tudo bem?

—Não sabia que estava atrás de mim.

—Eu nem sequer sabia que você ainda estava aqui em baixo. — ele replicou. Então, tocou minha cabeça. — está doendo?

—Nada descomunal. Talvez eu sobreviva.

—Talvez, é? Quanto drama! — ele riu suavemente.

—É claro que é talvez, já viu o tamanho da sua cabeça? Podia ter me causado traumatismo. — nós rimos. Ainda estávamos próximos, e mesmo na escuridão eu sabia que ele estava procurando meu olhos. Então, tateando procurei seu corpo. Quando o achei, agarrei-me a ele, em um abraço apertado. Ele retribuiu na mesmo intensidade.

—Cansada?

—Muito.

—Quer que eu te leve até sua cama?

—Você não dá conta, magrelo. Depois vai ficar entrevado. — curti com sua cara. Antes que eu pudesse prever, minhas pernas já não estavam mais no chão e no minuto seguinte eu estava sendo carregada escada acima até meu quarto. — isso que é tratamento de rainha.

***

—E foi isso! — terminei minha história engolindo o que restava do meu sanduíche. Kyra me observava atentamente enquanto eu contava sobre a noite passada e agora era minha vez de escuta-la falar.

—Caraca, meu maninho escapou por pouco hein? — ela comentou.

—Né. Se o Tobias não estivesse lá...

—Mas diz aí Eva, você não fica nervosa por trabalhar em um lugar que só tem homem? Honestamente, eu ficaria. — ela contou.

—Não. Para eu é algo normal entende? Eles na deles, eu na minha e nós não misturamos amizade com lance ou romance. Todos saem ganhando.

—Verdade. Mas deve ser difícil isso.

—Às vezes é. Mas, fazer o que? Tem que trabalhar.

—Mas, diz aí, porque tanta implicância com a tal da Rita? — Só de ouvir seu nome já sentia aquele sentimento voltando à tona.

—Nada, só acho que ela não chega nem aos pés do Ethan. — disse indiferente, tomando um pouco do meu creme de morango. Kyra ainda estava comendo seu sanduíche. Estávamos na lanchonete a duas quadras do serviço de Kyra. Ela pediu-me para ser encontrada lá para que pudéssemos trocar as novidades, já que ela havia saído com Caio noite passada.

—Arran, sei. — ela abriu aquele sorriso safado para mim.

—O que?

—Nada. — Kyra negou, sorrindo mais ainda. Franzi a testa confusa.

—Fala!

—Você aí, dizendo que a garota não chega aos pés de Ethan. Isso pra mim está cheirando a algo...

—Ah nem vem. Ethan é meu amigo.

—Mas eu nem tinha falado nada! — Kyra gargalhou e meu rosto, pela primeira vez em muito tempo, aqueceu. — Mas confessa que está com ciúme. — abri a boca para negar, mas meu sensor anti-mentiras acendeu. Então, calei-me, mesmo não concordando com ele. Eu não estava com ciúme. Ou será que estava? Em vez disso apenas disse:

—Ah! Cala a boca e me conta como foi com o Caio.

—Foi muito bom. Ele me levou pra um concerto e nós conversamos sobre tudo. Falamos mais de planos sobre como economizar energia e entre outros. Foi tão bom. Ele e eu combinamos em tanta coisa e ele tem ideias que eu nunca nem havia pensado que pudessem ser reais. Ele realmente me faz ver que o mundo pode ser melhor.

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—Aww que fofo. Ele realmente deve ser especial, já que você não é tão romântica assim com todos. — eu disse olhando-a com afeto. Vi suas bochechas corarem.

—É ele é... Diferente. E surpreendente, sem dúvida. — ela falou animada, e eu sabia que ali vinha mais meia hora de palestra sobre “como o senhor Valdez é especial”.

***

Sábado à noite. Não há nada melhor que ficar de folga. Depois de tanto trabalhar, finalmente podia me sentar no conforto do meu sofá e curtir meu tédio. Kyra estava com Caio em uma palestra inútil sobre como o mundo vai acabar daqui a vinte anos. Tudo bem, não tão inútil assim. Mesmo assim, ela havia me chamado para ir, mas sem nem pensar eu recusei. Ir pra uma palestra chata para ser vela? Não é melhor me torturar logo?

Ethan estava enfiado em seus livros. Já havia um bom tempo que estava assim e eu não reclamei. Afinal, ele dizia que isso o acalmava e quem sou eu pra questionar suas manias? Cada um lida com o nervosismo como pode. Então aproveitei o silêncio para pensar. Por que não pude negar que senti ciúme de Ethan? Talvez seja ciúme de amigo, argumentei. Então neguei. Não, eu sentia ciúme de meus amigos, e aquilo foi três vezes mais forte que ciúme de amigo. Então o que será? Uma única opção veio a minha mente. Descartei-a sem nem pensar duas vezes. Não, não é possível. Eu amava Patrick, não amava? Mas ultimamente mudei tanto... E se isso tiver mudado também? E seu eu estiver realmente...

—Conversando sozinha Evangeline? — Ethan assustou-me de tal modo que eu caí do sofá. Isso levantou gargalhadas dele e minha.

—Que susto Ethan. — ele riu ainda mais, descendo a escada e se sentando ao meu lado.

—Então estava pensando em coisas proibidas... — sua expressão era de pervertida. Bati em seu braço, o rosto corado. Isso andava acontecendo com muita frequência.

—Não! Não estava pensando em nada disso. — eu respondi envergonhada.

—Então era em que?

—Hã... Hum... E-em nada — gaguejei. Como podia contar para Ethan que eu estava pensando se estava sentindo algo por ele?

—Aí viu, está a prova!

—Calado Ethan. Achei que ia ficar em seu quarto até criar raízes. — provoquei sorrindo. Esperei que ele caísse na distração e esquecesse o assunto. Deu certo.

—Não. — ele riu sem humor. — graças a você, não consigo mais me concentrar nos estudos como antes.

—Que má influência eu sou!

—Tem razão. Deveria ser presa.

I Said why does it feel so good? So good to be bad! — cantarolei a música do David Guetta. Ethan sorriu maroto.

—Você não presta. — e ficamos em silêncio. Supreendentemente quem o quebrou foi ele. — quer sair comigo? — engasguei com a saliva e Ethan sorriu sem graça. — é tão ruim assim sair comigo?

—Não foi isso que eu quis dizer. É que você me pegou de surpresa. E vai ser um encontro?

—Não, só uma saída de amigos. Podemos ir ao cinema!

—Hum... Eu to louca pra ver os guardiões da galáxia.

—Por mim fechou. — ele falou. Dei de ombros. Afinal, o que poderia acontecer de mais em uma saída de amigos?