Nova fase'

Ciumes


Eu acordo com os dedos passeando pela minha barriga, abro os olhos e Keyse está com o queixo apoiado no travesseiro bem ao lado da minha cabeça e me olha com aquele sorriso que consegue arrancar cada centímetro de ar de dentro dos meus pulmões e é inevitável sorrir de volta.
— Como que você tá? – pergunto um pouco preocupado já que essa noite ela não conseguia dormir direito e estava bem desconfortável com qualquer posição, e imagino que deve ser complicado mesmo, por que já com sete meses completos a barriga dela está gigante, totalmente redonda e linda, e as vezes ainda fico em pânico quando me lembro que dentro dela tem duas vidas se formando, nossos filhos, que mesmo ainda dentro da barriga dela já tem todo meu amor.
— Eu estou ótima – ela fala com um sorriso e uma animação que me surpreende um pouco, esses últimos dias ela anda bastante irritada, mas sorrio com a resposta dela e antes que eu possa dizer alguma coisa, ela se aproxima mais e encaixa a boca no meu pescoço, seus lábios são quentes e quando tocam minha pele transferem o calor pra mim, ela não para apenas no toque dos lábios em mim, ela beija meu pescoço, sua língua traça um caminho até minha orelha e ela morde enquanto puxa lentamente, sua respiração no meu ouvido – E eu acordei morrendo de fome – ela sussurra baixo e provocante, de um jeito que só ela consegue fazer, meu corpo inteiro se desperta pra ela, mas outra coisa me prende.
— Você não estava bem essa madrugada! – falo tentando manter algum pensamento racional enquanto ela continua brincando com minha orelha.
— Não estamos mais na madrugada – ela responde com um sorriso que mesmo sem eu ver sei que é um daqueles maliciosos e preciso de um esforço completamente surreal pra não agarrar ela, já faz exatos nove dias desde a ultima vez em que nós fizemos amor e confesso que tudo que eu quero agora é finalizar esse tempo que continua correndo, mas eu nunca me perdoaria se fizesse mal a ela ou aos bebês, ela tem se sentido bastante incomodada esses dias, a médica disse que é normal, mas ela tem tido faltas de ar e algumas dores nas pernas, sem falar que os pés dela estavam bastante inchados ontem, então por mais que eu a queira mais do que qualquer coisa no mundo, eu também me preocupo com eles e é meu dever cuidar dela.
— Mas você não estava bem, talvez você devesse descansar... – ela para os beijos no meu pescoço e levanta o rosto pra me olhar nos olhos, parece surpresa e um pouco decepcionada talvez, por isso me sinto obrigado a explicar – A médica disse pra você não se cansar muito, essa madrugada você quase não dormiu, então eu só estou preocupado com você, não quero que nada aconteça com você, nem com eles – eu toco sua barriga e ela acompanha com o olhar, parecendo pensativa.
— É por que eu tô gorda?
— O quê? – eu escuto o que ela diz mas não consigo acreditar que ela pense algo assim.
— É por que eu tô gorda? – ela repete mais alto e mais firme enquanto me encara tentando esconder o quanto está afetada – É isso não é? Pode falar, Pyter! Fala! – ela exige já se afastando de mim – Eu tô gorda, tô inchada, eu tô... Eu tô um lixo e essa não é a mulher que você casou, não é isso? Eu sei que é...
— OK! Chega – falo já cortando ela e me levantando pra sentar na cama – De onde você tirou tudo isso? – ela apenas me encara em silencio, seus olhos por mais que estejam fixados nos meus tentando parecer inabalável não escondem todos os sentimentos que eu consigo enxergar atrás deles, ela está magoada e essa é a ultima coisa que eu quero fazer, por isso suavizo minha postura, me aproximo dela novamente e lhe dou um sorriso – Eu te amo! – falo e ela parece realmente surpresa, como se nunca tivesse escutado eu dizer isso antes, embora em minha defesa, eu diga isso a ela todo dia, eu toco o queixo dela, segurando-o e fazendo ela me olhar – Você não é um lixo! Não está gorda e eu te acho tão absolutamente e incomparavelmente linda como eu sempre achei! Você é exatamente a mesma mulher com que eu me casei e agora carrega os dois maiores presentes que eu poderia receber e se você acha que alguns kilos a mais consegue mudar isso, então acho que eu errei em alguma coisa – ela nega com a cabeça imediatamente e toca meu rosto.
— Você não errou em nada – ela afirma e depois esconde o rosto entre as próprias mãos – Eu acho que eu tô ficando louca – ela fala ainda com o rosto escondido, eu acabo rindo.
— É, acho que sim – ela abaixa as mãos e me olha fingindo estar ofendida – Completamente louca – eu falo fazendo uma careta e o sinal na cabeça indicando que ela está doida, ela ri mas me acerta um tapa.
— Era pra você continuar o lindo discurso sobre como eu sou linda e absolutamente normal!
— Mas você é linda por que absolutamente não é nada normal – ela ri e me faz uma careta.
— São os hormônios! – ela dá de ombros, eu me arrasto até estar lado a lado com ela e a puxo pros meus braços, encaixando-a em mim em um abraço apertado, ela coloca a cabeça no meu peito e me aperta nela também, eu afundo meu rosto no seu cabelo e coloco um beijo no mesmo lugar, nós afrouxamos o abraço mas ela continua no mesmo lugar e eu apoio meu queixo na sua cabeça.
— Eu tenho aula hoje – eu falo lamentando por que não queria ter que deixar ela aqui.
— Ainda tá cedo – ela fala e eu olho pro relógio que está na parede lateral, ainda tenho uma hora e vinte minutos, deixo meu corpo relaxar e volto a sentir o perfume do cabelo dela, então sinto os dedos novamente passeando na minha barriga, olho pra baixo e ela escorrega eles lentamente, passando pelo meu umbigo e seguindo o caminho abaixo, sua mão entra por dentro da minha calça de moletom e seus dedos rapidamente encontram o que estavam procurando, sua mão me envolve e imediatamente meu corpo responde a ela, com uma rapidez impressionante, ela escorrega os dedos envolta de mim e levanta o rosto do meu peito, me olhando com aqueles olhos castanhos brilhantes e cheios de expectativas, enquanto continua o que está fazendo aquele sorriso volta a aparecer e mesmo que eu fizesse toda força do mundo já seria impossível resistir a ela, eu fecho os olhos alguns segundos apenas absorvendo a sensação que meu corpo tem ao ser tocado por ela novamente, quando abro os olhos ela está com um sorriso orgulhoso.
