Parker

Boa com esporte, não com números


Parker não achava que se sentiria melhor depois de chorar no colo da filha. Rebecca, mesmo sem saber, havia tirado boa parte de sua tristeza ao lhe dar aquele colo.

Após se acalmar, Rayle pegou a filha no colo, agradeceu e a levou consigo para o quarto. Deixou que ela dormisse ali com ela, e na manhã seguinte, Rayle resolveu contar à filha o motivo de estar chorando, já que foi questionada quando estavam tomando café.

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Rayle não contou sobre Renê e a mãe dele, apenas sobre Sara, e mostrou inúmeras fotos das duas pra menina. Rebecca adorou as fotos e vivia dizendo que a "tia Sara" era muito bonita.

Parker sorriu. Sara realmente era muito bonita. Era divertida e super inteligente. Becca ia adorá-la se a conhecesse. Esse "se" a machucava.

Deixou esse pensamento longe pra não ficar triste novamente e levou um susto quando Becca disse "ai!" ao morder um pedaço de maçã.

— O que foi, amor?

— Meu dente.- ela abriu a boca e ficou cutucando o dente que doeu com a língua.

— Ah! Seu Dentinho está mole!- Rayle exclamou. — A fada do dente vai vir te visitar!- disse empolgada e a menina se empolgou também.

— A fada do dente?? Sério??

— Sim! Quando seu dente cair, ela vai vir buscar ele embaixo do seu travesseiro e vai deixar uma surpresa.

— Que surpresa é?

— Geralmente é um dólar, mas ela pode deixar outras lembrancinhas. Ninguém sabe.

Rebecca sorriu animada pra conhecer a fada do dente, mas Rayle lhe explicou as regras. Ninguém conseguia vê-la, pois a fada só aparecia quando a criança dormia.

Becca ficou triste, mas continuou empolgada com a possibilidade de receber a visita da fada do dente.

— Vai amolecendo ele que ele cai mais rápido.

— Tabom.

— E olha que nem precisou cair do skate pra perder os dentes.- Rayle comentou e riu sozinha.

O primeiro dentinho de Amy também caiu, quase ao mesmo tempo que Becca, só uns dias depois. As duas ficaram as coisas mais fofas banguelinhas.

Os meses foram passando e quando Becca completou sete anos, começou a treinar com Ben para um campeonato de skate no ano seguinte. Rebecca colocou na cabeça que queria participar. Os organizadores disseram que só podiam se inscrever a partir dos oito anos, então até ter a idade, Ben ia ensinar tudo o que sabia.

Parker, apesar de temerosa por ser um esporte um tanto perigoso, incentivava a filha mais que qualquer um. Sentia arrepios só de ver Ben fazendo aquelas manobras nas alturas, quem dirá vendo Becca fazer a mesma coisa. A possibilidade dela se esborrachar no chão como a mãe geralmente fazia, era certa.

Rayle tinha certa habilidade em ficar em cima do skate e virar certo nas curvas. Manobras? Nem pensar.

Amy acompanhava Rebecca em todos os treinos e também super incentivava, afinal, era sua melhor amiga.

Assim que voltaram do treino, as duas foram pra casa de Becca almoçar e levaram mais alguém.

— Acha que mamãe vai brigar comigo?

— A tia Rayle é surtada, mas no lado positivo. Ela vai acabar aceitando o Pipoca. A chata aqui é minha mãe, esqueceu?

— Tia Amélia só é chata com animais.

— Com animais e com qualquer pessoa minimamente diferente dela.

— Ok, você tem um ponto.

As duas suspiram, uma ansiosa e outra nervosa.

— Bem… vamos lá.

O cheiro de fritura inundou suas narinas assim que entraram no apartamento. Rayle tinha fritado hambúrguer e batata frita pra elas. Continuava uma negação na cozinha, mas Becca nunca morreu de fome, então tudo lindo.

— Mãezinha!

— Oi, meus amores! Estou na cozinha!

— Deu pra perceber.- Amy riu ao entrar e vê-la de avental. Ela insistia em usar porque era de cupcakes e era fofo demais.

