O pior já passou, era o que Milena pensava em relação a Graziele. Uma não era mais obrigada a conviver com a outra. Mas a rivalidade estava apenas começando, e o ódio agora era ainda mais intenso. O sucesso no meio musical é atordoante, não dá espaço para relaxamento, e Milena estava descobrindo isso da pior maneira possível. Se alguém chega no auge, mais ainda do que fãs, essa pessoa ganhará haters, e é exatamente aí que vai precisar se dedicar ainda mais, fazer mais, trabalhar mais. Era o que começava a acontecer naquela manhã no Xisto, inevitavelmente, onde um pequeno sucesso, lhe levava agora à vergonha e humilhação, à possibilidade de perder a única coisa que conseguiu com segurança, e ainda assim, muito esforço: seu emprego.

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A outra, supostamente mais bem sucedida até então, estava completamente fora de controle; sua obsessão em ser superior aos outros era tão grande que lhe cegava, e era canalizada na inveja absurda que sentia pelo talento da ex-colega de escola. Parecia que tudo em sua vida provava como era incrível, menos quando Milena aparecia. Com seu estilo pacato e origem simples, era quase um ultraje, uma ofensa, que uma pessoa medíocre daquelas fosse mais talentosa que a herdeira dos Barbosa (pelo menos, na cabeça dela). Milena retornar tanto tempo depois, lhe desbancando era, então, demais para sua soberba. Chacoalhou a outra num ritmo desgastante, só suportável por alguém que aplicasse muito ódio no que fazia. Deu-lhe uns puxões de cabelo e depois começou a puxar seu uniforme no intuito de lhe mostrar que ainda era somente uma atendente e de estragar sua aparência mesmo.

A ideia de chamar a polícia gritava na mente de Milena mas ela não conseguia nem falar nada. Uns cinco minutos se passaram com Graziele descontando toda sua raiva até cansar. Um grupo de clientes fez uma roda em volta das duas, mas ninguém tinha coragem de intervir. Ao notar o rebuliço ela se afastou, largando a rival em farrapos no chão do restaurante. Saía como se nada tivesse acontecido. Só aí que dois dos que estavam assistindo a briga correram para ajudar Milena a se levantar. A primeira coisa que ela fez foi ligar para a polícia. Não queria saber se “Eusfraudósia” seria o mais novo nome a ser fichado ou não, ela já estava indo embora dali e ainda era bem mais rica que Milena, com certeza teria advogados melhores. Mas precisava, antes de mais nada, abrir um boletim de ocorrência para provar ao seu Xisto que era somente uma vítima, não tinha causado nada. Terminar o expediente foi horrível, nada disfarçava seu rosto abatido e para piorar, seu colega de turno ainda ficava dando risinhos debochados cada vez que olhava para ela.

De tarde, sem saber do ocorrido, Patrick entrou animado na lanchonete, ainda sob o embalo do sucesso na noite anterior; estava na verdade ansioso para ver Milena e comemorar com ela. Porém, sua alegria foi cancelada assim que seu olhar cruzou com o dela. Percebendo a preocupação no rosto do amigo assim que ele lhe viu, ela se obrigou a ir logo lhe contando tudo, mas reviver em palavras o estresse da manhã se revelou uma tarefa mais difícil do que pensava. Assim que terminou de ouvir o relato, ele passou as mãos nervosamente por seus dreads, não conseguindo deixar de se sentir um pouco culpado, afinal, ele que insistiu para Milena cantar na banda, inclusive dando a ideia de…

— Espera aí! Mas você nem ao menos estava lá com a gente! Como foi que ela percebeu quem era?! Essa garota deve ser MUITO recalcada para focar em você quando podia descontar a decepçãozinha do show de marketing dela na Ana, no Ricardo ou em MIM! - Ele fez um movimento exagerado nessa hora. Notavelmente preferia que tivesse sido com ele.