— E você ainda acha que eu não quero você? – pergunto e em resposta ela praticamente avança em cima de mim e me beija com força, paixão e uma fome que pra mim sempre será insaciável.
— Eu tô morrendo de fome – ela fala enquanto chega por trás de mim olhando o que eu estou fazendo.
— Ainda? Achei que eu tivesse mandado bem – eu falo e ela me dá um tapa mas acaba rindo.
— Eu tô falando de comida, seu idiota – eu também acabo rindo, então me viro de frente pra ela e mostro o prato com o sanduiche que eu estava terminando de preparar, ela morde o lábio animada e sem nenhuma etiqueta ela pega o sanduiche com as mãos e tira uma mordida grande e exagerada – Você é o melhor... marido... do mundo – ela fala com a boca cheia, eu sorrio satisfeito e limpo a migalha de pão que ficou na sua boca, ela sorri e fecha os olhos suspirando com o sabor – Eu tenho que admitir que você melhorou bastante, ninguém faz sanduiches como você! – ela fala e me dá um beijo rápido antes de voltar a morder.
— Eu sou o rei dos sanduiches então! – ela faz sinal de positivo com o dedo e sai da cozinha carregando o prato, eu sorrio e termino de limpar a mesa, pego um copo de leite, corto dois pedaços de bolo, pego umas fatias de queijo e uma maçã, coloco tudo em um outro prato e vou pra sala, ela está jogada no sofá, com as pernas dobradas enquanto termina de devorar o sanduiche, a mordida que ela dá é ainda mais exagerada que a primeira e acaba sujando seus dedos, então simplesmente passa a língua neles sem desperdiçar nada, eu paro um segundo apenas olhando pra ela e sorrindo como um idiota, mas é que sempre que eu a vejo nessas situações é quando eu novamente me apaixono por ela, pra muitos pode não ser a cena mais atraente, sexy ou muito menos elegante, mas pra mim é a cena mais linda, por que são nesses momentos que eu vejo que a mesma menina maluca, exagerada e com um espirito contagiante que eu conheci quando criança ainda está aqui, só que agora como minha mulher e mãe dos meus filhos, então, sim, eu amo ver o quanto ela ainda tem essa leveza que só ela consegue trazer pra minha vida, como se sentisse minha presença ela vira o rosto e me vê parado olhando-a, ela passa a mão na boca como se estivesse se limpando, eu me aproximo dela e lhe entrego o copo de leite, ela pega e toma um longo gole.
— Eu sei o que você está pensando! – ela fala me olhando.
— Eu tenha certeza que não sabe!
— Que eu pareço uma louca esfomeada que não consegue se controlar quando vê alguma coisa de comer! – eu solto uma risada alta, mas nego com a cabeça.
— Não chegou nem perto! – aviso e ela me olha desconfiada, eu ignoro e coloco o outro prato que estava trazendo na frente dela, que me olha como se eu tivesse fazendo besteira.
— Você não pode colocar mais comida na minha frente, eu acabei de falar que sou uma esfomeada incontrolável, lembra? – eu sorrio, me inclino e a beijo rapidamente na boca e depois na testa, pego a maçã e lhe dou uma piscada.
— Eu volto pra almoço! – aviso já me afastando.
— Você não disse o que estava pensando – ela avisa e eu sorrio por que sabia que ela ia insistir, ela é tão curiosa, quanto sempre foi.
— Que eu te amo! – ela ia contestar e exigir mais explicações, mas eu pego minha mochila do chão da sala e saio rapidamente.
Jogo a maçã pra cima e volto a agarrar ela no ar, encaixo minha mochila em apenas um ombro e já estava passando pela casa dos meus pais quando a porta se abre, Pietro corre até a mim.
— Já não era pra você estar na escola? – pergunto enquanto passo a mão no cabelo dele.
— Eu tinha penteado o cabelo dele – mamãe reclama enquanto se aproxima de nós.
— Eu sei, por isso que baguncei – ela me encara como se eu tivesse realmente falado uma besteira, mas eu beijo a bochecha dela e ela logo sorri de volta – Ele entra mais tarde hoje?
— Eu acabei me enrolando e perdemos a hora! Agora temos que correr – ela fala já pegando na mão dele.
— Eu levo ele! Tô indo pra lá mesmo!
— Isso mãe, o Pyt me leva, não precisa ir não! – ele fala animado e ela tenta parecer ofendida, ele ri, pula pra dá um beijo na bochecha dela e então sai correndo na direção da saída da Vila.
— Pyter não deixa ele correr assim, cuidado com os carros! – mamãe avisa preocupada.
— Não é a primeira vez que eu faço isso, relaxa – mando um beijo no ar e ela fica lá parada com as mãos juntas nos olhando como se fossemos pra alguma batalha medieval, eu acabo rindo mas trago o Pietro pra mais perto de mim antes que ela tenha um ataque do coração.
— Eu acertei tudo na prova de matemática – ele fala orgulhoso de si enquanto andamos.
— Claro que você tirou! Vou te contar um segredo... – eu sussurro e ele se aproxima curioso – Nós somos gênios! – eu falo e ele ri.
— Eu sei! Mas eu sou o mais inteligente de todos!
— Ei, ei, um pouquinho de humildade faz bem!
— O que quer dizer humildade? – ele pergunta curioso enquanto pula em um pé só logo a minha frente, eu acabo sorrindo.
— É quando você não fica se elogiando por aí e nem dizendo o quanto você é incrível – eu explico e ele pula se virando de frente pra mim e me faz parar no caminho.
— Então você não é humilde! – ele dá de ombros e eu acabo rindo de novo – Você fala pra todo mundo que você é incrível e ontem você disse que é o melhor do mundo, ah e naquele dia que a gente foi almoçar la na casa da tia Delly você falou que é o mais bonito... E também...
— Ok, ok! Já entendi que eu não sou humilde, agora será que a gente pode ir andando por que você está atrasado? – pergunto tentando não continuar rindo, ele dá de ombros e volta a andar pulando de um pé pro outro.
— Bem tem uma garota lá na escola que gosta de mim... – ele fala normalmente.
— Ah é? E você gosta dela? – ele dá de ombros.
