Orleans

Capítulo 12 - Enchanted


Okay, vamos recapitular uma coisa ou duas. É extremamente importante fazer isso quando se está em uma posição de extremo ridículo diante de uma parede de retratos de uma família que não é a sua, fazendo algo muito vergonhoso como falar sozinha, principalmente quando o ato de se falar sozinha significa que você está dialogando com uma pessoa existente fora de uma e que hipoteticamente poderia surgir do nada, já que aquela é a casa dela.

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Resumindo: qual era a única maldita e infeliz chance no mundo de que aquilo acontecesse exatamente naquele momento? Nenhuma. Mesmo assim, Katerina Emily Dalton, como um feliz exemplar do sexo feminino portadora dos genes fracassados Dalton, havia conseguido este imenso mérito. Parabéns.

— Se-se-senhor Valois... Leo. — o sangue foi roubado do meu corpo ou alguém abriu uma janela diretamente para o ártico. Nunca senti tanto frio e ao mesmo tempo, minhas bochechas nunca estiveram tão quentes. Me afastei da parede rapidamente, unindo as mãos nas costas.

— Senhorita Katerina.

Ele me cumprimentou com um gesto, aquele meneio educado enquanto dois passos eram suficientes para estar no mesmo átrio, saindo da curva de corredor que eu tinha ignorado do lado contrário. Mais um exemplo daquele tipo de coisa que poderia ser evitada se eu prestasse mais atenção onde estou ao invés de ficar devaneando sozinha.

— Devo perguntar agora o motivo de encontra-la perambulando pela minha casa ou devo deixa-la a sós com seu aconselhamento com meu retrato?

— É uma pergunta deveras pertinente, Sr. Valois.

— Imensamente, eu concordo. — e de fato ele parecia surpreso com a minha presença ali, quase tanto quanto eu estava se parasse para pensar que dentre todos os lugares do mundo em que não devia estar, a casa dos irmãos Valois era o número um.

— Eu conheci sua mãe.

— Minha mãe... — Leo cruzou os braços, criando uma dobra no casaco de lã pesada e castanha que estava usando. Provavelmente não estava dentro da casa quando chegamos, pois a ponta de seu nariz estava vermelho pelo frio e usava um cachecol verde que estava visivelmente desalinhado (coisa rara de se ver).

— Sim, Janet. Uma pessoa adorável, a conheci no Betty’s esta tarde e ela fez um convite para o chá.

— Compreendo. Minha mãe é uma criatura sociável — ele respirou fundo, tamborilando os dedos contra o braço direito em uma pequena pausa. — Deveria ter dito que tinha planos para vir até York, senhorita Katerina. Teria sido um prazer...

— Oh, eu não tinha planos. — Não mesmo, Leo. Pode acreditar — Uma série de acontecimentos acabou me trazendo até aqui e por acaso, até sua casa, Sr. Valois. E definitivamente entendo cada vez mais a sua aversão por minha “toca” em Nova Iorque. Esta casa é maravilhosa. É imensa.

— Lucas disse que a senhorita se mudou do porão. Aliás, havia uma série de fotos do seu novo apartamento que ele fez questão de mostrar, acompanhado de uma mensagem em letras grandes bem imperativas sobre o assunto.

Oh, céus. A vergonha. Já nem me lembrava de ter pedido aquilo para Luke, de qualquer forma, tinha seu lado positivo. Não havia mais toca para me esconder.

— Pois é. Eu fiz isso.

— Parece um bom imóvel. Com exceção de seu absurdo gosto por amarelo na porta da frente.

Um elogio e uma crítica. Estávamos caminhando bem.

— Dá personalidade para a entrada. O senhor precisa ver o capacho colorido, combina perfeitamente.

— Consigo imaginar — ele revirou os olhos.

Lentamente Leo desfez os braços cruzados e escondeu as mãos dentro dos bolsos de seu jeans. O movimento chamou minha atenção para um pequeno detalhe, algo que poderia ter sido ignorado, mas que naquele momento serviu perfeitamente para me fazer sorrir e aliviar um pouco aquele exército de borboletas no meu estômago.

Leo Thomas Valois D’Orleans estava usando botas. Botas de borracha. Claro que eram pretas e sóbrias, sujas com terra molhada, nada próximas das minhas queridinhas amarelas que me esperavam em casa, porém adicionavam uma certa bagunça no inglês que me deixou intrigada.

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— Galochas, Sr. Valois? — tudo bem, eu tinha que dizer que tinha visto. Era uma chance única! — Achei que tinha algo muito pessoal contra elas.

A reação de Leo foi engraçada. Ele precisou olhar para os próprios pés, incrédulo de que tinha provavelmente, se esquecido de tirar as botas quando entrou na casa. Vencido pelo óbvio, suspirou profundamente.

— Botas de trabalho, senhorita Katerina. E desde que não sejam amarelas ofuscantes como aquelas com que a encontrei trabalhando tão absurdamente, não vejo motivo para repeli-las.

— Então o senhor trabalha no campo quando está em casa, Sr. Valois? — deduzi pela terra e o jeans que estava marcado em alguns lugares.

“O trabalho agradável é remédio da canseira” — citou “O Homem”, com um breve erguer da sobrancelha — Não necessariamente o campo, senhorita Dalton, mas os jardins.

— Jardinagem. Um passatempo interessante.

Então Próspero me surpreendia novamente. Pelo visto uma parte das minhas férias se resumia em descobrir algumas coisas sobre ele, desde seus dotes na culinária, para seu gosto por jardinagem e quem sabe o que mais até o final da minha curta estadia em York? Se não fosse pelo quase constante mau humor e as irritantes manias de retórica e modos antissociais, Leo seria um partido que dificilmente estaria disponível como parecia estar.

A pergunta crucial era: ele estava mesmo disponível ou meu súbito interesse nele me impedia de prestar melhor atenção a qualquer coisa que indicasse o contrário?

— Deveras. Mas me permita outra pergunta, senhorita Katerina... Sobre o quê exatamente eu teria uma palavra ou duas a dizer, como estava questionando o retrato quando cheguei?

— É um assunto um pouco... Complicado. Envolve uma série de coisas que eu deveria ter prestado mais atenção para não deixar que chegassem até este nível, Sr. Valois. Eu me calei quando devia ter sido uma tagarela como de costume. — além do detalhe de estar enlouquecendo por falar com fotos naturalmente.

— Algo pessoal?

— Sim. Familiar também. E por tantas vezes eu devia ter dado ouvidos ao meu instinto, ao que vi. Teria evitado muitos problemas e com certeza eu não estaria aqui tomando seu tempo ou invadindo sua casa, Sr. Valois.

— “Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o que, com frequência, poderíamos ganhar por simples medo de arriscar”.

Um arrepio subiu pelas minhas costas quando a voz de Leo terminou de declarar aquele verso. Não era o sotaque (que sozinho já causava isso), mas o teor da frase que ele escolheu dizer antes de trocarmos um olhar silencioso e ele se virar na direção das fotos com um suave sorriso nos lábios, que se desfez aos poucos.

Okay, Próspero. O que você está querendo me dizer?

