–Alguém ao menos sabe o que é esse lugar?-Questionou Lonpak para os oito homens restantes.

–Será clichê caso eu diga que é um templo antigo de uma civilização extinta?-Um homem de Westka falou baixo.Falara com ele anteriormente, e afirmara que era um pesquisador enviado por um dos 3 reis(supostamente ele não possuía permissão para dizer qual) para entender o que estava acontecendo com quem ia às Oito Terras.Era dito que os Westesis que viajavam para lá nunca voltavam.O homem possuía uma barba castanha rala no queixo, e olhar de certa forma assustado.Naquela escuridão, não era possível saber qual a cor dos seus olhos, ou qual era o metal da sua espada, mas estava claro que ele nunca havia passado por algo do tipo antes.

–Calouros.-Um velho andava ao lado dele o tempo todo, supostamente um ministro do tal rei.Possuía, no máximo, 1,65m, era totalmente careca, usava uma túnica azul e roxa e andava resmungando sobre absolutamente tudo.Aquele ali parecia ter mais experiência nessas situações do que qualquer um ali.-Seu idiota, não deveria ter contado a eles o que era!Boca fechada sempre, lembra?

–Quantas vezes tenho que dizer que meu nome é Mljet?

–Não pedi pra você dizer nenhuma delas, calouro!Se quiser voltar com a cabeça colada ao pescoço, é melhor não questionar Hvar!

Subitamente, lembrei.

Aquele velho era Hvar Neved, um dos homens que agiu contra Ishtar 15 anos atrás.Por isso aquele desgraçado ocupava um alto cargo em Westka!

–Gustaf, esse idoso...-Me aproximei do rusko.

–Eu sei muito bem quem ele é, Nerlinir.Entretanto, faça como eu venho fazendo há mais de 10 anos : se controle.Como ele mesmo disse, feche a boca se quiser voltar com a cabeça no lugar.

Me surpreendi.Aquele Gustaf estava bem diferente da última vez que o vira.O que poderia fazer um monstro incontrolável se tornar um homem centrado e paciente em poucos anos?

Estávamos numa caverna com dezenas de milhares de inscrições nas paredes.A iluminação era muito fraca, não haviam tochas, e no teto abobadado era possível ver a enorme cabeça de um tigre-marfim esculpida em pedra e pintada com o que parecia sangue. O tigre estava com a boca aberta para baixo, dando a impressão de que a qualquer momento ele rugiria e nos engoliria.

Um dos homens que acamparam na praia veio correndo.

–Achamos mais um!

–Ótimo.- Por algum motivo, Lonpak estava sendo o líder -Tragam ele para junto de nós.Devemos... -Ele olhou para o topo da caverna, esperando que o tigre caísse sobre todos ali a qualquer instante- parar por aqui.

O sobrevivente era, na verdade, a sobrevivente.Havia sido avistada na praia, boiando num dos destroços do barco.A maré estava alta, então Essen, o mágico, usou alguns truques para trazê-la para a areia.Ela disse que seu nome era Kalysa, e que vinha de Arkhang, com um trabalho a cumprir para um certo imperador de Gargos.Ficou bem claro para todos que ela era uma prostituta, mas ninguém teve coragem de falar.

–Então, o que você lembra antes do ataque?-Perguntou Mljet, que era mais útil do que se imaginava : sabia mais de medicina que qualquer um ali.Isto é, só não mais que o velho Hvar, mas é óbvio que o ancião não quis colaborar em absolutamente nada.

–Ataque?Houve um ataque?-A moça aparentava cerca de 20 anos e só de observá-la ficava claro que não havia nenhum tipo de inocência nela.Os longos cabelos lisos e dourados casavam bem com os olhos escuros.Embora estivesse claro o tipo de coisa que ela fazia para viver, suas roupas eram recatadas, como se fosse uma nobre.

–Sim.Há umas 12 horas, o Princesa de Telmar foi destruído por uma quimera-do-mar.

–Quimera-do-mar?

Ela tinha motivos para a confusão.Até quem lutou com a criatura ainda estava sem entender como exatamente tudo aconteceu.