— Ela tem cheiro de morango! – ele fala e eu não consigo segurar a risada – E o papai falou que eu sou muito nova pra gostar de alguma menina, eu disse pra ele que eu sou quase homem, mas ele falou que quando eu gostar de uma menina é por que não preciso mais brincar de bola e nem luta com ele, e eu gosto de brincar com ele... – ele vai falando e eu me pego rindo outra vez por que isso é bem o tipo do papai mesmo, ele sempre teve muito ciúmes de qualquer um de nós, eu achava que seria só com a Pérola por ser a queridinha dele e a menina, mas quando eu e Keyse começamos a namorar ele mal se aguentava quieto, mamãe precisou de varias conversas pra ele não surtar, no dia do meu casamento ele parecia mais nervoso que eu e me perguntou por mais de dez vezes se eu não iria abandonar eles e é engraçado como agora eu já começo a ter uma noção do que se passava na cabeça dele, por que os meninos ainda nem nasceram e eu já não quero me separar deles nunca e é realmente avassalador e assustador todos esses sentimentos. Nós chegamos na escola e como ele está comigo passa direto pelos corredores sem ser parado por ninguém, eu o deixo na sala de aula e aviso a professora que ocorreu um problema em casa por isso ele se atrasou, ela aceita sem problemas e ele entra animado na sala, eu vou direto pra quadra preparar tudo para as aulas e me concentro no trabalho. Já estava no final da ultima aula quando vejo Nicy, a secretária da diretora, uma jovem senhora viúva que ainda tem um charme mesmo com seus fios de cabelo branco, ela está na entrada da quadra, faz um sinal pra chamar minha atenção e eu deixo os alunos treinando o passe de bola e corro até ela.
— A diretora convocou uma reunião no final do turno com todos os professores – ela avisa com um sorriso simpático que já é a marca dela, eu concordo e afirmo que estarei lá assim que acabar a aula, então volto pro meio da quadra, termino a aula e alguns alunos me ajudam a arrumar a quadra, depois eles vão embora e eu vou até o vestiário dos professores, troco minha camisa por que está bastante suada já que estamos no meio do verão, lava meu rosto e vou atrás da Nicy, ela está na mesa dela arrumando uns papéis.
— Nicy, Nicy... – eu chamo com um sorriso jogando charme e ela me olha já com a sobrancelha erguida.
— Vai, pede logo o que você quer... – ela fala e eu coloco a mão no coração, fingindo estar ofendido.
— Quê isso, meu amor, sabe que você é minha secretária preferida!
— Por que só tem eu! – ela devolve querendo rir.
— Aí é um problema na logística, e não culpa minha! – eu pisco um dos olhos e me jogo na cadeira a frente da mesa dela, puxo sua mão e coloco um beijo enquanto ela me encara desconfiada – Sabe o que é? Eu tenho um pequeno problema...
— Você sempre tem um pequeno problema! – eu finjo ofensa de novo.
— Eu disse pra Keyse que voltava pro almoço e ela vai ficar me esperando em casa, gravida, sensível, se sentindo esquecida... Ah não ser que...
— Que você ligue avisando? – ela pergunta tirando a mão da minha e me encara.
— São dois minutos! – aviso fazendo o numero dois com os dedos.
— Você sabe que eu não tenho autorização pra deixar ninguém usar o telefone, não sabe? – eu faço uma cara triste – Eu posso perder meu emprego!
— Ninguém demitira a melhor secretária que essa escola já teve – eu falo e ela ergue a sobrancelha me encarando – E teriam que me demitir antes e você sabe que esse lugar não duraria uma semana sem nós dois né? – eu falo e ela acaba rindo, então pega o telefone e empurra pra mim.
— Você tem um minuto! Não dois! UM! – ela faz um com o dedo e eu pego o telefone rapidamente.
— Eu te amo! – eu falo sem sair som e ela fica levemente corada, o sinal da chamada já estava no terceiro bipe quando a voz do outro lado me faz sorrir.
— Meu amor, linda, maravilhosa, razão da minha vida...
— Você não vai poder vim almoçar em casa né? – ela pergunta já me cortando mas sua voz não está brava nem chateada.
— Vai ter uma reunião agora!
— Você vai pro projeto daí então?
— Vou, devo chegar em casa no final da tarde!
— Ai que bom
— Que bom? Me senti ofendido agora! – ela ri.
— É por que eu acordei agora e não tinha feito nada, então acho que vou furar o almoço lá na sua irmã! – eu acabo rindo.
— Minha mãe tá em casa também!
— E comer a comida dela, não obrigada, eu vi a Pérola tá em casa, vou pra lá e depois eu volto pra dormir, já que eu só sei fazer isso mesmo – ela fala com um pouco de desânimo.
— Se eu me lembro bem, hoje de manhã você mostrou que sabe fazer muito além disso... – eu falo e a Nicy me encara, eu sorrio e mando um beijo pra ela que finge afastar com a mão.
— Bom, eu tô ansiosa pra confirmar essa teoria – ela fala e eu sorrio ainda mais.
— Você sabe que eu sempre posso ter um imprevisto e não ir na reunião né? – ela ri do outro lado, uma risada que é musica pra mim.
— A gente se vê a noite e por favor, para de jogar charme pra Nicy atender seus favores... – ela fala mas está rindo – Agradeça ela por mim e... Eu te amo!
— Eu te amo! – afirmo e desligo – Pronto, viu! Nossos empregos intactos e minha linda e gravida esposa calma dentro de casa – eu falo e Nicy revira os olhos tentando não sorrir – Ela mandou eu te agradecer por ser tão gentil, simpática e maravilhosa... – ela ri e revira os olhos novamente.
— Você é mesmo apaixonado por essa menina né? – ela fala mesmo já sabendo a resposta.
— Ela é a mulher da minha vida – dou de ombros e ela sorri me olhando.
— Esses meninos já tem muita sorte! – dessa vez eu sorrio de um jeito bobo. Enquanto a reunião não começa eu aproveito pra ajeitar meus diários de aula e já estava quase terminando quando Nicy me avisa que iremos começar, entro na sala dos professores e a mesa está rodeada, a diretora na posição principal, então assumo uma das cadeiras e a reunião começa.
— Agradeço a presença de todos, essa reunião foi marcada tão em cima da hora por que o assunto é realmente urgente, acredito que todos saibam perfeitamente quem é o nosso aluno, Claudio Trumplr... – ela dá uma pausa e alguns de nós se entreolham, enquanto outros se mantem indiferente e até arriscam uma revirada de olhos – Bom, Claudio está visivelmente abaixo de todas as médias que a escola exige, ele é disperso, agita as aulas da maioria dos professores, não se empenha pra alcançar os outros e eu já perdi a conta de quantas vezes tive pais reclamando que ele andou ameaçando ou assustando seus filhos... Nós tentamos ajuda-lo, eu tentei contornar os problemas mas infelizmente não vejo outra saída, por isso chamei vocês aqui, pra anunciar que a escola irá afastar o aluno Trumplr de suas atividades escolares – eu levo um segundo pra tentar entender o que ela disse e enquanto alguns murmurinhos de concordância começa a surgir eu levanto a mão pra falar.
