– Ah, finalmente chegamos! – Dizia Louva-a-Deus quando a carroça passou pelos portões da cidade.

Ele estava no ombro direito de Macaco, observando a vista e as garotas. Recebeu um peteleco do símio em reprovação ao que disse anteriormente.

– Ei! Por que isso? – Perguntou.

– Só porque não é você quem está com o traseiro achatado de ficar sentado. Só fica olhando as garotas daqui e murmurando que todas elas cairiam à seus pés, mas esqueceu que não tem pés.

Os outros riram, menos Shifu, envergonhado com o comportamento de ambos. Mi riu, porém ainda assim concentrada em observar sua paciente. Parecia mais relaxada, mais tranquila e passou a viagem calada como quem reflete.

Para não invadir a intimidade dos pensamentos da felina, a leopardo apenas a chamou para a conversa com uma simples pergunta:

– Eles são sempre assim, não é?

– São piores, a cada discussão – respondeu, soltando um riso suave.

– Macaco, Macaco... não sabe o que diz.

– Ah, não? Te dói alguma coisa? – Respondeu ao inseto, que parecia não querer deixa-lo em paz.

– Não, mas logo vocês poderão se levantar. Olha lá, estamos chegando ao palácio – apontou com sua piça.

A enorme estrutura bem construída ficava cada vez mais próxima. Já haviam passado pela entrada e logo veriam novamente seu amigo e conheceriam as princesas e o grande imperador de toda a China.

A carroça parou. Todos desceram, logicamente, ajudando Tigresa, que grunhia por isso. Ela não era capaz de detê-los porque Shifu e Hui Nuan a encaravam e suplicaram para ela permitir. Ela lhes daria um neto e ambos não eram capazes de não protege-la. Sua filha única e seu único neto que estava por vir.

Por outro lado, apesar de não se sentir bem sendo protegida de tal forma, ela não ligava para isso. A única razão que a impedia realmente de distribuir golpes nos outros furiosos e até mesmo na doutora, era que quanto mais evitasse arrumar brigas, mais cedo veria seu marido. Era isso que iluminava sua mente e acalmava seus instintos guerreiros e assassinos.

Caminharam pelas escadas que levavam à entrada sendo guiados pelos guardas. A carroça fora descarregada e despachada de volta à Gongmen. Atravessando as grandes portas foram levados ao salão principal onde se via três tronos, um para cada um da família.

– Eles chegaram – anunciou Fa Huo.

Rin estava em sua casa, ambos em silêncio para pensar se aquela dita pelo panda melhor maneira de executar seus planos. A pantera negra estava decidida a separar seu antigo companheiro e a princesa, afinal, esta poderia ter quem mais desejasse, era rica, dentro de anos seria a imperatriz. Por que se contentar com um pobretão? Era o que Rin pensava até ser interrompida por Fa.

– Nossa... como sabe? – Perguntou ela olhando-o surpresa.

Estavam sentados numa mesa desfrutando um lanche e chá que ela levara a ele. A felina deixou de comer no momento em que se surpreendeu.

– Eu senti – respondeu sorvendo mais uma vez o líquido verde em seu copo.

– Às vezes você me assusta..

– Às vezes você me irrita. Não importa se te assusto – respondeu encarando-a – o importante é fazermos tudo bem feito. A princesa me deve um favor e irei cobrar. Você já sabe seu papel. Não é hora de ter medo nem de mim, nem dos meus planos.

– Está bem, desculpe – abaixou a cabeça.

O panda se levantou e caminhou até uma bancada por mais pão. A raiva daqueles dois era enorme, mas teria de ser paciente. Logo poderia se vingar.

E foi com esse pensamento que a carranca mau humorada transformou-se em um sorriso torto e podre.

Ainda não estava ciente do desaparecimento de seu antigo prisioneiro e nem importaria, já que não conseguiria impedi-lo a tempo.

O tigre prisioneiro caminhava sob o sol forte daquele dia, o mais rápido que suas velhas pernas aguentavam. Estavam doloridas, mas isso não era importante para ele. O que martelava em sua mente e coração era a esperança de salvar o que restou de sua família.

Foi pedido aos guerreiros que aguardassem, mas antes de um empregado – uma águia – ser enviada para chamar o imperador, as princesas e o Dragão Guerreiro, foi pedido um local para que Tigresa pudesse trocar o colete e retirar as vendas que apertavam seu torso e também um assento para ela. Depois de ela se trocar a cadeira chegou pelas patas de um leão da guarda e ela foi forçada a se sentar pelos olhares de todos à sua volta.

