— Já arrumei seu quarto, você pode entrar e dormir se quiser. Está tudo bem. Eu lhe chamo para o almoço.

Eu sabia que ela queria que parecesse que estava triste pelo fim do meu namoro. Sabia que ela queria que eu pensasse isso. Mas era tão estranho porque eu conseguia ver o pequeno sorriso no canto dos lábios dela. Pura satisfação estampada em seu rosto. Talvez tenha sido por isso que eu resolvi partir naquela época.

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— Obrigada, mas não quero dormir. Vou arrumar minhas coisas.

Ela assentiu com a cabeça e foi fazer algo que eu não me interessei em saber. Subi as escadas à procura do meu antigo quarto. Desde que havia decidido ir passar um tempo morando com Percy nunca mais havia voltado para casa, o que equivalia a quase um ano sem entrar no lugar.

Ao abrir a porta não fiquei surpresa, sabia que Atena não ia querer mexer em nada, provavelmente julgando o lugar como repugnante, uma zona morta ou algo assim. Já deve ter dado para sentir o amor de pessoa que ela é, não?

Meus pôsteres de banda ainda estavam lá, alguns soltando da parede devido à falta das minhas mãos cuidadosas. Minhas estantes ainda continham meus livros nem tão favoritos assim. O lugar tinha um cheiro estranho de mofo e surpreendentemente biscoito. Nem quero saber o porquê.

As paredes ainda tinham a cor creme que sempre detestei, a cama ocupava o centro do quarto com um cobertor detalhado em renda e travesseiros azuis. Exatamente como deixei. Fico me perguntando que se isso era a definição de Atena para “já arrumei seu quarto” prefiro não pensar em como ele estava antes.

Em um parecer geral tudo parecia continuar no lugar, o que era realmente bom. Detestaria saber que ela havia mexido nas minhas coisas.

Aos poucos consegui trazer minhas escassas caixas para dentro do cômodo e comecei o lento processo de desempacotar tudo. É, eu sei. Emocionante.

Depois do que pareceu ser poucos minutos quase tudo parecia estar em seu lugar e agora aqui finalmente aparenta ser meu quarto, mas eu ainda preciso dar um jeito naquelas paredes.

Peguei a última bolsa de roupas e comecei a ajeitá-las em uma pilha, uma a uma foram encontrando seus lugares no grande e exagerado armário, até que algo me chama atenção: um papel escorregou por entre as peças e rumou direto para o chão.

Abaixei para pegá-lo e pude ver melhor. Era uma foto. Na verdade, três fotos juntas. Um garoto e uma garota sorriam animados em uma pequena salinha para fotos, ela com o cabelo meio preso meio solto devido aos pulos e o garoto tentando sujá-la com sorvete azul, sorrindo de uma orelha à outra. Percy e Annabeth, o casal fadado a nunca terminar.

— O almoço está pronto.

Dei um pulo olhando em direção à porta e escondendo a foto rapidamente, até perceber a estupidez do ato. Não havia nada para esconder.

— Já? Nem vi o tempo passar, desculpe. Já irei descer.

Atena observava o quarto como quem analisa alguém e não parecia contente, que surpresa. Acredito que um dia ela não tenha sido tão amarga e, possivelmente fora mais bonita quando sorria. Na verdade era extremamente parecida comigo: os quase mesmo olhos cinzentos, estatura média, cabelo longo e encaracolado diferindo apenas no fato de o dela ser negro e o meu extremamente loiro. Queria poder vê-la sorrir de verdade outra vez.

— Não demore.

Assenti com a cabeça e guardei as peças restantes, escondendo a foto. Talvez eu ainda me sinta como a garotinha que precisava fugir de casa para ver o garoto que gostava.

Desci lentamente as escadas e fui em direção à cozinha sentindo o cheiro maravilhoso. De uma coisa eu não podia reclamar: ela cozinhava bem.

Depois de colocar mais comida no meu prato do que eu provavelmente iria comer, sentei-me a mesa e encarei a refeição. A essa altura ele já deveria ter acordado. Chequei o celular: nenhuma mísera mensagem de texto.

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Comecei a comer com a animação de uma criança que é obrigada a comer legumes, o que me deixou ainda mais deprimida.

Mas fui interrompida do meu momento das trevas ao ouvir uma porta batendo.

— Está esperando alguém? – minha mãe negou com a cabeça. – Mas então quem...?

Não pude terminar minha frase, um moreno irrompeu na cozinha, olhando para os lados até que seus olhos se focaram em mim. Pareceu aliviado, mas estava suando e seu rosto estava mais vermelho do que eu imaginava ser humanamente possível.

— Pode me dizer o que isso significa? – ele levantou a mão com um pequeno papel rabiscado. Ele parecia ainda mais nervoso, sua veia no pescoço parecia querer sair sambando pela minha casa.

— Meu deus Percy! – levantei, afastando o prato – Está tudo bem com você?

— Como você espera que eu me sinta bem quando a minha namorada me deixa? E, pior, não tem a decência de dizer isso na minha cara! Acha mesmo que um bilhete dizendo “Me desculpe, o problema não sou eu, é você. Não me procure. Não me ligue. Amo você” ia ser suficiente? Aliás, super coerente o “amo você”, não acha?

— Senhor Jackson eu acho melhor você...

— Eu acho melhor você não se meter nisso senhora Chase. Não quero que você envenene essa conversa, como todo o resto.

— Escute aqui rapaz... - Minha mãe parecia ofendida e, meu deus, a veia na testa dela estava saltando. Eu não podia deixar a veia dela explodir.

— Mamãe. Por favor, nos dê licença, sim? Vai ser rápido, prometo.

A contra gosto ela saiu pisando firme, de nariz empinado. Tive vontade de rir, Percy diz que eu faço exatamente igual.

— Vai explicar agora ou tá difícil?

— O que você espera que eu explique Percy?

— Não sei, começa pelo básico tipo, porque você me deixou?

— Eu tentei conversar com você milhares de vezes. Mas você parou para me ouvir? Não. – apontei, chegando mais perto dele. – Eu disse: “Hey, Percy, acho que nós podemos estar com certo problema”. E o que você respondia? “Claro que não Annabeth, está tudo ótimo” – tentei imitar sua voz.

— Mas estava.

Não estava não! – cheguei ainda mais perto colocando o dedo em seu peito acusadoramente – Você só enxerga o seu lado da situação. E eu? E o que eu penso? E o que eu quero? E suas crises de possessividade? Como fica? Como fica cada vez que eu queria tentar concertar as coisas e você ia lá e fazia tudo errado outra vez só pra me pedir desculpas e voltar a fazer tudo novamente?

— Annabeth eu... Eu não entendo.

— Não entende? Quer que eu desenhe? Acabou Percy. Chega. Chega de me fazer chorar. Chega de me deixar triste.

— Mas você sabe que...

— Nem venha com desculpas, vá embora daqui. Anda logo! Eu não quero mais te ver, não quero mais te ouvir! Anda!

Comecei a empurrá-lo em direção a porta até finalmente colocá-lo para fora.

— Ótimo, agora não vai falar nada, não é? Isso facilita muito o processo.

— Você prometeu. – disse ele baixinho olhando para o chão.

— O quê?

— Você prometeu. – repetiu mais alto, dessa vez me olhando nos olhos.

— O que eu prometi?

— Você prometeu que nunca me abandonaria.

Um nó se formou na minha garganta e eu sabia que choraria, então fiz o que era mais sábio: fechei a porta na cara do mesmo e subi as escadas correndo para chorar em meu travesseiro como uma adolescente boba.