— E a senhora acha que expulsar ele é a melhor saída ou apenas está fazendo o que é mais fácil pra vocês? – assim que pergunto a sala fica completamente muda, sinto todos os olhares em mim e a diretora me olha fixamente tentando me intimidar.
— Não é fácil pra mim expulsar um dos alunos, mas sim, eu fiz tudo que estava ao meu alcance e acredito que os seus colegas também! – ela fala mantendo uma posição firme.
— Me desculpa, mas não é isso que eu vi! Eu vi professores expulsando ele da aula, vi ele recebendo punições diariamente, ficando até tarde sozinho como castigo, sem nenhuma supervisão, isso foi o que eu vi...
— Pyter... – ela tenta me interromper.
— Não, só um minuto! Eu vi tudo isso e sabe o que eu não vi? Eu não vi algum dos meus colegas tentar alcançar ele de algum jeito, não vi quase ninguém tentar trazer a atenção dele pra aula, não vi ninguém deixar ele até tarde mas lhe dar um livro pra ler, uma lição ou simplesmente tentar conversar com ele, isso é o que eu não vi, então sinceramente não me venha falar que vocês fizeram tudo por ele, por que não fizeram! – desabafo sentindo uma frustração e raiva ainda maior, Claudio é sim um aluno complicado, mas ninguém parou por dois minutos pra tentar ouvir os motivos dele.
— Você só fala isso por que é o único que ele tem medo e que consegue manter ele controlado – o professor de historia fala de um jeito estupido e arrogante, nunca gostei muito dele e agora entendo o por que.
— Ele não tem medo de mim, por que nunca foi isso que eu quis dele, eu o respeitei e em troca ele me respeitou, eu dei atenção pra ele e em troca ele me dá a atenção dele, essa é a única pequena diferença! – ele bufa balançando a cabeça e coçando a barba preta e grande que ele ostenta no rosto.
— Mesmo que eu quisesse manter ele na escola, não teria motivo, ele já reprovou em todas as matérias, exceto, claro, na sua! – a diretora fala como se não tivesse escutado nada do que eu disse.
— O ano ainda não acabou, estamos na metade, eu tenho certeza se fizermos realmente alguma coisa, ainda conseguimos ajudar ele de verdade! – ela parece desacreditada, e olha para os professores em volta, todos parecem evitar contato visual, exceto a nova professora de ciências, ela me olha como se fosse a única que realmente entendesse o que eu estou falando, ela veio transferida do Distrito 6, está aqui há 4 meses e nunca trocamos mais do que um bom dia ou boa tarde, mesmo assim é pra ela que eu olho quando volto a falar – Se nós desistirmos dele, se largamos ele e o colocarmos pra fora da escola, então ele estará na rua, sozinho de novo, o pai dele trabalha o dia inteiro, a mãe morreu há dois anos, ele não tem irmãos, nem nenhum parente, a escola, mesmo que de um jeito ainda torto, é o único lugar que ele tem, jogar ele pra fora, é tirar qualquer coisa sólida que ele ainda tem, isso vai destruir ele! Nós não podemos fazer isso – quando termino de falar ela me olha como se realmente entendesse a gravidade de tudo, ela respira fundo e olha pra diretora.
— Nós podíamos dar a ele mais uma chance, no Distrito 6 nós tínhamos um aluno que...
— Me desculpa, professora, mas não estamos no Distrito 6! – a diretora a corta e ela abaixa a cabeça e me olha como se tivesse tentado mas falhado grandemente – Eu entendo sua frustração, professor, eu também me sinto assim, mas nós tentamos sim e infelizmente não obtivemos resultados, o aluno está em suspensão por ter rasgado o próprio caderno quando teve que mostrar sua lição de casa, mas assim que ele retornar nós anunciaremos a saída dele e não estou aberta a reclamações, apenas achei melhor avisar os senhores! – ela fala e antes que ela dispense a todos, eu me levanto e saio da sala, bato a porta e o barulho faz Nicy me olhar assustada.
— Eu odeio essa mulher! – eu falo e ela me força um sorriso, eu passo direto e saio pelo corredor sentindo ainda raiva e frustração transbordando pela minha pele. Comecei a dar aula pro Claudio no ano passado, eu já sabia do histórico dele e de como todos os professores reclamavam e não suportavam ter ele dentro de suas aulas, mesmo assim, lutei contra tudo que ouvi e tentei me aproximar dele, não foi fácil, não foi rápido, mas posso dizer que valeu a pena, desde a primeira vez que ele chegou na quadra eu não vi só o garoto revoltado e rebelde, que de tão alto e forte assusta os outros, mas eu vi um garoto de 13 anos completamente perdido, toda a marra e pose que ele tem escondem o quanto ele se sente sozinho, e foi por isso que eu continuei tentando mesmo quando ele me chamava de mauricinho rico, famosinho, mesmo quando ele xingava os garotos de marica ou quando se recusava a jogar a bola que caiu aos pés dele, mesmo assim eu continuei tentando, por que eu vejo algo nele, um dia depois de três meses aguentando tudo que ele aprontava eu o encontrei de castigo na escola, ele estava na quadra arremessando bolas, eu me aproximei em silencio e comecei a jogar com ele, depois de vários minutos apenas jogando e sem dizer nada, ele parou a bola me olhou e disse “Se um dia eu pudesse ser igual a alguém queria ser igual você”, aquilo foi tão forte que eu não tive palavras na hora, já tinha escutado isso de varias crianças, adolescentes e até do Pietro, mas teve algo diferente quando ele disse, por que de alguma forma senti que eu o alcancei, que ele se sentiu alcançado e foi ali que eu me empenhei ainda mais por ele, nós continuamos jogando por mais alguns minutos, sem nenhuma conversa e então na aula seguinte ele era o aluno mais dedicado da turma, sempre me ajudando a preparar a quadra e a limpar ela no final, nós passamos a conversar bastante e descobri que ele é ótimo falando, muitas vezes sabe se expressar melhor que eu, eu vi nele um potencial que só precisa ser explorado, ao contrario do que eles pensam ele é sim muito inteligente e é por isso que eu não posso virar as costas e calar minha boca, ele precisa de uma chance, ele merece uma chance. Eu ando tão rápido e distraído que só vejo que cheguei na quadra do projeto quando vejo o portão a minha frente, eu entro e o lugar ainda está vazio, eu vou pro vestiário, abro meu armário, coloco meu uniforme, vou pro canto onde temos um saco de areia pendurado e começo a socar e chutar com toda força que consigo, tentando colocar pra fora um pouco de toda minha frustração, eu quero fazer algo por ele, mas não tenho ideia de como fazer isso, por isso continuo socando e chutando, socando e chutando, socando e chutando.