— O cheiro de óleo está tão forte assim?

— Só impregnou a casa.- Becca comentou e foi então que Rayle viu o filhotinho no colo da filha.

— O que é isso?- as duas olharam para ele e disseram que era um cachorro. — Nossa, meu Deus, descobriram a América!- foi irônica. — Eu sei que é um cachorro. O que estão fazendo com ele? De quem ele é?

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— É nosso.- Becca respondeu, morta de medo, porém confiante.

— Nosso??

— Mãe, abandonaram ele numa caixa perto do parque. Não podíamos deixar ele lá.

— Meu amor, mal conseguimos cuidar uma da outra, como vamos ter um cachorro?

— Eu limpo a sujeira e levo pra passear, e você dá o banho e compra a comida. Tarefas divididas, fica mais fácil.

Rayle semicerrou os olhos e tentou não sorrir.

— Teve tempo pra planejar tudo né?

— Por favor, mãezinha, vamos ficar com ele?

Rayle olhou bem para aquela coisinha minúscula, na cor creme, fofinha com a cabeça tombada olhando pra ela. Uma cara pidona, assim como a da filha e da amiga dela.

Parker não resistiu.

— Não acostuma ele na cama.

Os olhos de Rebecca brilharam e ela começou a dar pulinhos de alegria. Pipoca latiu e ela o colocou no chão correndo para abraçar a mãe.

Rayle hesitou em adotar Pipoca, mas foi a que mais o mimou em casa, até sessão de fotos fez dele. Havia fotos dele, de Rebecca e até Amy pela casa.

Mais meses foram passando, e finalmente o mês do campeonato chegou. Rebecca se inscreveu e parecia cada vez mais nervosa conforme a data se aproximava.

O campeonato teria quatro fases, cada uma em um dia. A primeira fase seria a mais conhecida e praticada no mundo, a Street. Essa modalidade é uma simulação de uma rua de verdade, com corrimão, escadas, rampas, bancos, etc. Os skatistas são avaliados em dificuldade, originalidade e variedade de manobras realizadas com sucesso, ligação fluida de truques individuais e, o uso do curso e obstáculos do curso. Tudo isso em 10 minutos. A segunda fase é a clássica Bowl, onde os skatistas vão pra uma pista arredondada onde podem fazer pequenos saltos aéreos mais assemelhados com o surf. Com 5 minutos para os 10 classificados, eles serão avaliados da mesma forma que a primeira. A terceira fase é a Park que mistura as duas primeiras modalidades e eles terão apenas 45 segundos para executar a sua linha, passando assim pra fase final, a vertical. A que Rebecca mais tinha medo de não passar. O skatista campeão será aquele que alcançar a maior nota depois de um número predeterminado de descidas. A vertical consiste em uma pista em formato de ‘U’, chamado half pipe, com paredes muito maiores que as demais modalidades.

Rebecca praticou muito e treinou muito para conseguir chegar pelo menos na terceira fase, essa era meta dela, mas Rayle sabia que ela ia chegar na final e repetia isso para que ela também acreditasse. Eles haviam dividido por idade pra ser justo. Rebecca participaria do Campeonato Infantil, e Ben dos Jovens Adultos. Um dava apoio ao outro.

Rayle tentava mantê-la calma e focada, mas estava tão nervosa quanto ela. Quando o grande dia finalmente chegou, Becca estava preparada pra arrasar, mas mesmo assim insegura de falhar. Recebeu todo o apoio necessário de sua família, sua mãe, sua amiga e seus tios. Sim! Jerry conseguiu viajar para vê-la se apresentar também! Rebecca era só alegria.

Foi com satisfação e adrenalina, que a viram fazer as primeiras manobras na Street. Seus ollies, flips e grinds* foram perfeitos.