— Bruce Campbell está com você? — não era bem isso que eu imaginava que estava se passando pela cabeça dele, mas era válido.

— Sim. Nós trouxemos sua mãe para casa. Foi então que ela insistiu para ficarmos para o chá.

— Entendo. Que outro motivo a traria até York senão passar as festas com os Campbell, correto?

Querer me livrar dos Campbell entrava na lista de bons motivos para se viajar até York, mesmo que a contragosto?

— Não estou aqui para passar o natal com Campbell algum, Sr. Valois.

— Não está?

Ali estava a chance de ouro, o momento perfeito, o gancho primordial! Tudo que me bastava era abrir o verbo e começar a explicar desde o princípio todo o mal entendido que tinha se desenrolado por conta da minha boca grande e de um casamento arranjado.

Leo ficaria furioso, com toda a certeza, afinal, quem gosta de mentirosos? E talvez nunca mais o visse e teria de lidar com o peso e as consequências do meu ato impensado, mas estava pronta. Mesmo que isso significasse que Samantha estava certa novamente e toda e qualquer mínima chance que existisse para mim fosse desaparecer.

Apertei os lábios e minha expressão bastou para ter a atenção de Leo por um instante. Meu coração palpitava (seria possível ter um enfarto fulminante?), meus pés batiam discretamente no chão. Porém, não eram apenas os meus pés que estavam batendo. Havia alguém vindo pelo corredor.

— Esperando alguém? — a sobrancelha deu o tom da ironia, um segundo antes de um corado Collins surgir diante do átrio, aparentando algumas gotículas de suor na testa brilhante.

— Collins? — ri ao vê-lo enxugar o rosto com o avental.

— Graças à boa Elizabeth, vocês me pouparam dois trabalhos em encontra-los juntos!

— Janet está dando mais trabalho do que de costume, Collins? Talvez esteja animada com a chegada de visitas tão repentinas para seu adorado chá.

— Sua mãe continua a mesma, senhor. E exatamente por isso estou procurando por vocês. Seu pai acaba de chegar e a Sra. D’Orleans requisitou que vocês se reúnam com ele na sala de jantar. Sabe que não é muito prudente evitar um pedido que envolva seu pai.

— De fato. E como pelo visto, a senhorita Dalton vai nos acompanhar nessa incursão familiar, acredito que queira seguir Collins até a sala de jantar para adiantar seus cumprimentos, Katerina.

— O senhor não vem? Para o chá.

— Em seguida. Não me perdoaria se pisasse nos tapetes seculares da casa com estas botas molhadas e sujas, senhorita Katerina. Brevemente estarei com vocês.

Tão elegantemente quanto me cumprimentou antes, Leo repetiu o gesto e passou por entre mim e Collins, tomando seu caminho pelo corredor e dando por encerrado nosso rápido encontro desencontrado pela casa. O mordomo sorriu agradavelmente e me ofereceu o braço, beijando minha mão como um agrado gentil.

— Está preparada para o chá? — começamos a caminhar com calma para longe do átrio e de todas aquelas fotos dos D’Orleans.

— Preparada? Parece até que está me levando para uma execução, Collins.

— Talvez se assemelhe a isso. Reunir um Campbell aos Orleans nesta casa é um feito que há muito não acontece. E você logo descobrirá isso.

— Tem a ver com a inimizade de Bruce e Leo, não é? Ainda não sei muito sobre esse mistério todo que ronda essa questão, Collins. Todos parecem querer me poupar.

— O Sr. Campbell é seu noivo. Não é educado da parte de ninguém, revirar o passado ou qualquer animosidade quando se trata de um assunto considerado encerrado, senhorita Kate. Ainda mais algo que possa trazer qualquer desconforto para você.

Pelos bons antepassados Creole... Não era a toa que Luke e Leo tinham toda aquela educação e posição sobre aquela conversa. Collins era de fato um tutor excelente e eu concordaria com tudo o que ele disse se fosse realmente verdade.

— Você me contaria se Bruce não fosse meu noivo, Collins?

O mordomo ajeitou os óculos na ponta do nariz e segurou minha mão, sem que deixássemos de caminhar na direção das escadarias da entrada. Bruce não estava aguardando por mim ali, como temia que estivesse no mesmo lugar em que tinha o deixado sozinho. Provavelmente havia seguido para o chá sem se importar muito com a minha presença — o que depois de suas últimas ações, era um alívio.

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— Quando eu a conheci, senhorita Kate, na livraria em que trabalha, me lembro perfeitamente de ter olhado para você e me perguntado onde os meninos estavam com a cabeça de se envolver com uma nova-iorquina. Você poderia ser uma benção ou uma maldição na vida dos dois, ainda mais pelo quanto já havia escutado de você durante os dias anteriores ao nosso encontro.

— Gostaria de saber o quê tanto falam de mim por aí — ri, realmente sem graça. Collins mostrou que deveríamos subir as escadas de madeira que partiam do hall, e seguimos degrau por degrau sem pressa. Só tinha olhos para o que o mordomo estava dizendo, interessada.

— Coisas boas e engraçadas. Algumas coisas ruins, eventualmente no depender dos humores. Mas o jovem Lucas possuí uma afinidade indescritível com você, senhorita Kate, inegável. E é o maior culpado, se todos já ouviram falar de você antes mesmo de conhecê-la. Espero que não se zangue com isso.

— Jamais. Eu tenho muito a agradecer pela amizade de Luke, Collins.

— O problema, senhorita Kate é que na terceira vez que a vi, parada à distância na chuva em uma calçada perto do Central Park com lágrimas nos olhos; soube imediatamente de uma coisa sobre você, que talvez não tenha se dado conta. E durante todo o resto da adorável noite que esteve conosco na casa em Nova Iorque, apenas me fortificou ainda mais uma certeza...

Paramos diante das portas de madeira logo no final da escadaria, no primeiro andar. Collins soltou meu braço devagar e abriu uma fresta da entrada, apenas se curvando um pouquinho para me confidenciar algo:

— A senhorita não sabe mentir.

Ainda estava olhando nos olhos miúdos de Collins por trás de seus óculos, esperando que ele completasse aquela descoberta com alguma coisa que não fosse um sorriso gentil e fofo, mas não tive muito tempo de dialogar. Tão logo meu rosto foi visto pelo lado de dentro do cômodo, as mãos de Janet Valois me alcançaram velozmente.

— Katerina! Que bom que chegou. Edward, venha conhecer a Kate! Vamos, Kate. Edward está conversando com Bruce.

Janet sorria efusiva, radiante, como se estivesse levando alguém famoso para conhecer o marido. Eu era famosa à minha maneira, pelo visto, particularmente entre os Valois D’Orleans e nem sabia se considerava isso bom, ou muito ruim.

A sala de jantar era tão suntuosa quanto o que parecia ser da casa toda. Um cômodo muito amplo, com janelas imensas e protegidas por cortinas claras, bem iluminado por lustres lindos e um papel de parede claro e repleto de arabescos delicados. Uma grande mesa grandiosa estava em seu centro, coberta por uma toalha creme e vários vasos com flores frescas. Diante das janelas, um conjunto de sofás oferecia algum conforto para antes e depois das refeições, além de uma vista linda para a entrada da casa.

