—Harry, por favor! - Matt já havia perdido a conta de quantas vezes pedira ao garoto para que o ajudasse com o trabalho. A Professora Anna, em seu primeiro dia de aula, resolvera aplicar um trabalho aonde os alunos formariam duplas e simulariam um Show de Talentos.


Segundo ela, aquela era uma performance que aproximaria os estudantes, para que o resto do ano fluísse em harmonia. Matt ouvira tudo aquilo com pesar. Seu parceiro no trabalho era Harry Osborn e eles teriam de escolher entre cantar, dançar, atuar ou recitar para uma turma cheia de adolescentes. Nenhum aluno parecia contente com a tarefa. As duplas se dividiram pelo grande ginásio coberto, planejando suas apresentações. Matt chegara à conclusão de que recitar algum poema ou um trecho de algum livro seria a opção menos humilhante, infelizmente, Harry não.

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—Eu não vou fazer isso, ok? É ridículo! - O garoto disse a Matt, cruzando os braços.


—Harry, é a única coisa que podemos fazer. Eu me recuso a ficar sem nota por sua causa!


—Olha, eu tenho uma reputação a zelar. Não vou recitar nenhum poeminha idiota e virar chacota da escola inteira. Pode tirar o cavalo da chuva! - Harry falava firme, irredutível. Era ridículo, Matt sabia. Mas preferia passar por ridículo a ganhar um lindo zero logo no primeiro dia de aula. Tinha planos para o futuro e queria que seu histórico escolar fosse exemplar.


—Harry, me escuta! Nós não sabemos cantar, não sabemos dançar, não sabemos atuar... - Matt já havia perdido a paciência e chacoalhava a folha com as instruções da atividade na cara de Harry. Ele não podia enxergar o rosto do garoto, mas tinha certeza de que o mesmo revirava os olhos - A única porcaria que sabemos fazer é ler. Então, pare de birra e trate de decorar logo algum maldito poema! - Harry se surpreendeu. Nunca havia visto Murdock perder a compostura assim. Sempre viu Matt como o garoto nerd e certinho. Tratou de pegar o papel que ele lhe apontava e o viu abaixar os ombros, mais aliviado.


—Leia as instruções, por favor - Matt pediu agora calmo. Harry bufou.


—Só para deixar registrado - Osborn disse - Eu odeio Educação Artística!


Um pouco mais a frente, Peter balançava a cabeça em negação.


—Wade, eu realmente acho que não é uma boa ideia...


—'Tá brincando? A professora vai adorar! – Wade respondia animado, oferecendo um dos fones de ouvido a Peter – Você sabe a letra, só precisa entrar no ritmo...


—Eu... E-eu não vou conseguir fazer isso. Eu nunca nem falei em público antes. Eu não vou conseguir cantar para a sala inteira! – O plano de Wade havia sido cantarem uma música, que segundo ele, era a maneira mais fácil de fazer a atividade. A ideia de cantar a plenos pulmões para uma turma de jovens não parecia intimidar o rapaz de maneira alguma – Nós podemos fazer a mesma coisa que o Harry e o Matt... Eles só vão ler.


—Eu te disse que sou péssimo em decorar qualquer coisa...


—Você decora músicas, não decora? – Peter perguntou levantando uma das sobrancelhas – É a mesma coisa, Wade.


—Não, é diferente. E também não é como se eu tivesse acabado de conhecer a música. É Queen, cara. Todo mundo conhece o Queen! – Peter bufou em desistência. Não adianta, ele não vai mudar de ideia. A professora anunciou que o tempo de preparação havia acabado e pediu para que os alunos se reunissem na frente das arquibancadas, a onde seria o palco improvisado.


—Tudo bem, pessoal. Como estamos em um número pequeno e tudo isso é uma grande brincadeira – Pequeno? E que brincadeira é essa que vale nota? Pensou Peter enquanto a professora falava – Nós não precisamos de um microfone. Então, quero que todos permaneçam em silêncio e prestem muita atenção. Lembre-se de falaram alto quando for a hora. Certo? – Ouve um burburinho e os alunos começaram a se deslocar, alguns pareciam agora até mais animados ou nem tanto. Anna havia alertado de que os que não realizassem a atividade teriam de participar de um projeto especial que ela estava planejando. Ninguém parecia interessado.


—Me lembre de reclamar com o diretor sobre essa professora – Harry se aproximou de Peter.