Independente disso, agora estava confortável com seu colete novo, sem as faixas apertando seu busto e com a faixa que prende sua calça um pouco mais frouxa, sem chance alguma de cair.

Só queria ver novamente seu marido, era pedir demais?

Estavam todos encarando as entradas ao lado dos tronos, porém uma voz veio de suas costas.

– Anuncio a chegada de suas majestades, o Imperador Zhu e, as princesas, Ayra e Xue – disse a mesma água, já à entrada do salão.

Tigresa se levantou. Todos se viraram para ver um altivo urso negro entrando à frente do que pareciam ser duas panteras brancas. Cada um, mentalmente, se perguntava como aquilo era possível.

Logo atrás vinha seu amigo panda sorrindo largamente e ainda atrás dele, caminhava Ju, lentamente até se aproximar dos demais, que pararam à uma distância curta dos guerreiros e convidados.

Ao vê-la, Tigresa não pode mais do que grunhir o mais alto que podia. A panda estava ao lado de Ayra, ambas o lado esquerdo do imperador. Ju estava de cabeça baixa, não conseguia encará-los, nem mesmo pretendia.

Hui Nuan sentiu raiva. Ela quase destruíra a felicidade de sua filha, erro que ele mesmo quase cometeu. Não pôde evitar o grunhido em sua garganta, fazendo coro com a felina.

– Tigresa, se acalme! – Exclamou Mi, colocando a pata em seu ombro.

Isso chamou a atenção da guerreira, que olhou para a médica. O olhar da leopardo era tão severo quanto o seu próprio. Por bem, respirou fundo e suspirou para soltar o ar.

– Eu imagino que se perguntem o que ela faz aqui – começou Ayra, dando um passo à frente – sei de seus erros do passado, porém também tenho conhecimento que mudou seu rumo e se arrependeu. Justamente e apenas por isso, foi-lhe permitido ficar.

Po apenas assistia a cena em silêncio. Sabia que sua esposa logo abriria de novo o focinho e tinha certeza de que não sairiam boas palavras. Ainda assim, ele não a impediu, já que entendia bem e concordava com as razões da guerreira para tal.

– Ela é uma criminosa e egoísta! – Bradava a líder dos Cinco Furiosos – ela tentou satisfazer os próprios caprichos ajudando ao pai!

– É minha amiga, exijo o devido respeito, mestre. E sendo ela o que é para mim, quero que presencie tais momentos de minha vida.

– Tais? – Perguntou Shifu.

– Sim – sorriu – vou me casar.

E foi então que recebeu muitos parabéns pelo casamento de todos, e quase todos esquecendo-se do amigo e da convidada de Ayra. Exceto Tigresa. Ela continuava com os olhos fixos em Ju. Lhe custava acreditar na mudança daquela fêmea, mas sacudindo a cabeça, recuperou a postura. Não era isso que importava naquele momento. Eram seu marido e seu pequeno tesouro, crescendo dentro de si.

Desceu o olhar, bem como as patas, ao ventre e sorriu com felicidade verdadeira e seus olhos ambarinos brilhavam a mais não poder.

Isso passou despercebido por quase todos, menos por Hui Nuan, que admirava que Lin, como a batizou, já amava seu filho, como a mãe dela a amou antes de nascer. Na sua humilde opinião, o amor maternal era algo lindo assim como o amor paternal poderia chegar a ser em algumas ocasiões ou mesmo a vida inteira em alguma família.

Ao levantar a cabeça, sem tirar as patas do ventre, Tigresa fitou Po que assistia a cena que se desenrolava. Ele, sentindo alguém olhar para si, a olhou e sorriu alheio ao que ela, inconscientemente, indicava. Voltaram a olhar Ayra respondendo mil e uma perguntas sobre o casamento e seu noivo, já estava encabulada e Po partiu em seu socorro.

– Ei, ei, gente, se esqueceram de mim?

– Po! – Gritaram todos eles e se jogaram em cima do panda. Exceto Shifu, Tigresa e Hui Nuan.

Depois de receberem o abraço de urso, se afastaram para que Tigresa pudesse cumprimenta-lo. Por conta das roupas mais largas, porém o colete verde, Po não notou a crescente silhueta e o ventre não mais plano, apenas com uma pequena curvatura. Ela avançou até ele e roçaram seus focinhos enquanto ele a enlaçava pela cintura e ela passava os braços ao redor de seu pescoço para depois abraça-lo forte. Estava emotiva, culpa da gravidez ou só saudade. Não queria voltar a se separar dele e em sua mente, aquilo não aconteceria.