— Tô com um pouco de pena do saco! – Ryan fala enquanto se aproxima de mim, ignoro ele e continuo o que estou fazendo – Ok, o que a Keyse aprontou dessa vez? – ele pergunta e eu desvio os olhos do saco pra ele por um segundo e ele levanta as mãos em inocência, eu soco mais forte – Tá bom, agora eu estou mesmo começando a me preocupar – ele fala e depois de mais uma sequencia de chutes e socos, eu paro, minha respiração já está forte e o suor desce pela minha testa, tiro as luvas e jogo no canto da parede, ele me entrega uma garrafa com agua e eu bebo um gole e depois jogo no rosto, ele continua esperando.
— Vão expulsar o Claudio da escola!
— Como assim expulsar? – ele parece realmente surpreso, eu explico sobre a reunião e o que foi falado – E agora? - Eu não sei! Mas eu não vou deixar isso acontecer! – garanto mesmo que ainda não saiba como, antes que pudéssemos continuar o assunto, os alunos começam a chegar e nós começamos nos preparar pra aula.
Foram duas turmas seguidas, quando acaba me sinto um pouco mais renovado, por mais que me cabeça ainda esteja cheia, as crianças sempre conseguem elevar um pouco meu humor e acabo dando algumas risadas com eles, quando todos se vão Ryan me encontra no vestiário.
— E a Keyse, tá bem? – ele pergunta e um sorriso aparece no meu rosto.
— Ah, me poupe dos detalhes mais pessoais – ele fala e eu acabo rindo.
— Nós estamos bem, muito bem! – ele também sorri.
— Que bom, a Nathy tá querendo ir naquele restaurante do outro lado e falou pra chamar vocês!
— Quando?
— No sábado!
— Eu vou fala com a Keyse, mas se ela estiver bem, nós vamos, ela já tá reclamando de ficar em casa o dia inteiro mesmo! Nós saímos da quadra e ele toma o caminho dele pra casa enquanto eu vou pra Vila, encontro Pérola saindo da casa dos meus pais, ela me vê e me espera.
— Você tá me devendo um pudim! – ela fala apontando pra mim.
— Um pudim?
— É, eu tinha um pudim hoje pra sobremesa do almoço e a Keyse só não comeu a travessa por que eu tirei de cima da mesa! – ela fala mas está rindo.
— Você colocou um pudim na frente dela? Ela está sem controles – eu me divirto e nós rimos.
— A barriga dela tá tão linda! – ela fala suspirando com alguma lembrança – Tá o dobro da que eu tive!
— São dois, então acho que faz sentido né? – falo com ironia e ela me faz uma careta.
— Quer saber, eu vou adorar ver você tendo que lidar com os bebês e o humor da Keyse – ela fala com um sorriso vitorioso.
— Eu já disse o quanto você é cruel? – ela solta uma gargalhada e me dá um aceno enquanto abre a porta da casa dela, eu acabo rindo e vou pra casa, entro e tudo está calmo, subo as escadas, a porta do quarto está aberta e a cena me faz parar, ela não me vê, está sentada na cama, as pernas dobradas, a blusa dobrada deixando a barriga totalmente a mostra, ela está com vários travesseiros nas costas e as mãos acariciando a barriga enquanto ela simplesmente conversa com eles, eu dou mais um passo e encosto na porta ouvindo ela falar.
“Na verdade eu acho que sempre tive uma quedinha pelo pai de vocês, mas também, ele era o garoto mais bonito do colégio todo e era atleta, e bom, vocês não sabem mas os atletas são os melhores... Eu sempre ficava torcendo por ele e nunca perdia uma luta, eu adorava ver o sorriso dele quando ganhava, era como se não existe mais ninguém e ... fosse só pra mim! Mas é um segredo, não contem pra ele que eu disse isso, ele já se acha demais, não queremos que ele tenha mais um motivo, ok?”
Eu não consigo segurar a risada e ela se assusta e olha na minha direção como se tivesse sido pega em flagrante.
— Sabe você é a segunda pessoa a me acusar disso hoje – eu falo rindo e me aproximando da cama, ela parece menos surpresa e sorri.
— E quem foi a primeira?
— O primeiro! O Pietro! Ele me perguntou o que é ser humilde, eu expliquei e ele disse que com certeza eu não sou humilde – eu falo e ela ri.
— Eu sempre disse que ele é um garoto esperto – eu faço uma careta enquanto subo na cama apoiado nos joelhos, lhe dou um beijo na boca rápido e então me sento já passando a mão na barriga dela, aproximo meu rosto e com a voz baixa também começo a falar com eles.
“O que sua mãe não sabe é que toda vez que eu sorria era mesmo pra ela, mesmo quando eu não sabia que estava apaixonado por ela! Mas é que... bom, vocês vão ver isso quando chegarem aqui desse lado, mas é impossível não se apaixonar pela mãe de vocês! Ela é linda, inteligente, mandona, esperta, tem um ótimo gosto pra maridos e é muito, muito gostosa...
— OK, ok! Acho que já está bom de conversa por hoje! – ela fala e eu acabo rindo, me arrasto até estar com o rosto na frente do dela.
— Eu senti muito a sua falta hoje, sabia? – falo e ela abre um sorriso, então eu a beijo lentamente.
— Você tá preocupado, aconteceu alguma coisa – ela fala assim que nossas bocas se separam e ainda é incrível que ela me conheça tão bem, eu fecho os olhos e encosto minha cabeça no travesseiro que está logo atrás da cabeça dela, ela se move e passa os dedos pelo meu cabelo, abro os olhos e ela está me olhando com atenção, então conto sobre o que aconteceu, ela não me interrompe apenas ouve, até que eu termino – Meu amor, eu te amo, tenho muito orgulho de você e de tudo que você fez e faz por essas crianças, mas nem sempre você consegue fazer tudo! Eu sinto muito, muito mesmo, sei o quanto isso é importante pra você, mas não depende só de você! – ela fala enquanto acaricia meu rosto.