—Pelo menos meu nome está no final da lista – O garoto respondeu – Eu deveria ter me atrasado mais, quem sabe ela não me proibiria de entrar na aula?

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—Azar o seu – disse Harry apontando para as instruções de Peter, nela continha um espaço em branco a onde os alunos deviriam descrever suas performances – Vai realmente fazer isso?


—Vou ter que fazer... Wade está seguro de que a professora vai adorar...


—A professora, com certeza – Harry riu – Já todo o resto... Eu disse que o cara não batia bem!


—Harry! – Peter repreendeu – Ele é normal se quer saber... Está bem, é um pouco diferente. Só isso.


Os nomes começaram a serem chamados e as apresentações iniciadas. A maioria era feita com muito mal gosto. Algumas estudante resolveram dançar e saíram-se até muito bem. Algumas duplas leram poemas e outras encenaram cenas de filmes clássicos. Harry foi ao encontro de Matt e Wade se aproximou novamente, sorrindo, confiante. Peter não pode deixar de sorrir tímido para o rapaz. Não pode ser tão ruim assim, não é?


Logo, Harry e Matt foram chamados. Eles caminharam até o “palco” e Harry subiu na arquibancada. Matt preferiu permanecer no chão.


—E então, meninos? O que vocês nos trouxeram? – A Professora perguntou animada. Ela estava adorando a atividade, até o momento, só mandara um dupla para a lista do “projeto especial”.


—É... Nós vamos recitar. Recitar um trecho do livro Persuasão, de Jane Austen – Matt falava olhando fixamente o horizonte. A professora pediu que iniciassem.


—Esse trecho é a a carta do Capitão Frederick Wentworth para Anne Elliot – Matt começou – “Não posso mais ouvir em silêncio. Preciso falar com você pelos meios de que disponho neste momento. Você partiu minha alma... Sou metade agonia, m-metade esperança. Não me diga que é tarde demais... que sentimentos tão preciosos foram-se para sempre.


Ofereço-me para você de novo com um coração muito mais seu do que quando você quase o despedaçou há oito anos e meio atrás. Não se atreva a dizer que o homem esquece mais rápido do que a mulher, que seu amor morre mais cedo. Eu tenho amado somente você, mais ninguém. Injusto posso ter sido, fraco e ressentido também, mas nunca inconstante. Você, apenas você trouxe-me para Bath. Faço planos pensando somente em você. Você não ainda percebeu? Terá você falhado em entender meus desejos?"


Matt recitava com incrível calmaria, como se lesse cada palavra. Ouve um silêncio mútuo, de pura apreciação. Alguns alunos pareciam emocionados e Peter correu o os olhos pelo ginásio. Wade escutava atento, e seus lábios mexiam-se juntos com o de Matt, só que em silêncio. Ele conhecia aquele trecho, ele recitava. Peter olhou Harry e o viu encarando Matt, surpreso.


Quando o garoto parou de recitar olhou para Harry, envergonhado. Ele sabia que todos o encaravam. Teve de pigarrear, até que garoto entendesse que era sua vez de recitar.


—É... – Era a primeira vez que Harry parecia constrangido em público – É... “Eu... Eu não teria... esperado nem estes dez dias... se tivesse podido ler... Ah, ler... seus sentimentos como eu penso que você... penetrou nos... Ah... meus.” – O garoto fazia muito esforço para tentar reproduzir as palavras decoradas. O silêncio da turma começou a ser rapidamente trocado por rizinhos e piadinhas – “Quase não posso escrever.... Eu... A todo instante ouço sons...É não... Ouço alguma coisa que me atordoa. Você...” É...


Harry travou. Não conseguia mais se lembrar de palavra alguma. As risadas aumentaram. Olhou para Matt desesperado querendo que ele pudesse ver seu olhar. Matt percebeu, mas antes que pudesse continuar o trecho do parceiro, Harry se adiantou.


— "Você é..." Alguma droga que eu não me lembro – Harry disse debochado. A turma se exaltou ainda mais, rindo alto. A professora irritou-se.


—Sr. Osborn! Eu estou realmente muito decepcionada! Todos se dedicaram na atividade, mas o Sr. parece nem ter se dado ao trabalho, não é mesmo? - Anna aumentou o tom de voz – Para o Projeto especial. A dupla.


As palavras chocaram Matt. Como assim, a dupla?


—É, me desculpe professora, mas eu fiz a minha parte – Protestou o rapaz.