Po também não queria mais se distanciar dela, a amava e muito. Acreditava não ter mais forças para isso.

– Po.

O murmúrio o fez sorrir de olhos fechados enquanto ainda a mantinha entre seus braços.

– Senti sua falta, Po...

– E eu a sua.

Poucos minutos depois, se separaram.

– O que aconteceu com você? Garça me contou que foi atingida por um golpe, isso não costuma acontecer...

– Eu... eu preciso falar com você à sós pra poder explicar.

– Está bem, vamos...

– Espere um minuto, panda – começou Shifu – primeiro, vamos nos hospedar e deixar que todos descansem – enfatizou a palavra “todos” – eu preciso falar com você primeiro.

– Não pode deixa-lo comigo antes? – Perguntou sua filha.

Não queria desapontá-la, ela estava diferente pela gravidez, porém o panda vermelho precisava falar com seu discípulo antes de qualquer outra coisa. Entretanto, antes que pudesse intervir, Hui Nuan tomou a palavra.

– Lin, filha, deixe que Mestre Shifu converse com ele. Sabe o que faz e... além disso, terá bastante tempo para aproveitar essa nova etapa na vida de vocês – piscou cúmplice para ela.

– Ahn? Que etapa?

– O casamento, Po... o casamento.

Entrelaçando suas patas, o casal, junto aos demais, começou a caminhar pelos corredores do palácio e mostrar os quartos de cada um. Tigresa, obviamente, ficaria junto ao panda. Cada um dos demais furiosos teria o próprio quarto, bem como Shifu, Mi e Hui Nuan. O quarto da médica estava ao lado dos aposentos do casal.

Ela se lembrava muito bem que no caminho à Gongmen, Tigresa lhe confidenciou, a ela e à Hui Nuan, que gostaria de dar a notícia ao marido, portanto juraram que não interfeririam.

A felina foi deixada no quarto, resolvendo tirar um cochilo. Isso foi encarado por Po como algo realmente muito estranho. Ela estava estranha... estranha, não. Diferente! Ele pôde notar. O cheiro, o modo de entoar a voz e as expressões faciais mudaram sutilmente. Apenas percebeu isso por ser seu marido... mas havia algo que mudou drasticamente, que provavelmente todos já haviam notado: o comportamento dela.

Foi por isso que, ao chegar aos jardins do palácio onde seu mestre o aguardava, estava com o cenho franzido. Não entendia o que estava acontecendo e sentia que ela lhe escondera algo. Talvez todos estivessem escondendo, algo referente ao ocorrido com ela alguns dias atrás já em viagem.

– Ah, você chegou, panda... o que houve? Por que essa cara?

Mestre Shifu estava sentado sobre uma pedra do jardim, virando a cabeça para a esquerda para encarar Po. O panda permaneceu parado fitando o chão, ainda um pouco aturdido por seus pensamentos e falou sem encarar o idoso:

– Eu, a... Tigresa. Ela tá estranha.

– Eu sei.

– Sabe por quê? – Levantou o rosto, esperançoso.

– Sim.

– Por que tá escondendo de mim? Ela é minha esposa, me preocupo com ela! Se alguma coisa ruim aconteceu... eu, eu... ela pode achar que não ligo pra ela, que não amo mais ela... que...

– Panda! Nosso assunto primeiro. O assunto com Tigresa depende deste que temos que tratar.

– Alguém atrás dela?

– Não – suspirou fechando os olhos para depois colocar seus orbes azuis nos verdes novamente, encarando-os com seriedade, determinação e uma ponta de temor – eu quero saber se já nomeou o novo líder de Yu Qin.

Neste momento, a cidade estava em calma. Os mestres de Gongmen ensinaram um contingente de pandas e assim, estavam formando o novo exército. Não costumavam ser agressivos, mas o fariam para cuidar dos seus.

Ho estava sentado ao lado de Jing-Quo, ambos tomando um chá preparado pelo ex-cozinheiro, agora líder do exército. Fez questão de renunciar ao cargo e, com a permissão de Po, passou a fazer parte do grupo. Aquele era seu dia de folga.

Uma peça no tabuleiro de mahjong foi movida.

– Sua vez – disse ele.

– Hm, vejamos...

Outra peça.

– Como acha que será a coroação da princesa?

– Não sei. Só espero que meu filho cumpra seu trabalho e nomeie logo um novo líder.