— Eu sei, eu só fico pensando como ele vai ficar sem a escola, ele vai ficar pela rua o dia inteiro sozinho... – eu esfrego as mãos no rosto então ela me puxa e me faz deitar com a cabeça nas suas pernas enquanto continua mexendo no meu cabelo.
— Eu sinto muito! – ela fala e apenas me deixa ficar ali com ela acariciando meu cabelo e me tranquilizando de um jeito que nem uma semana inteira socando e chutando coisas conseguiria me acalmar.
Depois de vários minutos sou despertador pelo barulho da barriga da Keyse, eu levanto o rosto e ela está rindo.
— Fome – ela dá de ombros como se fosse óbvio. Nós jantamos e dormimos cedo, quando acordo no dia seguinte ela ainda está dormindo, como só terei as aulas do projeto me permito dormir mais um pouco, acordo novamente com Keyse sentada na cama que está cheia de roupas espalhadas.
— O que houve? – pergunto olhando a bagunça.
— Eu não tenho roupa! Nenhuma roupa dá em mim, Pyter, eu não tô gorda, eu estou imensa! – ela fala e se levanta abrindo os braços pra que eu a veja melhor.
— Você tá linda!
— Eu tô gorda!
— A gorda mais linda do mundo – ela me joga uma das roupas no meio da minha cara, eu acabo rindo.
— Sabe aquele vestido branco que você adora? Não dá mais em mim! Sabe aquela lingerie vermelha? Não dá mais em mim. Nada dá mais em mim – ela reclama irritada.
— Posso confessar uma coisa? – ela me encara – Eu sempre feri você sem roupa mesmo! – eu pisco e ela me encara mas acaba rindo e volta a se sentar na cama.
— Isso não tem graça, eu pareço um monstro – eu me arrasto até ela, e a abraço por trás, minha boca no seu pescoço, subindo até sua orelha.
— Você é a mulher mais linda do mundo, isso nunca vai mudar pra mim – ela vira o rosto pra me olhar melhor.
— Jura?
— De todo coração – afirmo e ela me beija. Nós tomamos café da manhã juntos e eu a deixo dormindo de novo quando saio de casa. Vou direto pra quadra, encontro Ryan e o dia segue normalmente, um pouco antes do almoço e depois do fim da aula, nós estávamos terminando de arrumar as coisas.
— Pyter? – a voz me chama atenção e quando me viro, a professora nova da escola está parada na porta da quadra, ela está com uma calça preta e uma camiseta branca que ela geralmente usa na escola, o cabelo loiro está solto e liso, ela parece um pouco mais nova que eu e é bonita, segundo os comentários que ouço, mas na minha opinião nem chega aos pés da Keyse, ela entra e vem até nós.
— Emma! – eu acabo soando realmente surpreso e ela parece um pouco sem graça.
— Eu preciso falar com você! Se você puder... – eu olho pro Ryan.
— Eu termino de guardar as coisas – eu concordo e nós vamos até a sala que fizemos de escritório.
— Então... – ela me olha meio sem graça.
— Antes de vim pra cá, eu dava aula na escola do Distrito 6 e lá eu tinha um aluno que era detestado pelos professores, ele era rebelde, bagunceiro e tinha péssimas notas, eu fui uma das professoras que pediu a saída dele – ela confessa e me olha envergonhada, eu entendo menos ainda – Mas teve um professor que acreditou nele, que lutou por ele e mesmo indo contra o que todos achavam ele conseguiu resgatar ele, mesmo quando eu era contra ele, mesmo ele sendo meu marido! – ela para parecendo emocionada – Essa foi a maior lição que ele me deixou antes de morrer num acidente de carro...
— Eu sinto muito! – falo realmente surpreso.
— Eu também! – ela afirma e contem as lagrimas – Ele me ensinou que todos valem a pena, todos merecem uma chance, mesmo quando eles mesmos jogam as chances fora e foi por isso que eu fiz isso... – ela fala e me entrega um envelope branco que tem uma insígnia da Capital, ela me indica que eu abra e eu faço, puxo o papel de dentro dele e conforme leio quase não consigo acreditar, é um documento que proibi a expulsão do Claudio e ainda exigi que a escola lhe dê mais uma chance com as provas e trabalhos pra ele conseguir alcançar as médias, eu olho pra ela e ela me dá um sorriso.
— Como?
— Digamos que ele não me ensinou só a teoria – ela dá de ombros e eu ainda estou impressionado e tentando entender como ela fez isso – Não tenta entender, só aceita! É válido, pode acreditar, vai funcionar, só que eu sou a novata da escola, se eu entregar isso ela pede minha transferência e eu não posso suportar voltar pro 6 onde tudo me lembra ele, então... – eu respira fundo – Acho que não existe ninguém melhor pra entregar esse documento do que você! – ela fala com um sorriso incentivador.
— Eu nem sei o que dizer...
— Bom, eu não sei como são os costumes aqui, mas lá no 6 quando alguém te faz um favor, nós dizemos “muito obrigado” – eu acabo rindo e ela também.
— Muito obrigado! De verdade, muito obrigado mesmo!
— Você me lembrou ele enquanto tava falando, era a mesma raiva e indignação! – ela fala com a sombra de um sorriso e talvez pelo que ela me fez ou pela chance de salvar o Claudio ou por ver a tristeza nos olhos dela, não sei ao certo, mas eu dou um passo a frente e a abraço, ela me abraça de volta e solta um soluço preso – Eu sinto tanto a falta dele, tanto! – ela fala e eu sinto a dor dela, tento imaginar um mundo onde eu não tenha a Keyse e a dor é impensável, por isso apenas aperto o abraço.
— Eu sinto muito! – ela balança a cabeça e se afasta.
— Você sabe o que fazer, não sabe?
— Sei, obrigado de novo! – ela força um sorriso e sai do escritório, eu fico alguns segundos tentando entender tudo que aconteceu e então Ryan entra.
— Ué, cadê ela? – ele pergunta olhando pra dentro da sala.
— Acabou de sair!
— Eu só vi a bonitona! – ele fala e eu que fico confuso agora.
— E quem você queria vê? Só tava a gente aqui! – ele ia pegar uns papéis em cima da mesa e para no meio do caminho.
— Como assim só vocês? A Keyse entrou agora pouco, eu só não vi ela sair...