Bem ali, observando o céu cinzento do fim da tarde, Bruce Campbell estava acompanhado de um homem que demonstrava sua presença unicamente por seu modo de se portar. Tinha um copo de gim em uma das mãos e escutava Bruce falar com pouco interesse estampado no rosto. Parecia nobre, os olhos frios, os cabelos prateados muito bem penteados para trás, a roupa impecavelmente social.

Chegava a ser intimidador.

— Edward, esta é a Katerina Dalton de quem lhe falei — Janet se aproximou e parou alguns passos dos homens, ficando logo atrás de mim, segurando meus ombros. E era bom Janet me segurar mesmo ou estava começando a crer que meus joelhos iam me deixar na mão.

Edward, o patriarca D’Orleans, lançou um olhar na minha direção que seria capaz de esfaquear um meliante desavisado. Era muito claro de quem Leo havia herdado suas expressões, mesmo que seu pai tivesse olhos profundamente castanhos ao invés dos gélidos azuis que o Carma ostentava por aí.

— Então, esta é a famigerada senhorita Katerina Dalton. Imaginava de fato, quanto tempo levaria até conhecê-la.

Vamos esclarecer o seguinte:

Famigerada. Adjetivo.

Que tem muita fama; célebre, notável, famígero.

Pejorativo. Tristemente afamado.

Agora um momento de reflexão sobre este adjetivo no detalhe, levando em consideração a quantidade de vezes que Lucas deve ter falado sobre mim coisas boas ou que Leo deve ter falado coisas não tão boas. Podia começar a ter certeza de que Edward D’Orleans não estava me chamando de famigerada por ser alguém notável. O tom de ironia também não ajudava em nada.

— É um prazer conhece-lo, Sr. D’Orleans.

Fiquei na dúvida se fazia um daqueles cumprimentos rebuscados ou se apertava a mão daquele homem. Tive sorte de ele estender a mão primeiro ou em mais alguns segundos estaria me curvando em uma mistura desajeitada de gueixa e aristocrata inglesa de seriado televisivo. Foi um desastre contido.

— Estava prestes a falar sobre você para o Sr. D’Orleans, Kate — Bruce interviu, seu sorriso tão tranquilo como se nada tivesse ocorrido entre nós há pouco tempo atrás.

— Estávamos? Desculpe-me, Campbell, não estava prestando atenção suficiente na sua narrativa — Edward bebericou seu copo, deixando-o descansar na mesa de centro entre os sofás. — Achei que estivéssemos conversando sobre negócios e a teimosia do seu pai. Mas se pretende mudar de assunto para agradar sua noiva, vá em frente.

— Negócios. Vocês precisam realmente conversar sobre isso no horário do chá? É hora de assuntos mais amenos, de alguns sorrisos e pelo amor da coroa real, Edward, nada de gim! — Janet apanhou o copo e trocou olhares com o marido, que bufou, mas não fez nenhum gesto para impedi-la de se afastar com a bebida.

— Não estávamos falando sobre negócios, Janet. Segundo o Sr. Campbell, estávamos falando sobre a senhorita Dalton. Não é, Campbell?

— Não quero atrapalhar a conversa de vocês, realmente — murmurei, desejando internamente que os dois me ignorassem e voltassem realmente a falar seja lá do quê.

— Não atrapalha jamais, Kate — Bruce se aproximou, passando o braço pelo meu ombro. — Era apenas uma conversa cordial sobre os negócios do meu pai e do senhor Edward. Ele estava...

— Reclamando da teimosia e da falta de tato para negócios que o Sr. Campbell desenvolveu com o passar dos anos e que parece piorar a cada dia que passa. É a quinta reunião que George aceita participar e não existe ninguém neste mundo que mude sua cabeça medieval para a nova era para as indústrias têxteis.

— O senhor trabalha na área têxtil, Sr. D’Orleans? — perguntas óbvias, minha maior qualidade.

— Sim, senhorita Dalton. A família D’Orleans sempre esteve ligada intimamente com a produção de lã em Yorkshire, séculos de tradição que precisam seguir o crescimento da mente dos homens e os avanços em sua área. Não é a mente pequena que constrói impérios, tão pouco homens estagnados que carregam nos ombros o destino de tantos que dependem de sua frutífera mentalidade.

Ele falava sobre aquilo com uma naturalidade poética. Era claro o quanto Edward D’Orleans era apaixonado e orgulhoso quanto a seu alcance no trabalho, e visionário para as necessidades de sua indústria.

— Minha família trabalha com algodão há gerações também, Sr. D’Orleans. Com certeza o senhor iria gostar de conversar com meu pai sobre a nova era das indústrias.

— Pelo visto a senhorita não participa ativamente dos negócios de sua família, estou correto?

— Está sim. Eu e minha irmã escolhemos caminhos bem diferentes do trabalho tradicional da família. Na verdade, estamos fugindo bastante de tradicionalismos ultimamente — olhei para Bruce, que sorriu como se não tivesse entendido o recado.

— Algumas tradições são necessárias em família. Pois se perderemos nossas raízes, jamais seremos árvores fortes, senhorita Dalton.

— Talvez as árvores novas queiram fincar suas próprias raízes, Sr. D’Orleans. Mas eu admiro algumas tradições. Principalmente aquelas que não procuram colocar rédeas nas gerações mais novas.

Edward sorriu e seu rosto ficou mais leve, mesmo que não perdesse totalmente sua seriedade e presença. Descansou as mãos nos bolsos do seu blazer antes de continuar.

— É exatamente este o meu pensamento, senhorita. Prender os novos brotos de uma árvore centenária, apenas a fará mais fraca. É muito sábio aceitar que as novas gerações tracem seu próprio caminho e tragam o novo. E este é o pensamento que o teimoso e hipócrita Campbell não consegue aceitar.

Estava explicado realmente de onde aquele olhar do Raptores Britanicus havia surgido. Edward tinha olhos tão penetrantes e violentos que Bruce engoliu seriamente em seco, olhando ao redor para encontrar alguma outra âncora de assunto que não fosse sua querida “noivinha”.

Segurava um riso triunfante quando escutei uma voz vinda da entrada da sala de jantar, que me atraiu imediatamente.

— Como assim? Kate está aqui? — meus ouvidos não me traiam dessa vez. Luke estava ali, retirando uma bolsa carteiro dos ombros e jogando-a em uma das cadeiras enquanto Janet o recebia. Juliet estava com ele e beijava as bochechas da tia com carinho.

— Kate? KATE! — ele me localizou e correu até mim de braços abertos, como se não me visse há uns bons anos pelo menos.

Bruce deu um passo para o lado para permitir que o ruivinho me abraçasse forte e me tirasse do chão por um momento, rindo alto, feliz como sempre parecia estar.

— O que você está fazendo aqui? Caramba, que legal! Você está na minha casa! Você conheceu a casa? Você precisa conhecer tudo, Kate!