– Sabe o mais estranho nisso tudo? – Respondeu mexendo mais uma peça.

Jing demorou um pouco à responder, estava pensando em sua estratégia.

– O que é o mais estranho?

– Desde que Po se foi, nossa terra não tem tido tantas ocorrências de bandidos ou assassinos.

– É verdade... parando pra pensar...

– Será que era um atentado contra o Dragão Guerreiro?

Foi a vez de Ho mexer a peça e logo depois Jing. Este tentava formular uma resposta ao mesmo tempo que pensava no jogo.

– Pode ser... odiaria que isso fosse verdade... – deixou o jogo por um momento, encarando o amigo –, mas pelo que parece, eram atentados.

– Ou tentavam impedir Po de sair daqui... ele saiu deixando a vila sob nossa responsabilidade, mas ainda havia muitos malfeitores por perto...

Voltaram a se concentrar no jogo, passados mais minutos em silêncio, cada qual pensando sobre as hipóteses ditas anteriormente.

Mais peças foram mexidas e Ho se pronunciou novamente:

– Mas, tenho certeza que qual seja a encrenca em que ele esteja metido, ele vai sair... pelo que se ouve falar do temível e feroz Dragão Guerreiro, ele sempre sai... – disse sorridente olhando o tabuleiro e mexeu sua última peça para, então, anunciar: – ganhei.

Po estava tão surpreso com a pergunta de seu mestre que o encarou estupefato, saltando no lugar pelo susto, atitudes que não agradaram Shifu nem um pouco, muito menos as que se seguiram. Depois do breve momento de choque, abaixou o olhar e virava a cabeça levemente de um lado a outro procurando algo que o ajudasse a escapar de tal resposta.

– É, bem, como é que eu vou te dizer isso...

– Ah! Eu não acredito – disse pausadamente, de olhos fechados. Já sabia a resposta apenas pela postura (ou falta de) que o panda apresentara há momentos – você colocou tudo à perder.

Foi então que, encarando Po novamente, mostrou em seus olhos a preocupação genuína.

– Não! Não, ainda posso falar sobre o novo líder. Já sei quem vai ser e...

– Não! Não há mais tempo – interrompeu-o – não há mais tempo. Terá que se afastar de Tigresa até que a segurança dela esteja garantida.

– Como assim? Do que você tá falando, mestre?

– A minha filha está...

Não conseguia terminar de falar. Era ela quem deveria dar a notícia ao esposo e foi então que, relutante, respirou fundo e disse calmamente:

– É um pequeno detalhe que ninguém levou em conta por não pensarmos que era possível.

– Quê?

– Você vai entender. Agora – virou-se de costas para o guerreiro e gesticulou com a mão direita – vá com ela, Tigresa com certeza dará a resposta à sua pergunta.

Po ia replicar, mas viu a pata de Shifu se levantando em sinal para que ele se calasse. Então, com olhar confuso, deixou o mestre com sua raiva pela falta de palavra do panda e saiu correndo em direção aos aposentos que dividia com a esposa.

Correu bastante, não imaginava o que poderia ser que houvesse deixado Shifu daquele jeito. A opção de ter um filho de ambos estava fora de questão, portanto nem passou pela cabeça dele.

Antes que conseguisse chegar ao quarto com Tigresa, esta se encontrava vindo em direção, junto à doutora Mi, à luxuosa sala de jantar. Com tamanha bronca de seu mestre, nem reparou na hora. Olhou por uma das janelas daquele corredor lateral em que estava parado e viu que a vermelhidão do pôr-do-sol já estava dando lugar ao azul escuro da noite. Olhou novamente para a esposa, que estava mais próxima de si. Ela vinha sorrindo e com a felicidade aparente em seus olhos.

– Tigresa, eu... – não conseguiu continuar, então ela parou em frente a ele e esperou.

– Diga.

– Ei! – Alguém os chamava. Tigresa ladeou a cabeça para a direita do panda e este virou o pescoço e tronco, apenas para encontrarem com Garça e Louva-a-Deus na porta da sala – vocês não vem jantar?

– Já sim, já vamos – respondeu Po e se virando novamente para a felina – eu preciso convers... – sua fala foi interrompida desta vez pelo ronco de seu estômago.

Isso fez com que Tigresa risse, então, ela tomou o grande braço do panda e o levou consigo.

– Depois conversamos. Tenho algo muito importante a dizer.

