Depois de sairmos da prefeitura, passamos por uma lanchonete e, depois, fomos direto ao velho prédio. Comemos ali mesmo. Tínhamos andado bastante naquele dia, mas como estava acostumada a caminhar frequentemente, não sentia cansaço algum. Pelo jeito, Jade também estava habituada a isso, pois transbordava energia. De repente, decidi olhar pela janela e as luzes da cidade naquela noite escura me distraíram por um bom tempo. Só parei de contemplar o vazio, pois Jade me chamou a atenção:

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– Hoje foi um dia produtivo!

– Pois é.

– É melhor se preparar porque nosso próximo alvo não será tão fácil. O delegado é “durão”, o que aumenta muito as chances de dar merda.

– Oh... Mas você não disse que tinha contatos na polícia?

– Sim, mas são apenas policiais comuns. Então a vantagem é deles agora.

– Entendo...

– Fique tranquila! Se algo der errado é só correr como se não houvesse amanhã!

Ela disse aquilo com um largo sorriso no rosto e uma empolgação assustadora. Fiquei sem palavras diante de seu comentário.

– Bem... Acho melhor tomarmos um banho, já que andamos bastante.

– Essa é uma boa ideia. Quem vai primeiro?

– Primeiro? Somos duas garoas. Por que não vamos juntas?

Fazia sentido, mas, antes que pudesse concordar, as imagens do beijo dela com sua namorada vieram à minha mente e senti um arrepio percorrendo minha espinha.

– Eu... Não sei...

– Vamos! Eu não mordo... A não ser que você queira.

– Eu... O quê?!

Meus olhos comprovavam que Jade era uma boa pessoa (ótima, aliás), mas seu sorriso ficava cada vez mais malicioso e comecei a ficar nervosa.

– O que foi? Vai ser divertido! Eu lavo suas costas.

– O quê?! Não... Eu...

De repente, seu sorriso voltou ao normal e ela começou a gargalhar. Meu nervosismo desapareceu e, em seu lugar, surgiu uma grande confusão. Apenas a observei até que seu ataque de risos terminasse sem entender o que havia acontecido.

– Ai ai... Estou brincando, sua boba!

– O... O quê?

– Esqueceu-se de que sou compromissada?

– Oh... É verdade...

– Mas sério, acho melhor irmos juntas para economizar tempo.

– S-sério?

– Sim.

– T-tudo bem então.

Aquilo foi deveras constrangedor. Havia apenas uma banheira e... Não sei se foi melhor ou pior do que se fosse um chuveiro... No final ela lavou mesmo minhas costas... Mas é melhor deixarmos isso de lado... Depois do banho, trancamos a porta (sim, tínhamos nos esquecido disso) e decidimos dormir, mas havia somente uma cama de casal. Então tivemos que dormir juntas. Aquela noite foi um grande teste para com minha falta de entrosamento social.

No outro dia, Jade já não estava ao meu lado quando acordei. Lavei meu rosto, troquei de roupa e, depois de uns dez minutos, ela voltou com o café da manhã. Enquanto comíamos, discutíamos sobre a próxima etapa do plano:

– Bem, espero que tenha descansado porque precisaremos de energia.

– Por incrível que pareça, consegui dormir muito bem essa noite.

– É que você dormiu com a tia Jade aqui. Minha beleza afugentou sua insônia.

– É... O quê?

– Estou só brincando! Acho melhor você se acostumar, pois faço isso direto.

– Vou me lembrar disto.

– Ótimo. Quero que você vá armada, mas só a saque em último caso.

– T-tudo bem.

Pensei se seria capaz de usar a arma quando fosse preciso, mas lembrei-me de quando matara aquele Harrison com uma faca. Se fui capaz daquilo, provavelmente também sai capaz de matar alguém com uma arma de fogo. Quando percebi isso, senti um pouco de nojo de mim mesma e me perguntei novamente em como olharia nos olhos de minha irmã mais velha depois que tudo acabasse.

– Ah! – exclamou Jade. – Agora que notei algo. Faz tempo que a Jessy não dá as caras, não?

– Na verdade, isso é normal. Antes de me encontrar com o Harry, passava dias sem vê-la.

– Mas... Ela apareceu várias vezes para nós.

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– Já que é um espírito, Jessy possui todas as nossas habilidades. Então ela deve ter previsto nosso encontro e estava economizando energia, ou seja, ela deve estar reunindo mais agora.

– Entendo. Heh... Isso demonstra claramente a diferença entre nós. Posso até ser boa em planejar ataques e afins, mas posicionar todas as peças no lugar certo do tabuleiro sem sequer poder movimentá-las diretamente... Tiro meu chapéu para ela.

– Nunca tinha pensado nisso, mas é verdade.

Terminamos de comer, nos aprontamos e fomos direto à delegacia. Era bem mais longe do que a prefeitura e estava localizada na área dos Harrisons. Locomovemo-nos com cautela, pois à aquela altura os Harrisons já deviam estar mais atentos. Levamos quase duas horas para chegar ao nosso destino e mais vinte minutos para chegar ao escritório do delegado.

Ele estava de pé olhando por uma janela à direita da porta. Era um homem na casa dos trinta com cabelos curtos e loiros e olhos azuis (um típico habitante de Solene). Possuía uma expressão séria e não era uma boa pessoa.