— Acalme-se, Lucas — Edward soou mais rígido, passando a mão pelo topo dos cabelos do filho antes de nos deixar e sinalizar para que Bruce o seguisse para outro ponto da sala. Com certeza o assunto entre eles era sério.

— Pois é, olha só que coisa. Eu, na sua casa. E a sua casa é incrível, Luke!

— Não é? Você precisa ver só as passagens secretas!

— Passagens secretas? — arregalei os olhos. Começa a pensar no quanto seria legal ter crescido em uma casa com passagens por todos os lados. Minha mãe nunca teria me obrigado a comer sopa de ervilha se tivéssemos passagens secretas.

— Algumas. Eu vou te mostrar tudo.

— Depois do chá, Não é, Lucas? — Juliet se aproximou com um sorriso delicado. Seu vestido azul combinava perfeitamente com as grossas meias de inverno e as botas de couro que estava usando, como sempre uma visão linda. Irritante, mas com bom gosto, admito.

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— É muito bom revê-la, Juliet.

— Não esperava por essa surpresa, Katerina. Mas eu bem disse para minha tia que não de todo surpreendente que você viesse para York passar seu natal com seu noivo. A propósito, onde está Bruce? — ela olhou para os lados.

— Conversando com meu pai — Luke apontou, ainda estava abraçado comigo como se tivesse encontrado um bichinho de estimação fofo.

— Vou até lá para cumprimenta-lo.

Foi engraçado notar como as bochechas de Juliet ficaram coradas e o modo dela morder os lábios com uma ponta de ansiedade apenas por pensar em ir cumprimentar Bruce. Mas que ela tinha algum carinho por ele era um tanto óbvio, mesmo tendo ficado tão alegre em saber do meu noivado fictício. Tinha que parar de ficar procurando lógica em todas as coisas que envolviam aquilo.

— Vamos nos sentar? O chá vai ser servido — Janet anunciou em um tom de voz mais alto, batendo um pequeno sino prateado que estava sobre a mesa. Pela porta, duas senhoras traziam um carrinho com bandejas, servindo a mesa com bolos, pães, scones, geleias e queijos, creme batido, manteiga e obviamente, chá.

Luke caminhou comigo até a mesa e puxou uma das cadeiras para me sentar. Acomodou-se logo ao lado e apontou uma das senhoras, tímida e com um coque, que logo reconheci.

— Aquela é Claude. Ela trabalha na cozinha e é responsável por estas delícias — ele roubava um scone para o prato. — E esta aqui é Mary, a governanta.

A mulher que serviu a mesa bem ao nosso lado parecia um tipo de babá severa na faixa dos sessenta anos, com seus cabelos loiros cortados na altura do queixo, roupas impecáveis e um meio sorriso apenas para responder a apresentação de Lucas.

Janet se sentou do outro lado da mesa, na frente do filho e suspirou, vendo que o marido não havia escutado o chamado para se sentar.

— O que eu faço com o seu pai, Lucas? Divórcio?

— Por favor, com duas colheres de açúcar hoje — Luke mordeu o scone, que deixava sua boca cheia de creme e açúcar de confeiteiro, me fazendo rir.

— Família tradicional uma ova. — Janet respirou fundo, pegando uma colher e batendo contra uma xícara — Se eu tiver que chamar vocês mais uma vez, a louça vai começar a voar! Estão avisados!

— Não se assuste, Kate. Ela só jogou a louça uma vez e depois disso ninguém nunca mais duvidou que ela fosse capaz. Sempre funciona.

E de fato, funcionou.

Edward sentou-se na cabeceira da mesa, ao lado da esposa e Bruce tentou se sentar na cadeira bem a minha frente, mas Janet rapidamente estendeu a mão para cobrir o assento, interrompendo sua intenção.

— Desculpe, querido, mas eu gosto que meus filhos se sentem ao meu lado. Coisa de mãe, entende? — ela bateu os cílios e indicou a cadeira ao meu lado esquerdo. — Você pode se sentar ali, bem ao lado da Kate. É sempre de bom gosto um casal sentar lado a lado, sabia?

Bruce pediu desculpas para Janet e cumprimentou Luke antes de se sentar ao meu lado, a contrariedade estampada em seu rosto enquanto desenrolava um guardanapo de tecido para colocar no colo.

Eu estava tentando não rir. Era difícil.

Edward D’Orleans consultou seu relógio de pulso e gesticulou para Claude. Imediatamente a senhora começou a servir Janet, preenchendo a linda xícara cor de creme, decorada com vinhas azuis; com um perfumado e fervente chá. Luke não esperava ser servido. Ele próprio se esticava e enchia sua xícara de louça com chá escuro e leite, antes de apanhar uma fatia de bolo com frutas que estava por perto, fofo e morno.

Claude estava servindo Juliet com chá de morangos quando a loira acrescentou:

— Onde está Leo? Ele não vai tomar chá conosco?

— Deve estar ocupado cobrindo os jardins, com toda a certeza. A previsão é que neve em breve e com certeza ele não vai perder o trabalho por conta disso — Janet respondeu, enquanto me oferecia uma travessa repleta de bolinhos com gergelim negro.

— Eu o encontrei agora a pouco, devia estar chegando dos jardins. Disse que ia tirar as botas antes de se juntar a nós — achei melhor noticiar já que Collins não estava ali para dizer nada por mim.

— Leopold ainda se ocupa com aqueles jardins? Que insistência. Após tantos anos... — Bruce riu, como se houvesse alguma piada no assunto.

— E por que ele não se ocuparia? É bastante revigorante, ver algo que se pode dizer que foi alcançado com o próprio suor. Devia tentar, Bruce. É bem legal — Luke piscou para ele e logo enfiou outro scone pela boca, como se a resposta tivesse sido completamente casual. Mas a alfinetada tinha sido seca e a mesa ficou em silêncio por um minuto, até Edward pigarrear quando a porta da sala de jantar se abriu com a chegada de Leo.

— Clima interessante... — ele falou devagar enquanto Claude fechava a porta e Janet acenava para ele se sentar ao seu lado. Não era difícil de perceber que a refeição silenciosa parecia um pouco... Tensa.

— Não esperamos por você, querido, mas sirva-se — Janet ajeitava o casaco de Leo como se ele fosse uma criança de oito anos que tinha acabado de chegar do colégio. Ela era muito carinhosa com eles, mesmo quando isso incluía ameaçar jogar xícaras.

Claude serviu a xícara de Leo sem precisar perguntar qual chá ele preferia. Depois adicionou os dois cubos de açúcar e deixou o leite para ele dosar, exatamente como eu imaginei que faria. Durante todo o pequeno ritual de servir-se, nem ele, nem Bruce, pareceram notar a presença um do outro na mesa. Estavam praticamente invisíveis.

— Charlotte perguntou de você mais uma vez esta tarde, Leo. Você precisa ligar para ela — Juliet quase gorjeou, como se o assunto entre Leo e a tal Charlotte fosse muito interessante para deixar passar como observação naquele exato momento.

Engraçadinha. Merecia mesmo um puxão bem dado naqueles cabelos loiros perfeitos... Charlotte. Quem diabos era Charlotte?