Ela lhe anunciou sem olhar para ele. Mesmo assim, ao lado dela, pôde ver as expressões relaxadas, em um semblante que levava um sorriso feliz. Aquilo preocupou. Se ela sorria, por que deveria se preocupar? Não sabia ao certo, mas as palavras de certo mestre ainda martelavam em sua mente.

Chegaram na sala e se sentaram lado a lado. Olhando ao redor, Po notou que faltava alguém à mesa.

– Onde tá o mestre?

– Ficou meditando no jardim – respondeu-lhe Víbora.

Todos os outros estavam presentes. A comida foi posta e todos, exceto Po, a saboreavam. Ele nem se quer prestou atenção ao banquete que se apresentava, apenas queria saciar sua fome e sair logo dali para que Tigresa contasse algo de importância.

Além disso, outra coisa o distraía da comida: Tigresa se alimentando. Não costumava comer mais do que tofu ou a sopa de macarrão que ele lhe preparava. Nem bolinhos faziam parte de seu cardápio, preferindo sempre ignorá-los e os passar à Po. Ela agora enchera o prato raso com rolinhos com todos os tipos de recheios apresentados, alegando serem deliciosos; também tinha molho, macarrão num prato fundo, chá de jasmim, bolinhos com recheio de tofu frito, o próprio tofu frito e com molho de ervas e na sobremesa, ela não se conteve em pegar yaki manju – novidade na China, doce originário do Japão.

Quando levou um desses à boca, foi a primeira vez naquele jantar em que o panda prestava verdadeira atenção ao sabor do que comia. Adorou assim como os demais.

Silêncio.

Era disso que necessitava para pensar. Pensar em como matar o Dragão Guerreiro? Não. Não gastaria sua energia com isso. Precisava pensar em uma maneira de afastar sua filha daquele lugar o quanto antes, sem alarmar ninguém.

Shifu meditava, mas, mais uma vez, sua paz interior estava perturbada com o ocorrido. Não podia simplesmente dizer-lhe que a levaria para longe de Po por tais circunstâncias, mas as vidas dela e do bebê estavam em perigo. Porém sabia que ela não se afastaria sem bons motivos... mas estes são sim bons motivos, entretanto, fazê-la odiar o próprio marido não era algo legal a se pensar e sabia que ela sentiria algo assim quando conhecesse a verdade.

E se o Conselho dos Mestres soubesse e se inteirasse de que o panda não escolhera o novo líder para substituí-lo, as coisas se tornariam piores. Nem que ela quisesse se arriscar e arriscar a vida do bebê, por simples loucura talvez, não poderia porque os mestres a levariam de qualquer maneira, até mesmo tratando-a como uma prisioneira.

– O tempo lhe dará uma saída...

Uma voz carregada pela leve brisa o fez abrir os olhos repentinamente, fitando a escuridão ao redor. Aquela voz, era conhecida. Devido a seu desequilíbrio atual não conseguiu ver ninguém, mas se falasse de novo consigo, talvez tivesse certeza de quem se tratava.

– Aguarde. O tempo lhe dará uma saída, mais breve do que pensa, velho amigo...

As folhas no jardim, antes agitadas pela brisa suave e fresca, se acalmaram para não balançar mais. Mas antes, em um último sopro, uma folha de pessegueiro foi deixada no ar para cair na ponta do nariz do Grão-Mestre do Palácio de Jade. Então teve certeza.

Era Oogway.

Sorriu tomando a pétala com ambas as mãos e a olhando com carinho. Seu mestre e pai. Ainda sorrindo olhou para o céu, já tomado pela escuridão e centelhas brilhantes acompanhando o sorriso da lua.

– Obrigado, mestre.

Já na hora de se deitarem, Tigresa havia se trocado, colocando uma camisola branca. Lá fora já fazia frio, mas dentro do palácio era quente.

Po já estava deitado e coberto. Esperava a esposa e se não fossem as palavras de seu mestre, teria esquecido a conversa que teria com ela, distraído por sua beleza. Isso não aconteceu. Ela se sentou do lado direito e antes de colocar as pernas na cama, disse:

– Preciso te contar uma coisa...

– Fala.

Ela parecia nervosa em fala. Levou segundos para se virar e quando o fez, estava de cabeça baixa, com o semblante triste. Ele tomou as patas dela entre as dele, fazendo-a virar, chamando a atenção para encara-lo.

– Pode falar – disse com um sorriso amável, encarando os olhos ambarinos que lhe eram tão preciosos.

– E... eu, eu estou... – respirou fundo e a determinação de dizer-lhe veio a si com um sorriso – eu estou grávida.