—A atividade é em dupla Sr. Murdock, logo a punição também deverá ser. Não se dedicaram o suficiente – Matt se enfureceu e saiu para longe do palco improvisado. Seria capaz de voar no pescoço de Harry ali mesmo – Ok. Vamos prosseguir...


A professora continuou chamando nomes e Peter, que assistira tudo, achou que seria oportuno fazer a Wade uma pergunta.


—Você disse que não era bom em decorar coisas – começou olhando-o – Mas você recitou o trecho junto com o Matt, eu vi. Como assim?


—Eu lembro de algumas coisas que leio, 'tá legal? – Wade respondeu incomodado.


—Você lê Jane Austen?


—Eu lia... – respondeu simples, cortando o assunto. Peter preferiu não insistir.


Mais alguns alunos se apresentaram, incluído Gween que dançou, incrivelmente bem. Peter e Harry ainda se impressionavam com vários dons desconhecidos da amiga. Mais nomes foram chamados até que por fim, a dupla final foi requisitada. Peter começou a sentir o estomago embrulhar.


—Sr. Parker e Sr. Wilson! – A professora sorriu, não lembrava em nada a mulher que falara antes furiosa com Harry e Matt – O que vocês vão fazer?


—Nós vamos cantar! – se adiantou Wade – Queen, Rapsodia Bohemia!


—Nossa! – Anna sorriu ainda mais – Vocês são a primeira dupla a cantar. Isso é ótimo rapazes, podem começar!


—Pode deixar! Peter, no três, ok? – Wade subiu em cima da arquibancada e puxou Peter junto. Todos pareciam ansiosos pela performance. Todos estão esperando é para rir da nossa cara, Peter não pode deixar de pensar ao sentir o estomago embrulhando cada vez mais.


—“Is this the real life?” – Wade começou a cantar. Nem de longe sua voz seria própria para isso. Era desafinado e o fato de ser acappella deixava tudo ainda pior – “Is this just fantasy?”


—Meu Deus! – Harry falou baixo colocando a mão na boca, em choque.


Caught in a landslide
No escape from reality


Wade fazia gestos com a mão para que Peter começasse a cantar. O garoto balançava freneticamente a cabeça em negação. Não, por favor! Por favor!


Open your eyes
Look up to the skies and see


Peter se viu abrindo a boca pela primeira vez, mas o que saiu de lá não foi mais do que um cochicho tímido. Os alunos começaram a se agitar, rindo.


I'm just a poor boy
I need no sympathy
Because I'm easy come, easy go
Little high, little low
Anyway the wind blows
Doesn't really matter to me, to me

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Wade cantava como se estivesse em seu próprio show. A essa altura do campeonato, os alunos riam, batiam palmas e cantavam junto. Peter viu vários celulares apontados para eles, filmando. Filmando sua desgraça.


"Mama, just killed a man
Put a gun against his head
Pulled my trigger, now he's dead
Mama, life had just begun
But now I've gone and thrown it all away
Mama, oh!
Didn't mean to make you cry
If I'm not back again this time tomorrow
Carry on, carry on
As if nothing really matters
"


A professora também já havia entrado no clima e batia palmas junto dos alunos. Aquilo era o fim.
A "platéia" foi a loucura quando a crescente da música começou. Peter já não sabia mais aonde enfiar sua cara. Ele cantava algumas frases desconexas em meio a todo o show de Wade.


"Too late, my time has come
Sends shivers down my spine
Body's aching all the time
Goodbye everybody, I've got to go
Gotta leave you all behind and face the truth
Mama, oh!
(Anyway the wind blows)
I don't wanna die
I sometimes wish I'd never been born at all
"


Jesus, essa música não tem fim? Peter sentia o estômago se revirar cada vez mais. Procurou entre os alunos, Harry, e o viu perto de Matt, Gween e Foggy. Ninguém parecia acreditar muito no que estava vendo e ouvindo. Harry se matava de rir. O estômago de Peter continua a se contorcer.


