O Mágico e os Ladrões de Som
A exploração
Dave levou muito a sério o seu papel de líder daquela expedição e andava uns passos adiante de Brad e de Rob. O guitarrista era o mais assustado. Constantemente girava o pescoço e verificava se não estavam a ser seguidos. Ali sozinhos, entregues a si próprios, sem o amparo da presença autoritária do Doutor com sotaque escocês, sem o conforto da segurança de Mike Shinoda, ele sentia-se vulnerável.
— Queres parar de fazer isso? – pediu Rob.
— O que foi, Bourdon? Não quero ser surpreendido por um ataque traiçoeiro.
— Não vai acontecer nenhum ataque traiçoeiro, meu. O Joe foi infetado porque mexeu no fungo. Não viste o dedo dele? A unha verde? Ele encontrou aquela nojeira algures nos bastidores, tocou naquilo porque estava curioso e foi assim que ficou doente.
— Tens a certeza?
— O que o Rob diz faz sentido – concordou Dave. – E esta nave está abandonada, sem sinas de vida. Disse o Doutor. Nada te vai atacar pelas costas. Relaxa, Delson.
— E se aqui os fungos forem mais agressivos e caminharem pelos seus próprios meios? Uma gosma rastejante que não gosta de forasteiros. Como lesmas.
— Andas a ver muitos filmes…
— Não te rias, Bourdon! Estou a falar a sério! Ando a ver muitos filmes, ah é? E que merda é esta que nos está a acontecer, precisamente, neste momento? Isto não é um sonho! Está mesmo a acontecer.
— Estás demasiado tenso. Precisas de uma massagem. Queres que te faça uma massagem? Aprendi umas técnicas novas naquele último retiro espiritual que fiz.
— As lesmas são lentas – disse Dave. – Se a gosma verde se movimentar será dessa forma, por isso vais conseguir evitar o ataque facilmente. – Olhou para todos os lados. – Ajudava se houvesse mais luz…
— Achas que a gosma verde pode estar escondida nas partes escuras?! – guinchou Brad. – É possível, é possível que a gosma verde goste de escuridão. Tudo o que é peçonhento anda de noite!
— Ajudava se houve uma escotilha ou assim…
— Para que querias uma escotilha? – indagou Rob. – O Doutor disse que estamos no espaço e mesmo que existissem janelas veríamos apenas… noite.
— Veríamos estrelas e o que mais se pudesse ver nesta zona da Via Láctea. Eu queria conhecer a paisagem lá de fora, Rob. Não estás curioso? Imagina que veríamos esse tal planeta onde houve a guerra que o Doutor mencionou. Era um planeta alienígena!
— Ah… pois era. E talvez tivéssemos mais luz dentro da nave, pois o planeta estará a orbitar um sol.
— Sim! Ver um sol diferente do nosso sol!
— Estão demasiado contentes para o meu gosto – apontou Brad, zangado.
— Ora, Delson. Tens é de aproveitar o que temos aqui – contrapôs Dave sorrindo e deu-lhe um soco amigável no braço.
— Aproveitar o quê? Estamos num corredor sombrio de uma nave onde existem fungos que nos podem matar. O que é que podemos aproveitar? Explica-me…
— Estás a ser pessimista.
— Eu… eu estou a ser pessimista, Bourdon?!
— Ei, vamos lá a terminar com a discussão! – ordenou Dave. – Eu estou ao comando e não admito discussões entre a minha tripulação.
Brad resfolegou. Rob riu-se e bateu uma continência.
— Certo, comandante Farrell!
Caminharam calados durante alguns minutos. O corredor permanecia tranquilo, num silêncio gelado, escuro e quieto. Brad deixou de olhar para trás, amuado com a troça dos amigos. Enfiou as mãos nos bolsos das calças e pôs-se a mastigar em seco. Continuava inquieto, mas já não o iria demonstrar. Não lhes desejava mal, se acontecesse alguma coisa iria mergulhar de cabeça para os salvar, sem hesitar, colocando-se em perigo, mas isso não o impedia de ter o instinto de sobrevivência ligado e de estar cheio de medo. Incomodava-o que eles não percebessem isso, depois percebeu que estariam tão assustados quanto ele. Troçarem com a sua atitude era a forma que tinham de se defenderem e de continuarem a andar por aquele corredor, sozinhos e desarmados.