— A Keyse? Aqui? – ele confirma e eu não entendo, então levo um segundo pra chegar a uma conclusão, ela viu o abraço – MERDA! – eu passo por ele correndo ainda de uniforme e carregando o envelope, eu corro pra Vila, não vejo ela pelo caminho, assim que alcanço a vila vejo ela entrando em casa, corro até lá e ela acaba de fechar a porta quando eu alcanço a maçaneta, ela se vira pra mim.
— Eu posso explicar! – falo assim que ela me olha, ela ri e se afasta indo pra sala – Não é nada disso que você tá pensando, eu juro, ela só me fez um favor, eu agradeci, ela tava emocionada e ...
— E você recebeu abraçar e consolar ela!
— Foi só um abraço, de agradecimento!
— Agradecimento porra nenhuma, Pyter! Você quis abraçar ela!
— Meu amor, me escuta, era sobre a expulsão do Claudio...
— Pyter cala a boca! Eu não quero ouvir sua voz! Por favor, cala a boca – ela pede e está chorando.
— Não aconteceu nada além disso! – afirmo com a voz baixa mas olhando pra ela.
— Ela é uma mulher linda, que não está gorda, inchada, que pode perfeitamente atender todos os seus desejos...
— CHEGA! – eu falo mais alto, ela para e me olha – Você está sendo idiota, muito, muito idiota! Você é histérica, exagerada, maluca e louca e tudo bem, por que foi por essa mulher que eu me apaixonei e ainda estou apaixonado, mas isso... Isso não! A minha Keyse, minha esposa, minha mulher, minha melhor amiga, a mãe dos meus filhos, ela nunca me acusaria de nada assim e não é por que eu sou perfeito mas por que ela sabe que o amor que eu sinto por ela é a coisa mais importante da minha vida e que nada, nem ninguém, nem nenhuma mulher nunca vai conseguir me fazer ter duvida ou querer jogar isso fora, por que hoje, enquanto eu estava lá falando com a Emma e ela me disse que tinha perdido o marido dela em um acidente de carro e eu tentei pensar por um segundo como seria minha vida sem você, eu não suportei, não suportei aquele único segundo em que eu não tinha mais você do meu lado, então, sim, você pode me acusar de tudo, de ser um péssimo marido, irresponsável, péssimo na cozinha, um idiota completo e até péssimo de cama, mas não disso, eu jamais arriscaria nossa vida por uma aventura idiota, principalmente no momento mais importante das nossas vidas! Então, por favor, cala a boca você e entenda de uma vez por todas que eu não me importo com o quanto você engordou, desde que a mulher que eu ame ainda esteja aqui – eu me aproximo dela e então ela começa a chorar, eu a abraço e ela me aperta firme nela.
— Me perdoa, me perdoa, por favor, me perdoa! Eu confio em você e você é o melhor marido do mundo, eu te amo, eu só não sei o que aconteceu comigo quando te vi abraçado nela... Eu tenho tanto medo de te perder...
— Você NUNCA vai me perder – falo segurando o rosto dela e depois volto a abraça-la.
— Me perdoa! – ela repete ainda chorando, eu apenas mantenho ela abraçada em mim por alguns minutos.
— Quer ouvir uma boa noticia? – pergunto pra ela que concorda, eu pego o envelope que ficou jogado pelo sofá e entrego pra ela, depois de enxugar as lagrimas ela abre e começa a ler, então levanta os olhos pra mim tão surpresa quanto eu fiquei na hora.
— Isso realmente vale? – ela pergunta e eu concordo.
— Ela garantiu que sim!
— Meu amor, isso é... Meus parabéns, você tem um rebelde pra domar – ela fala e eu acabo sorrindo realmente feliz.
Depois disso nós ficamos novamente numa boa, ela entendeu que não havia nada entre Emma e eu e nem nenhuma outra mulher. No dia seguinte, eu levei o documento até a diretora, ela pareceu bastante ofendida por eu ter agido pelas costas dela, embora eu tenha explicado que ela não me deixou opções, mas acatou a ordem e cancelou a expulsão do Claudio, agora ele terá uma nova rodada de provas e tralhados a mais que todos os outros alunos, eu o chamei pra conversar no final das aulas e mesmo que no começo ele tenha desgostado da ideia, no fim da nossa conversa ele estava mais aberto e me prometeu que por mim ele iria tentar, eu disse que ele deveria fazer por ele mesmo e então mais uma vez ele me roubou as palavras quando disse que “ninguém acredita que eu vou conseguir, nem eu acredito, mas se você acredita em mim, então eu vou tentar sim, por que você é o cara mais legal que eu conheço” e sim, eu posso dizer que toda minha vida dando aula valeria a pena, mesmo se esse fosse o único elogio.
Os dias foram passando, as semanas correndo e os meses voando, até que acordo no meio da madrugada com Keyse apertando forte meu braço.
— É agora! – ela avisa e eu pulo da cama, pego as bolsas que já estavam preparadas no canto do quarto, puxo o roupão dela e a ajudo a se vestir, puxo uma camiseta minha e jogo por cima do ombro enquanto ajudo ela caminhar, descemos a escada com muito cuidado e enquanto eu pego as chaves do carro e a carteira ela geme de dor, eu volto até ela e a ajudo sair de casa, abro o carro e a coloco sentada, jogo as bolsas no banco de trás e corro até dos meus pais, bato forte na porta e em alguns segundos papai aparece.
— A gente tá indo pro hospital – aviso já correndo de volta pro carro, entro e Keyse está de olhos fechados e respirando forçadamente enquanto aperta a mão no banco, ligo o carro e vejo quando papai está batendo na porta da Pérola.
— Ok, meus amores, vocês estão com pressa, a mamãe já entendeu – ela fala e morde a boca segurando a dor.
— Já estamos chegando! – eu aviso quando vejo a entrada do hospital, assim que paro, pulo pra fora do carro e grito por ajuda, abro a porta pra tirar Keyse e dois enfermeiros aparecem com uma cadeira de rodas, colocam ela sentada enquanto eu pego as bolsas, entro junto com eles, digo o nome da médica e por sorte ela está de plantão e logo vem a nosso encontro.
— Olá papais, como estamos? Ansiosos? – ela pergunta com aquela mesma alegria de sempre, depois volta a atenção a Keyse, somos levados pra uma sala de preparação e outras enfermeiras estão lá, elas me olham de modo estranho e sinto alguns cochichos.