Becca passou com louvor na primeira, mandou muito bem na segunda, e conseguiu chegar na terceira como pretendia. E ela quase deixou o nervosismo tomar conta antes de ir pra pista. Ia por tudo a perder se Amy não lhe dissesse:

— Você tem 45 segundos e eu sei que parece pouco, mas você não precisa se preocupar com o tempo que tem. Esquece que estão te avaliando, só sinta o esporte que você ama dentro de você. Não precisa mostrar que é a melhor, eles mesmos vão ver.

Rebecca sorriu e quando finalizou seu tempo e viu que passou em primeiro lugar na Park, correu para abraçar Amy e chorou nos braços dela.

O nervosismo pra vertical era tão grande que Rebecca quase pensou em desistir. A pista não era tão alta comparada a que Ben iria competir, mas era alta mesmo assim.

E por não estar tão relaxada quanto sua adversária na hora de descer, ela não venceu.

Rebecca ganhou medalha de prata no campeonato, enchendo mais uma vez sua mãe de orgulho, independente de ser ouro, prata ou bronze. Correu para abraçá-la na plateia depois de tirar todas as fotos.

— Parabéns, meu amooor!- Parker a apertava nos braços e lhe dava vários beijos na cabeça. — Estou tão orgulhosa de você! Você foi muito bem!

— Obrigada, mãe.- Becca era só sorrisos. Não queria se desgrudar dos braços da mãe até ver Amy, que a abraçou tão forte quanto.

— Você é incrível!- exclamou a amiga.

— Não mais do que você.- Rebecca respondeu.

Rayle sorriu olhando pras duas.

Becca abraçou seus tios e Ben também. Aquele era um dia especial e tinham que levá-las para comemorar. Becca pôde chamar mais dois amigos skatistas dela e Rayle os levou ao parque de diversões. A fotógrafa e os amigos se divertiram com as crianças e outras vezes só paravam para observá-los, muitas vezes com Rayle toda boba. Sua pequena skatista era pura alegria e era assim que queria vê-la sempre.

Quando chegaram em casa, super exaustas, foi que Rebecca se emocionou ao pensar no que vivenciou naquele dia, e no que não vivenciou também.

— Oh meu amor… o que foi?

— Eu consegui.- ela sentiu a voz falhar e as lágrimas acumularem. — Eu consegui fazer aquelas manobras, mãe. Eu consegui chegar na final.

Rayle sorriu e a puxou para seu abraço.

— Eu disse que você ia conseguir. Não é preciso ter apenas talento na hora de fazer as coisas. Determinação, persistência, paciência. Tudo isso é determinante, e você treinou muito e se arrebentou muito pra conseguir aquela medalha. Dizem que o segundo lugar é sempre ruim, mas nós não concordamos com isso, não é?

— É.- Rebecca sorriu ainda chorando e abraçou a mãe com mais força. — Obrigada, mãe.

Parker beijou a testa da filha e continuou em seu abraço até ela parar de chorar.

— Sua avó nunca aprovaria isso.- deixou escapar. E não falou de sua mãe, falou de Carmen.

— A vovó?- Rebecca desfez o abraço. — Nunca me falou sobre ela.- Rebecca deduziu que ela estivesse falando da avó paterna, pois a materna já foi muitas vezes mencionada e super aprovaria o esporte que ela amava. — Aliás…- hesitou um pouco. — Eu não ia perguntar… mas hoje eu… acho que senti falta.- Rayle prestou atenção em cada palavra e já imaginava o que estava por vir. — Cadê o meu pai?- a fotógrafa sentiu o coração doer e desviou os olhos da filha. — Os pais dos meus amigos estavam todos lá, menos o do Caleb que tava trabalhando, mas fora ele, estavam todos torcendo pelos filhos. Por que o meu não?

Dessa vez, foi Parker quem ficou com vontade de chorar. Sua filha tinha oito anos. Não queria que ela soubesse ainda. Mas sabia que um dia ela ia perguntar.

— Meu amor, eu… eu vou te contar sobre o seu pai. Eu só vou te pedir uma coisa.- Rebecca esperou que sua mãe prosseguisse. Não parecia ser coisa boa. — Tenta não guardar ódio, rancor, ressentimento dentro de si pelo que ele fez. Isso não é bom pra ninguém.