— Depois do natal, Juliet, provavelmente — Leo adicionou, cortando uma fatia quase milimétrica de um pão sovado que estava próximo.

— Provavelmente? — Edward se pronunciou — Não pense em deixar a senhorita Charlotte sem uma resposta, Leopold. Seria muito indelicado da sua parte.

— E ingrato. Eu já disse isso para ele — Juliet sorriu, vitoriosa.

Leo apenas suspirou e bebeu um gole de seu chá, que cheirava perfeitamente a bergamota, espiralando vapor perto de seu rosto. Seu modo de revirar os olhos discretamente me lembrava das vezes que fui tratada como criança na frente de estranhos, coisa normalmente feita por minha amada mãe Aida. Portanto não era muito difícil me solidarizar com a posição dele naquele momento.

— Podem deixar para conversar sobre todos estes assuntos depois? Ora, temos visitas hoje e adoraria que o chá corresse bem, sem cobranças, negócios ou discussões. É pedir demais para vocês?

— Não se incomode, mãe — Leo tocou sobre o braço de Janet, antes de apanhar a manteigueira e pareceu finalmente notar que estava sentado logo na minha frente. — Não creio que estas coisas possam assustar a senhorita Dalton.

— De modo algum — respondi.

— Kate está acostumada com conversas de família, Sra. Valois. Ela mesma vem de uma família bem, como posso dizer... — Bruce dramatizava a busca por uma palavra em especial, girando a colher dentro de sua xícara, batendo o talher contra a borda da louça. — Conturbada.

— Bruce! — reclamei.

— Não precisa se envergonhar, Kate. Você está entre bons amigos, todos temos problemas familiares. Ninguém vai julgar você por nada, muito menos pela sua família — ele continuou girando a colher com um sorriso quase doce, mas que para mim estava claro que era tão falso quanto sua vontade de me fazer sentir entre amigos depois de um comentário daqueles.

Todos pareciam levemente embaraçados pelo comentário infeliz, até que a voz de Leo surgiu por trás de sua xícara depois de outro gole de chá.

— Não creio que este seja um assunto que a senhorita Dalton queira expor, Sr. Campbell, tão pouco que seja de bom tom que a coloque em uma situação ridícula assim. E eu agradeceria imensamente se parasse de bater essa maldita colher na louça antes de pedir desculpas para ela pela idiotice que acabou de dizer.

Oh, pelos bons autores. Se houvesse uma faca capaz de cortar a tensão que se instalou naquela mesa quando Leo e Bruce trocaram um olhar, ela teria de ser mais poderosa do que qualquer sabre de luz do universo. Qualquer um poderia sentir e ver claramente no rosto dos dois, o quanto era perigoso reuni-los em um só recinto.

Janet só podia estar louca quando nos convidou para aquele chá.

— Meninos, meninos. Comportem-se, sim? — ela suspirou com a simplicidade de uma mãe que tenta acalmar uma discussão de garotinhos. — Bruce, peça desculpas para Katerina.

— Isso mesmo, Bruce, peça desculpas — Luke apoiou os cotovelos na mesa, rindo enquanto esperava Bruce dizer qualquer coisa. Deliciando-se com a situação.

— Sra. Valois, eu não... — Bruce gaguejou.

— Você ouviu minha esposa, Campbell? — Edward não permitiu que Bruce desse qualquer desculpa ou tentasse mais nenhum sorriso que fingia uma situação normal. — Desculpe-se com a moça.

— Gente, não precisamos criar um drama só por conta disso, não é? — Juliet tentou minimizar, dando um risinho baixo. Porém Leo ergueu o indicador no ar e só o movimento foi o suficiente para ela não se atrever a continuar com seu serviço de “pacificadora”.

— Sr. Campbell, acredito que seja a sua deixa — completou.

Se eu poderia simplesmente dizer que estava tudo bem e o assunto passar? Sim, eu poderia. Mas entre poder e querer havia uma diferença muito grande, ainda mais depois daquele surto vilanesco que Bruce havia tido no corredor mais cedo.

Ele precisava de uma lição e se os Valois D’Orleans estavam do meu lado (pelo menos a maioria), quem seria eu para discordar da sensação boa que isso me causava?

— Me perdoe, Kate. Foi uma brincadeira descabida — Bruce tomou minha mão e a beijou — não vai se repetir.

— É bom que não se repita mesmo. — Bufei irritada e tirei minha mão da dele logo que pude, pedindo que Luke me passasse um daqueles scones com amoras que pareciam bem melhores do que perder tempo de vida tentando compreender o tipo de lógica de uma pessoa bipolar como Bruce estava demonstrando ser.

Em silêncio, enquanto bebericava o chá quente e doce, sem me atrever a erguer os olhos para não encarar Leo do outro lado da mesa; ficava remoendo o que estava de fato acontecendo ali. Não me atrevia a pensar nos motivos de qualquer coisa entre Leo e Bruce no passado, mas aquela inimizade começava a pesar no meu destino.

Se o desentendimento entre eles era tão grave quanto finalmente transparecia, meu futuro corria sérios riscos. Bruce tinha deixado subentendido que não aceitava que eu terminasse com o casamento arranjado se o objetivo principal fosse ter alguma chance com Leo. Toda a mudança nos seus modos, que costumavam ser gentis e agora pareciam com um ridículo adolescente embirrado, tinha ocorrido após nossa discussão no corredor do hall.

Próspero. Você quer se livrar da tradição para poder correr para ele, não é?”, sua voz estava fresca na minha memória, principalmente a forma com que ironizava o renome que dei para Leo. E doía perceber que sem querer, tinha armado Bruce com fortes motivos para simplesmente manter nosso compromisso indiferente da minha vontade ou do que eu realmente pensava.

Fiquei tanto tempo imersa em pensamentos, desligada das conversas que continuavam desenrolando na mesa alheias a mim, que só voltei a escutar quando Juliet chamou meu nome.

— Katerina, você está me escutando?

Ergui os olhos depressa e encontrei Leo olhando para mim, de certo modo parecia um pouco preocupado, mas no segundo seguinte se distraiu com as risadas que Lucas estava dando ao descrever como o forno da cozinha explodiu quando ele era pequeno e se levantou para atender um chamado de Edward, que estava em pé mais distante da mesa, agora que todos pareciam já ter terminado o chá.

— Desculpe, Juliet, eu estava desligada. Sobre o que você estava falando?

— Eu estava perguntando se vocês já decidiram uma data para o casamento — Os olhinhos dela brilhavam, sinceramente interessada.

— Nós não... Conversamos sobre isso ainda... — não esperava aquela pergunta.

— Se você precisar de algumas dicas para a data, me diga. Tenho uma pasta repleta de ideias para casamentos e as melhores datas por estação, horário. Com certeza você precisa ver os vestidos que eu tenho nos recortes. Você vai amar e eu posso te recomendar alguns amigos que trabalham com isso.

— A irmã de Kate é estilista, Juliet. Ela te contou? — Bruce sorriu para ela.

— Eu não sabia. Kate, seu vestido vai ser exclusivo! Que lindo! Já tem as ideias? Os croquis?

— Não, nada ainda. Adria é muito ocupada e nunca conversamos sobre isso.