Milena sacudiu os ombros, sem fazer ideia também de como Graziele tinha descoberto, mas querendo que o amigo se tranquilizasse de alguma forma. Durante a manhã ela tinha pensado até em desistir da banda, mas ao ver o desespero de Patrick por ela, não tinha coragem de deixá-lo na mão. Preocupadíssimo, ele ficou ainda checando várias vezes se ela tinha algum machucado maior aparente, até deixá-la voltar para casa. Bufou estressadíssimo quando seu Xisto apareceu lhe dando uma bronca dizendo que ele estava enrolando para começar o serviço. Uma meia hora depois se xingou mentalmente por ter esquecido de contar para Milena a notícia boa de como os números de views da música deles tinha crescido absurdamente. O chefe viu sua cara de preocupação e brincou com ele:

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— Você gosta mesmo daquela moça, não é? Por que não se declara? Já foi jogado para a friendzone?

Patrick arregalou os olhos pelo fato do chefe coroa conhecer aquela palavra, aquela maldita palavra que vinha preocupando sua mente nos últimos tempos. Riu, desconversando, mas não deixando de se certificar que Milena não levaria nenhuma punição pela briga de manhã.

Enquanto isso, Ana e Ricardo saudaram Milena, empolgadíssimos, assim que ela entrou pela vila. Ela continuou encarando os dois, sem ânimo enquanto eles contiuaram sorrindo empolgados. Ricardo então falou:

— Olha, eu sei que somos, literalmente, a banda de uma música só, mas para as nossas condições, o sucesso é praticamente um milagre. - e virou a tela de seu celular, mostrando os streams de “O que há de Melhor”, que tinham dobrado de uma noite para outra. No YouTube as visualizações tinham chegado a triplicar e estavam longe de estagnar.

— Nossa, gente… Isso é incrível, mas… acho que precisamos tomar cuidado. - Cansadamente ela repetiu o relato do que tinha acontecido de manhã, tendo dessa vez compreensão imediata da prima, que conhecia bem do que a antiga colega de escola delas era capaz.

— Calma, bonitinha. Mesmo que isso tirasse seu emprego, em pouco tempo estaremos mais ricos do que com qualquer emprego possível e imaginável, você vai ver! - Ana falou, tentando animá-la. Há um tempo atrás ainda duvidava um pouco se tinham altas chances de fazer sucessoo um dia, mas depois da última noite, ela realmente acreditava e não seria uma “mal-resolvida" que cortaria sua felicidade. Ricardo concordou, mas não deixou de se preocupar um pouco com como Milena devia estar se sentido depois daquela situação horrível. Ana sempre tentou a vida com a música mas ele não, trabalhara como auxiliar de banco por anos, até ser mandado embora e só seu talento musical lhe servir para ganhar dinheiro. Sabia do desespero não só finaceiro, mas moral, que era o risco de ser mandado embora. Por isso, colocou a mão no ombro de Milena, e ignorou um pouco o que a namorada falou, mandando:

— Fica tranquila, seu Xisto parece boa pessoa, ele não faria a sacanagem de te botar na rua por isso.

Ana lançou-lhe um olhar contrariado, mas como o bem-estar da prima era mais importante que uma divergência de ideias naquele momento, deixou passar. Além do mais, tinha visto de perto os traumas da prima se formarem.

— Sabe do que você realmente precisa para se sentir melhor? Disso aqui. - então tirou um papel cheio de anotações do bolso da bermuda. Eram informações de vários shows que tinham conseguido marcar durante a manhã por conta do sucesso da invasão ao conservatório. Milena realmente ficou surpresa, e perguntou como tinham conseguido isso, se para tocar em barzinho geralmente era uma luta.

— Carregar o nome de uma banda famosa é muito mais do que ter gente invejosa atrás, é conseguir privilégios no agendamento de casas de show também. - Ana disse piscando para prima, conseguindo resgatar um pouco da confiança da mesma na banda.