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— Tá.- ela forçou um sorriso. Não sabia o que esperar.

Rayle a levou até seu quarto e contou tudo pra ela, desde o dia que o conheceu até o dia que não o reconheceu mais.

Do jeito que era chorona, Parker deixou cair algumas lágrimas, e Rebecca chorou copiosamente.

— Renê Espinoza.- Rebecca repetiu o nome do pai, aquele que nunca esteve presente. — Ele não merece ter um nome bonito assim.

Rayle quase riu, seria cômico se não fosse trágico.

— Tem razão.

— Agora eu entendi o que o tio Tom disse pra mim uma vez.- Rayle ergueu as sobrancelhas. — Ele disse que você foi a única que não desistiu de mim e a única que me amou antes mesmo de saber quem eu era.

Rayle ficou surpresa, e mais uma vez, quis chorar. Se seu coração era machucado, naquele momento ele havia se curado totalmente.

— Você é a melhor mãe do mundo!

Rebecca jogou-se nos braços da mãe, que mais uma vez se orgulhou da filha que tinha. Era esperta, corajosa, altruísta, gentil e compreensiva. Pra pouca idade que tinha, Rebecca já sabia dar valor pras coisas e sabia reconhecer o esforço de alguém, principalmente o de sua mãe, que a criou sozinha, que era mãe e pai ao mesmo tempo.

— Te amo, mãezinha.

— Eu também te amo, meu pedacinho de céu.

~ ☺ ~

Aos nove anos, Rebecca já tinha trocado quase todos os dentes, tinha vencido em segundo lugar no torneio de skate mais uma vez e descobriu que era uma negação em aritmética.

— Olha, filha, eu não te culpo porque eu também não entendo nada disso, mas se sua nota não melhorar nessa matéria, você vai repetir o ano.

— Eu não sei mais o que fazer, mãezinha. Amy já tentou me explicar, mas não entra na minha cabeça. Queria que a tia Sara estivesse aqui, você disse que ela é um gênio.

— Pois é, ela com certeza saberia te ensinar a resolver essas contas.

— Que droga, eu sou tão burra.

— Não, meu amor, você não é burra. Você é brilhante em outras coisas. Ninguém é bom em tudo. Se eu passei, você passa.

Becca sorriu, mas ainda se sentia péssima por não entender o que precisava pra passar.

— Mudando completamente de assunto, Amy vai vir pra cá hoje?

— Disse que sim, e se prepara porque a tia Amélia vai querer fotos Newborn da Anne.

Parker bufou.

Sim, Amy agora era irmã mais velha. A mãe de Amy engravidou no ano anterior e contratou Rayle pra tirar suas fotos de gestante. Mesmo não sendo especialista nesse tipo de ensaio, Parker abriu uma exceção pra ela. A pequena Anne nasceu e agora essa.

— Eu disse que só fiz o ensaio de gestante dela por ser mãe da sua melhor amiga, eu não faço esse tipo de trabalho, nem gestante, nem newborn. Agora, como eu falo pra ela que eu não quero fazer sem ela me odiar e proibir a Amy de vir aqui?

— E não tem nem como falar que não sabe fazer, porque você mostrou pra todo mundo o meu newborn, então…

— Puta merda, é verdade.- Rayle fez careta e bateu com a cabeça na mesa cobrindo ela com os braços. — Maldita hora que eu inventei de mostrar o bebê lindo que você era.

— Que eu era?- Rebecca dramatizou. — Eu ainda sou seu bebê, mãe.

A fotógrafa riu levantando a cabeça e trazendo a filha pro seu colo.

— Acredite, daqui uns anos você jamais vai repetir isso e vai impedir que eu fale.

Esperava que esses anos passassem bem devagar, pois já estavam rápidos demais.

As notas em matemática não foram das melhores e Rebecca entrou em pânico antes mesmo de entrar no ensino médio. Amy fazia de tudo para ajudá-la com os números, e nessa matéria, Becca sempre passava raspando. O Chris do B-, faltava só a camiseta.