— Vocês parecem não conversar nada sobre esse casamento, não é mesmo? — Janet meteu-se na conversa, com um erguer de sobrancelha que poderia me fazer rir se ela não fosse mãe de Leo. — Desse jeito, Katerina, vou começar a pensar que você nem quer se casar.

— Mamãe... — Lucas revirou os olhos, envergonhado do que Janet estava falando.

— Estou sendo sincera. Nunca vi uma noiva tão desinteressada assim. Kate, querida... Você quer esse casamento?

Se você nunca ouviu o barulho de um coração tendo uma parada forçada por stress intenso, meu caro saiba que é um barulho ensurdecedor, mesmo que seja em silêncio.

Senti o sangue me faltar no rosto e as palavras fugirem da minha boca. Minha consciência dizia em voz alta: “conte para eles!”, mas eu não conseguia imaginar um desastre maior para acontecer naquele dia.

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— Kate nunca foi interessada em casamentos. Por isso ela ainda não se preocupou com esses detalhes, não é Kate? Mas vamos ter o melhor para esse casamento, sem dúvidas — Bruce adiantou.

— Não duvido. Ela me contou sobre o anel de noivado. Bruce, você devia ter a feito trazer o anel, eu adoraria vê-lo! — Juliet ria, como se ela fosse a noiva. Bem que ela poderia se casar com Bruce. Eu não tinha nada contra isso, dava minha benção.

— Ora, não foi nada de mais, Juliet. Mas foi a maior alegria da minha vida quando Kate aceitou a aliança, mesmo que tenha sido em um lugar tão simples como uma cafeteria qualquer de Nova Iorque.

Me entreolhei com Bruce e ao invés de encontrar aquele suave sentir que comumente encontrava quando pensava que estava sendo bem educado, gentil e me salvando de situações embaraçosas; visualizei o quanto ele estava na verdade, manipulando aquela mentira, me colocando dentro de uma história que não dava brechas para que ninguém duvidasse do nosso pretenso compromisso.

No momento seguinte, a sala de jantar girou para mim e precisei respirar fundo. Estava em pânico. Tinha de sair daquele martírio de perguntas e mentiras.

— Eu... Preciso de um pouco de ar... Me desculpem.

Me levantei e Luke fez menção de se levantar também, mas não deixei. Disse que estava bem, que era culpa do chá preto que não tinha costume de tomar e que provavelmente estava sentindo calores por conta dele.

Contornei a mesa e vi quando Leo pediu licença para Edward e veio até mim, estranhando que eu estivesse saindo de lá.

— Está tudo bem, senhorita Dalton?

Impensadamente, apanhei a mão dele e quase supliquei, prestes a começar a chorar por não saber o que mais fazer naquela situação constrangedora.

— Por favor, o senhor pode me tirar daqui um pouco? Gostaria que fosse um herói improvável uma última vez. Preciso respirar. — murmurei.

Leo pareceu não entender inicialmente, olhando para a mesa onde todos ainda conversavam e depois para seu pai. Suas sobrancelhas franzidas eram a expressão perfeita da confusão.

— A biblioteca.

— Fica longe? — questionei.

— No fim do andar.

— Ótimo.

Puxei-o pela mão e ao invés de qualquer resistência, ele seguiu comigo, como se agora eu fosse sua guia por uma casa que nem conhecesse. Só pedi que ele me mostrasse em qual porta deveria entrar quando chegássemos lá.

Eu caminharia de volta para Nova Iorque se pudesse, mas naquele instante, só me importava em escapar.

******

As portas de vidro da biblioteca eram muito maiores do que qualquer escada de dobrar que já tinha visualizado na minha vida e o pequeno pensamento de que talvez, fosse preciso mais do que uma pessoa para trocar aquelas cortinas, me roubou um pouco a atenção. Dali era possível enxergar o amplo terraço e todo o jardim que estava adormecido na estação fria, mas que não deixava de ser deslumbrante, um cenário que ia mudando de cor com o por do sol que mal se via. Pena que o início da escuridão não me permitia ver com mais clareza.

Meu coração ainda estava descompassado, doendo contra o peito com a descrição mais patética de um tambor. É engraçado como se consegue sentir cada batida entre os ombros e a garganta, quase acreditando que o maldito órgão mudou de lugar. Mas lá estava, parada diante daquelas janelas e decidindo entre meus mais novos e estranhos pensamentos sobre corações nômades e escadas com mais de cinco metros ao invés de chorar (como era a minha vontade anterior).

Não sei exatamente de onde a coragem brotou ou porque a saída mais rápida do martírio me veio na forma daquele homem, que agora mantinha um silêncio grave e respeitoso entre os livros daquela suntuosa biblioteca secular. Com o canto dos olhos conseguia ver Leo com as mãos para trás, balançando suavemente o corpo e tamborilando os dedos como de costume, talvez se perguntando — tanto quanto eu! — o que havia me motivado a simplesmente pegá-lo pela mão e arrastá-lo até ali.

Tinha que torcer, rezar, pedir internamente para que nenhum deus interplanetário surgisse para me cobrir de azar como parecia mais do que costumeiro quando se tratava da minha vida. Já me bastava a cena de que tinha acabado de escapar, a situação tão irritante e complicada com que tive de lidar sem nem ao menos ter culpa dela.

Okay. Eu tinha uma parcela de culpa, assumo.

— Séculos de jardinagem, gerações nascidas e mortas, extenuantes dias e noites gastos com podas e regas para jamais, conseguirem plantas que durem todo o inverno.

Leo rompeu o silêncio com aquele comentário por talvez acreditar que eu estivesse analisando o trabalho no jardim de sua família e foi muito gentil da parte dele em não começarmos a conversar qualquer coisa que envolvesse tecidos, Campbells ou chá, e nem mesmo pedir nenhuma explicação ou fazer qualquer comentário com sua costumeira acidez.

— Faz parte da beleza do inverno, não é? As plantas adormecidas, o frio congelante, a neve, o natal. Qual seria a graça no final do ano sem isso tudo, Sr. Valois? Até as pessoas mudam nessa estação.

— Acha mesmo isso, senhorita Katerina?

— Sim. O inverno deixa as pessoas mais frias, quietas e reclusas. O natal serve para trazer um pouco de calor na época mais gelada, como um jardineiro que cobre uma parte do jardim para proteger as mudas da geada. É algo passageiro, mas que funciona.

Busquei encontrar Leo pelo imenso cômodo e ele estava bem próximo, caminhando devagar até estar do meu lado e abrir um pouco mais as cortinas para a noite que caía.

— Falando desta forma, começarei a imaginar que a senhorita possuí um desprezo pessoal pelos invernos.

— Nem todos os invernos. Apenas alguns, ainda mais longe de casa.

— Então seria um desprezo pessoal por este inverno em especial?

Nossos olhos se encontraram. Claro que eu não tinha nenhum desprezo pelas minhas férias, mesmo que ela pudesse ser resumida em uma única palavra: problemas. Era apenas uma pequena divergência de opinião sobre o divertimento que as festas de final de ano pareciam me causar e o que estavam causando.