"I see a little silhouette of a man
Scaramouche! Scaramouche! Will you do the fandango?
Thunderbolt and lightning, very, very frightening me
Galileo! Galileo!
Galileo! Galileo!
Galileo Figaro!
Magnifico, oh!
"I'm just a poor boy and nobody loves me
He's just a poor boy from a poor family
Spare him his life, from this monstrosity
Easy come, easy go, will you let me go?
Bismillah! No, we will not let you go! (Let him go!)
Bismillah! We will not let you go! (Let him go!)
Bismillah! We will not let you go! (Let me go!)
Will not let you go! (Let me go!)
Never, never let you go!
Never let me go, oh!
No, no, no, no, no, no, no!
Oh, mamma mia, mamma mia! Mamma mia, let me go!
Beelzebub, has a devil put aside for me, for me, for me"


Wade começou a afinar a voz, dando enfase a parte mais animada da música. Ele se empolgava cada vez mais. Quando Peter pensou que não havia mais nenhuma maneira de passar vergonha. Wade se exaltou ainda mais, pulando entre as arquibancadas, o puxando. O grande momento da música aconteceria finalmente. O estômago de Peter só girava.


"So you think you can stop me and spit in my eye?
So you think you can love me and leave me to die?
Oh, baby! Can't do this to me, baby!
Just gotta get out
Just gotta get right outta here
Oh, yeah! Oh, yeah!
Nothing really matters
Anyone can see
Nothing really matters
Nothing really matters to me
"


Um rompante de aplausos tomou a turma do segundo ano. Muitos riam, gritavam, assobiavam. A professora estava estarrecida com um enorme sorriso no rosto. Wade ofegante e descia do "palco" puxando Peter. O garoto de tão vermelho, poderia estar ficando roxo. Percebeu que na porta do ginásio, alunos de outras classes (provavelmente os que estavam tendo aula nos ginásios ao lado) se amontoavam para ver e aplaudir a apresentação dos dois. Depois de tudo aquilo, Peter se permitiu olhar para Wade e rir. Havia sido coisa mais estúpida que já fizera na vida. Mas no fim, ganharia uma excelente nota, a professora parecia ter amado. Até que, sentiu seu estômago revirar de maneira intensa. Não, não, não!


Antes que pudesse pensar em sair correndo para o banheiro, Peter se curvou e despejou no chão seu almoço inteiro. A turma silenciou-se.


—Sr. Parker, querido - A professora se aproximou preocupada - Está tudo bem?


Se está tudo bem? Claro! Só gorfei na frete na turma inteira. Peter passou a mão na boca e olhou para seus colegas, percebeu então, que a maioria dos celulares continuavam gravando o final da apresentação.


O silêncio logo foi quebrado com uma enxurrada de risos. Peter olhou para os próprios pés. Ótima maneira de começar o ano.


[...]


O resto das aulas, voaram. Peter não pode evitar de ouvir todas as piadinhas pelo resto do dia. Os vídeos com a sua cantoria ridícula e a gorfada no final haviam se espalhado como um vírus. Logo a escola inteira já estava sabendo se sua gloriosa performance. As piadas eram maldosas e mesmo assim, Wade pareceu ligar. Peter observava de longe, as brincadeiras de seus colegas para com o rapaz e o mesmo apenas entrava nelas. Como se estivesse comemorando a abertura de um grande show exclusivo. Peter se sentiu mal por ele.


Além de tudo, no final do dia, todos os alunos da escola foram reunidos no grande (grande mesmo) auditório para escutarem uma longa fala do novo diretor. Ele apresentou-se, apresentou sua proposta de "nova escola" e se estendeu nas normas escolares. Quando finalmente todos foram dispensados e o jantar servido, Peter deitou-se com pesar na cama. Havia sido um dia agitado e tudo que mais queria no momento era deitar e dormir tranquilamente. Olhou de canto Matt, que passava os dedos sobre um livro, já deitado em sua cama. Não achou por mal então, apagar a luz do abajur e desejar uma boa noite. Antes que pudesse realmente cair no sono, viu o celular piscar.


22:37— Facebook: Harry Osborn te marcou em uma publicação.


Com muito preguiça, Peter clicou na notificação e foi redirecionado a uma página da rede social. Era o perfil de um rapaz desconhecido.


Will Sloan
Vejam o que esses caras fizeram na escola!!! LOL


Peter estremeceu. Viu o maldito do vídeo da performance, no Facebook. Ao dar um rápida procurada, o garoto percebeu que o vídeo havia se espalhado por toda a rede e agora, provavelmente ele e Wade eram os mais novos memes da internet.
Peter bufou e jogou o celular de lado, se afundando no travesseiro. A onde estava com a cabeça quando concordou com ideia daquele maluco do Wade Wilson?