Obsessão

Confiança


Eu estava inquieta apesar de estar sentada na sala de espera da Dra. Aires. Uma menina - Não devia ter mais do que uns doze anos- me encarava com curiosidade e medo, como se eu fosse algum tipo de animal feroz num zoológico. E como eu poderia culpá-la? Se ela não tivesse visto meu rosto nos noticiários provavelmente estaria assustada com o quanto eu estava ansiosa. Eu balançava minha perna na tentativa inconsciente de aliviar minha ansiedade. Lancei à menina um sorriso, tentando ser sincera, mas tinha certeza que acabei fazendo uma careta em vez de lhe dar um sorriso.

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— Chloe Manhattan? - A Dra. Aires abriu a porta do seu consultório. Ela sim tinha um sorriso sincero e calmo.

Me levantei de prontidão e entrei no seu consultório. Sentei-me na poltrona que sempre sentava e coloquei um pequeno travesseiro no meu colo, como eu sempre fazia quando entrava no consultório.

Minha psicóloga se sentou à minha frente e me encarou com um olhar tênue, como de costume.

— O que gostaria de trazer para a sessão de hoje? - A Dra. me perguntou.

Apertei a almofada e respirei fundo.

— Bem - Comecei-, desde que saí da reabilitação eu sinto que estou assustada. De repente o mundo parece muito mais perigoso.

Ela balançou a cabeça em tom de afirmação, como se reconhecesse meus sentimentos.

— Sente falta de como as coisas eram antes?

Fiz que sim com a cabeça.

— Sinto falta de como eu era antes - Desabafei - Sinto falta de como eu era confiante, sem medo, de como eu mostrava o rosto para o mundo.

Tivemos uma pausa. Eu odiava aquelas pausas. Mas era o tempo que eu tinha para processar o que eu havia dito, sentir o peso das palavras. Era um tempo importante e meu, que eu não tinha com as pessoas no meu dia a dia.

— Sabe - Ela quebrou o silêncio -, não há garantia de que nada vá acontecer com você se você sair por aí. Todos temos medos. Um pai tem medo de ver o filho crescer e experenciar o mundo, tem medo de que ele se arrisque e se machuque com isso. Simplesmente não há garantias de que o mundo vá ser bom conosco, mas devemos nos agarrar às chances de que as coisas se resolverão. Você viveu muitas coisas boas, pois quis. E você tem a chance de viver muitas outras coisas incríveis se conseguir se abrir para as oportunidades certas.

Balancei a cabeça para sair daquela memória, daquele flashback. Olhei para o meu computador e para os infinitos e-mails que eu havia mandado. Realmente, eu estava conseguindo me abrir para novas oportunidades.

Meu computador fez um aviso, me notificando de um e-mail que havia acabado de aparecer. Era um e-mail de Ally com um anexo.

"Olha só o que eu acabei de achar.

Sua cara. Uma bela oportunidade.

Beijos, te amo, sua ilha de Nova York"

Sorri para o e-mail com a piada sobre meu sobrenome e abri o anexo. Era uma oportunidade para trabalhar na área de design de uma gravadora e produtora. Olhei para o endereço e senti borboletas no estômago. Não pensei duas vezes, apenas peguei uma pasta com alguns currículos impressos, me arrimei, peguei um casaco e saí de casa.

Tive sorte de não ter pego um metrô lotado, me achei com facilidade e em alguns minutos eu já estava na frente da produtora. Entrei com o pé direito.

Dei de cara com uma mulher que tinha o seu cabelo preto em uma bagunça semi-organizada. Ela tinha a orelha toda furada e cheia de brincos, estava debruçada sobre o balcão olhando folhas em uma pasta.

— Olá - Eu disse.

Ela apenas moveu seus olhos em minha direção.

— Desculpe, estamos com a agenda cheia. Tente ligar no começo de dezembro.

— Oh - Eu disse, e percebi que estava insegura, então ajeitei minha postura - Na verdade estou aqui para a possibilidade de um emprego da área de design gráfico.

Ela se ajeitou.

— Ah, sim - Ela sorriu - Desculpe. - Ela levou sua mão na minha direção para me comprimentar - Eu sou Bree Lexa.

— Chloe Manhattan - Apertei sua mão.

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Seus olhos se arregalaram por um segundo e eu senti um nó no estômago.

— Claro - Bree finalmente se recompôs - E o que você nos traz hoje?

Peguei um dos meus currículos estrategicamente posicionados e a entreguei. Ela deu uma breve lida.

— Tudo bem - Disse ela - Vou falar com o meu chefe e agendar uma entrevista. Gostaria de conhecer os estúdios?

Me animei um pouco e me agarrei naquela oportunidade. De todos os currículos mandados e todas as tentativas, aquela com certeza foi a melhor, já que foi a única com resposta. Talvez eles estivessem desesperados. Bom, eu também estava, então funcionava perfeitamente.

Bree me mostrou os estúdios, as salas de mixagem, de administração.. Com certeza era maior do que eu havia imaginado. Não pude deixar de me encantar com os posters dos famosos que haviam passado por ali. Não vi nenhum poster como de Bob Dylan, mas vi posters de artistas indies que eu gostava muito e passaram por turnês por todo o país. Me animei com a ideia de trabalhar no local.