— Não, embora este inverno esteja sendo uma verdadeira montanha de surpresas, não sei se tenho motivos suficientes para desprezá-lo.

— Então a estação ainda deve guardar algumas esperanças pelo seu apreço, senhorita Katerina?

Qual era o assunto mesmo?

— Creio que sim, Sr. Valois. Mas ela precisa ser muito convincente.

Leo fez uma pausa. Eu já sabia exatamente quando ele estava pensando em alguma coisa. Suas sobrancelhas não se moviam, mas seus lábios eram levemente mordidos, e o olhar se perdia adiante. O mesmo modus operandi de suas compras mais detalhadas na livraria.

— Existe uma flor naquele jardim, que resiste bravamente ao inverno — ele recomeçou, apontando o jardim na escuridão. — Outras o fazem, por certo, com igual coragem; porém esta se destaca por sua vivacidade. É difícil saber exatamente qual será sua cor quando é plantada e pode surpreender mesmo um jardineiro experiente, tantas nuances possuí.

— O inverno todo, Sr. Valois? — realmente estava em duvidas se aquela conversa era sobre o clima. Tinha uma experiência interessante sobre previsões do tempo na minha adolescência, mas não era importante no momento.

— Uma boa parte dele. Mas ela não morre, apenas deixa de florir quando o frio é muito intenso e retorna ao menor sinal de amenidade. O frio não a intimida, é a única que permanece colorida e viva mesmo sob as geadas intensas.

Tive de sorrir com o carinho com que Leo falava daquela planta e sua flor. Com sua audácia de sobreviver um trecho do inverno, ela tinha cativado o inglês e sua admiração. Já era um bom indicador do que conseguia impressionar o Sr. Valois.

— Ela serve de motivo para o inverno ganhar meu apreço? Uma simples flor?

— Não, mas talvez possa aprender com ela sobre o inverno, senhorita Katerina. Uma simples planta, supostamente frágil e tola como qualquer outra, com um florir apenas colorido e perfumada tal qual o restante do jardim. Mas forte em seu objetivo de perdurar contra o frio cortante, contra o obstáculo imposto, mesmo sendo prejulgada como uma planta banal.

— Mas ela deixa de florir, como o senhor mesmo pontuou. Ela desiste no meio do inverno e não vence.

Do lado de fora, pequenos postes de luz se acendiam ao redor dos jardins e delineando todo o trecho da entrada desde o portão de ferro, até a escada da casa. A iluminação aumentava o ar etéreo da casa dos D’Orleans, porém nada me preparava para as pequenas luzes douradas aos montes, que enfeitavam arbustos e touceiras, contornavam roseiras e canteiros. O natal em York nunca seria o mesmo na minha mente depois daquela visão.

Porém houve outra visão, diferente das luzes douradas ou dos jardins iluminados. Um sorriso que surgiu na minha frente quando Leo se curvou para roubar a minha atenção, desafiando minha capacidade de não sorrir com ele.

— Ela não desiste, senhorita Dalton. Ela apenas deixa a intempérie destruir as flores que são meros enfeites, o que vemos por fora, o que julgamos ver. Por baixo da geada e da neve, ela se mantem tão viva e verde como antes e com raízes mais firmes a cada ano.

— O senhor parece apaixonado por ela, senhor Valois. — ri baixinho. E rir baixinho era um sinal bem claro de que não conseguiria continuar olhando nos belos olhos de Leo por muito tempo.

— Talvez eu esteja, senhorita Katerina. Talvez eu esteja. Não é sempre que uma flor consegue me surpreender — num movimento, a mão de Leo tocou meu ombro e diferente da sensação que tive ao pegar sua mão; o simples toque pareceu elétrico mesmo sobre meu casaco. Ele indicou com o rosto, a vista da janela e depois apontou um lugar logo abaixo da varanda, um canteiro coberto de flores multicoloridas e arredondadas. — Amores-perfeitos, Katerina.

— São as guerreiras contra o inverno?

Leo assentiu enquanto admirávamos as cores. Ele parecia tão seguro, tão gentil como nunca imaginei que pudesse ser por baixo daquela casca irritante e insuportavelmente inglesa. Quanto a mim... Talvez uma batedeira fosse o melhor que poderia se parecer comigo naquele instante, mas eu sabia disfarçar muito bem.

— Sim. Talvez não durem até amanhã. Vai nevar ainda esta noite e provavelmente a véspera de natal será pálida e muito fria. Própria para a planta demonstrar seu valor.

Santo Edgar Allan Poe... Aquilo não era sobre flores, nem sobre amores-perfeitos ou jardins ou natal. Aquela conversa estava muito clara para mim (ou eu estava escutando coisas muito além da minha imaginação) e o tum-tum-tum que começava a me incomodar na garganta, juntamente das duas dúzias de borboletas no meu estômago; pediam um momento de iniciativa!

Força, Katerina! Faça valer o ar que você respira! O máximo que pode acontecer é ser expulsa aos pontapés pela escadaria, deposta do país e consequentemente entrar em uma crise de tristeza regada a sorvete e filmes dramáticos mexicanos, jurando nunca mais se deixar levar por nenhuma criatura que tenha sotaque britânico ou sobrancelhas arqueadas. Força!

Respirei fundo, o bastante para as costas doerem, e apanhei a mão de Leo com as minhas, atraindo sua atenção no mesmo instante. Ele me questionou com os olhos antes da sobrancelha esquerda atacar sem perdão.

Eu estava perdida. A sobrancelha não era mais um sinal temido, mas algo que repentinamente era só dele e tão dele que se transformava em um abusivo charme. Gaguejei um pouco antes de começar.

— Sr. Valois... Leo... Eu preciso dizer uma coisa. Algo completamente relevante, importante, primordial. Algo que tenho tentado dizer a algum tempo, ou melhor, algo que estou tentando resolver da melhor forma possível e que está me colocando em problemas cada dia maiores.

Agora as sobrancelhas de Leo estavam franzidas e todo seu olhar tornou sua expressão mais rígida, quase como me lembrava dele desde a primeira vez que entrou pela porta da Barnes & Noble. Ele ainda tinha sua mão segura pelas minhas e não conseguia evitar que meus dedos estivessem frios e trêmulos.

Meu olhar desviou do dele e engoli em seco antes de tomar coragem de encará-lo mais uma vez. Era isso, Kate. Hora da verdade.

— Eu contei uma mentira para você, Leo. E eu não quero mais continuar com isso...

— Uma mentira? — ele questionou, talvez não imaginasse que alguém como eu fosse capaz de algo assim. Sentia uma parcela de julgamento em seu olhar.

— Foi totalmente idiota e impensado, eu jamais imaginei que uma coisa dita por raiva pudesse tomar uma dimensão tão grande como tomou. Mas se tornou uma maldita bola de neve e cada vez que tentava te dizer, resolver o problema, algo acontecia ou você simplesmente era a pessoa mais irritante, soberba e mandona nesse mundo; o que não ajudava nada!

— Oh, então uma parcela de culpa na sua mentira, é minha?