O que ele não daria para estar com a sua guitarra! Acariciava-a, verificava as cordas de aço com a ponta dos dedos, murmurava-lhe mais uma jura de amor e depois iria para o palco. O primeiro acorde a emergir como um maremoto dos amplificadores ligados ao potente sistema de som. O ruído ensurdecedor da multidão a estender-se como um tapete heterogéneo de cores e de movimento. O espetáculo começava e ele estava livre de tudo o que era minúsculo. Medos incluídos.
— Não têm a impressão de que o corredor dá uma curva?
— O que queres dizer, Phoenix? – perguntou Rob.
— Estamos a percorrer uma passagem circular. Nós avançamos pelo corredor da direita, o Doutor, a Clara, Mike e Chester foram pelo corredor da esquerda. Estou a imaginar uma nave como um disco voador, estão a ver? – Uniu os dedos das mãos formando uma esfera com o espaço vazio entre eles. – O corredor principal é o eixo que divide os dois hemisférios. Depois temos os dois corredores que derivam desse principal. A minha estimativa é de que em breve regressaremos ao lugar onde está a cabina telefónica azul.
— A TARDIS? No fim deste corredor estará… a TARDIS?
— E estará a segunda equipa – acrescentou Brad. – Vamos também reencontrar o Doutor e os outros se os corredores forem mesmo circulares e, por isso, comunicantes. Então, por que razão estamos a fazer esta caminhada?
— Não sei – respondeu Dave ligeiramente baralhado. – O Doutor é que disse que esta seria a origem do fungo, mas também achou estranho o fungo provir daqui, da nave. Lembram-se? Ele está a apalpar terreno, como nós, embora com um pouco mais de experiência.
— Acham que o Doutor sabe o que faz? – perguntou Brad.
— Bem, ele é um alienígena e conhece todas estas coisas estranhas, tem uma nave espacial e um supercomputador armadilhado numa cabina telefónica que é maior por dentro. Disse-nos que ele era a nossa melhor hipótese. Eu acredito no Doutor – declarou Rob.
— Olhem!
O grito de Dave fez Brad saltar e agarrar-se ao Rob. Deu um impulso tão grande que o baterista esticou os braços, preparado para o segurar ao colo, mas Brad esquivou-se ao apoio constrangedor do amigo. Acalmou-se ao ver que Dave apontava a TARDIS e que assim confirmava a sua teoria peculiar. Ver a cabina telefónica consistiu um alívio e Brad suspirou alto.
Correu para a TARDIS e abraçou-se a uma esquina, repetindo que estava mais do que feliz por estar de volta. Era um porto seguro, era uma visão reconhecível e tinha sobrevivido à caminhada sem ter sido contaminado. Dave espreitou o corredor, mas não havia ninguém a aproximar-se. Perguntou alto se os outros teriam ficado retidos, pois pelas suas contas e ainda de acordo com a sua teoria, as duas passagens circulares seriam idênticas e as duas equipas teriam de ter percorrido o trajeto sensivelmente durante o mesmo tempo. Consultou o seu relógio de pulso e espantou-se por este estar parado.
Rob calcava um dedo na porta da TARDIS.
— Deixámos a nave aberta?
— Hum? – Dave esqueceu o seu relógio. – A porta está aberta? Não me lembro de o Doutor a ter fechado, na verdade.
— Vocês sabiam que isto é de madeira? – informou Brad acariciando a esquina da enorme caixa. – Estamos a viajar dentro de uma nave cujo exterior é feito de madeira?! Isto é de loucos!
— Trouxe-nos até aqui, então é porque a madeira porta-se bem no vácuo.
— Tu tens sempre explicação para tudo, não é, Bourdon? – atirou Brad irritado.
— Menos para a porta da nave estar aberta.
— Bem, companheiros, isso não interessa agora. Vamos lá para dentro, será mais seguro.
— E mais quente! – completou Brad, esfregando os braços. – Ainda fico engripado à conta disto.
— Qual será pior? Uma gripe… ou o fungo verde?
— Ah ah. Muito engraçado, Bourdon!
Dave empurrou-os à sua frente.
— Sim, entremos! E vamos ver como está o Joe.
Verificaram que estava tudo como tinham deixado. O mecanismo central oscilava, para cima e para baixo, naquela melodia típica que era zumbido, silvo e ondulação, tudo ao mesmo tempo. Desceram as pequenas escadas de metal que davam acesso ao piso inferior, abriram a porta do quarto onde tinham deixado o coreano a descansar no seu sono artificial.
A cama estava vazia.
Brad arquejou:
— Onde está o Joe?
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