– Quem são vocês? – disse o delegado.

– Somos Valentines e temos uma proposta a lhe fazer. – disse Jade com um sorriso no rosto.

– Valentines? Não quero nada que possam oferecer.

– Será?

– Ele nos olhou com desconfiança e se esparramou em sua cadeira acolchoada.

– Tudo bem. Vou ouvir o que têm a dizer, mas não demorem.

– Ótimo! Nós sabemos de seu trato com Lucas Harrison.

– Como vocês... Prossiga...

– Sabia que não se assustaria com tal informação.

– De jeito algum.

– Ah! Quero me desculpar por como falei antes. Cometi um erro.

– Do que está falando?

– Não temos uma proposta, e sim um comunicado: os Valentines vão tomar o resto da cidade.

Ele tentou esconder sua surpresa, mas pude notar por estar concentrada. Pelo jeito, Jade também notou, pois sorriu levemente.

– E como faremos isso, de nada adianta seu trato com eles.

– Interessante. Realmente interessante, mas que garantia vocês tem disso?

– Por enquanto, não tenho nada concreto. Aliás, não há como adquirir provas concretas nesse tipo de operação. Terá que confiar em minha palavra.

– Pode ser verdade... Mas tem um pequeno problema nesse comunicado.

Jade olhou para mim e soube que tinha que me preparar para o pior. Instintivamente coloquei minha mão na cintura (onde estava a arma).

– E qual seria?

– Eu falei com Lucas ontem e parece que vocês já estão agindo.

– Talvez.

– E ele também disse que não está disposto a entregar seu comando sem lutar.

– Esperava uma reação dessas.

– Ou seja...

–... Você vai continuar cooperando com ele, certo?

– Exatamente.

Os dois sacaram suas armas e atiraram algumas vezes um contra o outro, mas erraram. Eu fiz o mesmo e atingi o delegado no ombro esquerdo antes que pudesse se esconder atrás de sua mesa. Saímos da sala e ficamos ao lado da porta escoradas na parede:

– Não podemos deixa-lo vivo. – disse Jade. – Cuide do corredor que eu cuidarei do infeliz.

– Tudo bem!

Ela ficou trocando tiros com o homem enquanto eu ia até o final do corredor. Por sorte, havia apenas um caminho por onde alguém poderia vir. Usei a parede como barricada e deixei parte do meu rosto à mostra (apenas o suficiente para enxergar os reforços) e esperei.

Depois de algumas séries de disparos, silêncio. Olhei para trás instintivamente e Jade caminhava em minha direção. Logo voltei a prestar atenção no corredor e dois homens estavam vindo. Rapidamente atirei nos dois e atingi a cabeça de um e o ombro do outro. Poder ver os pontos vitais ajudava muito na hora de atirar, mas não havia garantias de que acertaria no lugar certo. Senti uma mão no meu ombro e me virei:

– O delegado já era. Vamos sair daqui.

– Tudo bem.

Corremos pelo corredor e dei um forte chute na nuca do homem que agonizava pelo ferimento em seu ombro e o mesmo desmaiou. Percorremos quase todo o local sem encontrar ninguém, mas podíamos ouvir disparos por toda parte. Pouco antes de chegar à saída, um homem entrou em nossa frente e, quando fui mirar nele, Jade abaixou minha arma.

– Está tudo bem. Esse é um dos nossos.

– Há quanto tempo Jade. – disse ele. – Como vai a Bunny?

– Louca como sempre. E tire os olhos porque aquela belezinha é minha.

– Tudo bem. O delegado...

– Morreu.

– Estão brigando para saber quem vai tomar o lugar? – perguntei.

– Mais ou menos. – respondeu o homem. – É que os policiais daqui ou apoiam os Harrisons ou os Valentines, então agora que as famílias estão em guerra entramos na luta também.

– Entendo...

– Ainda bem que demos de cara logo com você, Larry. Você sabe que não gosto de matar.

– Pois é. Pode deixar que cuidaremos daqui.

– Ótimo. Vão para a mansão depois de terminarem. É perigoso ficar por aqui.

– Sabemos disso, mas não seríamos úteis lá. Vamos enfrentar os putos na linha de frente.

Jade sorriu e abraçou Larry.

– Obrigada! Vamos Jackie.

Ela saiu na frente e, quando tentei segui-la, o homem me parou.

– A-algo errado?

– Não. É que nunca tinha te visto.

– É que... Eu nem sei dizer se sou uma Valentine, mas conheci Jade há pouco tempo.

– Bem, se ela confia em você também confiaremos. Cuide daquela ruiva.

– Eu... Vou tentar!

– Esse é o espírito! Agora saia daqui antes que se meta em problemas.

– Tudo bem.

A saída dos fundos levava a um beco e Jade me esperava no final do mesmo. Fui ao seu encontro e, depois de nos certificarmos de que era seguro, fugimos. Dessa vez, levamos umas três horas para percorrer o trajeto entre a delegacia e o velho prédio abandonado, pois havia vários Harrisons patrulhando a área e tivemos que mudar o caminho várias vezes. Acho que se ainda havia alguma incerteza sobre a guerra entre as duas famílias, essa incerteza foi completamente obliterada naquele dia. As coisas ficariam mais agitadas...