— Claro que sim! Eu nunca teria mentido se você não tivesse me provocado com suas acusações sobre o que meus atos o faziam pensar sobre mim.

Leo balançou a cabeça lentamente, aparentemente tentando se lembrar do que eu estava dizendo, de qual momento havia sido aquele em que a mentira tinha surgido por impulso. Ou nem tanto.

— Não estou compreendendo aonde quer chegar com isso, Katerina. Por que simplesmente não conta de uma vez o que foi que...

— Eu não estou noiva, Leo.

A única reação dele naquele instante foi apertar os olhos sem acreditar no que eu tinha dito e engolir cada palavra que poderia dizer. Seu rosto pendeu para o lado e seus lábios se entreabriram, aparentemente procurando alguma coisa sobre a questão em sua mente. Mas eu não podia deixar que Leo falasse nada ainda, não queria que tivesse logo de uma vez a péssima reação que eu esperava dele e me deixasse ali sozinha, sem me explicar.

— Bruce Campbell não é meu noivo, nunca será e eu menti pra você. Menti para Lucas e Collins, para sua mãe, seu pai e até para a sua prima irritante! Menti porque você me julgou aquela noite na sua biblioteca como se eu fosse inferior por estar com ele, como se o que eu sou não fosse suficiente para ter um homem qualquer interessado o bastante em mim ou para me beijar onde quer que fosse!

— Katerina, não... — Leo colocou sua outra mão sobre as minhas, tentando me interromper, mas não permiti. Precisava desabafar. Precisava me sentir limpa de todo aquele mal entendido.

— Minha família quer que eu me case com ele. É um acordo, uma maluquice sem fim e que acabou ganhando força com toda essa mentira absurda. Eu sei que estou tagarelando e que você não tem absolutamente nada a ver com toda essa imensa bagunça na minha vida, mas eu não queria que me julgasse eternamente por uma mentira ou me tratasse de forma diferente por causa de uma pessoa como Bruce, com quem claramente tem desavenças do passado e eu... eu...

Estava ofegando, despejando as palavras com tanta rapidez que sequer olhava para Leo. Meus olhos estavam fixos no chão, enquanto gesticulava para explicar tudo com ainda mais clareza. Só conseguia sentir um aperto no peito, algo dolorido que nunca senti antes.

Era minha chance indo embora. Conseguia visualizar exatamente como seria assim que ele se afastasse e dissesse algo frio a respeito da minha péssima reputação e escolhas. Ia me magoar e a culpa seria toda minha.

— Kate — a voz dele me fez respirar e erguer os olhos. Encontrei Leo me encarando sem nenhum franzir em suas sobrancelhas, sem nenhuma ruga de julgamento. Estava errada sobre o que ele estava pensando?

Ele me chamou de Kate.

— Será que pelo menos uma vez, desde o dia em que nos conhecemos, você poderia ficar em silêncio?

—... — abri a boca em vão, apenas puxando o ar.

— Ótimo.

Foi apenas isso que ele sussurrou. Um mero sussurro irritantemente britânico antes de soltar minhas mãos e segurar meu rosto e minha cintura tão rápido que meu coração parou no segundo que seus lábios encontraram os meus.

Próspero.

Carma.

Leo estava me beijando. Um beijo para calar Katerina Dalton.

E decididamente esta era a maior surpresa que poderia ganhar.

Não era possível pensar em nada mais naquele instante, apenas mantê-lo perto segurando seu casaco com minhas mãos e sentindo seus dedos entre meus cabelos. Seu perfume se misturava com a bergamota do seu chá favorito e por todos os bons deuses que estavam me sorrindo naquele momento, nunca pensei que pudesse me sentir tão absolutamente apaixonada por ele.

Suavemente, Leo afastou meus cabelos para trás e abrimos os olhos, simplesmente no silêncio de nossa respiração. Doce, ele beijou minha testa antes de encostar a cabeça na minha e procurar minhas mãos, que estavam frias e ainda tremendo.

Eu queria sorrir e beijá-lo mais uma vez, mas só conseguia olhar em seus olhos e procurar uma resposta que fosse para todas as novas perguntas que ele tinha me causado com aquele gesto tão inesperado.

— Não devia ter mentido para mim, Megera.

— Me perdoe... Próspero. — minha voz mal se atrevia a sair. Meus olhos deviam estar brilhantes de um monte de lágrimas irritantes que insistiram em surgir.

— Vai ficar tudo bem — Leo me abraçou e estar contra ele, sentir seu calor e ouvir o bater de seu coração, me fez sorrir. Quantas vezes disse que ele não tinha um coração ou que havia uma pedra em seu peito? Todos meus julgamentos precipitados sobre aquele homem pareciam tão ridículos agora.

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Na calmaria daquele abraço, notei quando Leo olhou na direção das portas da biblioteca pouco antes da voz de Lucas ecoar pelo corredor. Me afastei dele devagar, a contragosto, mas sabia que ainda tinha que contar tudo aquilo para Luke também e enquanto todo o mal entendido não fosse desfeito, aquele acontecimento era um segredo apenas meu e de Leo.

— Leo! Kate! — o ruivinho surgiu pela porta com seu imenso sorriso, mas parecendo um pouco preocupado — Estava procurando por vocês. Está... Tudo bem?

Luke se entreolhou com o irmão e depois comigo, estranhando alguma coisa. Começava a achar que os cabelos enferrujados lhe conferiam alguma intuição paranormal.

— Sim, Luke. Eu raptei seu irmão por um momento para sair da sala, mas agora está tudo bem. Só precisava respirar um pouco e não queria ficar sozinha.

Meu sorriso não era digno de nenhuma indicação ao Oscar, contudo pareceu convencer bem por hora. Luke estava logo passando os braços ao nosso redor, em um de seus abraços coletivos.

— É melhor vocês voltarem pra lá, porque mamãe está prestes a jogar uma xícara na cabeça do nosso pai e eu acho uma péssima ideia. Precisamos distraí-la urgentemente! E depois desta questão importantíssima, temos os segundos fatos preocupantes: Bruce perguntou por você, Kate. Acho que ele quer ir embora... E Juliet não parou de me mandar encontrar você nem por um minuto, Leo. Eu não vou ficar enrolando todo mundo enquanto vocês dois fogem pela tangente, ok?

Lucas nos soltou com uma crise de seus risinhos e beijou minha bochecha antes de pegar Leo pela mão como uma criança, puxando-o com ele. Era óbvio que farejava bem mais do que dizia.

— Lucas, eu sei perfeitamente andar sozinho — Leo resmungou.

— Eu sei, mas não confio muito nisso. Prefiro te entregar são e salvo — eles pararam perto das portas, notando que fiquei parada ali diante das janelas, exatamente onde tinham me deixado.

— Você vem, Katerina? — Leo esticou a mão livre na minha direção, causando um imediato sorriso mais largo nos meus lábios.

Agora, tudo mudaria entre nós. Provavelmente doeria muito mais deixar York para trás quando o natal terminasse e não haveria ansiedade maior para acabar com o pesadelo daquele casamento forçado.

Se Bruce estava certo quando disse que queria me livrar do compromisso por conta de Próspero?

— Sim, claro que sim.