— Você tá sem camisa Pyter – Keyse mesmo gemendo de dor que percebe, eu olho pra baixo e realmente estou, mas antes que eu vista a camisa, um enfermeiro me leva pra colocar a roupa pra acompanhar o parto, me visto e quando volto Keyse já está com o mesmo camisão verde e touca que eu, somos levados pra outra sala, com vários equipamentos e completamente branca, me posiciono na maca ao lado dela, segurando sua mão e agora seus gemidos são maiores, quase gritos e bem mais frequentes.
— Calma, respira, vai passar... – eu falo e repito varias vezes tentando acalmar ela, então ela aperta minha mão e me puxa.
— Se você não calar a porra dessa boca eu vou apertar tanto sua mão que vai ter que amputar – ela fala me encarando.
— É por isso que eu te amo, sempre adorável – eu falo rindo mas ela solta outro grito.
— OK, vamos lá, vamos trazer esses garotões pro lado de fora – a médica fala já se posicionando entre as pernas da Keyse e então começa um longo processo onde ela pede que a Keyse faça força, e mais força e mais força, seguido de um “estamos quase lá”, eu começo a realmente ficar nervoso quando o choro alto e forte invade toda sala, então a médica levanta ele e uma outra enfermeira o pega virando-o pra mim e mesmo ainda sujo de sangue é o bebê mais lindo que eu já vi.
— Eu quero ver ele! – Keyse pede ansiosa.
— Vamos lá Keyse, ainda não acabou, preciso de você aqui – a médica pede e ela volta a fazer força, enquanto eu o pego no colo, pela primeira vez, meu filho está nos meus braços, ele é tão pequeno, mas com dobrinhas nos braços e nas pernas, já tem bastante cabelo, pretos como os meus, os olhinhos fechados e uma força pra chorar incrível, eu sorrio e aproximo meu rosto dele.
— É o papai! Você chegou, meu amor, você chegou – ele para de chorar como se pra ouvir minha voz e eu sorrio de novo, então há um novo choro, mas não dele e sim do outro, a enfermeira está o levantando quando eu o olho, tão igual ao que está em meus braços que me sinto confuso.
— Deixa eu ver agora – Keyse exige mesmo com a voz cansada, eu me aproximo e o coloco nos braços dela, ela o beija e chora e ri ao mesmo tempo, então pego o segundo, ele não chora tão alto e tão forte, e assim que eu pego ele se cala e sorri como se me conhecesse, eu sorrio e aproximo meu rosto dele.
— Você também chegou, e eu te amo muito – ele se mexe meio sorrindo e Keyse pede pra vê-lo, ficando com um de cada lado, eu beijo a testa dela e olho nos seus olhos, mesmo parecendo exausta ela sorri radiante – Eu amo vocês! – falo e a lagrima escorre dos olhos dela.
Os bebês são levados pelas enfermeiras e Keyse precisa se recuperar, eu saio da sala, troco minha roupa e vou pra sala de espera, mamãe, papai, Pietro, Grace, Philip, Louise, Pérola, Ian, Ryan, Nathy e Hannah estão todos aqui, eu sorrio quando vejo eles.
— E então? – Tia Grace pergunta quase pulando em cima de mim.
— Nasceram, são lindos, perfeitos e os três estão bem, daqui a pouco vai abrir a visita... Quer dizer, não sei se pro Distrito inteiro né? – falo rindo e olhando pra eles.
— E como eles são? – Pérola pergunta depois de me abraçar apertado.
— Perfeitos! Os bebês mais lindos que eu já vi na minha vida – falo transbordando orgulho.
— Mais que eu? – Louise pergunta já fazendo cara feia.
— E eu? – Pietro se junta a ela.
— Ah não, mas é diferente! Eles são os gêmeos mais lindos do mundo, você é a menina mais linda do mundo e você o quase homem mais lindo do mundo – falo e eles sorriem completamente satisfeitos.
— A gente pode ver eles? – Louise pergunta.
— Daqui a pouco – Pérola fala e ela revira os olhos e volta pra cadeira com o Pietro, então aos poucos todos vem me abraçar e parabenizar, esperamos por mais alguns longos minutos e então a medica dela aparece.
— Uau, a maior família que eu já vi – ela fala quando todos nos aproximamos – Bom, se todos quiserem ver tem que ser bem rapidinho por que eles precisam descansar, então vamos fazer dois grupos e cada um tem 3 minutinhos lá dentro, ok? – todos concordam e se dividem. No primeiro grupo estão meus pais, os da Keyse, Pérola, Ian e Pietro e Louise, e claro eu, nós entramos e Keyse está com os dois no colo, um de cada lado, eles estão de macacão azul e enquanto um dorme tranquilamente o outro se mexe tentando achar uma boa posição, as crianças ficam enlouquecidas com eles, Grace é a mais histérica como sempre, Philip baba em cima da Keyse, papai e mamãe são mais quietos mas vejo a emoção nos olhos deles quando se aproximam e tocam os meninos, Pérola e Ian elogiam eles e Keyse e então o tempo deles acaba, e a medica traz o outro grupo, Hannah quase corre até Keyse, beija, abraça, ri e morre de amores pelos meninos, Ryan e Nathy também estão encantados e me parabenizam de novo, logo já estão sendo retirados do quarto, a médica avisa que eu posso ficar dentro do quarto mas que Keyse precisa descansar, concordo e ela nos deixa sozinhos.
— Enfim, sós – eu falo me sentando na beirada da cama, olhando pra eles três, ela sorri mesmo cansada.
— Eles são perfeitos, melhor do que eu sonhei – ela confessa e eu sorrio orgulhoso.
— Nós somos oficialmente pais de gêmeos – eu falo e ela sorri também orgulhosa – Só precisamos descobrir qual é qual – eu falo e ela ri, nós já escolhemos os nomes, mas ainda não os donos deles.
— Esse daqui que nunca para quieto é o Lucca, Lucca esse é o seu papai... – ela fala e eu sorrio beijando a testa dele, ele se mexe mais ainda e balança as mãozinhas pra todo lado, nós rimos – E esse quietinho, que adora dormir e não chora tão alto, é o Theo! Theo, esse é o seu papai – eu beijo a testa dele também e em resposta ele apenas solta um suspiro alto, então olho pra ela, a mulher que me deu a maior e mais inesperada alegria da minha vida e tudo que eu sinto é amor, um amor tão grande, profundo e puro que me deixa sem ação e sem palavras – É, a gente também te ama! – ela fala como se lesse meus pensamentos, então eu a beijo, um beijo suave mas que comprova todo meu amor, ela sorri e eu sorrio de volta, olhando minha família.
MINHA FAMILIA!

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