— Me desculpe - Disse Bree quando seu celular tocou - Tenho que atender. Fique a vontade para ver alguns dos estúdios. Só tenha cuidado, já que a maioria está em gravação.

Fiz que sim com a cabeça e ela saiu. Fui seguindo as músicas. Pude ouvir diversos gêneros, diversas conversas. Entrei em um estúdio que a música havia me encantado e fiquei muito surpresa ao ver quem estava ali.

Sean me olhou com um sorriso.

— E aí, Chloe? - Ele me recebeu com um abraço - Veio ver o seu homem tocar?

Eu entrei devagar no estúdio e sentei em uma cadeira em frente ao painel de controle e o vidro que nos separava dos artistas. Pude ver Cameron de olhos fechados, tocando uma música que eu nunca havia ouvido antes na vida, mas que a melodia me encantava tanto quanto sua voz. Os dedos de Cameron pareciam dançar na guitarra enquanto ele dedilhava, sua voz era doce e firme. Eu me sentia hipnotizada.

— Ele é bom, né? - Perguntou Sean, me tirando do meu transe.

— É, sim - Sussurrei para que minha voz não atrapalhasse sua música.

"And I'll hear your laughter

I'll see your smile

You'll be much happier

Like I know you haven't been in a while.

You'll never have to cry by yourself, baby

You'll be happy again

And I'll be by your side

There will be no more pain"

A música acabou e eu me peguei querendo que ela não acabasse.

— O que acharam? - Cameron finalmente abriu os olhos e, quando o fez, olhou para mim com um sorriso de surpresa no rosto - Oh, hey, Chloe. O que achou?

Não pude conter meu sorriso causado pelas borboletas no estômago.

— O seu trabalho esta incrível - Eu apertei o botão no painel para que ele pudesse me ouvir de dentro da cabine.

Quis agradecer a Dra. Aires pelos seus conselhos. Se não fosse por ela, por fazer eu ganhar um pouco mais de confiança em mim mais uma vez, eu não estaria ali e perderia uma das coisas que fez com que eu me sentisse viva de novo.

— Acho que temos o que precisamos para hoje - Disse um homem.

Um homem se inclinou para perto de mim e apertou o mesmo botão para falar com Cameron. Ele não parecia se importar nem um pouco com a minha existência.

— Amanhã continuamos e entramos com a bateria - Disse ele e acrescentou com um sussurro - Se Larry resolver aparecer.

Os garotos riram e logo se prepararam para sair. O home que estava responsável pelo estúdio saiu com pressa. Sean pegou seu casaco pendurado em um cabide e se sentou ao meu lado.

— Recebeu o anexo que mandei para Ally? - Ele perguntou.

— Então foi você - Apontei para ele - Muito obrigada. Esse lugar parece incrível.

— Imaginei que fosse gostar. E acho que eles vão gostar de você também. Você tem a cara e o estilo do pessoal.

Fiquei contente ao ouvir aquilo.

— E então - Cameron disse assim que saiu do aquário e se juntou a nós - Finalmente Sean terá uma parceira de trabalho que consegue formular mais de duas frases em uma conversa.

Sean riu.

— É, eu espero que sim - Disse ele - Bom, eu tenho que ir nessa. Tenho planos para planejar. - Ele se levantou e foi em direção à porta - Vejo vocês em breve, suckers.

Levantei as sobrancelhas um tanto surpresa. Planos para planejar. Tudo bem.

Eu me levantei e fui em direção à Cameron.

— Não sabia que você podia compor também.

— É - Ele ficou um pouco vermelho e passou a mão em seus cabelos. Fiquei feliz em saber que eu também tinha esse efeito sobre ele - Parece que você vai ver mais um pouco disso também.

— Você também trabalha aqui?

— Ah, não. Eu trabalho em outra produtora, mas acho que aqui tem mais a ver com a nossa banda.

— Hmm.

Tentei esconder minha decepção. Gostaria de ver Cameron todos os dias. Mas logo afastei isso dos pensamentos, afinal eu não poderia colocar meus sentimentos de segurança encima dele. Era um fardo enorme para se carregar.

— Que bom que você apareceu - Ele se aproximou - Eu realmente espero que você consiga o emprego - Ele foi se aproximando mais e mais, até que eu pudesse sentir seu hálito doce no meu rosto. Ele tinha cheiro de madeira queimada e menta. Era aconchegante.

— Eu também espero que sim - Sussurrei - Apesar de ter você tirando a minha concentração.

— Jura? - Cameron passou os dedos pelo meu rosto e eu me arrepiei.

Ele levantou meu rosto suavemente e percebi que estávamos próximos demais. Seus lábios foram se aproximando dos meus até que, finalmente, ele me deu um breve beijo.

Mas logo ele se afastou de repente e me peguei desejando mais, muito mais.

— Até mais tarde, Chloe - Ele disse e foi em direção à porta.

— Mais tarde, tipo às 9h? - Reagi num impulso.

Ele me lançou um sorriso malicioso.

— Às 9h, no meu apartamento - Disse ele, por fim.

— Eu levo o vinho - Eu disse com a voz mais suave que eu tinha.

Ele me lançou um olhar que dizia tudo, um olhar que fez com que todo o meu corpo de arrepiasse de desejo. Sabia que teríamos uma noite especial.