–Fogo não vai adiantar, nem mesmo o grego!Guardem essas coisas para depois!Essa coisa só pode ser morta com conjuramentos ou maldições!-Gritava o imediato Andora.Ele estava no comando, pois o capitão Olho de Garça fora engolido pela boca bizarra do monstro instantes antes-Temos algum mago aqui?

Um novo estrondo.Peguei arco e aljava de um marujo morto pelos tentáculos(ou seriam pernas?Talvez até nadadeiras) e comecei a atirar o quanto podia na criatura.Já lutara com algumas antes, porém nunca uma tão grande e raivosa.

Já podia sentir o barco começando a afundar.Aqueles danos eram irreparáveis.

–Eu posso tentar fazer alguma coisa.-Essen, o mágico, com todos os seus adornos, deu um passo a frente.

–Ótimo, ótimo!Use sua magia mais poderosa contra essa coisa!-Assim que falou isso, Andora, foi puxado por um dos...membros da quimera.A boca de polvo na cabeça de leão-marinho deixava tudo um pouco mais estranho enquanto ele era engolido vivo, gritando de dor.

Essen simplesmente parou no meio do convés, sem se preocupar com o ataque que estávamos sofrendo.Abriu os braços e fechou os olhos, contra o vento.

–O que você está fazendo?

–Meu trabalho.-O excêntrico mágico respondeu com um sorriso no rosto.

Repentinamente, milhares de cobras começaram a sair das mangas do sobretudo dele.Se enroscaram, e mais, e mais, até formar uma enorme e única cobra.

–Isso não é exatamente mágica, não é?-Gustaf perguntou enquanto cortava quantos "tentáculos" podia.

–Magia negra.-Me lembrei dos olhares daqueles mortos na Guerra.Ainda me dava calafrios.

–Apenas aproveitem o show.-Aquele homem era definitivamente estranho.

A cobra gigante, seguindo o movimento dos dedos de Essen, se preparou para o bote, e...Mordeu no que devia ser o pescoço da criatura.De repente, as cobras se desenroscaram, desfazendo a serpente gigante, e Essen agora parecia cansado.Os movimentos da quimera começaram a ficar mais lentos.Aos poucos, ela parava.

–Agora é por sua conta.-Ele falou e desmaiou.

–O quê?Como assim?-Só pude olhar pra quimera parada, sem saber o que fazer.

Lonpak arregalou os olhos.

–Alguém, me dê um arco e uma flecha!Segurem-se em algo!

–Do que está falando?-Não era obrigado a obedecer ordens de um mercenário.

–Apenas façam.-A quimera começou a ficar totalmente negra.No centro do segundo tórax(onde fica o coração dessas criaturas), porém, ela estava brilhando com uma luz esverdeada.A luz começou a tomar conta do corpo dela de forma simétrica, e tive a impressão de que ela iria explodir.

Quando alguns tentáculos acima do convés começaram a explodir e soltar um estranho líquido negro(que não era sangue) que corroía a madeira, Lonpak atirou uma flecha diretamente no coração do monstro.

–Então, vimos uma luz e ouvi um barulho de colisão.Acordei agarrado ao mastro, em alto-mar.Felizmente, ou não, a corrente levou todos até essa ilha.-Estava precisando de água após tanto tempo explicando a história para Kalysa.-Não vai mesmo explicar o que era aquela mágica, Essen?-Eu omiti a parte da 'magia negra'.

Ele deu de ombros.

–Um mágico nunca revela seus segredos.Mas, de qualquer forma, de nada por salvar vocês.

–Do que está falando?Lonpak nos salvou!Você pode ter parado a quimera, mas não acho que aquele líquido negro que estava saindo dela era licor dos deuses!

Quando Essen estava prestes a retrucar, ouvimos um estrondo no fundo da caverna.Ou o que pensávamos que era o fundo.

–Bem-vindos.-Uma sombra alta parou a cerca de 15 metros do grupo de sobreviventes.-Sintam-se em casa.

–Nerlinir.-Gustaf me cutucou-Já ouvimos essa voz antes.