"Antes de tudo, você tem que querer se ajudar"

E os barulhos continuaram. Eu estava desesperado. Encostei minha cabeça na porta do banheiro e pude escutar. Alex estava... vomitando. Com seus próprios dedos na garganta.

– Alex! Anjo, você está bem? Precisa que eu chame alguém?

– Não! Nico, estou bem! – Porém, ela continuava vomitando.

– Alex, desculpa, mas tenho que fazer isso.

Sem muito esforço, arrombei a porta do banheiro e encontrei-a ajoelhada em frente ao vaso sanitário, com dois dedos dentro da garganta. Estava se fazendo vomitar.

– Nico! Não quero que veja isso! SAIA JÁ DAQUI!

– O QUE É QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO?!

Cheguei perto dela e ajudei-a a se levantar. Ela me afastou. Bem, na verdade ela me empurrou para fora do banheiro e se trancou. Escutei o barulho de água escorrendo. Ela estava escovando os dentes.

Depois de uns cinco minutos, ela abriu a porta. Estava com os olhos vermelhos e me olhava, chateada.

Sentou-se na cama, ao meu lado. E ficamos em silêncio. Silêncio. Silêncio. Silêncio.

Até que eu decidi perguntar o que estava em minha cabeça:

– Por que você faz isso? Por que faz isso a si mesma?

Ela pensou um pouco, e depois disse:

– Ás vezes, nem eu sei por quê.

– Mas hoje não é “ás vezes”, né? Hoje você sabe exatamente por que faz isso. Só não quer me contar.

– Você sabe por quê. Não preciso te dizer.

– Precisa. Preciso que você diga. Quero ouvir de sua própria boca.

– Eu não... Nico, eu não...

– Levante-se. – ela fez como pedido. Peguei seu braço e levei-a até a frente do espelho, mas ela desviou o rosto da imagem.

– Olhe para si mesma. – ordenei.

– Não. Não quero.

– Olhe para si mesma. – repeti.

Ela olhou, e contraiu o rosto quando viu o próprio reflexo. Sinceramente, eu não conseguia acreditar nisso.

– Você se acha feia. Acha-se gorda. Não come, ou come o mínimo possível, e depois vomita porque se sente culpada por ter comido. Quando aquelas garotas passaram a te chamar de gorda, você parou de comer. Queria ser magra e bonita como elas. Queria se sentir boa como elas. Queria ser aceita por elas.

Lágrimas escorriam por seus olhos.

– Ouvir isso de você faz tudo parecer mais doloroso. – ela me disse olhando para baixo.

Lágrimas escorriam por nossos olhos.

– Se eu pudesse... Mostrar-te o quanto você é linda... O quanto você é especial pra mim... Se você soubesse o quanto eu te amo...

– Não… Você não conseguiria… Você não faz ideia do quanto eu me odeio. Do quanto eu me acho horrorosa, inútil... Do quanto eu acho que não faço a diferença em nada. Se eu pudesse ser magra, Nico... Provar para mim mesma e para aquelas garotas que eu posso sim ser bonita como elas, que eu também posso ser perfeita... Mas tudo que eu como parece que se torna em gordura. Tudo que eu visto não fica bom o suficiente. Eu tenho tentado tanto ser perfeita, mas eu não consigo...

– Meu amor... Você já é perfeita! Como é que a Miss Perfeição em pessoa pode não se achar perfeita?!

– Não, Nico... Você não entende... Eu já tentei gostar de mim mesma, mas é difícil com essa minha aparência...

– Pare! Pare de pensar assim. Eu entendo que é difícil, mas meu amor... Olhe para isso... – Subi as mangas de sua blusa e virei suas cicatrizes em direção ao espelho. – Elas não te deixam mais bonita. Você não precisa delas. Elas apenas vão estragar sua pele... Alex, eu não entendo como é possível você não se achar bonita, mas eu vou tentar fazer você mudar sua mente. Você vai olhar no espelho algum dia, e irá pensar que está linda, porque linda é o que você é. Vai ser difícil no começo, querida, mas eu juro pelo Rio Estige que você vai se amar.

– Eu não consigo... Não é possível me amar! – ela soluçava.

– É CLARO QUE É POSSÍVEL! – Gritei. – EU TE AMO! Eu... Eu te amo, Alex... Você não precisa de mais ninguém, de mais nada. Eu vou te mostrar que eu te amo, não importa o quanto isso me custe ou quanto tempo leve. Mas, por favor, amor... Você tem que tentar. Eu quero te ajudar, mas antes de tudo, você tem que querer se ajudar. Você tem que querer melhorar.

Ela não me olhava, soluçava baixinho, cabisbaixa.

– Você quer melhorar, Alex? Você quer minha ajuda? Estou disposto a fazer tudo por você e para você. Mas se você não quiser, não há nada que eu possa fazer.

Silêncio.

– E então?... O que vai ser?

Silêncio.

– Eu...

Um soluço.

– Eu não sei... Se quero melhorar.

Quem se calou dessa vez fui eu.

– Essa tristeza... É viciante. Eu não gosto de me sentir assim, querido, mas... Tem alguma coisa em se sentir assim, que eu gosto...

– O que?

– Eu não sei... Nico, olha, eu não tenho certeza do que eu quero, mas eu vou tentar por você. Se isso significa que eu vou ter você ao meu lado, então eu... Irei tentar. Mas eu não prometo que conseguirei. Não sei... Não sei se consigo.

– Alex, com tudo que você já passou, sinceramente... Você conseguiria enfrentar o Inferno em silêncio.

Hell in silence

I can fight it, I can fight it

Pelo menos consegui fazê-la sorrir.

– Nico... Você é bom demais pra mim. Eu faço essas coisas e você continua aqui... Por quê?

– Porque eu te amo sua besta. – Beijei seu nariz, e sorri. – Viu? Se você não valesse a pena, eu não faria nada disso. E eu só faço isso porque é você. É só pra você, e tudo para você.

It's all for the sake of love

It’s all for you